sexta-feira, 24 de abril de 2020

O acidente do Alfa em Vale de Santarem na passagem de nivel de Peso em 22abr2020






Caros Colegas

Muito obrigado pelas informações que me enviaram. Destaco ainda a qualidade do trabalho do Carlos Cipriano e da imprensa, nomeadamente do Correio do Ribatejo, que permitem ter alguma noção do que se passou.
A minha vida profissional decorreu no metropolitano de Lisboa onde pratiquei alguma análise de riscos  e não quero usurpar qualquer competencia aos colegas profissionalmente mais ligados que eu ao caminho de ferro interurbano. Mas a gravidade da situação leva-me a escrever alguma coisa.
Exprimo as condolências aos familiares do motorista morto no acidente em trabalho e votos de recuperação dos feridos.
Refiro a correção do relatório do GPIAAF do acidente de 2016 na mesma passagem de nível do Peso (embora no sentido nascente - poente, enquanto o acidente de 22 de abril foi de poente – nascente) e lamento não ter sido andamento às recomendações.
Consultando o Google Earth, verifica-se que no sentido sul-norte a passagem rodoviária inferior mais próxima encontra-se a 2 km de distancia (passagem limitada a 3,5 m de altura e 2,8 m de largura) e a passagem de nível mais próxima encontra.se na estação de Santarem, a 4,7 km . Estes dois locais exigem uma grande volta por Santarem ou o prolongamento de 2 km da estrada que atravessa a passagem de nível do Peso.  Existe ligação alcatroada à aldeia de Caneiras, uma aldeia junto do rio Tejo (esta também servida pela estrada que atravessa a PN do Peso).
No sentido norte-sul existe uma passagem inferior junto da ponte de Asseca, a 1,4 km da PN do Peso, mas são caminhos rurais que teriam de ser adaptados para tráfego de camiões. A passagem de nível mais próxima encontra-se a sul da estação Vale de Santarem, a cerca de 3,6 km da PN do Peso. Mas não servem estradas que liguem a Caneiras.
Igualmente não há ligação da A13 (a autoestrada que passa sobre a via férrea a 150 m da PN do Peso e que segue pela ponte Salgueiro Maia) à zona de Caneiras.
Isto é, não há alternativa económica à PN do Peso, embora sejam visíveis as intervenções rodoviárias onerosas a poente da via férrea, contrastando com a penúria rural da zona a nascente da via férrea.
Admitindo que a distancia de visibilidade é de cerca de 550 m (apesar de ser uma curva de elevado raio, existe vegetação muito crescida junto das vias ), para uma velocidade de 140 km/h e uma desaceleração de 0,8 m/s2 considerando o tempo de reação, o choque terá ocorrido a cerca de 75 km/h, tendo o Alfa embatido na zona do depósito de combustível, como se pode ver na foto do Publico, e seccionado a ligação do trator Scania ao reboque, que rodou cerca de 180º.
Isto é, para esta velocidade, um pequeno atraso na travessia da PN pode mesmo gerar um acidente. E em caso de avaria ou, como parece ter acontecido, o reboque não se ter inserido na curva apertada e parado, o aumento da temporização não resolveria .   Se um detetor de presença de obstáculo ainda no canal ferroviário emitisse uma ordem de travagem automática, o comboio teria de estar a mais de 1000 metros para uma desaceleração de 0,8 m/s2  (infelizmente, esse dispositivo teria por efeito o abuso de provocar intencionalmente a paragem dos comboios).
Vendo a passagem de nível do Peso em planta, verifica-se que as curvas são demasiado apertadas, dificultando a manobra de camiões numa zona de grande atividade agrícola.
Isto é, também por isso, a solução parece ser a de eliminar a passagem de nível, ou por construção de passagens desniveladas ou por construção de estradas de acesso a passagens desniveladas (por exemplo aproveitando a da ponte de Asseca). Nesta zona, numa extensão de 7 km, PN a eliminar: Vale de Santarem, Peso e Santarem.
Donde, tudo indica que o relatório do GPIAAF estava correto (apesar da evidente carência de meios que levou à demora na publicação) e nem a IP nem a Câmara de Dantarem resolveram o assunto.
É lamentável a justificação da IP, que fez o que estava dentro das suas competencias.
Não devia haver compartimentos estanques. Um acidente mortal numa passagem de nível diz-nos respeito a todos, ferroviários. Uma das bandeiras do transporte ferrovia´rio é a segurança,  e esta morte conta para o indicador  fatalidades por 1000 milhões de passageiros-km, que em Portugal se aproxima intoleravelmente do indicador do transporte rodoviário.
Dir-se-á que somos um país pobre, que nos países mais ricos também há acidentes nas passagens de nível (eu sei, também acompanho isso), mas neste caso não basta a justificação da IP, que está previsto no Ferrovia 2020  (previsto mas não concursado segundo o artigo de Carlos Cipriano, e muito provavelmente sem o projeto necessário para submissão a fundos comunitários. Com a agravante da associação da ferrovia com as estradas não parecer terminar com a preferência pela rodovia, e haver dificuldade em aceitar que deve haver um orçamento para a manutenção/modernização  (correção das deficiências do troço de Santarem, incluindo a separação física com vedações segregando a via férrea) e outro orçamento, independente, para linha nova (duvido que seja a melhor solução o previsto no PNI2030 de 160 km de by passes na linha do norte, incluindo o de Santarem, em vez de toda a linha nova, mesmo que de construção faseada).
Peço desculpa pelos desabafos.
Saudações e votos de saúde






terça-feira, 14 de abril de 2020

Depois da destruição das chaminés de Setubal

Pouco antes da destruição das chaminés da antiga central térmica de Setúbal, recebi um email do chefe de gabinete da presidencia da câmara acusando a receção de anterior meu email estranhando a postura permissiva da câmara perante o atentado ao património industrial que se aproximava e sugerindo a realização dum referendo municipal:


"Encarrega-me a Senhora Presidente da Câmara de acusar recepção do mail enviado o qual mereceu a nossa melhor atenção.
Relativamente ao assunto registamos a sua opinião.

