sábado, 30 de outubro de 2010

Very fast post in blog 36 - o Requiem de Fauré na Gulbenkian



Este blogue confessa-se novamente emocionado. O maestro talvez nalgumas partes tenha sido lento. Mas com isso conseguiu o silencio e a concentração dos espetadores na Gulbenkian. Dies illa, dies irae,calamitatis et miseriae (Que dia, um dia de ira, calamidade e tristeza). Não é precisa uma política dirigista  e demasiado subsidiarizante do ministério da Cultura. É necessário sim que o ministério compreenda que espetáculos destes, de tão alto nível, com a soprano portuguesa Ana Quintans  a cantar maravilhosamente e bem acompanhada pelo barítono português Luis Rodrigues, saiam das paredes da fundação e sejam usufruidas pelo povo. A entidade reguladora da televisão pode bem num dos dias da semana lançar impostos elevados sobre os programas de baixo nivel para convencer as estações a comprar os programas de alto nível; que podem ser vendidos às televisões estrangeiras; que podem ser apoiados, os programas de alto nível, por simples cidadãos em regime de mutualidade. Pobre ministério da Cultura; pobre na rubrica do orçamento do Estado, que tão rico podias ser, mesmo com essa rubrica de dies irae, calamitatis et miseriae.
Está comovido, este blogue.

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Arquitectorium 7 - Praça de Londres a arder


O poeta surrealista José Afonso...
Praça de Londres a arder...
Poderia começar assim, porque Zeca Afonso foi um dos principais poetas surrealistas portugueses.



"Rio largo de profundis
Uma neta pra nascer
Amor avenidas novas
Praça de Londres a arder.
....................................."
Ocorre-me este poema quando passo na Praça de Londres.
Já foram retirados os tapumes e agora estão as vedações de rede.
Praça de Londres a arder.
Vejo uma modulação, como dizem os senhores arquitetos, de terra amontoada em plano inclinado da Avenida de Roma para a Avenida Guerra Junqueiro.

As obras ainda não estão concluidas, mas será que ainda vai ser instalada uma proteção contra o deslizamento da terra para a via de rodagem em dias de chuva?
E porque me incomoda a altura de terra que sufoca a base dos troncos das árvores?



Entre aquelas duas casuarinas sentei eu numa manhã de verão, há 46 anos, quem me deslumbrava no enamoramento pré-nupcial.
Retiraram o banco de jardim que lá estava, ainda há 6 meses.

O assunto não tem importancia, quando comparado com o que aflige os cidadãos e as cidadãs.
Mas é um sintoma.
De inconformidade, como dizem os técnicos de transportes.

PS - Passei novamente pela Praça de Londres ao fim do dia 29 de Outubro de 2010.  Choveu muito de manhã, a ponto de inundar o Rossio e obrigar a interromper a circulação do metropolitano. Ainda bem que a maré cheia tinha sido mais cedo e que estamos em quarto minguante (na lua nova ou na lua cheia as marés são mais altas).
O terreno postiço da Praça de Londres deslizou para os passeios mas não atingiu a via de rodagem. A chuva apenas deixou à vista pedras e sulcos de escoamento desenhados no terreno enquanto a relva cresce incipiente. Não está bonito.


quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Almoço na esplanada da Gulbenkian 7 – ainda as exportadoras negativas

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/09/almoco-na-esplanada-da-gulbenkian-6-as.html

O meu amigo, depois da primeira leitura do livro "Os últimos 200 anos da nossa economia e os próximos 30" tinha ficado a pensar no assunto das dez principais exportadoras portuguesas que, no seu conjunto, contribuem, paradoxalmente, para o desequilíbrio da balança de pagamentos, e decidiu apostrofar-me por causa do texto que escrevi em 1 de Setembro passado.
Que afinal lhe fazia confusão a diferença (Exportações - Importações) ser negativa.
Dizia ele:

- Como é que é possível? Então a Auto Europa recebe um kit de peças da fábrica da Volkswagen na Alemanha que nos custa X, mais um kit de auto rádios e de eletrónicas com software de comando do Japão que nos custa Y, mais um kit do outro lado do sol posto que nos custa Z.
Total importado I = X+Y+Z.
Quando se exporta o carrito exportamos I mais o valor acrescentado da assemblagem portuguesa.

- Bem, não sei explicar bem isto, mas parece-me que é assim, e não é nada bonito:
A Auto Europa, para além de I importado, recebe ainda os fornecimentos nacionais no valor A. A malta assembla e monta tudo acrescentando o valor B da mão de obra portuguesa, produzindo assim o carrito. Chamemos P = A+B à parte portuguesa.
Esse carrito é então mandado para a Alemanha e ficou pelo valor exportado de:
V=(I + P) (1 + pL + gL)
sendo L a taxa de lucro (o motor principal da economia segundo os Adam Smithistas) expressa por unidade , p a parte do lucro português expressa também por unidade, g a parte do lucro germânico e p+g = 1.
O meu amigo aquiesceu mas nada disse, enquanto enrolava o espaguete do seu prato de Bolonha.
O valor exportado, que será contabilizado no PIB (produto interno bruto), será:

V=(I + P) + (I + P)pL + (I + P)gL

sendo (I + P)gL o lucro germânico que vai ser :
                                                               
• contabilizado no PNB (produto nacional bruto)da Alemanha, e que vai ser
• descontado ao PIB português para cálculo do PNB português
          
É aqui que bate o ponto, as grandes empresas exportadoras portuguesas contribuem bem para o PIB, mas a sua contribuição para o PNB é mais reduzida.
Quer dizer , continuei eu, ignorando o ar enfadado do meu amigo, que por cada carrito a Alemanha paga-nos em divisas:

• o valor das divisas que a Auto Europa tinha exportado para obter I , compensando-as
• o valor de P + (I + P)pL

mas vai exigir à Auto Europa o pagamento de um tributo no valor do lucro germânico (I + P)gL

O meu amigo passou à sobremesa, aparentemente indiferente e concentrado na toilette de uma jovenzinha alemã, provável estudante do programa Erasmus.

- Mostra lá o papel, disse ele (ele sempre gostou de se entreter com manipulações matemáticas, e foi o que fez).
Aqui tens, chega-se a esta inequação, as exportações da Auto Europa só serão maiores do que as importações se se verificar

P + (I + P)pL > (I + P)gL
P +IpL + PpL > IgL + PgL
P – PgL +PpL > IgL – IpL
P [ 1 – (gL – pL)]) > I (gL - pL)
>  I (gL - pL) / [(1 – (gL - pL)]
 
- Realmente é, tens razão, isso quer dizer que, se os lucros forem fraternalmente repartidos entre a Alemanha e Portugal, basta que a componente portuguesa seja maior que zero para haver predomínio das exportações sobre as importações.

- O que pelos vistos não acontece.
Imagina que L=0,6 (60% de lucro), g=0,6 e p=0,4.
Então
P  >   I 0,12 / 0,86

Temos de concordar que é um pouco violento, a incorporação nacional ter de ser sempre maior do que 14% da parte importada para fazer pender a balança para o lado certo.

- Bem, a Volkswagen não é propriamente uma instituição de beneficência.

- Razão tinha aquele ministro, a mão de obra em Portugal está barata.

- Razão têm os economistas, aquele que dizia que o rendimento do trabalho é quase sempre muito menor do que o rendimento do capital, e aqueles que dizem, pobre país em que o PNB é muito mais pequeno do que o PIB, já de si não muito grande… Temos de aumentar o valor acrescentado dos bens transacionáveis exportados, como diz o livrinho “Os últimos 200 anos da nossa economia…” e aplicar as 25 medidas recomendadas.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Os dois acidentes, a estatística e as medidas prioritárias


Exmo Senhor Ministro

Gostaria muito que a presente carta chegasse ao seu conhecimento.
Por formação profissional, interessam-me as causas físicas das coisas e a correspondência com a realidade da matemática das estatísticas.
Escrevo pela mesma razão que levou um especialista de psicologia de apoio a vítimas do terrorismo, radicado em Londres, a propor o estudo aprofundado da tragédia que é a sinistralidade nas estradas de Portugal, ela própria correlacionada, entre tantas causas, com o contexto psicológico dos portugueses.

Dois acidentes recentes impressionaram-me particularmente:
- a morte de 5 pescadores na estrada de Valença
- a morte de 4 pessoas na estrada de Vila Real, entre as quais 3 jovens estudantes polacos
Seria de grande utilidade o esclarecimento das circunstancias em que eles ocorreram e a divulgação das causas, acompanhada de recomendações que pudessem ter evitado os acidentes. Essa divulgação teria assim efeitos didáticos.

Por outro lado, no momento em que escrevo, fim de Outubro de 2010, apenas estão disponíveis no sítio da ANSR os dados de Julho de 2010 com mortos no local ou a caminho do hospital, e os dados de Março de 2010 com mortos a 30 dias.
Os dados de mortos a 30 dias de Janeiro a Março de 2010 mostraram um acréscimo, relativamente aos mortos no local, de cerca de 30% (de 168 para 219).
Dentre os mortos de Janeiro a Março, os mortos por atropelamento a 30 dias tiveram um acréscimo de cerca de 80% (de 27 para 50) , talvez porque a segurança passiva a bordo aumenta, mas para os peões não.
Independentemente de haver ou não uma tendência (que matematicamente não é significativa) para redução do numero total de acidentes ou mesmo de mortos, estamos perante uma tragédia nacional que legitima os cidadãos pedirem medidas urgentes e eficazes.

Eu gostaria de não ser mal interpretado. Estou convencido de que os órgãos institucionalmente encarregados de analisar os acidentes e os órgãos que elaboram as estatísticas e as campanhas são tecnicamente competentes.
O que eu desejaria era que não se centrasse a intervenção oficial em anunciar sucessos como “estamos a travar esta tragédia” ou em fundar esperanças de melhoria na interpretaçção otimista de estatísticas.

