quinta-feira, 30 de setembro de 2021

O manifesto em defesa do jornalismo no Publico de 24set2021

 Caro Diretor

Não proponho a publicação desta mensagem na secção "cartas ao diretor" dada a sua extensão mas teria muito prazer em ter uma resposta, mesmo indireta, apesar da pouco provável disponibilidade para a leitura desta mensagem.

Não desejo imiscuir-me demasiado na polémica das vacinas para crianças, nem da liberdade de expressão ou da falta dela, nem dos currículos universitários, mas penso que são pertinentes algumas observações ao seu editorial de 24 de setembro.

Causou-me estranheza a afirmação que Paulo Morais não divulgou nenhum caso concreto de corrupção (etimologicamente, o latim diz-nos que corrupção significa deterioração... neste caso das instituições) quando no seu livro "Pequeno livro negro da corrupção" são descritos abundantes casos, desde o A da Quinta do Ambrósio, ao Z do Zé das medalhas, passando pelo M do Monte Branco e o V do Vale do Galante. Penso que o autor citado merece a correção da afirmação.

Quanto às certezas e incertezas científicas, recordo a atenção que a minha professora de filosofia do 6º (agora 10º ano, será que ainda há filosofia para todos no 10º ano?) deu a um texto de um médico praticante do método científico, chamando a atenção para os cuidados na observação dos dados estatísticos, da dificuldade de estabelecer relações de causa e efeito, dos cuidados com as coincidências, da natureza das correlações, mas na necessidade inescapável de experimentar, de testar as hipóteses, como diz o método científico, e sabemos que isso é feito pelas instituições oficiais. 

Na minha profissão, tive de atender ao carater pluridisciplinar da maior parte das questões, até porque mesmo na minha especialidade não posso arvorar-me em detentor da certeza "comprovadamente científica". E já vimos como tantos "especialistas" têm dificuldade em aceitar isto.

Quanto aos currículos, citando o meu antigo professor de Eletrotecnia Teórica do IST, devemos preferir o essencial ao acessório, neste caso a qualidade do conteúdo sobre a correção da forma, se quisermos estar dentro das questões. Embora não possamos esquecer, e até graças a artigos de opinião no Publico, a endogamia e a inveja que infetam alguns meios universitários (e não só esses meios).

Sobre a publicação  e despublicação (maravilhas dos sítios da Internet) ocorre-me um episódio antigo, em que um diretor, talvez por não poder "despublicar", informou o autor do artigo incorreto,  "Publicamos este, mas escusas de mandar artigos desses", embora também para isso sirvam as notas da redação, para mostrar o contraditório do artigo incorreto. Cito este episódio porque efetivamente concordo com o caro Diretor, há critérios deontológicos, neste caso do jornalismo, que devem prevalecer.  Aliás no dia seguinte o provedor dos leitores veio dar suporte ao "manifesto em defesa do jornalismo".

Mas precisamente porque há um código deontológico do jornalismo temos de aceitar como natural que outras profissões tenham também um código deontológico. E, infelizmente, podem surgir conflitos. Por exemplo, quando um profissional tem uma análise baseada na sua experiencia e na sua formação técnica (ou humana) que foi desrespeitada pelas instancias hierárquicas superiores sobre um tema de impacto público. O conselho editorial pode achar que não merece haver notícia, até porque uma decisão sobre um investimento público só muitos anos depois pode ser apreciado pela opinião pública. Pode também achar que alguém pretendeu ingerir-se na liberdade editorial do jornal.

Talvez já tenha adivinhado que me refiro a casos como o da expansão do metro de Lisboa. O editorial do Público declarava que era um erro criticar a linha circular porque havia linhas circulares por esses metros fora. Mas, tinha o editorialista, que achara que o tema era notícia,  conhecimentos técnicos para poder pronunciar-se daquele modo? E era notícia, o tema, nada mais nada menos do que uma lei do Parlamento (art.282 da 2/2020) que mandava suspender a construção da linha circular, e a decisão contrária de um governo e de uma empresa pública de continuar o processo de construção. 

Cada um falará por si, mas a deontologia da minha profissão manda que tem de se fazer uma declaração de escusa ou de declaração explícita de discordância, que se está a colaborar numa obra ilegal porque a estrutura hierárquica determinou a desobediência à lei. Infelizmente neste caso da linha circular a deontologia do jornalismo contornou a dificuldade, e simplesmente ignorou a deontologia dos técnicos de transportes que mostraram as inconformidades de um Estudo de Impacto Ambiental e o desrespeito por um Plano Regional de Organização do Território da Área Metropolitana de Lisboa.

Detenho-me neste tema, porque mantenho ainda viva a memória dos meus tempos de jovem, quando os meus colegas e eu esperávamos ansiosos a chegada, umas vezes mensal outras nem isso, da revista de eletrónica e telecomunicações, "Wireless World", que na altura ainda era incipiente a microinformática, e nós entusiasmávamo-nos mais com as aplicações da microeletrónica. A SAAB, na Suécia, estava a fabricar um novo caça para a NATO, e os seus técnicos tinham enchido o focinho do avião com sensores e detetores que, à semelhança dos tubarões que detetam a presa à distancia, tornavam obsoletos os caças adversários. O editorialista da WW, também ele técnico, interrogava-se, uma máquina de guerra destas, infalivelmente mortífera, só era possível porque havia técnicos que tinham desenvolvido tais sistemas, seria ético pôr os seus conhecimentos ao serviço dum instrumento de morte como os caças SAAB? e concluia sem certezas, mas que tinha de ter a liberdade de expressão de poder dizer o que pensava dos instrumentos de morte. 

Isto, numa altura em que o "Imagine" de John Lennon corria o mundo, era aceitável? Qual a garantia que um louco não ganhe eleições e não vai pôr os caças a bombardear inocentes?