Com os meus cumprimentos, "

Evidentemente que o registo da minha discordancia , evocando o exemplo com um final feliz do depósito de água de Tavira, cuja destruição foi impedida pelos tavirenses, o exemplo do respeito pelo património industrial no Ruhr e na própria EDP na sua central Tejo, a excelente dissertação de Helga Carina Santos Matos de 2015, mas também o exemplo negativo da destruição dispensável do viaduto das Presas, no Tua, de nada serve perante o argumento financeiro de uma manutenção cara (apesar do turismo arqueológico industrial gerar receitas) e perante a realidade de que as chaminés já não existem.
Email que tinha enviado:

Mas continua a ser possível exprimir uma opinião, e deu-se o caso de, ao observar um episódio de uma série televisiva sobre a vida dura dos refugiados, cuja ação se desenrola em Dublin, ter dado com os olhos nas duas chaminés de Setubal, perdão de Dublin.

As chaminés da central de gás, ao sul de Dublin, desativada em 2010, também com 200 m de altura e mantidas por decisão do conselho da cidade ao atribuir-lhes em 2014 o estatuto de estruturas protegidas

O departamento de planeamento do Conselho de Dublin incluiu em 2014 a central Poolbeg Generation Station na lista de estruturas protegidas. As chaminés foram entendidas como um emblema daquela região da cidade e os guias turísticos explicam como podem ser vistas de perto.
Claro que a central de Setubal não pode comparar-se à central Tejo, mas era património industrial e podia comparar-se com a central de Dublin.
Perderam-se, tal como se perdeu, ao privatizar a EDP, empresa estratégica, a capacidade de decidir o destino de uma estrutura patrimonial. Embora duvide que sob gestão pública, conhecidas as relações entre os governos e os nomeados para funções de administração, o destino das chaminés tivesse sido melhor.
 Mas é um caso exemplar. Não esperava que a câmara de Setubal não tivesse levantado um dedo contra a destruição. Ao menos podia ter promovido um referendo municipal.

https://en.wikipedia.org/wiki/Poolbeg_Generating_Station




segunda-feira, 13 de abril de 2020

A conflitualidade juridica IP-CP

No seguimento de um comunicado publicado em 2 de abril de 2020 pela ADFERSIT a propósito da conflitualidade jurídica entre a IP e a CP, retratada na série de reportagens por Carlos Cipriano no Público,  tomei a liberdade de enviar à direção da ADFERSIT o comentário seguinte.




Peço desculpa pelo comentário que vos envio ao comunicado sobre os conflitos jurídicos entre a CP e a REFER/IP.
Não posso fazê-lo na qualidade de técnico com experiencia na ferrovia de longa distancia, dado que a minha vida profissional se limitou ao metropolitano de Lisboa, por natureza excluído das diretivas europeias que regulam o funcionamento da referida ferrovia.
Mas posso fazê-lo como simples cidadão, cujo direito à participação nos assuntos públicos é garantido pela Constituição, e tenho ainda a desculpa de os comboios do metro, apesar da sua muito restrita circulação, ainda pertencerem à classe “pesada” com as suas 13 toneladas/eixo, e são 4 por carruagem, e tudo o que lhes diz respeito obedece às mesmas leis da Física que os comboios da CP, incluindo os princípios básicos da operação e manutenção de material circulante e infraestruturas.
Começo por felicitá-los pela tomada de posição e pelo apelo às duas empresas envolvidas, na expetativa de futura adequação do sistema regulatório.
Graças às excelentes reportagens de Carlos Cipriano, ficámos a saber pormenores dos conflitos de interesse.
Como afirmam no comunicado, não é de estranhar que, depois das intervenções e das restrições no operador e no gestor de infraestruturas se tenha chegado a este tipo de conflitos.
E citam, e muito bem, as diretivas europeias, nomeadamente a 91/440/CEE, como justificação para a separação de operador e de gestor de infraestruturas.
A atualização dessa diretiva, através das 2012/34/EU e da 2016/2370/EU vieram confirmá-la, mas eu gostaria de sublinhar que a separação não era nem é uma imposição das diretivas. Ou melhor, a separação contabilística é mandatória, mas ensinam em qualquer escola de engenharia que de qualquer coisa que se faça tem de se saber o custo, e mais importante que isso, tem de se saber os custos de todas as naturezas, nomeadamente das externalidades, e os benefícios. Por isso ninguém contesta essa imposição.
Aliás, era o que já fazíamos na primeira década do século XXI no metropolitano. Calculávamos desde os custos do passageiro-km e do comboio-km à taxa de utilização da infraestrutura e afetavamo-nos mutuamente, operação, manutenção de material circulante, manutenção de infraestruturas.
Mas, sinceramente, não pensávamos que a separação em empresas independentes trouxesse benefícios. Recordo, claro que com nostalgia, os telefonemas do meu colega da operação, preocupado com deficiências (mal functions) que lhe reportavam os seus colaboradores. Ao que eu lhe respondia que não me preocupava muito o que lhe reportavam, porque quando isso acontecia já as coisas estavam resolvidas ou em vias de resolução, mas o que me preocupava mesmo eram as deficiências de que eu não tinha conhecimento. Isto é, uma ligação direta entre os técnicos das duas áreas é essencial, e separá-las dificulta o trabalho de ambas, embora possa, naturalmente, criar mais lugares de prestigio.
Extrapolando, direi que muitos indícios apontam que os nossos colegas da SNCF e da DB também acham isso, baseando-se na sua experiência profissional, que naturalmente será mais intensa na ferrovia efetiva do que a dos legisladores e gestores da União Europeia (vem a propósito lamentar que não parece resolvida a relação entre as comissões especializadas na área da ferrovia de apoio à Comissão Europeia e as grandes associações profissionais ferroviárias como a UITP e a UIC).
Isto para dizer que as diretivas não impõem a separação física em duas empresas, do operador e do gestor das infraestruturas. Explicitamente consideram-na facultativa ou suscetível de integração numa organização vertical.
Não tenho a pretensão de conhecer todos os dados da questão e portanto se será recomendável a reversão, desfazendo a união REFER-Estradas de Portugal e refundindo a REFER com a  CP/EMEF (já que as diretivas impõem a tração no operador), embora no meu foro íntimo eu assim o intua.
Mas gostaria de ver o assunto debatido com a divulgação dos dados para uma posterior decisão informada.
Entretanto, como referido no vosso comunicado, operador e gestor deverão “pôr em prática um modelo de compromisso de cooperação e de resolução de conflitos”.
No entanto, permito-me observar, com base no histórico de acidentes ferroviários, que um dos fatores que potencia levar os conflitos para os tribunais é a inadmissível rarefação de meios humanos no GPIAFF, o que atrasa a produção de relatórios e nalguns casos a inviabiliza.
Cito o caso relatado por Carlos Cipriano, que o relatório do acidente do descarrilamento do TUA omitiu  a abertura da vala para telecomunicações ao lado da via que já estava em mau estado (desalinhada, falta de tirafundos, travessas podres, a que se juntou deficientes manutenção e estado do material circulante, para além de outros fatores registados).
Cito o caso do atropelamento mortal de duas adolescentes em Vila Nova de Anços, a propósito do qual o GPIAFF declarou que não investigava por não ter meios e estatutariamente não ser obrigado.
Cito o caso do acidente da Adémia, em que para além da evidencia no relatório das deficientes fiscalização e execução por outsourcing dos trabalhos, subsistiram dúvidas sobre a correta manutenção dos vagões do operador de mercadorias.
Para além de ser necessário envolver o sistema regulatório nestas questões e da colocação em prática por operador e gestor do referido modelo, penso que o reforço do GPIAFF com meios humanos é indispensável para a resolução destes conflitos (notar que o objetivo de um inquérito não é apurar responsabilidades civis, é determinar as causas e circunstancias em que se deu o acidente e produzir recomendações para evitar ou atenuar os acidentes).
Gostaria ainda de referir alguns pontos das diretivas invocadas e que têm atualidade, dadas as restrições climáticas que mais cedo ou mais tarde terão de se impor ao tráfego rodoviário de mercadorias para a Europa (a melhor solução seria o transporte ferroviário de camiões ou reboques, cada comboio com capacidade para 30 a 50 camiões):
- as diretivas aceitam nalgumas circunstancias ajudas do Estado às empresas e admitem a criação de um serviço distinto das empresas para a amortização das dívidas, o que, juntamente com os cofinanciamentos comunitários, é compatível com o desenvolvimento de projetos de novas infraestruturas e sua concretização
- as diretivas condenam a limitação do acesso a uma rede a operadores de países terceiros, o que automaticamente põe a necessidade de rapidamente assegurar a ligação a Espanha e à Europa em bitola UIC, uma vez que a solução de eixos variáveis é, para esses operadores, não só pelos custos de investimento como de exploraçaão, um obstáculo à concorrência.
Solicitando mais uma vez a vossa indulgencia para os meus comentários, e felicitando-vos pelo vosso trabalho na ADFERSIT, apresento os meus melhores cumprimentos