Se queremos reduzir os números, teremos de nos envolver numa campanha eficaz de redução dos limites de velocidade em condições normais e de uma redução ainda mais severa em circunstancias adversas de visibilidade ou aderência.
Podem alguns especialistas tentar demonstrar o contrário, mas a verdade é que há uma correlação fortemente positiva entre a velocidade e a taxa de acidentes. A pressão dos automobilistas apressados também não ajuda e é-lhes muitas vezes dificil compreender a necessidade, como diz o código, de adaptar a velocidade às condições de circulação. Daí a urgencia de uma campanha virada à psicologia.

Nestas circunstancias, sugiro aos serviços competentes, com caracter prioritário:
- a dinamização de uma campanha publicitária pela positiva mostrando os comportamentos corretos nas passadeiras de peões, e no controle da velocidade pelos automobilistas, em condições normais e em condições adversas
- o aperfeiçoamento da adaptação do código da estrada aos objetivos de redução da sinistralidade, nomeadamente revendo o texto relativo às passadeiras de peões e aos limites de velocidade em condições adversas de visibilidade e aderência
- a intensificação da fiscalização da velocidade excessiva, especialmente à aproximação das passadeiras
- a divulgação das condições, das causas, e de recomendações que pudessem ter evitado os acidentes noticiados pela comunicação social

Apresento os meus melhores cumprimentos

domingo, 24 de outubro de 2010

Neologismos

Engraçado, já existe uma aplicação informática, o neotracker,  que deteta e classifica automaticamente os neologismos.

A incidência dos neologismos, na imprensa, ocorre segundo a seguinte ordenação, por ordem decrescente:

1 – na alimentação (porque corresponde à necessidade primária e porque a globalização espalhou os alimentos ; 2 – na política (as tais expressões criadas na chamada luta política); 3 – no desporto; 4 – na informática e na técnica (pois, ou tínhamos uma ideia errada de que a tecnologia avança muito depressa, ou a imprensa não tanto sobre informática e técnica como deveria)

                                          Informação recolhida na Antena 2, com a devida vénia.
Um certo olhar em Outubro de 2010




http://tv1.rtp.pt/multimedia/progAudio.php?prog=2175&clip_wma=75073


Luísa Schmidt, socióloga no Instituto de ciências sociais, especializada em ambiente e comunicação, faz parte deste programa de debate da atualidade na Antena 2.

Ao comentar a violência urbana em França chamou a atenção para que já não é o protesto pela frustração das expetativas de uma reforma tranquila, quando há ainda alguma energia para a usufruir. O cerne da questão é o protesto contra o banditismo financeiro.

A senhora não pode ser acusada de subordinar-se a partidos ou tendências de extrema esquerda ou de esquerda mais ortodoxa.

E até Maria João Seixas, mais ligada ao atual poder político em Portugal, concordou, dizendo mesmo que a ofensiva do poder financeiro nos últimos 20 anos foi obscena.

Gosto de ouvir o programa, gosto de ouvir Luísa Schmidt, não só pelas ideias que expõe, mas pela suave pronúncia que as cidadãs cultas começam a espalhar, com a elisão dos “o” mudos a seguir aos “s” e aos “d”: partid’s, dividid’s, abs’lutamente, iss’. A sério, gosto de ouvir.

Mas também me interrogo por que deixaram os tais partidos e tendências de extrema esquerda e também os que não sendo de extrema se reclamam da dita esquerda, a falar sozinhos durante esses 20 anos.

Eu sei, o politicamente correto é dizer que nos tempos que correm não se põe a questão de esquerda e direita senão na distribuição dos deputados no Parlamento e os partidos da esquerda mais ortodoxa sujaram as mãos em sangue (não quer dizer que os outros também o não tenham feito, mas os princípios da ideologia da tal esquerda ortodoxa eram incompatíveis com isso, com a privação da liberdade, com a crítica da atribuição de prémios a quem sofre essa privação, etc, etc, mas isso é outra conversa) .

Então eu reformulo a questão: não há posições de esquerda e de direita; há apenas que obedecer ao programa da Declaração Universal do Direitos do Homem, o que é incompatível com o atual índice de desigualdade de rendimento, o coeficiente de Gini, como falado em texto recente neste blogue.

O mesmo diz, por outras palavras, o professor Adriano Moreira, em entrevista também na Antena 2, no programa Quinta essência, fundamentando na doutrina social da Igreja a absoluta necessidade de reduzir essa desigualdade (ver em

http://www.rtp.pt/multimedia/progAudio.php?prog=1152&clip_wma=75448     ).


Isto é, já se vão ouvindo, da parte de pessoas bem pensantes, coisas duras para os senhores financeiros e banqueiros:  que devem servir a comunidade, e não servirem-se da comunidade, que devem ser chamados a colaborar na resolução dos problemas, e não para explicarem como os problemas devem ser resolvidos, e como se pode baixar o tal coeficiente de Gini sem que os rendimentos dos bancos e agencias financeiras sofram muito.

Ou será uma visão demasiado marxista do que se está a passar? De que a prioridade ao lucro conduz ao ponto em que os rendimentos começam a ser decrescentes e tem de se voltar atrás (ou avançar?) no processo histórico e mudar de prioridade?

sábado, 23 de outubro de 2010

Ai flores de laranjeira

Parafraseando o trovador,

Ai flores de laranjeira, ai flores de laranjeira,
ai Deus,
onde estão?
se sabedes novas das laranjeiras
da Praça de Alvalade


Passados já uns meses depois da conclusão das obras à superfície, sobre a estação de metropolitano de Alvalade, eis a confirmação do que se disse quando arrancaram as laranjeiras.
As laranjeiras tinham expressão apesar do seu pequeno porte e da amplidão da praça.
Os jacarandás não sombreiam coisa nenhuma os peões que atravessam, porque estão recolhidos junto dos prédios mais altos.
As laranjeiras tapavam a vista , já  tapada pela estátua e pelas árvores de grande porte da avenida, da fachada da igreja de S.João de Brito, no cimo da avenida.
E por fazerem uma coisa que já estava feita, foram extraidas de onde estavam.
Contra a vontade dos moradores do bairro que se pronunciaram sobre o assunto.
A fotografia mostra um dos locais onde estavam.
Vê-se lá, agora, um plano tumular.
Não tem importancia, esta história, quando comparada com as tragédias nacionais, mas é muito importante que se critique a prepotencia.
A todos os níveis.
Muito.
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/03/as-laranjeiras-da-praca-de-alvalade.html

Alcantara no Outono


Visto das Docas de Alcantara, o MSC Orchestra.
Navio de cruzeiros de 89.600 toneladas, 294 m de comprimento e 18 m de calado.
Isto é, pode atracar no terminal de Santa Apolónia na maré alta.
Na maré baixa não.
Isto é, não deve atracar nem na alta.
A CML continuará a pensar em desativar o terminal de cruzeiros de Alcantara?
Será possível?

Registo assim o fenómeno turístico que continua a compensar em parte o desequilíbrio da balança de pagamentos (apesar do representante da companhia MSC fazer um chamariz a turistas portugueses), com o terminal de cruzeiros de Alcantara a funcionar bem.

Mantenho o anterior parecer (que aliás nem é meu, é dos especialistas), que o terminal de contentores de Alcantara não deve ser ampliado (também não pretendo fechá-lo já) e, quando o movimento o justificar, deve ser construido o terminal principal no fecho da Golada.

Mas era bonito deixar Santa Apolónia sossegada.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Se bem me lembro

É imperdoável eu estar a usar como tema deste texto o nome do programa de Vitorino Nemésio. Gostava de o ouvir falar, saltando de tema em tema. É pretensioso da minha parte tentar coisa parecida.

Mas talvez Vitorino Nemésio concordasse comigo que , por vezes, é importante (do meu ponto de vista, claro) fazer uma coisa imperdoável e tendencialmente pretensiosa como esta.

O texto é motivado pela pequena história ocorrida com os gémeos siameses que o Hospital da Estefania não chegou a operar porque tinham um coração comum.

Os gémeos voltaram para Luanda e o DN foi ouvir o cirurgião Gentil Martins, atualmente na situação de reforma.

O DN fez o que os lusitanos costumavam e costumam fazer.

Elegem quem acham que sabe dum assunto e consultam-no.

Não fazem isso por mal nem para privilegiar grupos ou pessoas, até porque não são especialistas.

Fazem-no porque a comunidade não se soube organizar de modo a que em cada especialidade se desenvolvam equipas que contenham em si diversidade e saibam debater os assuntos de forma aberta e centrada nos objetivos, e que se saibam coordenar entre todas as especialidades.

Deu-se o caso que a equipa que analisou o caso dos gémeos tomou a decisão sem pedir uma opinião a Gentil Martins.

Não era obrigatório, nem necessário, mas só houve em Portugal, até agora, separações de gémeos siameses realizadas por equipas dirigidas por Gentil Martins.

Seria então natural que os cirurgiões convidassem o colega sénior para dar um parecer.

Só um parecer, não vinculativo… apenas para que, quem estivesse com a responsabilidade da decisão final, ouvisse argumentos a partir de uma perspetiva diferente; sem que isso significasse que os argumentos fossem melhores; num grupo deve haver diversidade, para que a opinião dominante possa ser cotejada com outras; mesmo que uma opinião contraditória não deva ser adotada, o simples facto de existir estimula a fundamentação da dominante e fortalece-a.

Sem que isso significasse defender feudos em que só o senhor feudal pudesse opinar. Ou quintas, como se diz na versão mais burguesa e liberal que sucedeu ao feudalismo.

Mas não, não faz parte da cultura portuguesa debater as questões abertamente.