Assim como assim, Hitler ganhou as eleições e anos depois fez um referendo e ainda teve maior votação (eu sei, o contexto de violencia  condicionou a opção dos eleitores, que sabiam o que tinha acontecido à citada, pelo caro Diretor, Rosa Luxemburgo) seguindo-se os bombardeamentos de Londres com as V2 e os primeiros caças a jato.

Einstein e Oppenheimer tinham agido bem com o desenvolvimento nuclear? E antes deles Haber na 1ª guerra mundial deveria ter sido julgado por ter desenvolvido a arma química? (Haber, o químico do processo Haber-Bosch que vai ser útil na guerra pela descarbonização na produção de amónia e hidrogénio).

Na altura não tinha meios de saber que anos depois 4 políticos do mundo ocidental se reuniriam nos Açores e mandado avançar a aviação sofisticada para apoiar a invasão do Iraque das armas de destruição maciça que afinal não havia, com os resultados conhecidos. Nem que a partir de uma sala de comando no Wisconsin se podia telecomandar drones mortíferos largados de um porta aviões que matavam civis no Afeganistão. Eça, o Eça das Cartas de Inglaterra e do bombardeamento de Alexandria por desfastio do almirante não perdoaria a hipocrisia da prepotência ocidental por aquelas paragens (em vão procurei na livraria um exemplar das Cartas de Inglaterra na panóplia das obras completas de Eça, mas não quero ingerir-me na liberdade editorial da editora).

Eis-me assim, guardadas as devidas distancias, no meio de um conflito de deontologias. De um lado uma estrutura respaldada pelo seu código de ética, um jornal, ou um conselho de administração de uma empresa pública, do outro cidadãos que anteviram ameaças para o país ou técnicos que veem grandes somas desperdiçadas em investimentos habilmente conduzidos para soluções deficientes que não admitem debate, sofrendo um imperativo moral para exteriorizarem o seu pensamento.

Dou outro exemplo para além da linha circular, a política ferroviária de recusa de cumprimento dos regulamentos vinculativos da Comissão Europeia de interligação interoperável com a rede europeia em bitola UIC e ERTMS. Fizeram-se belos discursos durante o ano internacional do caminho de ferro, sob a presidência portuguesa do Conselho, mas não se avançou na negociação com Espanha para a concretização do verdadeiro corredor atlântico. Ou a ausência de notícias sobre a resposta à Comissão Europeia do governo português ao anúncio de um processo de infrações sobre a sinistralidade ferroviária (prudentes que são, para mim em excesso, os termos dos relatórios de inquéritos a acidentes pelo orgão competente).

 Interrogo-me, não são temas para notícia? para além da apresentação da política oficial, a do seu contraditório?

E por falar em deontologia, como podem os colegas mais jovens, no ativo nestas empresas, receber as ordens das hierarquias e informá-las dos erros nelas contidos, sem correr o risco de verem as suas carreiras ameaçadas?

Como deixar de evocar a citação que o meu professor de Sociologia no IST, fazia do "Se" : "se consegues ouvir o que disseste distorcido por oportunistas para enganar pessoas, ou ver estragadas as coisas a que na tua vida deste o teu esforço..." ? Ou de uma forma mais ligeira, evocar o desabafo de Ronaldo no intervalo do jogo do campeonato na Africa do Sul, "Carlos, assim não ganhamos o jogo". A ideia que prevalece na comunicação social é o respeito pelas hierarquias, pelo "top-down", independentemente da tendência ideológica dos seus leitores, mas o que Ronaldo queria dizer, sem se ingerir na liberdade decisória do treinador ou da federação de futebol, é que devem ser ouvidos os que estão na frente de obra, ou no "terreno".

Outro exemplo: a cobertura dada às iniciativas de promoção do ciclismo. Quem quer apontar as inconformidades e os riscos da política excessivamente promocional do ciclismo em Lisboa raramente o consegue. Tecnicamente a redução do tráfego automóvel, que a maioria deseja com bons fundamentos, consegue-se com o correto desenvolvimento do transporte coletivo, ficando as bicicletas como meio complementar (como aliás os veículos autónomos a pedido que tive o prazer de ver referidos em artigo no Público de  30set2021 sobre o Urban Collectif). Sistematicamente são ocultadas as denúncias de que a omissão de realização  de inquéritos rigorosos aos acidentes rodoviários e divulgação das suas conclusões e recomendações contribuem para que se mantenha uma taxa intolerável de sinistralidade. 

Não será a defesa do combate à sinistralidade rodoviária notícia?

Caro Diretor, fico por aqui, afinal quase como comecei, em defesa dos códigos deontológicos, em cada profissão, e também da liberdade de expressão.


Com os melhores cumprimentos


Fernando Santos e Silva








 


quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Três equívocos para tentar explicar que o governo é o poder executivo, executa, não legisla, salvo quando recebe delegação para isso

 https://www.msn.com/pt-pt/noticias/portugal/ant%c3%b3nio-costa-pede-audi%c3%aancia-a-marcelo-para-esclarecer-equ%c3%advocos/ar-AAOY6CR?ocid=mailsignout&li=BBoPWjC


São três equívocos para o sr Presidente da República tentar explicar que o governo é o poder executivo, executa, não legisla, salvo quando recebe delegação para isso, e que o presidente é o chefe supremo das Forças Armadas. Percebam isso e respeitem a lei, por mais canhestra que a lei da reforma das Forças Armadas seja segundo o parecer das chefias militares.