domingo, 12 de abril de 2020

Notícias da ferrovia por esse mundo fora...e por cá

 Com a devida vénia à Railway Gazette, comento algumas notícias recentes, as duas primeiras de grande interesse para os investimentos nacionais, embora não sejam fonte de esperança, as restantes para espreitar o que vai acontecendo lá por fora, nomeadamente as vantagens do sistema de autoestradas ferroviárias (solução para problemas das empresas de transporte rodoviário, que também seria bom aplicar-se em Portugal):


1 - UBS predicts post-pandemic shift from air to high speed rail

O consultor suiço UBS Research (grupo bancário e financeiro) elaborou um relatório intitulado "Por comboio ou por avião? o dilema do viajante depois do covid19 e no meio das preocupações com as alterações climáticas".
Uma das conclusões é que consumidores e governos provavelmente preocupar-se-ão mais com o significado de "ar limpo" (dados da UE: cerca de 430.000 mortes prematuras por ano devidas à poluição do ar).
Dados da União Europeia utilizados pela UBS:
A aviação representa:
  • 2,5 a 3% das emissões globais
  • 15% das emissões dos transportes
Em 2017 foram emitidas pelos transportes cerca de 4.500 milhões de toneladas equivalentes de CO2 , sendo:
  • 73% pelo rodoviário
  • 14% pela aviação
  • 13,5% pelo marítimo
  •   0,5% pelo ferroviário
Considerando os programas governamentais de descarbonização, é expetável uma transferencia do avião para o ferroviário de alta velocidade, pelo menos se os ditos governos acreditam nas leis da Física.
 A UBS prevê investimentos  em alta velocidade ferroviária de mais de 100.000 milhões  de euros na União Europeia e de igual valor na China, estimulando o crescimento da velocidade e da densidade populacional e industrial  servida.
A UBS  estima, por efeito multiplicador,  retornos da ordem de 40.000 a 60.000 euros em Espanha, França, Alemanha e Itália nos próximos 10 anos.
Segundo a UBS, isso pode abrandar o crescimento do tráfego aéreo para 4,6% por ano até 2028 (o que daria para a procura na área aeroportuária de Lisboa de cerca de 43 milhões de passageiros por ano, o que parece ser compatível com a capacidade do aeroporto do Montijo e da Portela; descansarão o governo e a Vinci com os atrasos na construção).
Numa sondagem a 1000 clientes de transportadores aéreas da UE e da China, a UBS concluiu que os viajantes tolerarão as seguintes durações máximas da viagem por comboio:

  • viagens de lazer -  5 a 6 horas  
  • viagens de negócios -  2 a 3 horas, podendo ir a 4 horas
Curiosamente, ainda segundo a UBS, na China verifica-se mais transferencia da estrada para o comboio do que do avião para o comboio.