Lembro-me de ter acontecido comigo; fiz parte do grupo inter-disciplinar que em 1976 estudou e elaborou a solução de substituição do sistema de venda de bilhetes nas cabinas de bilheteira pelo sistema de canais abertos com obliteração dos bilhetes à entrada . Dezoito anos depois, a industria francesa tinha desenvolvido os canais de acesso com portas automáticas controladas por cartões com “chip” sem contacto e necessitava de mercado internacional. Ninguém se lembrou, no extenso grupo que elaborou a solução adotada, de me pedir uma opinião; e as posições que prevaleceram foram monocromáticas, cristalizando em torno de ideias (sobre o fenómeno da cristalização ou polarização de ideias dominantes em grupos ver a sabedoria das multidões de James Surowiecky) que a realidade veio a demonstrar não serem realizáveis em segurança, como, por exemplo, ter os átrios das estações desguarnecidos de pessoal com os canais de acesso, com portas automáticas, operacionais, ou não conseguirem implementação credível, como a contagem origem –destino dos passageiros (devido à pulverização de títulos de transporte e à necessidade de ter os canais abertos quando não há guarnecimento de pessoal).

Dir-se-ia que numa sociedade equilibrada interessaria ouvir as opiniões dos seniores, por mais impressivo que seja o progresso técnico que rapidamente desatualiza os técnicos (embora não conste que o progresso técnico tenha mexido muito nos teoremas e nos princípios que são a base de qualquer técnica, e que por obedecerem ao método científico estão sempre prontos a ser sujeitos ao referendo e à contestação dos especialistas).

Dir-se-ia que Newton tinha razão em requerer a autoridade científica dos que o precederam para poder ver mais longe, e que isso só era possível porque se tratava de gigantes nos quais se apoiava.

Eu também achava esta frase de Newton muito bonita, até que me explicaram que originalmente estava contida numa carta para um seu rival na academia das ciências, o astrónomo Halley, que tinha uma estatura de quase anão.

Donde eu concluo que nos tratamos mal uns aos outros, mesmo se somos grandes figuras, quando o objetivo essencial a atingir, que é o bem estar das comunidades e o progresso científico, técnico e social, fica em segundo plano.

Não ter falado a Gentil Martins foi tratá-lo mal.

O objetivo essencial era separar as crianças.

De modo que eu, para afastar estes tristes pensamentos, vou tentar socorrer-me de uma metáfora mais técnica, para defender a utilidade dos seniores, e longe de mim a ideia de querer tratar mal alguém, apenas expor a ideia.

Nos anos finais  40 do século passado, toda a industria aeronáutica estava apostada em ultrapassar a barreira do som. A força aérea norte-americana teve meios para isso e conseguiu-o.

O avião que ultrapassou a barreira do som pela primeira vez (existe um filme de Hollywood romanceado, de que eu destaco o ideal da mulher norte americana fada do lar) tinha de ser lançado de bordo de um avião cargueiro porque era movido por foguetes.
Era o Bell X-1, pilotado por Chuck Yeagar, e foi batizado como Glamorous Glennis (a tal fada do lar).

O avião cargueiro escolhido foi um B-19 superfortaleza, com hélices, modelo Boeing de bombardeiro na segunda guerra mundial, com o compartimento das bombas adaptado a berço do avião-foguete.

Foi o sénior que permitiu ao júnior de elevado potencial lançar-se e atingir o objetivo.

Curioso terem escolhido um sénior com hélices, quando já existia o B-52, o bombardeiro quadri-reator de jacto, irmão gémeo do Boeing 707.

Curioso, acreditarem nos seniores.

Devo esta história à maravilhosa facilidade que a Internet põe ao nosso dispor;  uma base de dados com as efemérides de cada dia do ano, para que um estimado colega me chamou a atenção, perguntando-me de supetão, no dia 14 de outubro: sabe qual é a efeméride aeronáutica de hoje?

Ver em http://en.wikipedia.org/wiki/October_14

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A conjetura do economista envergonhado

Há médicos assim. Inibem-se de dizer a verdade ao doente. Mesmo que o assunto não seja sério, preferem manter a sua ciência longe da compreensão dos cidadãos e cidadãs.
Há economistas assim.
Uma análise psicanalítica poderia colocar a hipótese de ser por insegurança própria, resolvendo-se em vergonha ou inibição.
Têm pudor em explicar os efeitos nocivos das suas leis.
É apenas uma conjetura, a do pudor do economista.

Por exemplo, a lei de Philips, vive escondida, como já tenho dito.

A lei dos rendimentos decrescentes
A lei dos rendimentos decrescentes, também ( em inglês: rate to profit to fall - RTPF).
É uma lei de grande impacto na interpretação de fenómenos históricos e sociais. Aumentando um fator de produção mantendo os outros fixos, chegará uma altura em que a produtividade marginal  decrescerá (por exemplo, uma exploração agrícola aumenta a produção e o rendimento total até ao momento em que há excesso de mão de obra; idem para uma empresa em que o número de acionistas ultrapassou o ponto de equilíbrio).
Mas não se fala nela, apesar de Adam Smith e,especialmente David Ricardo, a terem desenvolvido; como se se quisesse manter os cidadãos e as cidadãs na ilusão de que a descida dos rendimentos de um investimento pode evitar-se indefinidamente. Valha a verdade que depois de Adam Smith e David Ricardo foi Marx que desenvolveu as aplicações desta lei, e os economistas de agora não gostam disso.
Porém a lei explica o que aconteceu, por exemplo,  em Opidium (a cidade romana a nascente de Óbidos, descoberta com a construção da A8) e em Conimbriga. As cidades floresciam e de repente desertificaram. Disse-se que tinham sido as invasões dos bárbaros. Ora, o conceito de invasão dos bárbaros é muito discutível e parece  ser primário, preguiça de se pensar melhor, porque as populações "agarradas" às economias locais, principalmente à produção agrícola, sempre foram prevalecendo ao longo das misceginações que se foram fazendo (ver Claudio Torres sobre este conceito). O que a lei dos rendimentos decrescentes explica é que a economia das cidades romanas assentava na escravatura, e foram aumentando de forma insustentável, como se diz agora, o número de escravos necessários para manter as cidades em funcionamento (poderiam ter utilizado a força do vapor que já era conhecida, mas os decisores políticos da altura não perceberam as variáveis em jogo e insistiram na escravatura) até que o rendimento decrescente levou as cidades ao declínio e à constituição dos montes agrícolas, unidades de produção agrícola autónomas, que depois deram nos feudos e nos conventos religiosos que tinham carater descentralizado e dimensões adaptadas à tecnologia da época. Isto é, a lei dos rendimentos decrescentes, não sendo o único fator,  ajuda a compreender o declínio do império romano (e também dos outros) e a ascensão do movimento religioso.

O indicador de Gini da desigualdade de rendimentos
E o indicador de Gini? Já tinham ouvido falar? Eu , pelo menos, desconhecia, apesar de ser um elemento estatístico.
Não, não se fala, mas é um indicador utilizado pelas Nações Unidas para estabelecer uma lista ordenada de países.
O indicador de Gini mede a desigualdade de rendimentos dos cidadãos  de um país, ou média  de todas as diferenças entre os rendimentos de todos os cidadãos           (ver http://en.wikipedia.org/wiki/Gini_coefficient#Credit_risk    e  http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_countries_by_income_equality  ).

E o que é mais importante, é que este indicador é um dos critérios de avaliação das agencias de "ranking" do risco do crédito.
Porque são os economistas tão envergonhados que não nos explicam isto mais claramente?
Isto é, mantendo os outros parâmetros, se quisermos taxas de juros mais baixas temos de baixar o indicador de desigualdade de rendimentos.
Por exemplo, o da Dinamarca é da ordem de 0,25, e o de Portugal é de 0,38 (valores limite teóricos: 0 para todos os cidadãos com rendimentos iguais, e 1 para um cidadão detentor de todo o rendimento nacional).
Podem consultar a lista no endereço indicado.
Como dizia Fernando Pessa, e esta, hein?

As metáforas dos economistas

Devo ao senhor professor Daniel Bessa, economista ex-ministro, o ter-me ensinado, através da comunicação social, a lei de Philips, a saber, que, se quisermos manter o custo de vida baixo, há que aumentar o desemprego.
Esta informação foi honesta, numa altura em que se queria fazer crer à população, isto é, às vítimas da lei, que se podia desenvolver a economia mantendo os preços baixos e criando emprego.
Infelizmente tal não é verdade na maior parte dos casos, e será pouco honesto querer fazê-lo crer à população, apesar de ser bem simples explicar a lei: com a condição de haver produção e oferta suficiente, aumentando o desemprego vai diminuir-se o poder de compra e a procura; se a procura baixa, o preço vai atrás.
Mas o senhor professor vem agora ensinar, como lhe ensinaram, como ele próprio disse, que as políticas económicas ou são expansionistas ou são restritivas.
Com o que todos concordamos, porque o crescimento está ameaçado com as medidas do PEC do nosso descontentamento.
E a metáfora do senhor professor é esta: estas medidas restritivas são como carregar com toda a força no travão e o carro ameaçar  sair da estrada, pelo que se deve conduzir carregando no travão com um pé e no acelerador com o outro pé, para existir algum crescimento.
Já não posso concordar, pelo menos na parte automóvel.
Ensinaram-me na escola de condução que devia ser o mesmo pé a carregar ora no acelerador ora no travão.
Mais tarde, experimentei carregar simultaneamente no travão e no acelerador. Mas segui os conselhos dos mais experientes e fiz isso com o mesmo pé (confesso que é um bocadinho dificil, só serve para condução desportiva com as rodas tratoras a patinhar, ou para aguentar o carro numa subida em ponto morto, mas consegue-se; especialmente se os pedais forem adaptados - cuidado porem com a adaptação e com a condução que se torna arriscada, pelo que se deve seguir o aviso: não tente fazer isso).
Acionar o acelerador com um pé e o travão com o outro tem o grande risco de ser mais longa a cadeia de controle mútuo entre a pressão no acelerador e a pressão no travão. É necessário ver primeiro o efeito para depois alterar as duas pressões . Isto é, é preferível controlar a travagem doseando apenas a pressão no travão esquecendo o acelerador, ou dosear a aceleração esquecendo o travão.
Esta é a primeira metáfora que me deixa preocupado com os senhores economistas.
A segunda vem do senhor professor Carlos Costa, governador do banco de Portugal, que nos propõe a seguinte metáfora: a economia portuguesa é como um quadrireator em que dois dos motores vão desacelerar - um é o consumo público  e outro é o consumo privado; dos outros dois motores, um é a exportação, que, se se portar bem, evitará que o avião perca altitude, e o outro é o investimento, que se está a engasgar.
Por Mercúrio, um motor só é muito pouco, e ainda por cima aumentamos o volume das exportações mas dão-nos menos pelo que exportamos, não porque o euro se desvalorize, mas porque a concorrencia é muita e porque muitas das nossas exportações têm pouco valor acrescentado, com a agravante disso mesmo, o euro está muito forte.
Como dizia o professor Daniel Barbosa nos anos 60 do século passado, o turismo (não era preciso ser de alta qualidade) e a emigração é que aguentavam a balança de pagamentos.
Ou por outras palavras, não vejo outra saída para a metáfora que não seja dar um bocadinho mais de gás ao motor do investimento.
Não pode ser só cortes.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Trichet em Marraquexe

http://economico.sapo.pt/noticias/zona-euro-precisa-de-reformas-orcamentais-mais-apertadas_101810.html


É sempre desconfortável um ignorante como eu comentar as recomendações tão sábias de Trichet, em Marraquexe, no dia 16 de Outubro de 2010.