Descarrilamento do comboio Amtrak Seattle-Chicago em Joplin, Montana

 https://abc7chicago.com/amtrak-train-from-chicago-that-derailed-was-going-under-speed-limit/11056396/


Infelizmente, os erros de exploração e de manutenção acontecem. Embora o NTSB ainda não tenha emitido o seu parecer, aparentemente o descarrilamento terá tido como causa um aparelho de mudança de via, como se pode ver pela foto. A lança de ponta poderá ter estado mal posicionada ou um objeto como uma pedra impedido o funcionamento correto tendo falhado o mecanismo de deteção ou um objeto na cróssima (esta visível na foto) ou uma peça indevidamente suspensa do material circulante que tenha impelido a lança, indo uns rodados para uma via e outros para outra. 

Para além dos procedimentos de manutenção, é essencial o desenvolvimento, já iniciado nalgumas explorações, de dispositivos de deteção da presença de obstáculos na via, incluindo os aparelhos de mudança de via. Igualmente é importante que os técnicos de todas as companhias sejam informados sobre as conclusões e recomendações dos inquéritos.







PS - Infelizmente, mais uma noticia de morte por atropelamento de uma senhora na linha perto de Beja. Como o maquinista da automotora não se apercebeu, é possivel que o acidente tenha tido origem no fenómeno da sucção por proximidade do veículo em marcha. Mais uma vez se verifica a necessidade de inquéritos rigorosos e o esclarecimento se o Estado português está a responder corretamente ao pedido da Comissão Europeia para redução da sinistralidade (estas fatalidades deveriam ser contabilizadas nas estatísticas de sinistralidade ferroviária).

https://www.msn.com/pt-pt/noticias/ultimas/idosa-morre-atropelada-por-automotora-em-beja/ar-AAOXPlc?ocid=mailsignout&li=BBoPWjC

imagem a 200m do local do atropelamento



imagem a 50m do local de atropelamento


imagem junto do local de atropelamento

O processo de infração relativo à sinistralidade ferroviária, de resposta requerida até 14set2021, está tratado em

terça-feira, 28 de setembro de 2021

Sobre a ilegalidade da construção da linha circular do metro, comunicação ao TCA

Em mais uma ação contra a construção ilegal da linha circular do metro, considerando a lei 2/2020, foi enviada  em 22set2021 a seguinte comunicação ao senhor Procurador Coordenador do TCA, subscrita por 9 pessoas, solicitando a retoma do processo PA 4/2019-G entregue na PGR pela ilegalidade do EIA, e também agora, a anulação deste:


Exmo Digno Procurador Coordenador do Tribunal Central Administrativo    

  

Assunto: Linha circular do metropolitano de Lisboa 



 

 

As empreitadas da linha circular do metropolitano encontram-se já a decorrer, pese embora tal seja, salvo melhor opinião, ilegal, nomeadamente pelo incumprimento do artigo 282 da lei 2/2020 de 31mar2020 (lei do orçamento de Estado para 2020) e pelas inconformidades da DIA e do TUA. Reforça o carater ilegal da obra a Resolução 167/2019 da AR na anterior legislatura, que recomendava ao Governo a suspensão da linha circular e a elaboração de um plano de mobilidade.  

Nas circunstâncias atuais (escavação já avançada do poço de 54m de profundidade do 1º lote - Rato-Santos cujo contrato foi assinado em 6mai2020 e visado pelo TdC em 27jun2020) é ainda possível interditar o início das escavações na zona da Avenida 24 de julho e da construção de novos viadutos de forte impacto visual no Campo Grande.  

  

Por isso tomamos a liberdade de requerer o seguimento do PA 4/2019-G entregue na PGR, Gabinete dos Interesses Difusos e de insistir, ​através de sugestão de providencia cautelar,  na proposta de anulação da DIA e de suspensão imediata e sem termo definido das obras. Para evitar custos adicionais por anulação de um contrato, recordamos o precedente da construção da sede da PJ em Lisboa depois da desistência da construção no Porto já adjudicada. 

  

Interpretamos assim o sentimento dos cidadãos que se sentem lesados pelo fim de ligações diretas desde Odivelas ou Telheiras, ou pela insegurança durante as obras na colina da Estrela, ou, numa perspetiva mais geral, dos cidadãos da AML que estão privados de um plano de mobilidade credível, que integre as políticas de organização do território e cuja elaboração tenha uma vertente participativa.  

Destacamos o facto, contrariamente ao anunciado pelo sr presidente da CML, que nem o PROTAML de 2002, nem o Plano Diretor Municipal de 2012 referem a linha circular, antes explicitamente defendem a extensão do metropolitano a Alcântara.  

Na seguinte ligação poderá encontrar os argumentos técnicos contrários à obra que atestam as inconformidades da DIA: 

  

argumentacao tecnica   

  

Sem prejuízo do que for entendido por V.Exa, permitimo-nos propor a junção da presente exposição ao PA 4/2019-G e requerer a inquirição dos dois técnicos que subscrevem a presente exposição para defesa da pretensão e proposta de alternativas compensatórias da anulação da DIA e suspensão das obras.  


 

Lisboa, 22 de setembro de 2021 


sexta-feira, 17 de setembro de 2021

O bairro dos cerejais, em Moscovo

 O bairro dos cerejais é uma opereta de Shostakovitch, do período pós Estaline, que relata as peripécias e a corrupção na atribuição de casas no novo bairro construido nos fins dos anos 50 para a classe trabalhadora:

https://en.wikipedia.org/wiki/Moscow,_Cheryomushki

Shostakovitch é um dos mais importantes compositores do século XX e os seus problemas com a política estalinista são sempre lembrados pelos comentadores ocidentais. Segundo testemunhos, era uma pessoa boa e que acreditava nos seus ideais. A sua opereta pretendia precisamente criticar os maus servidores públicos.