Os números são encorajadores para os planeadores da ligação de alta velocidade Lisboa-Madrid. Apesar de deficientes negociações terem permitido levar a extensão da ligação até 715 km, isso significará para uma velocidade máxima de 300 km/h e média de 210 km/h, um tempo de percurso de 3 horas e 20 minutos; caso a velocidade máxima possa ser de 350 km/h e  a velocidade média de 245 km/h teremos um tempo de percurso de 2 horas e 50 minutos. Em termos energéticos, recordo a comparação comboio-avião Lisboa-Madrid em
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/09/madrid-lisboa-de-aviao-ou-de-tgv.html
e
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2017/04/investimentos-em-ferrovia-situacao-em.html




2 - EU funding to support Madrid – Lisboa link

Do programa de 1.400 milhões de euros do European Green Deal para 7 países foram alocados 264,95 milhões de euros à ligação de alta velocidade Lisboa-Madrid, segundo a comissária para a Coesão e Reformas Elisa Ferreira, em meados de março de 2020
(Ver também 
https://ec.europa.eu/regional_policy/pt/newsroom/news/2020/03/17-03-2020-eu-cohesion-policy-invests-over-eur1-4-billion-in-green-projects-in-7-member-states       )



Aparentemente uma boa noticia, verifica-se porem que essa verba se destina aos 179 km dos troços Plasencia-Caceres-Badajoz e aos estudos para a ligação Plasencia-Madrid via Toledo.
Está ainda por definir, visto não haver colaboração da parte portuguesa nesse sentido, a data de colocação em serviço da ligação Lisboa- madrid (715 km) segundo as normas da interoperabilidade (sinalização ETCS nivel 2, eletrificação 25 kVAC, bitola UIC), pelo menos nalguns troços. Para o serviço de passageiros poderia usar-se transitoriamente a solução eixos variáveis, e para as mercadorias percursos alternativos.
Segundo a noticia, em 2023 a ligação dita de alta velocidade (máximo 300 km/h, 25 kVAC e ETCS nivel 2) far-se-á em bitola ibérica (travessas polivalentes de fixações para 4 carris para futura mudança para bitola UIC) com o traçado de alta velocidade entre Plasencia-Badajoz Evora-Lisboa (e Madrid-Toledo) e linhas convencionais Toledo-Plasencia e Evora-Lisboa.
A noticia refere ainda o arranque das obras da ligação Sines-Badajoz, possivelmente em referencia ao traçado Evora sul-Caia em construção com travessas polivalentes e à proposta de inclusão no CSOP da ligação Sines-Grandola Norte para evitar os declives de Sines-Ermidas, julga-se que também com travessas polivalentes.

Não são boas notícias, porque o corredor Atlantico sul precisa de muito mais do que isso, sabendo-se que os traçados de alta velocidade e em bitola UIC permitem uma exploração do transporte de mercadorias mais rentável devido ao menor consumo de energia quando comparado com os traçados convencionais e devido às ligações transfronteiriças mais rápidas na entrada em França, no pressuposto das exportações para França, Alemanha e Europa central. Mais uma vez refiro a solução eficiente das autoestradas ferroviárias para transporte de reboque.
E o argumento vale tambem para o transporte de passageiros devido à desejável transferencia do transporte aéreo de curta distancia para o ferroviário.

Vê-se portanto com grande preocupação a estagnação em que caiu o projeto de interligações interoperáveis e eficientes à Europa e lamenta-se que a Comissão Europeia não faça mais do que comentar ou sugerir a aceleração do planeamento da parte portuguesa.
Como exemplo dessa complacencia, agravada por aparente aceitação acrítica das informações oficiais prestadas pelas entidades portuguesas da especialidade à Comissão Europeia, veja-se o relatório de 26fev2020 da Comissão sobre Portugal e o desenvolvimento  das recomendações:

Nas páginas 21 (recomendação 3) e 82/83 (recomendação 3) fazem-se as recomendações sobre os investimentos ferroviários. Na página 66 verifica-se o óbvio, que as questóes da  interoperabilidade ferroviária constituem um estrangulamento e que falta um planeamento estratégico para os investimentos e modernização da ferrovia e a coordenação com Espanha e França.
São palavras duras mas temperadas com a benevolencia de considerar que tem havido progressos.

Salvo melhor opinião, com os atuais procedimentos e estrutura das entidades que tratam do setor, sem, pelo menos, a criação duma entidade distinta da atual IP, não será possivel esse planeamento estratégico e manter-se-á a indefinição, a estagnação e a ineficiencia com as consequentes perdas de receitas. A exemplo  do que faz a Espanha, existe uma ADIF para a rede convencional, e existe ums ADIF alta velocidade, para as infraestruturas para a alta velocidade, e cada uma das entidades tem de ter o seu orçamento próprio, para que não se diga que não pode fazer-se linha nova porque o dinheiro foi todo para a modernização da linha antiga.

E é urgente planear os investimentos para o quadro 2021-2027 em articulação com o CSOP e com a sociedade civil. Um grupo de cidadãos vem desde 2017 fazendo formalmente, junto dos poderes políticos, propostas de atuação para concretização das ligações ferroviárias integralmente interoperáveis com a Europa. Ver por exemplo a sua discriminação e cronograma em
https://manifestoferrovia.blogspot.com/2018/03/1.html

Sugere-se começar pela renegociação do contrato Poceirão-Caia, cujo consórcio adjudicatário é credor de uma indemnização de 150 milhões de euros.
Por exemplo, nova ligação Sines-Poceirão em travessas de 3 carris (possibilidade de utilização por comboios de bitola ibérica ou UIC), Poceirão-Évora norte em bitola UIC em coordenação com o outro lado da fronteira, idem para a mudança de bitola ibérica para UIC no troço Évora norte-Caia.
Enquanto a bitola UIC não estiver disponivel em Evora norte-Caia e na terceira travessia do Tejo-Poceirão-Vendas Novas, serviço de mercadorias por Sines-Ermidas-Evora sul-Caia e serviço de passageiros com eixos variáveis Poceirão-ponte 25abril.