Até aceito que se tenha como objetivo limitar o défice publico a 3% do PIB e a dívida pública da 60% do PIB, como dizem Trichet e Merkel.

Mas falta o resto da realidade ("Há mais vida para além do defice", não era o que dizia Jorge Sampaio?). Falta ver como anda o endividamento das empresas não públicas, especialmente como vai a vida das entidades bancárias, in e off-shore. E falta ver, principalmente, como anda o cumprimento das cláusulas da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Devemos defender os Direitos do Homem, não é assim?

Bom, então vamos ver o que nos divide:

Trichet quer mais rapidez nas reformas e na punição dos países que falham o objetivo do défice. Não quer que o BCE compre muitos títulos de dívida pública porque isso gera pressões inflacionistas. Também prefere manter o estado de coisas no domínio das taxas de juro baixas a instituições não públicas que depois emprestam a juros altos aos Estados. Acha, ele e Merkel, que o BCE , para ser independente, deve estar acima da vontade dos eleitores.

Que diz Sarkozy a propósito disto? Diz, por exemplo, que as políticas do BCE têm de estar sujeitas a sufrágio universal, isto é, a independência do BCE deve ter como limite a vontade livremente informada e expressa dos cidadãos.

Não é isso que acham Trichet e Merkel.

Quanto a Merkel, é com os eleitores alemães, mas quanto a Trichet, e se acelerássemos a reforma do senhor?

É que nestas coisas sinto-me muito próximo da cultura francesa, aquela da liberté, fraternité et égalité…

domingo, 17 de outubro de 2010

As laranjas da Luisa, a California e os amendoins

Encontrei a minha amiga Luisa à saida do supermercado.
Eu entrava e ela saia pela saida sem compras.
Explicou-me que tinha lá ido de propósito para comprar laranjas e, como só as havia da África do Sul e ainda na semana anterior tinha visto laranjas na árvore, no Algarve, tinha desistido.
- Engraçado, disse eu, há dias aconteceu-me uma coisa parecida. Acabei por não comprar fruta neste supemercado.
Talvez haja uma moral nesta história, que é a de que os gestores de compras das grandes superfícies comerciais deviam estar atentos ao que os clientes pensam.
Pode ser que as laranjas da África do Sul sejam mais baratas.
Mas estão a consumir combustíveis fósseis para chegarem ao supermercado, e se contabilizarmos esse prejuizo, esse, e o da dependencia alimentar do país importador, ficam mais caras.
Já dentro do supermercado, depara-se-me um expositor cheio de simpáticas embalagens com amendoins e a informação: "US Quality from California".
O estado da California tem as suas contas num estado lastimável, com 12% de desempregados.
O que é surpreendente, com a produção em informática, cinema, vinho e produtos agricolas que tem, mas é um facto.
De modo que me detenho a olhar para as embalagens de amendoins, recordando que o primeiro motor de Rudolf Diesel funcionou com óleo de amendoim.
É isso, ou nos geminamos com a Califórnia, ou plantamos amendoim no Algarve.

Saldanha Sanches


O professor de direito fiscal Saldanha Sanches foi um homem que o regime anterior prendeu durante 8 anos. A seguir ao 25 de Abril, o regime não podia ignorá-lo, porque pareceria muito mal. Mas não parece querer aplicar os princípios que ele defendeu.
De modo que é um facto surpreendente, pela positiva, ver à venda, nos supermercados, o seu último livro, concluido na véspera da sua morte: Justiça Fiscal.
O livro faz parte da coleção da Fundação Manuel dos Santos,que é também outro facto surpreendente por tentar focar os problemas do nosso país com objetividade, disseminando os trabalhos.
Cada livro custa 3,15 euro.
Não deixem de trazer para casa, no meio da fruta importada, a "Justiça fiscal", porque, cinco meses depois do desaparecimento de Saldanha Sanches, as medidas que ele sugere são extremamente oportunas: tributo virado principalmente para o rendimento e progressivo ("o discurso contra os impostos é sempre o discurso de uma minoria privilegiada à custa da comunidade"), impostos sobre importações, simplificação das leis, redução do formalismo dos tribunais, fim do sigilo bancário.
Citação: "Hoje em dia, em Portugal, a crise geral do Estado social prestador obriga a uma distribuição de sacrificios que, para ser legítima, deverá atingir todas as camadas da sociedade".
Para os técnicos de transportes tem especial interesse as análises sobre a internalização das externalidades dos combustíveis fósseis (atenuação dos efeitos negativos de uma causa para que a comunidade não contribuiu), considerando justos os impostos sobre os combustíveis (como curiosidade, a verba prevista para o ISP no orçamento para 2011 é de cerca de 2.390 milhões de euros,ou menos 1,2% do que a varba prevista para 2010, na expetativa da dimuição do consumo) por combaterem a dependencia do carbono e, assim, facilitarem a economia de outras formas de energia mais ambientais ou a transferencia para meios de transporte energeticamente mais eficientes. Está também considerada a "road pricing" (taxação da entrada de automóveis numa cidade).

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Outra vez o metro de Luanda


Damned, como dizem os norte-americanos.
Não é que, quando eu escrevi o texto do dia 12 de Outubro passado, com a proposta de duas linhas para o novo metro de Luanda, já o embaixador de Angola na Tailandia tinha anunciado a assinatura de um acordo com a empresa MPK, da republica da Malásia, para a construção da linha de metro em viaduto Benfica-Cacuaco?
A MPK já está a construir urbanizações em Luanda e tem portanto um aposição muito forte. Mas está a propor uma tecnologia que não domina, mono-carril com rodas de borracha, possivelmente de fabrico japonês, “off-the-shelf”, isto é, de fabrico série sem ter em conta as especificidades locais (por exemplo, as rodas de borracha vão aumentar o consumo energético e vão diminuir a fiabilidade devido às condições ambientais).
Igualmente a travessia do centro da cidade pode recomendar o recurso a túnel, exigindo a consideração das características freáticas da zona.
Por tudo isto, apesar da MPK já ter o negócio, nada impede que Angola contrate uma fiscalização que, não só no domínio da construção civil, mas também do equipamento e do material circulante (por exemplo, o tipo de material circulante vai condicionar o projeto dos viadutos).
E é aqui que podiam mesmo entrar os nossos técnicos da especialidade.
Até porque ainda há a segunda linha para propor, desde o novo aeroporto, ao km30 da estrada de Viana (Av.Deolinda Rodrigues), até ao 1º de Maio (onde pode fazer a correspondência com a linha 1) e ao Baleizão.
É claro que vai ter de se explicar aos políticos e decisores de Luanda o mesmo que teve de se explicar aos politicos e decisores de Lisboa, que um novo aeroporto internacional não pode utilizar a linha de caminho de ferro interurbana pré-existente (já existe uma linha de caminho de ferro paralela á Avenida Deolinda Rodrigues) porque as características dos modos de transporte são diferentes: um aeroporto deve estar ligado por um “cordão umbilical” ao centro da cidade, com poucas paragens, e na estação central já devem existir os balcões de “check-in” necessários.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Blogue comovido