Guardadas as devidas distancias, lembrei-me das discussões sobre os programas de renda acessível e renda apoiada em curso na câmara municipal de Lisboa, especialmente as dos prédios vendidos pela Segurança Social  à CML.




Para a hipótese de uma providencia cautelar suspender a construção da linha circular

 Recentemente uma providencia cautelar, que pretendia proibir a construção do aeroporto do Montijo, foi recusada pelo Tribunal de Almada, com a justificação de que a construção não irá executar-se por ser ilegal, não satisfazendo os critérios ambientais.

Pus a hipótese de que outra providencia cautelar, invocando a ilegalidade da construção da linha circular, contratualizada em 2020 em evidente desrespeito pelo art 282 da lei 2/2020 poderia inviabilizar o prosseguimento das obras (o art 282, além de mandar suspender a construção da linha circular, mandava, entre outras ações, executar um plano de mobilidade para a  AML).

Nessas circunstancias, mandam as boas regras que se apresentem alternativas. O que é um exercício interessante que até é compatível com as obras atualmente a decorrer no lote 1, nomeadamente o poço de ataque junto do antigo hospital militar da Estrela junto do jardim da Estrela. Será possível aproveitar o projeto da estação com alterações nos túneis de acesso.

Quanto ao problema dos prejuízos por anulação de contrato, relembro o precedente da obra da sede da PJ em Lisboa, executada pelo empreiteiro que não pôde construir a sede da PJ no Porto, depois da adjudicação.

Reitero que se trata de uma hipótese.




projeto do metro em curso; não divulgados ainda pormenores da estação de Alcantara Terra,  do viaduto sobre o vale de Alcantara, de eventual término junto do Instituto de Agronomia e ligação à linha LRT de Algés/Restelo; indico a preto sugestões para: 1) uma ligação pedonal com tapete rolante entre uma estação Estrela da linha vermelha e a estação Estrela da linha circular junto do jardim, atualmente em construção dos toscos, assinalda com uma circunferencia amarela, 2) uma ligação em viaduto do tipo PRT, personal rapid transit ou podcar, de veículos autónomos em sítio próprio a pedido, entre a estação Alcantara Mar da linha de Cascais, a estação de metro de Alcantara Terra e uma eventual estação Alvito do suburbano da margem sul, em alternativa prolongamento da linha LRT de Algés/Restelo


alternativa 1 à desistência da linha circular: prolongamento da linha amarela através da galeria do término existente do Rato (e não como previsto no projeto do metro em nova galeria ao lado), servindo o bairro da Lapa e o museu de Arte Antiga, até à estação Alcantara Mar da linha de Cascais; aproveitamento do projeto da estação Estrela com alteração de tuneis de acesso aos cais; prolongamento da linha vermelha como precisto no projeto do metro; mesmas sugestões a preto como na figura anterior do projeto em curso, 



alternativa 2 à desistência da linha circular; prolongamento da linha amarela para Alcantara Terra, em vez da linha vermelha; como na alternativa 1, aproveitamento da galeria do término do Rato e do projeto da estação Estrela com pequenas alterações dos tuneis de acesso aos cais; correspondencia entre as duas linhas numa estação na Av.Infante Santo; rolongamento da linha vermelha para a Lapa, museu de Arte Antiga e estação de Alcantara Mar da linha de Cascais; identicas sugestões a preto




terça-feira, 14 de setembro de 2021

O parque urbano da Praça de Espanha em agosto de 2021

Com a devida vénia ao Nascer do Sol refiro a ligação para o excelente artigo de 10 de julho de Elsa Severino sobre o parque, o que se prevê de construções à volta (sede da Jerónimo Martins com 14 andares, sob a rota de aproximação do aeroporto? sede do Montepio, prédios para habitação com 8 andares na avenida dos Combatentes ... ) e as omissões neste investimento da ligação desejada por Ribeiro Teles a Monsanto  e da correta drenagem da Praça de Espanha:

https://sol.sapo.pt/artigo/740296/parque-urbano-na-praca-de-espanha-o-sonho-de-goncalo-ribeiro-telles-

Inaugurado em 13 de junho pelo sr presidente da CML, continuaram as obras, não só as relativas ao átrio sul da estação de metro, como de alguns percursos e edificações.

Para além das omissões referidas e que são graves (falta de ligação a Monsanto e falta de cumprimento do plano de drenagem que previa um depósito de retenção), para além das ameaças das novas construções, cabe referir algumas soluções criticáveis de sentidos de transito e de mudança de direção, e que a passagem pedonal aérea (compatível para uso pedonal e ciclista simultâneo em segurança?) é parte essencial da obra por fazer parte do projeto original.

Algumas imagens datadas de julho e agosto, isto é, depois da inauguração em 13 de junho:

Curso da drenagem, a poente da Praça de Espanha, entre o Teatro A Comuna e as traseiras da av. Columbano Bordalo Pinheiro

percurso pedonal interrompido para conclusão de um café com esplanada


ao fundo as obras do acesso sul da estação de metro; viaduto pedonal sobre a drenagem

outra vista do acesso sul da estação de metro e viaduto pedonal sobre a drenagem, de acesso à estação/lado sul



percurso pedonal entre o parque e av.Gilbenkian e embaixada de Espanha; à esquerda acesso à estação, lado sul



local aproximado do acidente de perfuração do teto da galeria do metro, zona de início da drenagem






receia-se que seja este o novo modelo de assentos



vista do teatro da Comuna


Programa Sociedade civil da RTP2 de 13set2021 sobre sinistralidade rodoviária

Comentário ao programa da Sociedade Civil da RTP2 sobre sinistralidade rodoviária de 13 de setembro de 2021       https://www.rtp.pt/play/p8271/e567194/sociedade-civil 


