"A demagogia consiste em utilizar métodos discursivos ... fraudulentos porque usam a mentira intencional para capturar o favor dos cidadãos"
António Guerreiro, Ação Paralela, Público 2025.05.16
As últimas sessões do 11º congresso do CRP (Centro Rodoferroviário Português) foram dedicadas à linha de Alta Velocidade Lisboa-Porto-Vigo conforme o programa em https://11crp.crp.pt/programa/ .
Comento neste texto apenas as intervenções do representante da Mota Engil, eng Rui Guimaráes, da Câmara de Coimbra, enga Ana Bastos, e da IP, eng Carlos Fernandes.
1 - Mota Engil
Sobre a intervenção do representante da Mota Engil assinalo a coincidencia com uma intervenção minha em 2008 numa sessão, organizada pelo gabinete de advogados que tinha elaborado a lei de contratação pública, para a divulgar junto dos técnicos do metropolitano de Lisboa. Apesar de estarmos presentes mais de uma centena de técnicos, apenas outro colega e eu apontámos inconformidades à proposta de lei. Chamei a atenção ao senhor advogado que a obrigação do processo de concurso estar concluido ao pormenor para poder iniciar-se o processo de avaliação ambiental e subsequente aprovação introduzia um atraso não desejável na concretização do investimento, nomeadamente porque o caderno de encargos não deve incluir um projeto de execução sem variantes, mas antes um estudo prévio conpatível com melhorias tecnico económicas na fase de análise propostas e de início da obra. O senhor advogado foi muito simpático e disse que eu devia ser razoável cumrindo a lei, mas eu fiquei a pensar que provavelmente ele nunca teria conduzido uma obra e achava que os projetos de execução podem ser feitos por quem elabora o caderno de encargos e não por quem vai fazer a obra (exemplo, o caderno de encargos deve definir um nível de iluminação, mas é o concorrente que diz quantas lâmpadas e de que tipo precisa para satisfazer a especificação). Isto é, quem tinha feito a lei não conhecia as questões de obra. Nesse mesmo ano foi inútil o meu pedido à adminstração para que lançasse rapidamente, antes da entrada em vigor da nova lei da contratação pública, o concurso para a instalação de elevadores na estação Colégio Militar. Teve tempo a SONAE para construir a sua segunda torre no centro comercial Colombo, enquanto as obras dos elevadores se arrastaram ano após ano, com desistencia do primeiro empreiteiro.
Apoio as declarações no congresso dos representantes da Mota Engil ao proporem, nos processos de avaliação de propostas a valorização das soluções técnicas, incluindo a ossibilidade de variantes.
É evidente que a Mota Engil defende os seus interesses ao criticar a lei da contratação pública, mas muita da sua argumentação está correta. É necessário melhorar a lei. Mas é difícil que a parte jurídica aceite a crítica com humildade e espírito de cooperação.
2 - Câmara Municipal de Coimbra
A apresentação de Ana Bastos confirmou o que já se sabia. Partindo de uma reivindicação justa mas que deveria ser moderada com critérios de eficiência energética, aproveita-se a construção da linha de AV para promover uma reurbanização perdulária das zonas da estação de Coimbra B e entre Coimbra B e a antiga Coimbra A, desmantelando-se a ligação ferroviária entre estas. Analogamente ao caso de Campanhã, também com um desvio do trajeto Santo Ovídio-Aeroporto, entregou-se a arquiteto famoso o projeto de um investimento imobiliário muito elevado, incompatível com critérios de equilíbrio económico e financeiro. Pessoalmente, preferiria a estação de AV de Coimbra em Taveiro, com ligação de 7,5 km à antiga Coimbra A, ou preferivelmente na margem norte do Mondego com ligação de 5 km a Coimbra A, através de uma linha de metro ferroviário tápido em sítio rigorosamente segregado e apenas com paragem em Coimbra B e A. Em qualquer caso evitando o desvio em Taveiro pela linha do Norte quadruplicada.