Este blogue ficou comovido nos últimos dias.
Primeiro, foi a voz de Joan Sutherland que se calou.
A ópera é um fenómeno estranho.
É um espetaculo popular, mas começou por ser o que distinguia a corte e os fidalgos do povo e da média e baixa burguesia.
Veja-se o caso da ópera do Tejo, um edifício novo onde hoje está a praça do Município, que o terramoto de 1755 destruiu.
O prejuizo porém não foi pago só por quem ia à ópera, mas por todo o povo (estimativa dos prejuízos em Lisboa devidos ao terramoto: 75% do PIB desse ano).
Quando digo que é um espetáculo popular, é porque quando há ópera no Coliseu ele enche-se.
E quando Verdi estreava as suas óperas o povo entoava logo a seguir as suas árias.
Mas há outra razão por que as óperas são um espetaculo popular, embora o senso comum ache que é uma musica aborrecida.
No meio das ingenuidades dos libretos e das inconsequencias dos argumentos, quase todas as paixões e sentimentos humanos são tratados. E a música sublinha essas paixões e sentimentos, por vezes de forma tocante.
Ou talvez que o autor do blogue seja demasiado sensivel e por isso escreve estas coisas, mas já António Damásio dizia que só se pode ser racional se nos comovermos.
Joan Sutherland teve uma das vozes mais bonitas de soprano.
Classificada como soprano spinto (isto é, dramático) com coloratura (isto é, com capacidade para dar notas ágeis) , embora pudesse fazer papeis de soprano ligeiro.
Outro exemplo de voz assim era a de Maria Callas, mas o timbre da voz de Joan Sutherland era, nalgumas personagens, mais bonito.
Quer isso dizer que a senhora tinha características fora do normal.
E à sua qualidade de cantora excecional aliava outra característica: era uma senhora muito simples que se sentava nos ensaios, enquanto esperava pela sua vez, a conversar com o pessoal da orquestra e dos adereços, e a fazer "tricot".
Falo nisto só para chamar a atenção para que qualquer pessoa pode ser excecional desde que não se aproveite das suas características para querer estar acima dos outros.
Isto é, para estas pessoas a revolução francesa não foi feita em vão e acreditam no trabalho em equipa, sem individualismos (como diz o outro, é assim que se ganham jogos, sem individualismos, não é?).
Bem podiam aproveitar a lição, os senhores empresários que no congresso do BSCD (Conselho empresarial para o desenvolvimento sustentável) insistiram que o objetivo das empresas é ganhar dinheiro e aumentar os lucros para os seus acionistas.
A desregulação deu no que deu, e continuam com a mesma cartilha adam smithista (que me perdoe Adam Smith que certamente não seria tão adam smithista como os seus adeptos)...
E falo no congresso do BSCD porque tambem lá se falou da filantropia de Bill Gates.
O nosso grande empresário presidente da Portucel, Semapa e Secil (não estou a criticar a política ambiental da Portucel, que aliás já foi gabada neste blogue) fez uma afirmação chocante, que foi a de desconfiar da verdade da doação de Bill Gates, acrescentando de forma infeliz que nem sabe o que é a filantropia, e que cada um dê o que quiser.
Alguém comentou inocentemente que não basta às empresas ter um diretor de responsabilidade social.
Porque esse diretor normalmente acumula com a direção da imagem.
E todos sabemos que a imagem lida com a perceção das pessoas e não com a realidade, mesmo que a realidade possa condicionar as pessoas ou ser-lhes ocultada quando não se faça uma campanha, não de promoção da imagem, mas de esclarecimento da realidade.
E também muitos de nós insistem neste ponto: numa empresa tem de haver separação hierárquica entre funções essenciais de natureza diferente; não é bom que o responsável da manutenção acumule com a responsabilidade do controle de qualidade, não é bom que o responsável de uma parte que depende de outra parte para funcionar seja o mesmo dessa parte, não é bom que o responsável da segurança dependa hierarquicamente dum responsável operacional, não é bom que o responsável social seja o responsável da imagem.
São funções que devem ser exercidas como controle mútuo entre órgãos, fora da dependência dum órgão unico.
Porque o órgão único tem tendência para mascarar as falhas, e os órgãos distintos têm tendência para as evidenciar.
São princípios básicos da divisão do trabalho, do controle da qualidade e da fiabilidade e confiabilidade das empresas.
Será que o autor do blogue tem vindo a iludir-se ao longo dos anos com a sua experiencia profissional e tão ilustres empresários são os detentores das verdades? ( e se é assim, se tão ilustres empresários de empresas de tanto sucesso estão tão seguros de que seguiram o caminho certo, porque está a economia portuguesa tão mal e tão sem desculpas apesar da crise internacional?).
Ou terão razão os gurus que defendem a filantropia, a sabedoria das multidões e as 22 + 25 medidas que este blogue anda a comentar? Ou os empresários com sensibilidade, como os dos cafés de Campo Maior, ou os da restauração do lugre Santa Maria Manuela, ou os que tentam salvar a Vista Alegre, ou os têxteis, ou os sapatos.
Por isso gostaria que os ilustres empresários e gestores de sucesso ouvissem Joan Sutherland.
Talvez lhes amaciasse os corações.
Ficassem mais filantrópicos, já que a maioria dos portugueses é como eu, incapaz de montar um negócio ou uma empresa por ações e ganhar muito dinheiro com ela.
Se tiverem paciência, procurem em “you tube joan sutherland”.
Experimentem a “casta diva”, da ópera Norma (a sacerdotisa druida tem um caso com o consul romano e as sociedades da altura eram muito limitativas dos direitos humanos…).
Segundo (segunda razão para este blogue se ter comovido nestes dias, como disse logo no princípio), o caso do resgate dos 33 mineiros é exemplar.
O problema era efetivamente difícil de resolver em tempo curto.
E o método seguido foi o correto: não se escondeu nada, procurou-se informação e ajuda entre técnicos de todo o mundo; não foi só a NASA, veio equipamento do Japão, sa Austria, Alemanha, Austrália, etc, sem esquecer o papel importante da Codelco (empresa pública de minas do Chile – e depois disto ainda haverá adam smithistas que disseminem a mensagem de que “o estado”, palavra feia que serve para afastar a simpatia da pessoas, não tem vocação? O problema não é a empresa ser estatal ou privada, o problema é as pessoas trabalharem bem ou não).
Isto é, não se fez um concurso público para escolher um gabinete de consultoria para fazer o projeto do resgate, seguindo-se um concurso público para selecionar os equipamentos a utilizar.
Simplesmente, dinamizou-se um processo de debate interativo e aberto, e um dos métodos propostos deu resultado.
A estimativa inicial para todas as operações de resgate era de 120 dias e conseguiu-se em 69.
A estimativa para a retirada dos mineiros com a cápsula era de 48 horas e conseguiu-se em 23.
Independentemente de razões psicológicas como foi o caso, um planeamento deve ser feito com prazos realizáveis e, na dúvida, não alimentar esperanças que possam não ser realizadas.
Por isso deveriam os gestores e os decisores deixarem-se de impor prazos, mais ou menos políticos, e perguntar primeiro aos técnicos que prazos podem ser definidos.
Deixem-me acentuar ainda o papel importantíssimo da psicologia. Em qualquer acidente ou em deficientes condições de saúde há regras psicológicas para seguir. Quebrá-las, por exemplo com excesso de exposição mediática, só pode prejudicar.
Por isso está corretissimo o período de 2 dias de quarentena previstos e se teme o impacto das campanhas publicitárias.
Já não é o mesmo caso do filme de Billy Wilder com Kirk Douglas (Ace in the hole - o jornalista conseguiu que se escolhesse o pior método de resgate dos mineiros para fazer render a campanha mediática, com resultados trágicos), além de que poderá recuperar-se algum do dinheiro gasto com a operação (300.000 euro por mineiro salvo), mas conviria haver contenção na exposição.
Enfim, um viva aos mineiros e aos seus salvadores.
Como disse o último mineiro a sair,Luis Urzua, último como se fosse o comandante do navio naufragado, “fizemos o que todos esperavam que fizéssemos, tivemos força para isso e pelas nossas famílias, e isso foi o mais importante”.
E assim fica este blogue comovido, num mundo em que a humanidade também é capaz de fazer as melhores coisas com a capacidade técnica de que dispõe.

PS - Em tempo: corrigi uma informação errada: os prejuízos do terramoto de 1755 foram da ordem de 75% do PIB desse ano, e não 10% como escrevi primeiro (fonte: História de Portugal, ed. a esfera dos livros, coordenação Rui Ramos)

terça-feira, 12 de outubro de 2010

De Lisboa, cidade da tolerância, a Luanda


Ao lado do monumento contra a intolerância e o fanatismo, no largo de S.Domingos, encontra-se o muro com a inscrição em todas as línguas: “Lisboa, cidade da tolerância”.

Vá, vamos pensar um bocadinho nas medidas 3, 16, 18 e 19/25 propostas por Luis Monteiro e listadas na mensagem de dia 5 de Outubro passado. Escrevo assim porque são 25 medidas.

Dentre as 22 medidas propostas pelos economistas franceses aterrorizados, para a União Europeia, o que se vê de mais parecido com o que eu estou a querer dizer é a medida 16/22 (reanalisar a circulação de capitais e mercadorias entre a UE e o resto do mundo).

A medida 3/25 propõe a sensibilização do público para as relações comerciais com os PALOP. Na sequência desta medida, a 16/25 propõe a aceitação da ideia de localizar empresas portuguesas nos PALOP. A medida 18/25 é uma evidência, que é a proposta de aumento das exportações, e a 19/25 convoca os PALOP para o aumento da cooperação, incluindo as trocas comerciais.

Consultando as estatísticas, verifica-se que o comércio com os PALOP ainda tem pouca expressão nas importações e exportações portuguesas. Idem para os países BRIC (Brasil, Russia, India e China). As trocas principais portuguesas são com países do euro. Assim não podemos utilizar as vantagens cambiais. Por exemplo, com Angola, poderíamos fornecer serviços pagos em dólares, porque o petróleo que lhes compramos pode ser pago em dólares. Ou receberíamos em títulos da dívida pública dos USA.

Muitas empresas de serviços (consultoria de gestão, de formação, de organização de recursos humanos), de construção civil , da industria transformadora, da industria alimentar, já compreenderam isso e já lá estão a funcionar…

Como técnico de transportes, e considerando que algumas expetativas não foram atingidas nos contratos angolanos com a China nesta área, questiono-me se não seria uma boa oferta o estudo do metropolitano de Luanda.

Seguindo o exemplo da Arábia Saudita e do Irão, Angola poderia desde já preparar-se para o fim do petróleo, que se deseja ainda venha longe.
Desenvolver uma rede urbana de transportes coletivos de elevada eficiência permitiria poupar nos consumos de combustível em automóveis particulares, nas carrinhas de transporte coletivo e nos autocaros, e seria portanto do interesse de Angola.

É o que um humilde técnico pode propor, para tentarmos aumentar as nossas exportações:  fazer o projeto e a fiscalização do metro de Luanda.

Para começar, uma linha de Viana para o Baleizão, passando pelo 1º de Maio.

De Viana ao 1º de Maio em viaduto, ao longo de 15 km da placa central da Avenida Deolinda Rodrigues, heroína da luta pela independência, correspondente de Martin Luther King.

Do 1º de Maio, com a estátua de Agostinho Neto, até ao Baleizão, no topo sul da baía, em subterrâneo, 2 km, mas com estações simples e muito próximas da superfície.