Caro Luis Castro

Felicito-o pela oportunidade e qualidade das intervenções no programa. Trata-se de verdadeiro serviço público.
No entanto, observo que o valor de 167 dado no programa para o número de vítimas mortais em 2020, refere-se apenas ao primeiro semestre do ano, de janeiro a junho de 2020 conforme o relatório da ANSR de junho de 2021 (em que o número de vítimas mortais no 1º semestre de 2021 foi de 140. Isto é, o número de vítimas mortais em 2020 foi, segundo o relatório da ANSR para 2020, 390  (números pra o continente) .  Dado que estes valores se referem a vítimas a 24 horas haverá que agravá-los cerca de 30% o que dará cerca de 500 vítimas mortais em 2020 e 180 no 1º semestre de 2021.
Embora haja efetivamente uma diminuição, estamos longe dela se fazer com eficiência. Por exemplo, em 2018 o número de vítimas mortais foi superior ao de 2013. 

Segundo o relatório de 2020 da DG MOVE da Comissão Europeia, a posição de Portugal na sinistralidade rodoviária na EU-27 é em 22º lugar com 68 vítimas mortais por ano por milhão de habitantes (média da EU-27, 52) ou 19º lugar com 7,2 vítimas mortais por ano por mil milhões de passageiros-km (média da EU-27,  5,4) .


Estes números revelam que haverá demasiado otimismo na análise feita e a necessidade de campanhas eficazes de redução da sinistralidade, sendo certo que a própria EU necessita de melhorar os seus números. A considerar ainda a gravidade das consequências dos acidentes para os utilizadores vulneráveis (peões e ciclistas - 3 mortes de ciclistas na AML nos últimos 3 meses).


Tal como referido no programa, os principais problemas são a velocidade e o contexto cultural que desvaloriza o risco. Só será possível a visão zero com o cumprimento rigoroso dos limites de velocidade, o que a maioria dos condutores não quer fazer nem deixar que os outros cumpram (exemplo do radar na Av.Marechal Gomes da Costa, sou sistemáticamente ultrapassado por condutores irados quando reduzo para  50 km/h na rampa antecedente.

Faz falta como referido no programa uma campanha de sensibilização nos meios de comunicação social, mas impõe-se que as imagens apresentadas sejam as dos comportamentos positivos (não mostrar condutores a falar ao telemóvel porque subconscientemente conduz à aceitação da ação, nem imagens de acidentes, porque "isso só acontece aos outros e eu sou muito bom condutor").


Junto duas ligações onde o tema da sinistralidade rodoviária é tratado, inclusive com destaque para o ciclismo :




https://fcsseratostenes.blogspot.com/2021/09/nao-senhor-primeiro-ministro-discutir.html  



Com os melhores cumprimentos

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

5 horas de um fim de dia remansoso

 Primeiro, no fim da tarde de um dia calmo de fim de férias, li ao acaso algumas páginas de um livro interessante, "O cérebro em ação" de David Eagleman.

Achei curiosa descrição que o autor, neurocirurgião, fez da luta entre células pela sua sobrevivencia. E que o que poderia ser uma conquista evolucional ser muitas vezes, na realidade, um caminho para apressar o fim.

Sorri interiormente tentando relacionar isso com a ideia que há uns tempos tinha tido que as limitações da teoria marxista, por exemplo a relevância que poderá ser dada à luta de classes em detrimento da cooperação desde que não se violem direitos fundamentais, se deviam ao estado incipiente de muitas disciplinas científicas do tempo de Marx. Ele não era obrigado a saber que na Natureza a luta pela sobrevivencia entre células pode conduzir à morte (embora Sun Tzu e Clausewitz tenham deixado escrito qualquer coisa como ser melhor não empreender algumas lutas) . Vivia-se na época de Marx uma euforia e uma confiança no determinismo que depois as mecânicas quantica e ondulatória se encarregaram de arrefecer. Mais uma razão para não sermos tão isto é preto e quem não concordar é porque acha que é branco (maniqueismo, maniqueismo, porque nos atormentas?).

E continuei a relacionar, agora com as teorias liberais, ou neoliberais, da escola de Chicago, tão do agrado de tantos comentadores da nossa praça e de alguns políticos, com uma fé cega nas virtudes dos mercados livres e das concorrências. Afinal, se forem como as células, a evolução será no sentido da degradação das condições sociais, com o desprezo pelos mais fracos, com a condenação dos seus filhos a ficarem cada vez mais afastados dos melhor colocados. O que será uma aplicação da lei de Fermat-Weber, quanto maior for o poder de atração de um sistema, mais forte ele se tornará relativamente aos sistemas de menor poder atrativo.

Mas achei que já era tempo de ler o jornal do dia, que se aproximava  a hora do jantar e tinha-o deixado de lado, precisamente pelo carater remansoso do dia. Depara-se-me um artigo oportuno de Ricardo Cabral sobre "Os preços da eletricidade: um enquadramento regulatório que acentua falhas de mercado". 

https://www.publico.pt/2021/09/13/opiniao/opiniao/precos-electricidade-enquadramento-regulatorio-acentua-falhas-mercado-1977217

Refere o crescimento dos preços no mercado MIBEL de venda grossista, mais de 150 euros por MWh, o que equivale a 15 centimos por kWh. Ora, em ambiente de regulação ineficiente, se atendermos às rendas e às tarifas de compensação (as famosas FIT, feed in que são o incentivo aos produtores de renováveis subsidiando-os com a diferença entre FIT e o preço grossista que pode resultar dos produtores de não renováveis ),  para os produtores de centrais térmicas para cobrir as intermitencias das renováveis (as intermitencias cobrir-se-iam melhor se  houvesse interligações elétricas de muito alta tensão contínua entre Portugal e França, mas a UE está desatenta) e de incentivo para os produtores de renováveis (tudo associado dá o chamado défice tarifário perto de 3000 milhões de euros), não devemos admirar-nos, embora a causa próxima pareça ser o aumento dos custos do gás natural, a sua escassez internacional em termos de transporte (há uns tempos protestei por se ter desistido do reforço do gasoduto Argélia-Sul de França), as taxas de penalização da emissão  de CO2 (60€/tonCO2) e a "volatilidade" dos futuros nos contratos dos grossistas.