Como facto  positivo na comunicação da senhora comissária Elisa Ferreira, assinale-se a concessão de um cofinanciamento de 107 milhões de euros para a expansão do metro do Porto. Verifica-se assim que os colegas do metro do Porto preparam de forma melhor do que em Lisboa os seus projetos de expansão, pese embora a exiguidade do subsidio.

3 - Budapest cross-city upgrading gathers pace

Depois da construção da linha 4 do metropolitano de Budapeste que foi alvo de muita contestação (7,4 km, 1400 milhões de euros!), o governo hungaro pretende melhorar a travessia leste-oeste da cidade, libertando o tráfego interurbano e de mercadorias da passagem pelo centro da cidade. 
Na fase presente, está a ser lançado o concurso para a construção de um interface junto da estação Nepliget para correspondencia entre a linha 3 do metro, com a rede de elétricos e com a redes interurbana e suburbana. Seguir-se-á a quadruplicação da linha suburbana.



O objeto do concurso é  a remodelação da estação de Nepliget como interface entre a rede de metro, linhas de elétricos e a rede interurbana e suburbana; os algarismos nos círculos coloridos assinalam o número da linha de metro; a linha 1 foi a segunda linha de metro construida no mundo, em 1896, no tempo do império austro-hungaro



4 - Tokyu Corp completes platform edge door programme

A companhia japonesa de transportes suburbanos (64 estações) completou o seu programa de 5 anos para instalação de portas de cais por motivos de segurança.
Os incidentes com passageiros diminuiram de 131 em 2014 para 10 em 2019.
O sistema de portas de cais tem a grande vantagem de diminuir o risco de acidentes com passageiros com o fecho de portas dos comboios, e tem ainda a vantagem de reduzir a probabilidade de suicidios. No entanto é um sistema caro e em principio a sua fiabilidade é inferior à dos comboios. Mas seria interessante considerar um programa progressivo, distribuido ao longo dos anos, dada a redução dos riscos.





5 - Ukrainian Railways announces the open selection of candidates for the position of the CEO

A empresa pública de caminhos de ferro ucranianos (19.000 km de linhas, 7º maior transportador ferroviário mundial de mercadorias) anunciou um concurso público internacional para seleção do seu CEO.
Serão os consultores Boyden que conduzirão o processo.
O prazo para apresentaçao das candidaturas já terminou, mas os requesitos podem ser vistos em
https://www.uz.gov.ua/en/press_center/up_to_date_topic/512550/

Eis um procedmento interessante para evitar deixar as empresas públicas nas mãos de nomeados pelas suas ligações ao poder político e pouco conhecedores do negócio, embora se corra o risco de deixar o concurso deserto por excesso de exigencia.



6 - Brittany Ferries to launch Cherbourg – Spain rail motorway service

A companhia Brittany Ferries planeia lançar em 2021 um serviço de autoestradas ferroviárias de reboques não acompanhados desde o porto de Cherbourg, no norte de França, até Mouguerre, perto da fronteira com Espanha, cerca de 930 km.
O sistema de autoestradas ferroviárias, dada a sua eficiencia energética e a possibilidade dos reboque viajarem não acompanhados, parece ser um sistema ideal para ligação de Portugal à Europa central.
Inconvenientes: exige investimento em material circulante e adaptação de infraestruturas, como tuneis ou by-passes,e pressão diplomática sobre França para construção de nova linha de mercadorias entre Bordeus e a fronteira espanhola para não interferir com o tráfego de pasageiros.



Os vagões consistem numa plataforma que gira sobre um eixo vertical de modo a permitir o acesso dos reboques, puxados por um trator



sexta-feira, 10 de abril de 2020

Sobre a insistência do senhor ministro do Ambiente em prosseguir o processo da linha circular



Pequeno diário desta novela

13 de abril de 2020

Surpreendentemente, o metro de Lisboa emitiu um comunicado para a imprensa no domingo de Páscoa, previsivelmente em teletrabalho do seu secretariado, informando que tinha adjudicado em 9 de abril os toscos do troço Rato-Santos por 48,6 milhões de euros e um prazo de execução de 960 dias, aguardando-se o visto do tribunal de Contas para a assinatura do contrato:
https://www.publico.pt/2020/04/12/economia/noticia/metro-lisboa-adjudica-primeira-empreitada-plano-expansao-1912001

Bem, embora a minha confiança no sistema juridico português seja limitada, ainda acredito que o Tribunal de Contas não irá visar. E o senhor presidente da CML aproveitará para agudizar o conflito com o TC .
Mas nunca se sabe. 
Quanto ao limite de 2023, já duvido que o prolongamento Rato-Cais do Sodré e os novos viadutos de Campo Grande o possam cumprir. Nem a estimativa de custos. Incluindo para este troço,  48,5 milhões de euros para Rato-Santos não chegam se se quiser garantir em bom nível a segurança da obra.
O mandado dos artigos 282 e 283 é para fazer estudos comparativos e alargados à AML e de viabilidade (nota minha - se necessário com recurso a consultores estrangeiros), grandes manutenções e adaptação de estações a pessoas com mobilidade reduzida que podem ser pagos com o cofinanciamento comunitário, além de poderem ser desviados para outros empreendimentos. 
Para beneficiarem de cofinanciamento têm de estar definidos pelo menos os estudos prévios e as análises custos benefícios. Os estudos têm de estar concluidos durante o ano de 2020 segundo a letra do decerto lei de aprovação do orçamento. Isto é, basta deixar as coisas arrastarem-se para o Tribunal de Contas poder pôr o visto em janeiro de 2021, a menos que o Parlamento renove o mandado para o orçamento de 2021.
Para o metro do Porto estão garantidos este ano 107 milhões de cofinanciamento pelo fundo de coesão, os colegas do metro do Porto serão mais expeditos.
Continuo a achar que o prosseguimento deveria ser a chamada do metro à comissão de economia e obras públicas para controles periódicos do avanço desses estudos e tomada de medidas alternativas para eles avançarem sem direções enviesadas.
Mas também reconheço que os deputados têm muitas solicitações.