E uma segunda linha, cruzando a primeira no 1º de Maio, de Benfica, nas urbanizações do sul, até ao Cacuaco, a Nordeste, sempre em viaduto, 20 km, passando pelo aeroporto.

Vamos estimar que as duas linhas custariam 600 milhões de dólares, a que teriam de se somar 250 milhões de dólares para os primeiros 40 comboios.

As empresas de construção civil portuguesas gostariam de concorrer. E os nossos técnicos da especialidade poderiam fazer muito do projeto em Lisboa.

A estadia de um técnico em Luanda, que é uma das cidades mais caras do planeta, incluindo a estadia e uma viagem de ida e volta de avião, ficaria por qualquer coisa como 15.000 dólares por mês.

5% do valor da obra (42,5 milhões de dólares) daria para pagar o projeto e a fiscalização.

Por que esperar, então?

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

TRADUZIDO DO GREGO – o rapto de Europa feito ao contrário

Era uma vez um país de sol, mar e um povo deslumbrado.
Tanto os cidadãos desse país, como o seu governo,
Tinham ao longo dos anos pedido emprestado dinheiro,
para poderem viver acima dos seus rendimentos.

Para continuarem a pedir empréstimos,
foi contratado um grupo de consultores,
a Goldman Sachs,
que ocultaram as dividas das empresas públicas

Pior que isso, manipularam as contas,
até que o dinheiro faltou e o povo saiu à rua,
o governo mudou
e continuou o dinheiro a faltar

Então o governo pediu ajuda
Aos governos dos países vizinhos
Que partilhavam com o país de sol a história e a cultura
Que a todos tinham maravilhado

O povo continuou a sair á rua,
a ralhar com o governo,
embora não tivesse sido aquele governo
que se tinha endividado tanto

E foi então que a loja de prego
Onde o governo costumava ir,
Pediu como penhor o coração
Da apresentadora de TV preferida pelo povo

O governo hesitou, e voltou a pedir ajuda aos países vizinhos.
Os governos dos paises mais ricos aproveitaram para lhe ralhar.
Esqueceram-se que durante anos tinham andado a emprestar o dinheiro
Com que os cidadãos do pais de sol lhes compravam automóveis e metropolitanos

E logo o juro do empréstimo subiu e os mercados abstratos perderam a calma.
O governo do país de sol lembrou que se não havia dinheiro
Foi porque as lojas de prego tinham prometido juros mais altos do que os que podia pagar,
e os governos ricos e pobres tiveram de injetar dinheiro nelas.

De nada valeu ao governo do país de sol.
Empedernidos e insensíveis, nada demoveu os governos ricos.
Às lojas de prego emprestavam a juro baixo,
Mas elas ao governo do país de sol era alto o juro,

E foi então que o governo do país de sol
se lembrou de perguntar ao império do meio
se não queria comprar uns títulos do Tesouro
a uma taxa de juro mais de amigo

E o império do meio perguntou se podia visitar o país de sol
Claro que sim, disse o governo,
E mostrou-lhe o berço onde tinha nascido
a cultura do país de sol e de todos os países vizinhos

O imperador do meio ficou tão deslumbrado
Como o povo do país de sol
E comprou logo todos os títulos
que havia para vender e pediu mais a um juro ainda mais baixo

Respirou de alívio o governo do país de sol,
mas entretanto, num dos países vizinhos, mais ao norte,
o grande prémio do ano do ramo da oliveira
foi solenemente dado a Xiaobo

Pregava Xiaobo no império do meio da não violência
a grande estratégia de Gandhi
e também a Declaração Universal dos Direitos do Homem,
por isso vivia num campo de concentração.

Tal era uma mancha na imagem do império do meio
Que os governos vizinhos logo aproveitaram
Para rasgar as vestes do seu descontentamento
E dos títulos do Tesouro a venda criticar

Tanto ralharam os governos ricos vizinhos
Que os povos ricos vizinhos começaram a dizer
Que o império do meio andava a fazer ao contrário
o rapto de Europa, filha de Agenor, rei de Tiro.

E se fosse verdade, quem se admiraria?
Não quiseram os governos ricos ajudar,
Porque se queixam agora se o império do meio
Ilhas vier comprar e fábricas instalar?

FINAL

Ponhamos a 9ª sinfonia a tocar em Lisboa,
no Largo de S.Domingos .
Atentemos bem no que dizem os cantores
em tão solene audição.
Não liguemos aos germânicos ralhetes,
antes dêmos a ler ao império do meio a mensagem
do monumento que lá está, para Xiaobo libertar.
E vamos então organizar , a nossa batalha da produção
















NOTAS:
1 - Os versos não rimam porque já custa traduzir do grego e pô-los a rimar ainda custa mais
2 - Europa é, na mitologia grega, o nome da filha do rei de Tiro que foi raptada por Zeus, disfarçado de touro branco, e levada por ele para a ilha de Creta ( ver em:
http://aguerradetroia.wordpress.com/category/6-zeus-jupiter/62-o-rapto-de-europa/ )
3 - todos os restantes factos descritos se baseiam, porém, na realidade e não são pura coincidência

domingo, 10 de outubro de 2010

Economicómio LXII - As 22 medidas dos economistas aterrorizados

Vamos então listar as 22 medidas propostas por um grupo de economistas franceses, conforme falado no registo de dia 5 de Outubro passado.
Ver:
http://arrastao.org/sem-categoria/manifesto-dos-economistas-aterrorizados/#more-21362

Não são estes economistas adeptos da cartilha neo-liberal e as suas propostas são ao nível da União Europeia.
Mas as ideias que eles expressam são didáticas e ajudam a compreender a crise.
É curiosíssima a reação de alguns comentadores no blogue que as divulgaram. Possivelmente o blogue terá uma conotação cm um partido politico e os comentadores gostam de praticar o mazdeísmo ou dualidade do bem e do mal, em lugar de procurar a colaboração.
Achei imensa graça ao ar escandalizado de um senhor comentador que reagiu muito mal à metáfora de que o liberalismo é uma religião.
Mas não são os neo-liberais que enchem a boca com a mão invisível que resolve tudo? É que não foi Adam Smith que se lembrou disso. Adam Smith dizia que a mão invisível iria castigar quem se portasse mal, nos mercados, tal como lady Macbeth e marido foram castigados.
Enfim, estas 22 medidas deveriam ser analisadas no nosso país por quem tem poder para isso, já que a democracia formal em que vivemos não nos dá essa possibilidade. Alguma coisa poderia ser útil a Portugal, assim como as 25 medidas do mesmo texto de dia 5 (algumas das quais até virão do campo liberal, como a nº8).
Mas para que isso funcionasse, seria necessário melhorar a capacidade de debate e de organização dos métodos de resolução em equipa dos problemas, em que nós, portugueses, somos mesmo muito fracos, como a história e o nosso quotidiano demonstram.
Para acalmar os mercados, perdão, para acalmar os comentadores mais “liberais” que se zangaram com o texto, permito-me recordar as palavras de Obama: Não fui eleito para fazer o frete aos senhores de Wall Street. 
Além disso, algumas das medidas que se seguem já foram legisladas nos USA de Obama.
Valha a verdade que para os saudosos de Reagan (no tempo do petróleo barato, don’t forget) e para o Tea Party, Obama deve ser um perigoso comunista.
Enfim, mais valia que nos entendêssemos, ideologias aparte.
Eis então as 22 medidas:

Medida n.º 1: Limitar, de forma muito estrita, os mercados financeiros e as actividades dos actores financeiros, proibindo os bancos de especular por conta própria, evitando assim a propagação das bolhas e dos colapsos;
Medida n.º 2: Reduzir a liquidez e a especulação desetabilizadora através do controle dos movimentos de capitais e através de taxas sobre as transacções financeiras;
Medida n.º 3: Limitar as transacções financeiras às necessidades da economia real (por exemplo, CDS – credit default swaps - unicamente para quem possua títulos segurados, etc.);
Medida n.º 4: Estabelecer tectos para as remunerações dos operadores de transacções financeiras.
Medida n.º 5: Reforçar significativamente os contra-poderes nas empresas, de modo a obrigar os dirigentes a ter em conta os interesses do conjunto das partes envolvidas;
Medida n.º 6: Aumentar fortemente os impostos sobre os salários muito elevados, de modo a dissuadir a corrida a rendimentos insustentáveis;
Medida n.º 7: Reduzir a dependência das empresas em relação aos mercados financeiros, incrementando uma política pública de crédito (com taxas preferenciais para as actividades prioritárias no plano social e ambiental).
Medida n.º 8: As agências de notação financeira não devem estar autorizadas a influenciar, de forma arbitrária as taxas de juro dos mercados de dívida pública, baixando a notação de um Estado: a sua actividade deve ser regulamentada, exigindo-se que essa classificação resulte de um cálculo económico transparente;
Medida n.º 8 (b): Libertar os Estados da ameaça dos mercados financeiros, garantindo a compra de títulos da dívida pública pelo BCE.
Medida n.º 9: Efectuar uma auditoria pública das dívidas soberanas, de modo a determinar a sua origem e a conhecer a identidade dos principais detentores de títulos de dívida e os respectivos montantes que possuem.
Medida n.º 10: Manter os níveis de protecção social e, inclusivamente, reforçá-los (subsídio de desemprego, habitação…);
Medida n.º 11: Aumentar o esforço orçamental em matéria de educação, de investigação e de investimento na reconversão ecológica e ambiental…tendo em vista estabelecer as condições de um crescimento sustentável, capaz de permitir uma forte descida do desemprego.
Medida n.º 12: Atribuir de novo um carácter fortemente redistributivo à fiscalidade directa sobre os rendimentos (supressão das deduções fiscais, criação de novos escalões de impostos e aumento das taxas sobre os rendimentos…);
Medida n.º 13: Acabar com as isenções de que beneficiam as empresas que não tenham um efeito relevante sobre o emprego.
Medida n.º 14: Autorizar o Banco Central Europeu a financiar directamente os Estados (ou a impor aos bancos comerciais a subscrição de obrigações públicas emitidas), a um juro reduzido, aliviando desse modo o cerco que lhes é imposto pelos mercados financeiros;
Medida n.º 15: Caso seja necessário, reestruturar a dívida pública, limitando por exemplo o seu peso a determinado valor percentual do PIB, e estabelecendo uma discriminação entre os credores segundo o volume de títulos que possuam: os grande rentistas (particulares ou instituições) deverão aceitar uma extensão da maturidade da dívida, incluindo anulações parciais ou totais. E é igualmente necessário voltar a negociar as exorbitantes taxas de juro dos títulos emitidos pelos países que entraram em dificuldades na sequência da crise.
Medida n.º 16: Pôr em causa a livre circulação de capitais e de mercadorias entre a União Europeia e o resto do mundo, renegociando se necessário os acordos multilaterais ou bilaterais actualmente em vigor;
Medida n.º 17: Substituir a política da concorrência pela “harmonização e prosperidade”, enquanto fio condutor da construção europeia, estabelecendo objectivos comuns vinculativos tanto em matéria de progresso social como em matéria de políticas macroeconómicas (através de GOPS: Grandes Orientações de Política Social).
Medida n.º 18: Assegurar uma verdadeira coordenação das políticas macroeconómicas e uma redução concertada dos desequilíbrios comerciais entre os países europeus;
Medida n.º 19: Compensar os desequilíbrios da balança de pagamentos na Europa através de um Banco de Pagamentos (que organize os empréstimos entre países europeus);
Medida n.º 20: Se a crise do euro conduzir à sua desintegração, e enquanto se aguarda pelo surgimento de um orçamento europeu (cf. infra), instituir um regime monetário intra-europeu (com moeda comum do tipo “bancor”), que seja capaz de reorganizar a absorção dos desequilíbrios entre balanças comerciais no seio da Europa.
Medida n.º 21: Desenvolver uma verdadeira fiscalidade europeia (taxa de carbono, imposto sobre os lucros, etc.) e um verdadeiro orçamento europeu, que favoreçam a convergência das economias para uma maior equidade nas condições de acesso aos serviços públicos e serviços sociais nos diferentes Estados membros, com base nas melhores experiências e modelos;
Medida n.º 22: Lançar um vasto plano europeu, financiado por subscrição pública a taxas de juro reduzidas mas com garantia, e/ou através da emissão monetária do BCE, tendo em vista encetar a reconversão ecológica da economia europeia.






Helicopteros

Será verdade o que a reportagem do DN diz: que a empresa de meios aéreos (EMA) criada pelo Governo para fornecer helicópteros à PSP, GNR , ANSR e Proteção civil, nomeadamente para combate aos incêndios:
- vende o aluguer de helicopteros a essas entidades a preços superiores aos das empresas privadas? (preço unitário da EMA 5000 euros por hora, valor do contrato com as PSP, GNR , ANSR e Proteção civil: 500.000 euros; preço da HeliPortugal 2500 euros  por hora; valor correspondente da HeliPortugal aos requisitos do contrato: 370.000 euros)
- que parte da sua frota de 9 helicopteros está alugada à HeliPortugal?
-  que o endividamento da empresa não conta para o défice público?
- que no contrato da EMA com aquelas entidades existe uma cláusula de confidencialidade anti-constitucional?

Eu confesso-me muito agarrado a ideias do antigamente, e tenho sido acusado de rejeitar inovações (embora no meu curriculo profissional conste a contribuição para a introdução em Portugal de várias novas tecnologias aplicadas ao meio ferroviário), mas  o que impediria o ministério da administração interna de requisitar helicópteros ao ministério da defesa e à sua força aérea? O código de contratação pública?
Ai não, peço desculpa, as funções destes helicópteros integram-se no setor estratégico do Estado e questões estratégicas podem não estar sujeitas às leis do mercado se o Estado utilizar os seus próprios meios (Ah, aumenta o défice, mas recorrer ao mercado pode aumentar mais ainda).
Não tem nada que ver com a defesa da concorrência. Não devemos impedir a atividade privada, mas também não devemos impedir o desempenho dos serviços públicos.
 A Portucel e a Altri alugam helicopteros no mercado privado para proteger as suas florestas. Nada a objetar. Se for mais conveniente para o Ministério da Administração Interna fazê-lo, também não tenho nada a objetar.
Mas assim, desta forma? (para o caso de ser verdade o que a reportagem do DN diz, claro).

Fastigimia

Fico a dever à exposição organizada pela Fundação EDP a informação sobre Fastigimia.
Tomé Pinheiro da Veiga foi procurador geral do reino e chanceler-mor.
Em 1605 teve de se deslocar à corte de Filipe III  em Valadolid.
Ao regressar, escreveu Fastigimia, tentando comparar a cultura portuguesa e a cultura castelhana.
Fastigimia pertence , juntamente com a Arte de Furtar do Padre Manuel da Costa, e os textos do Padre António Vieira e de Francisco Manuel de Melo, ao conjunto das principais obras literárias portuguesas do século XVII.
Nesse tempo, as estruturas dirigentes de ambos os países desprezavam a economia. O poder dominante, a corte espanhola, endividava-se de forma galopante, para alem de desenvolver uma política europeia desastrosa.
No entanto, Tomé da Veiga apontou várias características negativas dos portugueses, relativamente aos castelhanos:
- que os portugueses têm as suas terras partidas aos palmos com suas paredinhas de pedra a separá-las, como quem diz «Isto é meu, não é teu, não me furtes as minhas uvas» ; isto é, como se diz agora, os portugueses gostam muito de se fechar nos seus compartimentos estanques e pôr cortinas nas janelas;
- que os portugueses tratam mal as suas mulheres, ao contrário dos castelhanos, que, ao menos as tratavam como suas irmãs e filhas dos seus pais, cristãs e bichinhos que boliam e sabiam falar; isto é, a sociedade castelhana da época parece ter sido já nessa época mais aberta e interventiva.

Associo esta informação à que a correspondente do DN em Madrid reportou há uns dias: o embaixador castelhano que se deslocou a Lisboa para reclamar os direitos de Filipe II à coroa portuguesa, ao apresentar depois o seu relatório ao rei, referindo-se às entidades com quem tinha falado e argumentado, descreveu-as como sendo "uma gente estranha".
De facto, analisando a gestão da coisa pública e das grandes empresas portuguesas, a falta de consideração da Ciência como fator indispensável da equação, a rejeição dos métodos de resolução de problemas de que é exemplo a ignorância votada a livros como "A sabedoria das multidões" (estou-me a repetir, mas pode ser que numa das repetições algum dirigente que eventualmente seja meu leitor resolva ler o livro) sinto-me a ceder à tentação de considerar os dirigentes de sucesso do meu país como "gente estanha".
E assim não me podem acusar de não propor soluções.
Interessa estudar a história para ajudar a compreender o presente.
E tentar pistas para o futuro, perdoe-se-me o truísmo comum.

Desanimo - import/export

Desânimo nas estatísticas do INE de importações e exportações do País, de Junho a  Agosto de 2010, porque não houve melhorias, pelo contrário, quando comparadas com o mesmo período do ano passado.
Exportações: passaram de 7,91 mil milhões de euros em 2009 para 9,03 mil milhões em 2010
Importações: passaram de 12,85 mil milhões em 2009 para 14,14 mil milhões em 2010.
O que significa que o defice aumentou; pouco mas aumentou.
Com a agravante da importação de combustíveis ter crescido 24,8% em valor, neste periodo de 2010, relativamente ao mesmo periodo em 2009.
Por outras palavras, apesar do esforço de quem trabalha, a situação não melhorou.
Como os economistas já explicaram publicamente, o problema é os bens transacionáveis que exportamos serem pouco valorizados.
Mas talvez possamos encarar a questão desta maneira:
1 - os consumos têm de ser contidos, nomeadamente no setor de transportes (é conhecida a proposta de transferir passageiros do TI para o TC, para conseguir transportar os mesmos passageiros com menos combustível)
2 - sendo  2/3 das exportações e importações portuguesas relativas à UE, não é boa política manter uma quota tão baixa com o resto do mundo; porem, para aumentar essa quota, o atual cambio do euro deveria baixar, porque como está não favorece as exportações (apesar de favorecer a importação de petróleo); donde se concluirá que a atual política do BCE, de manter alto o cambio do euro, baixas as taxas de juro e elevado o desemprego (i.é, inflação baixa), não serve o nosso país. Não esquecer que os lugares decisórios do BCE não são sujeitos a concurso público nem a a sufrágio eleitoral. Acresce que paises que poderiam ajudar a economia portuguesa são tambem prejudicados pela taxa de cambio existente. Por exemplo, Angola recebe em dolares USA pela venda do seu petróleo, mas paga em euros às empresas portuguesas que trabalham em Angola. A cotação alta do euro impede assim um  maior envolvimento de empresas portuguesas em Angola.

É, não estou a gostar da política do BCE.

O relógio

As imagens mostram os mecanismos do relógio que durante três séculos e meio funcionou numa das torres do mosteiro da Batalha.
Já no século XV se desenhavam corretamente os dentes das engrenagens.
Homenagem aos técnicos que construiram, instalaram e mantiveram os mecanismos.
Quanto mais não seja, para não nos darmos, a nós e ao nosso tempo, muita importância.
Talvez que os guias turisticos possam incluir esta referência.
Podia ajudar ao turismo que, como dizia o professor Daniel Babosa, é essencial para equilibrar a balança de pagamentos.