Achei curioso que, como professor do ISEG, o articulista recorde as teorias liberalizantes da escola de Chicago, que como disse é tão do agrado de muitos comentadores, e recordei um interessantissimo livro de um professor de Física da universidade de Stanford, "Energia para o futuro", de Robert Laughlin, que descreve a catástrofe da desregulação na California e da ENRON. Em 2001 o preço grossita subiu de 30 dolares/MWh para 350 dolares/MWh  (3 centimos/kWh para 35 centimos/kWh). 

Para comparação, até agora o preço médio grossista em Portugal foi de 50 euros/MWh (5centimos/kWh) tendo atingido recentemente 152 euros/MWh (15,2 centimos/kWh). Como as faturas de eletricidade contêm várias alíneas de taxas adicionais que elas próprias discriminam, um cidadão pôde pagar até aqui cerca de 14 centimos/kWh pelo consumo de eletricidade, mas incluindo todas as taxas adicionais o preço unitário subiu-lhe para 67 centimos/kWh (670 euros/MWh). 

O tema não era propício ao remanso, mas felizmente chegou a hora de jantar e tive a agradável surpresa de ser presenteado pela RTP2 com o programa comemorativo dos 10 anos da "Musique en fête" na cidade de Orange, perto de Avignon. Uma vistosa e participada mostra de músicas para quase todos os gostos, de ópera a jazz, flamenco e canções de sucesso, no anfiteatro do teatro antigo de Orange, construido no século I pelos romanos. A maior parte delas anteriores a 1980 e aos anos da escola de Chicago,  sem menosprezo pelas mais recentes, mas que seria uma pena se se perdesse o sentido da música anterior aos anos da escola de Chicago, seria.

https://www.rtp.pt/programa/tv/p41162

quinta-feira, 9 de setembro de 2021

RECAPE do lote 3 (viadutos de Campo Grande) da linha circular do metropolitano de Lisboa

 

Comentário enviado em 9 de setembro de 2021 à Agencia do Ambiente, a propósito do RECAPE do lote 3:

https://participa.pt/pt/consulta/recape-metro-lisboa-viadutos-do-campo-grande-lote-3

A minha participação destina-se a deixar expressa a discordância e a reclamação pelo prosseguimento da construção da linha circular, em claro desrespeito pela lei 2/2020 da República. Por esse facto, é uma ação ilegal, cuja natureza o visto do Tribunal de Contas não pode alterar por não poder sobrepor-se a uma lei da AR. Como técnico de transportes, deixei expresso na consulta pública as incorreções do EIA nunca corrigidas, nomeadamente a falácia da comparação do fecho da linha circular com o prolongamento apenas a Campo de Ourique, as falsidades de que o EIA era compatível com o PROTAML 2002 e de que a linha circular permitia maiores frequências do que as 2 linhas equivalentes separadas, a desconsideração dos moradores da linha de Odivelas e de Telheiras relativamente aos da linha de Cascais (a medida correta, aliás expressa no art 282 da lei 2/2020, é o prolongamento até Alcântara Mar em viaduto para correspondência com a linha de Cascais) e a omissão de que a probabilidade de paragem por avaria ou excesso de afluência é superior na linha circular relativamente à das 2 equivalentes (razão pela qual  linha circular de Londres foi convertida em linha em laço). Infelizmente nenhum destes argumentos foi considerado no processo de consulta, tendo o RECAPE  do lote 1 classificado todos com "fora do âmbito" (a minha reclamação é a de que este não é um argumento, é uma recusa de aceitar a participação dos cidadãos).

Relativamente ao lote 3, por maioria de razão  um investimento inútil em termos de expansão da rede, comento os seguintes documentos deste RECAPE:

- projeto de Arquitetura - o prolongamento de 16,5m para nascente dos cais sul constitui uma protuberância desenquadrada do conjunto dos materiais da estação existente, agravada pela necessidade de novos pilares e pela natureza das chapas propostas (págs 17/18) ; a necessidade deste prolongamento resulta dos novos viadutos, dispensáveis como já referido com a agravante de eliminar uma ligação ao PMOII o que reduz a capacidade de reação a perturbações da circulação;  contrariamente ao afirmado, seria mais importante, e corresponderia ao cumprimento de uma obrigação legal, o equipamento da estação com elevadores e IS para pessoas com mobilidade reduzida;  

- anexo 8, pág 97 - discorda-se da conclusão, os novos viadutos são dissonantes e constituem uma agressão visual num contexto que foi pensado de forma completamente distinta; basta considerar o número de novos pilares e a sua robustez necessária para não perturbar os existentes, para termos um contexto saturado de obstáculos visuais (aplicável ao impacto visual contra os moradores da torre vicentina); numa perspetiva metropolitana, e não na de uma linha circular fechada sobre o centro da cidade, os interfaces rodoviários devem ser deslocados para o exterior, pelo que os novos viadutos vêm inviabilizar uma correspondência intermodal com modos menos agressivos, como seja o LRT; 

- projeto de estruturas, pág 83 - pelo que me foi dado entender, e solicito correção se estiver errado, a necessidade de compatibilização com a nova legislação antissísmica refere-se apenas às novas estruturas necessárias à intervenção a nascente da estação e não, como poderá inferir-se, ao maciço e pórticos de estabilização dos tabuleiros com recurso a cabos esticadores que acompanham os tabuleiros, situado a nascente da intervenção ( este maciço resultou da correção do projeto inicial e foi executado antes de 1993).