9 de abril de 2020 

A câmara municipal de Lisboa, com votos contra apenas do PS, aprovou a seguinte moção:

Moção nº       /2020
Linha Circular do Metropolitano de Lisboa

Considerando a recente publicação do Orçamento de Estado para 2020; e em particular os seus artigos 282º e 283º, cujo teor se reproduz aqui, com sublinhado e bold nosso:
Artigo 282.º
Investimentos e expansão da rede do metropolitano de Lisboa
1 — O Governo promove, durante o ano de 2020, as medidas necessárias junto da empresa Metropolitano de Lisboa, E. P. E., para suspender o processo de construção da Linha Circular entre o Cais Sodré e o Campo Grande, devendo ser dada prioridade à expansão da rede de metropolitano até Loures, bem como para Alcântara e a zona ocidental de Lisboa.
2 — Durante o ano de 2020, o Governo:
a) Realiza, através da Metropolitano de Lisboa, E. P. E:
i) Um estudo técnico e de viabilidade económica, que permita uma avaliação comparativa entre a extensão até Alcântara e a Linha Circular;
ii) Os estudos técnicos e económicos necessários com vista à sua expansão prioritária para o concelho de Loures;
iii) Uma avaliação global custo-benefício, abrangendo as várias soluções alternativas para a extensão da rede para a zona ocidental de Lisboa;
b) Elabora um estudo global de mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa, nomeadamente quanto às redes de transportes públicos, à ligação dos modos de transporte, à intermodalidade e interfaces;
c) Com vista ao normal funcionamento do metropolitano de Lisboa, procede:
i) À contratação urgente dos trabalhadores necessários, tendo em conta as diversas áreas onde se verifica carência de pessoal;
ii) À reposição dos materiais necessários à manutenção e reparação do material circulante e dos equipamentos;
iii) À realização urgente de obras nas estações que necessitam de intervenção, principalmente devido às infiltrações.

Artigo 283.º
Promoção da acessibilidade no metropolitano de Lisboa
Tendo em vista o cumprimento da legislação sobre acessibilidades e para que sejam progressivamente eliminadas as barreiras existentes, o Governo promove a concretização de obras nas estações do metropolitano de Lisboa já existentes, por forma a torná-las totalmente acessíveis a cidadãos com mobilidade reduzida, nomeadamente através da instalação de elevadores e/ou plataformas elevatórias para cadeira de rodas e da adaptação dos corrimãos para leitura em braille do número de degraus.

Considerando, por outro lado, o recente despacho assinado pelo ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes, autorizando o Metro de Lisboa a concretizar o “prolongamento das Linhas Amarela e Verde”, com a ligação do Rato ao Cais do Sodré.

Considerando ainda, que a uma pergunta dos eurodeputados do PCP, sobre se as verbas do atual Quadro Financeiro Plurianual (2013-2020) que estão previstas serem alocadas à construção da linha circular do metropolitano de Lisboa, poderiam ser realocadas para a concretização de outros projetos de expansão da rede de metropolitano. Fomos informados que, e citamos:
“O Quadro Financeiro Plurianual (QFP) de 2014-2020 não contempla financiamentos destinados a projetos específicos em regime de gestão partilhada. Cabe ao Estado-Membro, e não à Comissão, selecionar projetos concretos, em conformidade com as disposições aplicáveis e os programas operacionais aprovados. Para projetos qualificados como «grandes projetos», que é o caso da linha circular do metro de Lisboa, a Comissão aprova a contribuição da União através de uma decisão na sequência de um pedido apresentado pelo Estado-Membro. Neste contexto, as autoridades portuguesas planearam recorrer a um montante de 83 milhões de EUR ao abrigo do Programa Operacional da Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR) para cofinanciar a linha circular do metro de Lisboa. A possibilidade de reafectar esse montante será sempre uma decisão das autoridades portuguesas. Até à data, a Comissão não foi informada de qualquer intenção das autoridades nacionais nesse sentido.”

A Câmara Municipal de Lisboa, reunida a 9 de abril de 2020, decide:
  1. Manifestar ao Governo a sua discordância pelo não cumprimento do disposto nos artigos citados acima, aprovados por uma ampla maioria de deputados da Assembleia da República;
  2. Reiterar que a expansão da rede do Metropolitano de Lisboa constitui um elemento determinante para a Cidade e a área metropolitana em que se insere, pelo que importa concretizar o teor dos artigos aprovados na Assembleia da República, aproveitando para o efeito os fundos comunitários disponíveis, tal como determina a Comissão Europeia.
Lisboa, 7 de Abril de 2020
Os Vereadores do PCP
João Ferreira                                                                    Ana Jara

Comentário:

É verdade, sr ministro, os 10,5 milhões de euros no OE para material circulante e sinalização (CBTC) para toda a rede são imprescindiveis (apesar da esperteza saloia de ampliar o ambito do concurso para incluir Rato-Cais do Sodré). Não deve suspender-se esse concurso, e julgo que a impugnação já foi ultrapassada.
Mas tambem há no OE 24,2282 milhões para a expansão da rede que podem ser utilizados para os estudos comparativos e de viabilidade que deveriam ter sido feitos em 2017 e não foram porque o sr ministro não quis. Preferiu encomendar um estudo orientado para a linha circular. Disse nessa altura que a cidade se abria às pessoas com a linha circular  (e contra este argumento não tenho eu argumentos e se tivesse não os utilizava). 
Agora lamenta que não há tempo até 2023. 
Até há, mas com um grupo de controle periodico e com autoridade para coordenação interdisciplinar, não pode ser é com metodos top down e com a pratica da contratação publica habitual. 
Estudos até dez2020, concurso condicional simultaneamente com o EIA e adjudicação até jun2021, 2 anos para obra de 4000m a 6m por dia e ensaios já podem ser feitos no principio de 2024.
Mas era preciso ter unhas. E alterar a mentalidade dos fazedores da lei da contratação pública. Estamos em situação de emergencia, não é? A alteração para considerar o arranque dos procedimentos concursais de forma condicional, isto é, lançar os concursos ainda antes de todas as aprovações formais, foi uma das propostas que apresentei no ano 2008 aos senhores advogados que foram anunciar a nova lei de contratação pública. Surdos ficaram, o que não admira, nunca tiveram de lidar com as obras de infraestruturas. Mas depois não venham queixar-se das deficiencias da lei e das interpretações que dela fazem atrasando os empreendimentos.
Alem disso, sr ministro,  a sra comissária já escreveu que pode usar, o senhor ou outro ministro, os 83 milhões para outros fins, não tente enganar mais os cidadãos.
Ah, tambem é verdade que o metro já está a estudar o prolongamento para Alcantara, mas não mostra pormenores, nem alternativas, e parece que a imobiliária SARL não deixa fazer viadutos, por isso a estimativa é de 400 milhões (tirem o sentido de que podem fazer a circular por 200 milhões). 
Alem disso, basta empatar para não se conseguir cumprir o mandado dos artigos 282 e 283 (este manda pôr elevadores nas estações,  cuja falta que se arrasta há anos é uma vergonha).
Mas tambem duvido que o Tribunal de Contas ponha o visto nuns contratos para Rato-Santos e Santos-Cais do Sodré quando o decreto mandou suspender a circular. 
A proposito, o primeiro significado da palavra recomendação no dicionario Priberam é "incumbir formalmente alguem de". 
Ciberduvidas?


8 de abril de 2020

Retorno ao processo de avaliação ambiental da linha circular
o TUA, que poderá encontrar no site  participa em

Na página 47 diz que considerou o PROTAML e o PDML. Porem conforme refiro em 
A referencia ao PROTAML é enganadora (pág71 do RS)  porque ele previa a ligação a Alcantara conforme lembrado em muitos pareceres na consulta publica.

Não parece haver nenhuma referencia à CCDRLVT .
Não há tambem fundamento para a linha circular no PAMUS da AML de fevereiro de 2016 que na pág 47 apenas refere a expansão para a Reboleira. Link  para este PAMUS:

Aproveito ainda para juntar o meu parecer na consulta pública em que no ponto 4 refiro a incoerencia com o PROTAML.



7 de abril de 2020

Esta não devia ser uma telenovela neste período que atravessamos, agora com o episódio da infeliz declaração do senhor ministro Matos Fernandes a que se seguiu o esclarecimento de Elisa Ferreira:

Estamos perante um caso muito grave de desobediencia institucional, pelo que é boa a sugestão  de destacar o incumprimento do PROTAML (julgo que se refere ao de 2002 uma vez que as revisões posteriores não foram aprovadas) e do PAMUS da AML (de que conheço apenas a versão de fevereiro de 2016) e que são de facto omissos quanto à linha circular.

Relativamente ao PROTAML, que o EIA diz falsamente cumprir, veja-se a seguinte ligação:
Relativamente ao PAMUS, sugiro:
Gostaria de recordar que, segundo o dicionário Priberam, o primeiro significado de recomendação é "ato ou efeito de recomendar", e o primeiro significado de recomendar é "encarregar formalmente alguém de".  Donde, segundo o senhor Presidente, o Parlamento encarregou formalmente o governo de cumprir os artigos 282 e 283.

Até certo ponto, o senhor ministro tem a razão de considerar que até ao fim de 2020 é muito dificil de cumprir o mandado desses dois artigos (recordo que o 283 manda promover a concretização de obras para tornar as estações acessíveis a pessoas com mobilidade reduzida). O artigo 282 determina que  o governo mande o metropolitano suspender o processo de construção da linha circular e dar prioridade à expansão para Loures e Alcantara. Para isso terá o metro de desenvolver estudos comparativos e de viabilidade para Loures, Alcantara, parte ocidental de Lisboa, estudo global para a AML e contratação de trabalhadores, reposição de sobresselentes e obras de reparação em estações. 
Trata-se de um programa ousado, que provavelmente só poderá levar-se a cabo, em termos de projeto, se o metropolitano receber apoios (caso não seja possivel dentro do país, a UE tem mecanismos de apoio técnico por exemplo á contratação de gabinetes de engenharia internacionais). O próprio orçamento de Estado prevê 24,2282 milhões de euros para a expansão da rede do metro sem mencionar a linha circular  (mais 10,5 milhões de euros para material circulante e sinalização/CBTC). Os famosos 83 milhões de euros, como garantiu Elsa Ferreira, podem ser alocados a outros investimentos, nomeadamente ao próprio programa do mandado, ou a empreendimentos exteriores ao metro.
Só que o problema está, para além da execução dos projetos até ao fim de 2020,  em que a  concretização das obras respetivas  seja até 2023 .
Esta é uma das grandes fragilidades das relações de Portugal com os fundos comunitários para infraestruturas, a incapacidade de elaboração de um plano estratégico para a mobilidade na AML e dos anteprojetos das várias ligações e submetê-los com exito à candidatura aos fundos. 
Seria interessante a divulgação pelo governo como conseguiu obter um cofinanciamento de 83 milhões de euros para a linha circular quando a sua justificação assenta em  dados duvidosos (porquê a linha circular quando não foi comparada com nenhum dos troços previstos no mapa de 2009? mas apenas com uma parte do prolongamento da linha vermelha, logo antecipadamente desfavorecida no estudo comparativo. Igualmente seria interessante a divulgação já publicamente pedida do estudo da VTM que segundo o EIA, fundamenta a opção pela linha circular.
Se não for feito um controle periódico do avanço dos trabalhos cometidos ao metropolitano e corrigida a trajetória, os atrasos acumular-se-ão e chegar-se-á ao fim de 2020 sem dados fiáveis para tomar decisões.
É possivel tentar organizar uma equipa de acompanhamento, com apoio da Ordem dos engenheiros, de universidades, associações técnicas como a ADFERSIT, técnicos da especialidade, imprensa da especialidade, departamentos técnicos das câmaras da AML, mas o controle pelos deputados será essencial.