Mais uma vez ouvimos os encómios à solução metrobus, que não posso subscrever por várias razões:
i) em igualdade de desenvolvimento tecnológico e de capacidade de transporte, o veículo ferroviário tem um índice de eficiência energética da ordem de 60 Wh/passageiro-km contra 70 Wh/pass-km do veículo de pneus;
ii) o rendimento da tração por baterias é da ordem de 66% contra o rendimento de 90% por catenária
iii) para uma capacidade a bordo de 1000 kWh o veículo por baterias necessita de um peso permanente de cerca de 10 toneladas para equipamento e baterias
iv) de acordo com várias informações, só existirá guiamento ótico automático nas estações e nos túneis, duvidando-se da fiabilidade do sistema, se estendido a todo o percurso, em condições meteorológicas extremas
3 - IP Sobre a intervenção de Carlos Fernandes registo que se mantem a política dos sucessivos governos portugueses, assente na estratégia conservadora da IP, dos seus consultores e do Agrupamento Europeu de Interesse Económico RFC4 (que gere o corredor atlântico de mercadorias), a qual pretende integrar as novas linhas de AV na expansão da rede existente de bitola ibérica.
Esta estratégia é contrária à regulamentação comunitária como o comprovam os sucessivos relatórios (workplans) e recentes declarações do coordenador da DG MOVE do corredor atlântico, Carlo Secchi: resposta C.Secchi 12mai2025 . Nelas se insiste na bitola UIC, incluindo a proposta de implementing act para os relapsos franceses do GPSO.
Considerando que desde 2017, com a emissão do Manifesto Portugal uma ilha ferroviária? vêm-se repetindo sessões públicas em que não é promovido um debate exaustivo e esclarecedor, baseado em argumentação técnica conferida, sobre o cumprimento dos regulamentos no planeamento e construção das novas linhas das redes transeuropeias interoperáveis TEN-T, decidi enviar a Carlos Fernandes a seguinte comunicação:
Caro Colega
Escrevo-lhe a propósito da sua intervenção no 11º congresso do CRP, em que se repetiu a situação verificada na Ordem dos Engenheiros em 2023.09.14 . O colega tinha afirmado que Espanha fazia o mesmo que Portugal na linha Lisboa-Madrid, via única e bitola ibérica em travessas polivalentes, como argumento para justificar a opção pela bitola ibérica em Portugal. Fiquei de lhe enviar e enviei-lhe as fotos e a descrição da ADIF AV da linha da Extremadura (Madrid-Badajoz) mostrando a via dupla (efetivamente entre Badajoz e Merida havia um troço de via única, como em Évora-Caia, mas do lado espanhol não há viadutos com tabuleiros e pilares apenas para uma via como do lado português em que só existem as bases dos pilares para os tabuleiros da segunda via). Não comparei os 250km/h de velocidade de projeto do lado português com os 300km/h do lado espanhol porque na altura o segredo da limitação a 250km/h estava ainda guardado. Também na atualidade a diferença é grande, com ensaios de ERTMS a decorrer na linha de AV Plasencia-Badajoz, aguardando-se o planeamento para a sua instalação do lado português. Não tendo recebido acusação da receção, provavelmente terei endereçado mal a comunicação.
Tentarei melhorar o canal de comunicação desta vez, a propósito da sua afirmação no 11º CRP que Espanha faz o mesmo que Portugal, só está a construir novas linhas de AV em bitola ibérica. Mais uma vez o argumento de que Espanha e Portugal têm o mesmo comportamento face à linha Madrid-Lisboa.
Discordo lembrando que o colega sabe melhor do que eu que o Y basco está a ser construido, devagarinho mas está, em bitola UIC para tráfego misto passageiros e mercadorias com o objetivo 2030 da rede core do regulamento 1679 ; que está em curso a ligação com terceiro carril na linha existente de Irun a Astigarrara; que decorrem concursos para as obras da nova linha Burgos-Vitoria em bitola UIC (é verdade que exclusiva para passageiros, o coordenador do corredor atlântico Carlo Secchi ainda não conseguiu obter do governo espanhol o planeamento para a ligação das mercadorias em bitola UIC e os mapas do anexo I do regulamento 1679 não esclarecem, terá de se fazer transbordo, numa primeira fase, em Vitoria).