lado nascente da estação, situação atual

maciço e pórticos de reforço estrutural de correção, antes da inauguração em 1993, do projeto original; notar os cabos de reforço ao lado dos tabuleiros




acrescento para a ampliação dos cais sul para nascente: alçado sul e alçado norte; patente a dissonância com o existente (tipos de pilares, de vãos e de recobrimento)

chapas metálicas de cobre/alumínio que recobrirão a ampliação dos cais sul
vista do lado nascente da ampliação dos cais sul




esboço da ampliação de 16,5m dos cais sul






informação adicional sobre a obra do lote 3:

sugestões para a acessibilidade para pessoas de mobilidade reduzida:


PS em 10set2021 :

1 - Tendo o sr presidente da CML afirmado no debate com Carlos Moedas que o PDM de 2012 incluia a linha circular  , transcrevo do art.81.3/UOPG 9 do referido PDM de 30 de agosto de 2012, que não refere a linha circular, antes a expansão a Alcâtara:


2) Objetivos/Termos de referência 

… … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … … 

e) Marcar uma nova centralidade urbana em Alcântara, com a potenciação de novas ligações ferroviárias, a extensão da rede do metropolitano e a qualificação e criação de novos corredores de transporte público; 

 

Observo ainda que o PAMUS de fevereiro de 2016 não referia nenhuma linha circular. Esta fazia parte de um plano que incluia a expansão a Sacavem, Loures, Hospital F.Fonseca e Alcantara, elaborado em 2009 durante a campanha autárquica, sem a participação dos técnicos de operação e de manutenção do metropolitano, que foi efetivamente aprovado em assembleia intermunicipal, mas sem definir a prioridade das propostas. 

Conviria esclarecer se estão incorretas as minhas referencias ao PDM e ao PAMUS ou se o sr presidente endogenizou, de tanto acreditar nelas, coisas que não aconteceram.

 

Mais informação sobre o PROTAML , o PAMUS e o PDML:

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/04/sobre-insistencia-do-senhor-ministro-do.html

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2019/09/ainda-o-protaml2002-e-linha-circular-do.html

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/02/a-circular-da-nossa-discordia.html

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/04/ainda-os-sump-aos-2-de-abril-de-2020.html

http://www.cm-oeiras.pt/pt/viver/mobilidade/PublishingImages/Paginas/portugal2020_pamus/PAMUS_AMLvers%C3%A3o-final-Vol-I-Relat%C3%B3rio.pdf


2 - Número aproximado de novos pilares dos novos viadutos consistindo em obstrução visual:  15 + 6 ;
número de novos aparelhos de dilatação na via férrea, requerendo atenção da manutenção:  12

quarta-feira, 8 de setembro de 2021

O PIB cresceu no 2º trimestre de 2021, 15,5% de variação homóloga, mas ...

 O partido no governo embandeirou em arco, o PIB cresceu 15,5% no 2º trimestre de 2021 relativamente ao 2º trimestre de 2020.

Mas, segundo o INE

https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=472472977&DESTAQUESmodo=2

o país continua a exportar menos do que a importar. E assim continua dependente do exterior mais do que o admissível, não é sustentável, obriga a empréstimos e doações:

Exportações, importações e saldos nos últimos 12 meses em milhões de euros:

exportações  de bens         59948          importações  de bens  71128         saldo de bens      -11180

exportações de serviços     18386         importações serviços  12500        saldo serviços         5886

                                                                                   SALDO TOTAL                                  - 5294



Gráficos retirados de  https://www.publico.pt/2021/09/06/economia/opiniao/principio-fim-milagre-economico-portugues-1976383






terça-feira, 7 de setembro de 2021

A propósito da conferência Velo City, num país em que os indicadores de sinistralidade rodoviária são piores do que a média da EU-27

 Na véspera da inauguração da conferência, um artigo do Público titulava "Ter mais mulheres a pedalar é um sinal de que as ruas são seguras":


Penso que o correto seria dizer que é um sinal da perceção que as ruas são seguras, sendo certo que é muito fácil haver uma grande divergência entre um risco real e a perceção que se tem dele.

A imagem seguinte é um clássico que ilustra essa possível divergência, assinalando-se riscos reais inferiores e superiores aos que são percecionados:

Graças ao crescimento do movimento pelo ciclismo nas cidades, apoiado nas preocupações de vida saudável e luta contra as alterações climáticas, a perceção dos riscos de andar de bicicleta será a de que a sua prática estará cada vez mais segura, apesar das recentes mortes de 2 ciclistas jovens, atropeladas por automóveis.
O nível real dos riscos, porém, não é possível estabelecer com segurança porque os dados reais da sinistralidade com bicicletas não são disponibilizados de modo a poder ter-se confiança neles. 

De facto, não tem sido divulgado qualquer relatório que sustente a afirmação de que as ruas são seguras para os utilizadores mais vulneráveis, peões e ciclistas. Em termos de engenharia de transportes, o indicador de risco é o número de fatalidades por mil milhões de passageiros-km por ano (total em km das viagens por cada modo de deslocação), e não parece haver elementos para o calcular no caso de Lisboa, nem sequer o número de intervenções de ortopedia nos hospitais por motivo de acidente.

Nos relatórios da ANSR não são explicitadas as vítimas mortais e os feridos graves em acidentes discriminados com bicicletas, com ciclomotores e com meios de locomoção com motor auxiliar. 

Do relatório da ANSR de junho de 2021 apenas se retira que o número de acidentes envolvendo velocípedes no 1º semestre de 2021 cresceu 33% relativamente ao mesmo período de 2020, sem informar quanto cresceu o respetivo tráfego em km de viagens. 

