segunda-feira, 19 de abril de 2010

PARE, ESCUTE, OLHE - Um documentário de Jorge Pelicano

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Eu pedia-vos para irem ver este documentário sobre a linha do Tua.
É verdade que defende abertamente a não construção da barragem e isso pode não ser simpático para muitos cidadãos, os quais poderão não apreciar o trabalho de engenheiros do século XIX, apesar de ser uma vergonha perder-se o património de arqueologia e o potencial turístico.
O próprio documentário mostra exemplos na Suíça de caminhos de ferro de via estreita.
Está muito bem feito e é muito bonito.
Aproveitem, vão ao novo cinema de bairro, o City Alvalade, ao lado da estação de metro de Alvalade, e revitalizem a vida de bairro em Lisboa.
É o problema de Lisboa, a desertificação. Perdeu 34% de habitantes nos últimos 30 anos.
Tal como o distrito de Bragança perdeu 34% da população nos últimos 30 anos.

Não é preciso ser sociólogo para perceber que a estratégia (ou a sua ausência) falhou, em Lisboa e em Bragança (em 1992 fechou-se a linha entre Mirandela e Bragança com o pretexto de que as ligações rodoviárias seriam suficientes e comprou-se material circulante ligeiro usado na Bósnia, cuja bitola teve de ser adaptada, para funcionar no troço restante: Mirandela-Tua). É sempre possível o abandono, a degradação. Em 1936 a viagem do Tua a Bragança (133 km) demorava 4 horas; em 1990 demorava 4 horas e meia.
Deste ponto de vista podíamos tentar abordar o problema.
Outro ponto de vista podia ser o de alguns habitantes entrevistados: que façam a barragem, mas cheguem-na para lá para ser compatibilizada com a linha, que até podia ser em túnel, como um dos habitantes explica.

Pela voz dos simples, como diz o aforismo, é apontada a estratégia correta: compatibilizar a barragem com a linha (claro, não pode chegar à cota 185, enquanto o rio está à cota100; teremos de nos contentar com menos energia produzida;  porém, se se utilizar conduta em carga até à cota 90 para evitar um muro tão alto e completarem a barragem com uma instalação eólica para bombar para a albufeira, minimizam-se as perdas), eventualmente com sacrifício da parte mais baixa, dos primeiros 5 km, até à cota 160. Que é o que diz a declaração de impacto ambiental, tirando a cota que fixa em 170 m, a qual inunda os primeiros 16 km da linha : autorização de construção da barragem condicionada ao estudo de uma alternativa à linha.

E aqui bate o ponto.
Eu andei na mesma escola em que andaram os senhores projetistas importantes da empresa importante que está autorizada a construir a barragem. E lembro-me como os colegas destinados a ter muito sucesso na sua vida profissional já faziam os projetos. Otimizando o tempo gasto com eles, porque tempo é dinheiro (nesse tempo, despachar um projeto permitia fazer outro para rapidamente se ter boa nota).
E estudar uma alternativa que salve a maior parte da linha, que permita a conservação de alguns troços, que construa túneis ou funiculares de cremalheira (há povoações à cota 300 e 400) para fugir às águas, custa muito tempo.
É mais fácil assinar uma declaração em como não é técnica-económicamente razoável construir alternativas…
E eu direi que poderá não ser economicamente razoável, mas que há soluções técnicas. Até para Abu Simbel houve. E há coisas que não têm preço. Como diz um político no filme, não pode haver só o critério económico (eu sei, há dificuldades financeiras).
Mas se não quiserem maçar-se com análises, apreciem no filme a performance artística de um antigo funcionário da CP (julgo que trabalhador da manutenção de via, que me lembro dele numa entrevista na televisão a seguir ao último acidente, a dizer que não compreendia como se deixava chegar a linha férrea a tamanha degradação, reduzindo como reduziram o quadro do pessoal afeto a essa manutenção – critérios de gestão da manutenção que tão bem conhecemos todos).
São exemplos de cinema de muito alto nível os diálogos dele com a mulher (a culpa é tua por não ter ido para o Brasil), com a jovem emigrante de férias em Ribeirinha (o teu irmão mais velho onde está? Está em França. E o teu irmão mais novo? Em França está), com um conterrâneo a descrever a queda do fogueteiro na festa de S.Lourenço (a velhota, que era nova, disse-lhe que devia ir agradecer ao santo que o salvou de uma queda de um telhado, ao fogueteiro - o que deitava os foguetes – e o fogueteiro disse: eu? Ao santo? que por causa desse f… é que eu rebolei pelo telhado e me ia partindo todo?)
Vá, vejam o filme e, como cidadãos, exijam alternativas técnicas para salvar a linha do Tua. Os turistas deixam cá divisas, vá.

http://www.youtube.com/watch?v=RX9u7AtjLxU&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=CbnR9EKqUBI&feature=related


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