Pela positiva, vejam-se as declarações do ministro Puente nos ensaios do ERTMS em Plasencia-Badajoz (continuamos a acreditar no STM? é viável, mas não era mais prático atender ao que diz o regulamento 1679? o ERTMS é para estar a funcionar em 2030 e o CONVEL desativado em 2040). Vamos ter Madrid-Navalmoral/Talayuela em bitola UIC, decorre o estudo prévio. Pena que só para passageiros (lá está, os mapas 7 de mercadorias do anexo I do 1679 precisam de ser corrigidos para mais cedo que 2050).
Lembro ainda que o corredor mediterrânico beneficia de um apoio informado e reivindicativo por parte de associações empresariais podendo ver-se no site "Quiero corredor" o andamento da instalação da bitola UIC, prevendo-se que Valencia já estará ligada em bitola UIC à fronteira francesa, passageiros e mercadorias, antes de 2030 (2027?), quer em linha nova, quer em pré existente com terceiro carril ou "migrada" de ibérica para UIC, aumentando a atratividade do investimento estrangeiro em novas instalações industriais como se vem verificando na região de Valencia.
Em resumo, embora com limitações, desenvolvem-se neste momento em Espanha investimentos em ligações com bitola UIC , no corredor mediterrânico e no corredor atlântico, não tão velozmente como os seus comisionados desejariam, mas desenvolvem-se. Por isso, não parece consistente afirmar que Espanha já só constroi em bitola ibérica.
Optei por não comentar a sua afirmação no período de perguntas porque provavelmente me seria dito que não permitiriam o estabelecimento de diálogo direto (pena não se cultivar o diálogo informado, direto ou indireto).
Comento ainda duas afirmações suas no período de perguntas e respostas: 1 - Portugal pedirá adiamento da bitola UIC provavelmente por décadas (a questão do art.17.5) - concordará que já será mais que longo prazo e que entretanto se constrangirá o crescimento das exportações (como se deduz das vantagens para o comércio internacional referidas no PFN), confirmando o velho ditado de que o barato sai caro (poupar agora no investimento em UIC e linhas sem pendentes para perder o que for preciso nas próximas décadas); 2 - o projeto de AV é do país - se é do país parecerá lógico que seja a AR a aprovar o plano de transportes após debate na respetiva comissão com audição dos cidadãos como mandam os arts 48 e 165.1.z da Constituição, e não que ele seja aprovado por decreto lei do governo. Isto para não falar nos SUMP da AML e do seu PROTAML, sistematicamente ignorados pelos sucessivos governos ao arrepio das determinações do art.41 do regulamento 1679.
Deixo-lhe um link para recentes declarações do coordenador da DG MOVE do corredor atlântico, Carlo Secchi: resposta C.Secchi 12mai2025 . Nelas se insiste na bitola UIC, incluindo a proposta de implementing act para os relapsos franceses do GPSO.
Deixo-lhe ainda um link onde poderá encontrar os artigos e as apresentações com que participei no 11º congresso do CRP e que foram delicadamente remetidos para sessões paralelas pouco concorridas, evitando-se assim o diálogo informado artigos_resum
exec e apresentac temas 21 e 22 Não se cultiva em Portugal o debate informado, a divisão do grande auditório em grupos enquadrados por recoletores de pareceres para integração num pareceer final.,. técnicas de think tanks e wisdom of crowds ...
Com os melhores cumprimentos e ao dispor para esclarecimentos complementares
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Continuo impulso a la conexión de las capitales vascas a la red de alta velocidad y al Corredor Atlántico
Adif adjudica la redacción del proyecto para montar vías en el ramal guipuzcoano de la ‘Y’ vasca
• El proyecto, fase previa a licitar los trabajos, define las actuaciones a realizar para tender vías en este tramo (60km)
• Adif sigue adelantando y avanzando trabajos de la siguiente fase de la línea de alta velocidad, mientras completa la construcción de la plataforma del ramal vizcaíno, para el que también tiene en licitación la base de montaje de vía
• Suma estas actuaciones a las que impulsa en otros puntos y ámbitos de la línea: el nudo de Bergara, el tercer carril entre Astigarraga-Irun, el nudo de Arkaute o la licitación de primeras obras de la LAV Burgos-Vitoria