6 de abril de 2020 

No seguimento das declarações do senhor ministro, o grupo de cidadãos moradores em Odivelas emitiu o seguinte comunicado:

 CONTRA O FIM DA LINHA AMARELA
06/04/2020
Comunicado
Grave Atropelo ao Estado de Direito Democrático e à Democracia Representativa






No passado dia 31 de Março, foi publicado o Orçamento de Estado para 2020, onde através do art.º 282.º, entre outras medidas, foi imposto ao Governo a suspensão do «processo de construção da Linha Circular entre o Cais Sodré e o Campo Grande, devendo ser dada prioridade à expansão da rede de metropolitano até Loures, bem como para Alcântara e a zona ocidental de Lisboa».
Este é o tempo de se dar cumprimento à lei!

De acordo com Nota de Imprensa na página oficial do Ministério, o Senhor Ministro do Ambiente e Acção Climática, no dia 03 de Abril emitiu Despacho dando indicação à Metropolitano de Lisboa, E.P.E. para «continuar a executar os procedimentos administrativos necessários à aquisição de material circulante, modernização da sinalização e concretização do Plano de Expansão da rede do Metropolitano de Lisboa – Prolongamento das Linhas Amarela e Verde – Rato – Cais do Sodré, bem como os procedimentos conexos com esses projectos, nomeadamente os respectivos procedimentos de contratação pública.»
Aquele despacho é sustentado nos seguintes fundamentos:

        i.       Aquando da promulgação da Lei n.º 2/2020, de 31 de Março, que aprova o Orçamento de Estado para 2020 (LOE 2020), o Presidente da República considerou nota no site no Presidência da República que o inscrito no artigo 282.º da LOE 2020 não têm efeito vinculativo e que, em rigor, a Assembleia da República não suspendeu qualquer decisão administrativa, limitando-se a formular recomendação política, dirigida ao Governo e à Administração Pública em geral, sobre a aludida matéria;
      ii.          A retoma daquele projecto será especialmente importante perante os efeitos sobre a economia que a pandemia do COVID-19 já está a provocar em todo o Mundo e em Portugal.
      iii.          A não perda de 83 milhões de euros, financiados pelo Fundo de Coesão
     iv.          O Plano de Expansão da rede do Metropolitano de Lisboa – Prolongamento das Linhas Amarela e Verde – Rato – Cais do Sodré representa um investimento total de 276 milhões de euros

Ao longo deste processo temos verificado que sobre os argumentos usados para justificar a Linha Circular têm algum em comum, ou são fracos ou são omissos. Senão vejamos:

1. Quanto ao base o teor de nota no site no Presidência da República, oferece-nos dizer que:
1.1. As leis ou são promulgadas pelo Sr. Presidente da República, ou são vetadas politicamente ou com base na apreciação preventiva da constitucionalidade (de uma ou várias normas) pelo Tribunal Constitucional.
1.1.1. A única intervenção do Sr. Presidente da República na Lei do Orçamento de Estado para 2020 a considerar, resume-se ao que inscreveu naquela lei: «Promulgada em 23 de Março de 2020. Publique-se.»
1.1.2. Quaisquer comentários do Sr. Presidente da República sobre esta matéria não passam de exercício de liberdade de expressão, pois quando pôde agir assim não o fez. Naturalmente que estranhamos esta dicotomia comportamental.

1.2. Ora, veto Presidencial não terá existido, o que nos induz a duas conclusões:
1.2.1. Também o Senhor Presidente da República considera (ele mesmo o confirma na Nota proferida) não haver inconstitucionalidade naquele artigo (282.º) inserido na da Lei do Orçamento de Estado para 2020;
1.2.2. Porque no nosso ordenamento jurídico, não existem leis menores, nem artigos ou artiguinhos, a Lei de Orçamento de Estado para 2020 está integralmente aprovada e É PARA CUMPRIR INTEGRALMENTE.

2. Sabendo que a Comissão Europeia liberou o uso dos Fundos Comunitários para acudir às necessidades resultantes do surto pandémico (COVID-19), exortamos o Governo a aproveitar o momento para encaminhar responsavelmente os tais 83 milhões de euros, que vinham da "Europa" para o Metro, para o esforço na aquisição de equipamentos e materiais para o SNS. 83 milhões de euros certamente que permitirão a aquisição de materiais e equipamentos que assim evitarão que se imponha aos médicos a escolha de quem morre e de quem vive. Tal permitirá que aquele dinheiro não se perca (algo que só aconteceria por incúria) e que seja gasto com responsabilidade acudindo a uma real necessidade.

3. Verifica-se ainda que o custo da construção da Linha Circular do Metro era de 210 milhões, mas já vai em 276 milhões e a obra ainda nem sequer começou. Onde irá este valor parar?

Por se tratar de um grave atropelo ao Estado de Direito Democrático e à Democracia Representativa, ponderando a utilização de meios coercivos para conter esta decisão, é com muita preocupação que numa altura em que os direitos civis estão condicionados, verificamos existirem governantes que entendem poder agir à margem da lei.
Estamos convictos que alguém chamará o Senhor Ministro do Ambiente e Acção Climática, Matos Fernandes à razão e lhe diga que é errada a sua incapacidade de perceber que as Leis da República são para cumprir.

Se as leis da República são recomendações, perguntamos então porque temos de nós, os cidadãos, de as cumprir?

Sr. Ministro Matos Fernandes, os Cidadãos Contra o Fim da Linha Amarela recomendam-lhe que arrepie caminho!
O Senhor, como Governante tem de ser exemplar e estar na linha da frente dos que têm de cumprir a lei!
Não desejamos impor nada coercivamente, pelo que está na sua mão tal evitar!
Pelo Movimento de Cidadãos "Contra o Fim da Linha Amarela",
Vítor Peixoto
Ilda Tojal
Jorge Mendes
Paulo Bernardo e Sousa

PS: Para qualquer esclarecimento adicional indicamos o n.º 931325591 (Paulo Bernardo e Sousa) ou para contraofimdalinhaamarela@gmail.com.