Do relatório de 2018, mais completo, retira-se 24 ciclistas como vítimas mortais a 30 dias no Continente (infelizmente, as mortes em acidentes são superiores às contabilizadas no local e no transporte para o hospital). Considerando a população da AML, 2,8 milhões, que realizam por dia cerca de 5 milhões de deslocações em veículos e admitindo por ano 5 mortes na AML e que 2,5% do total de deslocações é feita em bicicleta com percurso médio de 15 km   estimo 9 mortes de ciclista por mil milhões de pass-km. Este valor é superior ao das mortes em automóvel (3 por mil milhões) e inferior em motos e motociclos (50 por mil milhões!) e contraria a falsa sensação de segurança que o artigo pretende passar (embora, efetivamente, aumentando o percurso médio e o número de utilizadores o indicador de risco melhor se, e só se, o número de acidentes não aumentar).

No relatório do inquérito  à mobilidade IMOB 2017 os valores para as deslocações em bicicleta foram: 0,7% do total de deslocações com percurso médio de 8,9km, admitindo-se entretanto um crescimento acentuado. 

Segundo o relatório de 2020 da DG MOVE da Comissão Europeia, a posição de Portugal na sinistralidade rodoviária na EU-27 é em 22º lugar com 68 vítimas mortais por ano por milhão de habitantes (média da EU-27, 52) ou 19º lugar com 7,2 vítimas mortais por ano por mil milhões de passageiros-km (média da EU-27,  5,4) .

Estes números revelam a gravidade das consequências dos acidentes para os utilizadores vulneráveis (peões e ciclistas) e a necessidade de campanhas eficazes de redução da sinistralidade, sendo certo que a própria EU necessita de melhorar os seus números. Embora a ANSR tenha campanhas em curso, duvida-se da sua eficácia, provavelmente por carência orçamental. 

Ainda segundo esse relatório (os números são ligeiramente diferentes dos da ANSR devido ao critério de registo das vítimas mortais a 24h ou a 30 dias (este mais realista) em 2018 das 700 vítimas mortais 163 foram peões.  Dos 537 restantes, 238 foram condutores ou passageiros de automóveis ligeiros e pesados, 112 de motos (é enorme o risco dos utilizadores de motos), 42 de ciclomotores (ignoro se inclui os utilizadores de trotinetas, bicicletas elétricas e vários com motor auxiliar) e 26 ciclistas.

Notar que os valores da sinistralidade em motos é catastrófico e em automóveis inaceitável.

Isto é, para proteger todos, é urgente fazer cumprir o Código da Estrada, nomeadamente os limites de velocidade, rever os pontos negros das estradas, manter uma estatística rigorosa de sinistralidade por modo e promover inquéritos exaustivos às circunstancias e causas dos acidentes e divulgação dos resultados e recomendações.

No caso das bicicletas, seria conveniente rever o Código da Estrada repondo a obrigatoriedade de utilização do capacete de segurança sempre que exista um motor auxiliar (revertendo a revogação do nº5 do art.82 e acrescentando no nº3 do art.112 "exceto quando expresso em contrário"), impor a utilização da campainha e explicitar a equiparação dos velocípedes aos veículos automóveis para efeito de cumprimento das regras de transito (cumprimento das indicações dos semáforos, não utilização montados dos passeios e das passadeiras de peões).

Pela gravidade dos recentes acidentes com a morte de duas ciclistas, conviria divulgar as circunstancias em que ocorreram.
No caso do acidente na avenida da Índia, parece que a causa do atropelamento terá sido o encadeamento pelo sol da manhã. Poderá concluir-se que, pelas caraterísticas da avenida, o tráfego de ciclistas deverá ser segregado, preferentemente desnivelado e com elementos de proteção da ciclovia ou criado um desvio para esta. Igualmente deveriam instalar-se sensores de velocidade (radares) comandando semáforos de retenção por excesso de velocidade.
No caso do atropelamento na estrada do Livramento, no Estoril, se as imagens do Google Earth estão atualizadas, e assim parece cotejando-as com as imagens transmitidas pela comunicação social, não existe uma ciclovia no local, mas sim uma passagem pedonal longitudinal num troço de estrada com 4,7 m de largura, sendo 1,7 m para a passagem pedonal e 3 m para a via de rodagem. O comprimento do troço em via única é de 140 m, tem limitação de velocidade de 30 km/h e comando por semáforos para passagem alternada. Este troço é especialmente perigoso para os ciclistas, mas toda a estrada do Livramento o é, com duas vias de 3 a 3,5 m  e bermas reduzidas. O inquérito ao acidente deveria esclarecer a velocidade a que o carro causador seguia, como e porque se despistou, como estavam os semáforos, e se a senhora poderia ter-se salvo se usasse capacete de segurança, se seguia na passagem pedonal ou na via de rodagem. Caso não haja disponibilidade para a expropriação para o alargamento ou criação de um desvio para duplicar a via, sugere-se a substituição da passagem pedonal por passeio sobreelevado com proteções antidespiste e instalação de radares de excesso de velocidade.

Local do acidente, sobre a passadeira, vista de S para N

local do acidente, sentido N-S

Aproximação do troço de via única pelo lado S

aproximação pelo lado N



PS - segundo informação de um dos intervenientes no programa Sociedade Civil dedicado à sinistralidade rodoviária em 13set2021 na RTP2, em situações semelhantes em Espanha (via sem desníveis entre a passagem pedonal e a via de rodagem, o limite de velocidade é de 20 km/h e não de 30 km/h como aqui. Não basta porém baixar o limite, impõe-se a ensibilização através de campanhas e a fiscalização rigorisa e consequente penalização.