Manuel Maria Carrilho

Não sou fã de Manuel Maria Carrilho, mas parece-me de grande valor o diagnóstico que faz da realidade portuguesa (não quer dizer que seja exaustivo) no seu recente livro, identificando, segundo a reportagem do DN sobre o lançamento do livro, 3 falhas principais :

- a política do betão (as empresas portuguesas revelam boa capacidade construtiva, mas o planeamento das infraestruturas sociais é deficiente e não é integrado em termos de organização do território)
- o deslumbramento tecnológico e novo-rico (governos e cidadãos são demasiado sensíveis à imagem, aos bens de consumo e às modas gestionárias)
- falta de debate (aqui devo recordar que Manuel Maria Carrilho foi o autor da unica referencia que vi, nos meios de comunicação social, ao livro "A sabedoria das multidões"; este facto é sintomático, num país com dificuldades de organização, da dependencia em que nos encontramos de grupos que se consideram detentores da sabedoria, vedando aos cidadãos o acesso ao debate e à resolução coletiva dos problemas).

E mais afirmou o autor:
- que a introdução do Magalhães nas escolas não parece ter melhorado a capacidade de raciocínio matemático das crianças
- que, a nível dos decisores, existe grande dificuldade em ligar os atos às consequências, donde advem autoritarismo e tentativas de ocultação

Como ele costuma dizer, "vivemos assim, mas não devíamos".

Pena faltar, quanto a mim, a Manuel Maria Carrilho, alguma formação no campo da cultura científica, para que, como diz o professor Carvalho Rodrigues, a ciência pudesse entrar na equação.

sábado, 9 de outubro de 2010

Poder político - poder económico

Curiosa esta vizinhança, entre o edifício da câmara municipal e a dependência do crédito agrícola, em igualdade de expressão arquitetónica.
Vem a propósito da promiscuidade já evidente, nos tempos que correm, entre o poder político e o poder económico.
Todos conhecemos ex-ministros que são grandes gestores de empresas de sucesso, sem que o sejam por concurso público.
A revista de sábado do DN chama a atenção para isso: Hintze Ribeiro e Luciano de Castro, os grandes políticos do tempo da bancarrota dos anos 90 do século XIX, alternavam na administração do Crédito Predial.
E, continuando a percorrer a revista do DN, tudo isto é como Marx dizia, as coisas acontecem duas vezes , da primeira vez como tragédia, da segunda como farsa.
Mas pode ser que os cidadãos e cidadãs eleitores tenham isto presente nas próximas eleições, especialmente que os grandes gestores das empresas de sucesso que já foram ministros são tambem grandes negadores de Marx, o que é natural.
Ah, a propósito, o DN tambem refere hoje que, de acordo com o portal base.gov, a direção geral de impostos comemorou o seu aniversário com uma festa que importou entre 220 mil e 400 mil euro (fonte: blogue de Fernando Fonseca).
Possivelmente por ajuste direto.
Será verdade? É que por vezes há "gralhas" no portal base.gov, e a festa até poderia ter sido por inscrição prévia e paga pelos participantes.
E aqui estou eu outra vez a recordar a discriminação de que fui vitima quando me proibiram o ajuste direto que propus na minha vida profissional.
Na minha proposta estava a fundamentação técnica da exceção, conforme as diretivas 17 e 18 de 2004 da CE, e assinei essa proposta, sem nunca me terem demonstrado, com argumentos técnicos (técnicos da especialidade, não juridicos ou económicos) que estava errado.
Nas comemorações da direção de impostos talvez tenha havido a fundamentação da urgencia.
Se assim foi, será mais uma demonstração da grande falha nacional de não se saber programar as coisas com antecedência, como se fosse dificil prever a aproximação de uma data.
É mesmo uma grande falha, a dificuldade de planear.

PS - Verifico, ao rever o texto, que um leitor mais precipitado poderia concluir que eu estava a defender soluções marxistas para evitar a promiscuidade entre o poder político e o poder económico.
Ora, eu referi apenas a análise  e o diagnóstico, por Marx, de uma situação que historicamente parece comprovada. Depois de Marx, a economia política e a ciencia da gestão evoluiram criando instrumentos para evitar essa promiscuidade.
É pela não utilização desses instrumentos, não existentes no tempo de Marx  (no fundo o controle mútuo de entidades não dependentes da mesma hierarquia e monitorizáveis pelas instituições públicas e pelos cidadãos e cidadãs) que este humilde blogue protesta.
Aliás, de que se queixava Eisenhower, no seu discurso de despedida, ao referir-se ao complexo político-militar industrial?

Einstein na Batalha

Quem estiver  interessado, pode admirar esta bica de uma fonte de pedra do século XVI no claustro do mosteiro da Batalha.
Visitar monumentos do século XVI é muito bom para a balança de pagamentos.
E atrair turistas com uma imagem de Einstein pode ter sido uma boa ideia do restaurador da pedra (ver no claustro do mosteiro da Madre de Deus, em Lisboa, um baixo relevo de um comboio no capitel de uma coluna).
Aplausos porque no momento da visita até  havia restauradores a trabalhar noutra zona do mosteiro.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Economicómio LXI - As medidas contra a crise

Neste clima de desalento recebo um email com o endereço dum blogue de economistas aterrorizados com tudo isto:
http://arrastao.org/sem-categoria/manifesto-dos-economistas-aterrorizados/#more-21362

Não estão tão horrorizados como isso, uma vez que propõem 22 medidas contra a crise.
Parecem-me, algumas delas, expressas de modo vago.
Talvez seja por serem economistas, mas vou ter de as estudar melhor para poder comentá-las...
Isso leva-me a voltar ao livro de um engenheiro horrorizado com a crise, Luis Monteiro, de que vos tinha prometido transcrever as 25 medidas propostas, o que vou  fazer, para mais tarde também as comentar. Por me parecerem concretas, considerei o livro excecional. Ver em :
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/08/blog-post_31.html

Existindo já alguma informação sobre medidas contra a crise, muitas delas ignoradas pelo poder político ou económico político que nos condiciona a todos, ocorre-me o poema Cantata da Paz de Sofia de Melo Breyner, escrito a propósito das guerras e das opressões, mas que julgo aplicável por andarmos a sacrificar os jovens abandonando-os ao insucesso escolar e à insuficiência cultural:

Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror
A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças
D’África e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados
Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado.

Vamos então às 25 medidas do livro “Os últimos 200 anos da nossa economia e os próximos 30”.
Não fiquem chocados por algumas delas parecerem subordinadas à cartilha neo-liberal; primeiro, porque devemos ter as mentes abertas e depois, porque as medidas só darão resultado se os cidadãos e as cidadãs participarem ativamente , ou os deixarem participar, no esforço coletivo, se tiverem uma cultura de intervenção cívica de colaboração alargada, sem salvadores da pátria ou professores cheios de si próprios, com humildade; e essa participação nem é liberal nem o contrário, é humanismo, independente das convicções ideológicas de cada um:

1. Mudança de modelo económico (substituir o modelo baseado no consumo e em salários baixos por um modelo baseado na exportação de bens transacionáveis de maior valor acrescentado do que as importações, e em serviços como turismo e saúde)
2. Planos estratégicos a longo prazo
3. Sensibilização da população para o mundo exterior, incluindo as comunidades de emigrantes, os PALOP e os países BRIC
4. Marketing cultural e histórico
5. Civismo e comportamento ético dos cidadãos e das empresas
6. Combate ao envelhecimento da população
7. Melhoria da Educação e da Inovação
8. Melhor gestão das leis laborais sob inspiração da experiência escandinava de modo a limitar o desemprego e as suas consequências
9. Melhoria dos serviços públicos
10. Melhoria da justiça
11. Racionalização dos investimentos públicos
12. Incentivos às empresas
13. Desenvolvimento sustentável no interior do país
14. Atracão de investimento estrangeiro
15. Diversificação do investimento no estrangeiro
16. Deslocalização de empresas para os PALOP
17. Desenvolvimento do setor marítimo
18. Aumento das exportações
19. Cooperação com os PALOP
20. Expansão do turismo
21. Recuperação da estrutura urbana
22. Desenvolvimento de interfaces logísticos
23. Melhorias ambientais
24. Racionalização do setor energético
25. Preparação contra a ocorrência de sismos

As azeitonas já pintaram


Já pintaram as azeitonas deste ano.
Irá o secretário de estado João Fictício conseguir aproveitar as potencialidades da azeitona desta vez?
E diminuir as importações de azeite?
Ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/search?q=fict%C3%ADcio

Economicómio LX - A conferencia do senhor ex-ministro

O senhor professor Daniel Bessa deu uma conferencia na Guarda, especialmente dedicada a industriais texteis.
O senhor professor, ex-ministro, merece consideração por ter sido, juntamente com o senhor professor Medina Carreira, dos poucos economistas que explicaram, publicamente, que a estabilidade de preços implica o aumento do desemprego (diminuindo o poder de compra diminui a procura e os preços baixam).
Nesta conferencia apresentou uma ideia válida, qual seja a de isentar de IRC os lucros que forem reinvestidos em atividades produtivas (curioso, a atividade económica paralela também está isenta de IRC).
Porém, quando confrontado com a informação de um dos industriais texteis de que o aumento das exportações de texteis não iria equilibrar a balança de pagamentos, porque temde importar matérias primas , nomeadamente fibras texteis, respondeu que era melhor que nada porque sempre se exportava valor acrescentado.
Este caso é dramático, conforme já referido neste blogue, porque as principais exportadoras portuguesas têm de importar mais em matérias primas (em valor) do que o que ganham em valor acrescentado exportado. Caso exemplar é a Auto Europa, cuja balança de pagamentos é negativa. Isto é, as nossas exportações deveriam incorporar mais matérias primas internas ou aumentar o valor acrescentado incorporado.
Pessoalmente eu esperaria que o senhor economista tivesse recomendado: então vamos instalar fábricas de fibras texteis em Portugal ou negociar preços especias com os produtores das matérias primas.
Mas não foi isso que o senhor economista disse aos seus ouvintes.
Continuo  a acreditar mais no guru dos anos 80, Drucker, que recomendou uma valente especialização nos grupos de produtos tradicionais, de grande incorporação nacional.
Mas será nostalgia da minha parte.