Caros Colegas
Muito obrigado pelas informações que me enviaram. Destaco
ainda a qualidade do trabalho do Carlos Cipriano e da imprensa, nomeadamente do
Correio do Ribatejo, que permitem ter alguma noção do que se passou.
A minha vida profissional decorreu no metropolitano de Lisboa
onde pratiquei alguma análise de riscos e não quero usurpar qualquer competencia aos
colegas profissionalmente mais ligados que eu ao caminho de ferro interurbano.
Mas a gravidade da situação leva-me a escrever alguma coisa.
Exprimo as condolências aos familiares do motorista morto no
acidente em trabalho e votos de recuperação dos feridos.
Refiro a correção do relatório do GPIAAF do acidente de 2016
na mesma passagem de nível do Peso (embora no sentido nascente - poente,
enquanto o acidente de 22 de abril foi de poente – nascente) e lamento não ter
sido andamento às recomendações.
Consultando o Google Earth, verifica-se que no sentido
sul-norte a passagem rodoviária inferior mais próxima encontra-se a 2 km de
distancia (passagem limitada a 3,5 m de altura e 2,8 m de largura) e a passagem
de nível mais próxima encontra.se na estação de Santarem, a 4,7 km . Estes dois
locais exigem uma grande volta por Santarem ou o prolongamento de 2 km da
estrada que atravessa a passagem de nível do Peso. Existe ligação alcatroada à aldeia de
Caneiras, uma aldeia junto do rio Tejo (esta também servida pela estrada que
atravessa a PN do Peso).
No sentido norte-sul existe uma passagem inferior junto da
ponte de Asseca, a 1,4 km da PN do Peso, mas são caminhos rurais que teriam de
ser adaptados para tráfego de camiões. A passagem de nível mais próxima
encontra-se a sul da estação Vale de Santarem, a cerca de 3,6 km da PN do Peso.
Mas não servem estradas que liguem a Caneiras.
Igualmente não há ligação da A13 (a autoestrada que passa
sobre a via férrea a 150 m da PN do Peso e que segue pela ponte Salgueiro Maia)
à zona de Caneiras.
Isto é, não há alternativa económica à PN do Peso, embora
sejam visíveis as intervenções rodoviárias onerosas a poente da via férrea,
contrastando com a penúria rural da zona a nascente da via férrea.
Admitindo
que a distancia de visibilidade é de cerca de 550 m (apesar de ser uma curva de
elevado raio, existe vegetação muito crescida junto das vias ), para uma
velocidade de 140 km/h e uma desaceleração de 0,8 m/s2 considerando o tempo de
reação, o choque terá ocorrido a cerca de 75 km/h, tendo o Alfa embatido na
zona do depósito de combustível, como se pode ver na foto do Publico, e
seccionado a ligação do trator Scania ao reboque, que rodou cerca de 180º.
Isto é, para esta velocidade, um pequeno atraso na travessia
da PN pode mesmo gerar um acidente. E em caso de avaria ou, como parece ter
acontecido, o reboque não se ter inserido na curva apertada e parado, o aumento
da temporização não resolveria . Se um
detetor de presença de obstáculo ainda no canal ferroviário emitisse uma ordem
de travagem automática, o comboio teria de estar a mais de 1000 metros para uma
desaceleração de 0,8 m/s2 (infelizmente,
esse dispositivo teria por efeito o abuso de provocar intencionalmente a
paragem dos comboios).
Vendo a passagem de nível do Peso em planta, verifica-se que
as curvas são demasiado apertadas, dificultando a manobra de camiões numa zona
de grande atividade agrícola.
Isto é, também por isso, a solução parece ser a de eliminar
a passagem de nível, ou por construção de passagens desniveladas ou por
construção de estradas de acesso a passagens desniveladas (por exemplo
aproveitando a da ponte de Asseca). Nesta zona, numa extensão de 7 km, PN a
eliminar: Vale de Santarem, Peso e Santarem.
Donde, tudo indica que o relatório do GPIAAF estava correto
(apesar da evidente carência de meios que levou à demora na publicação) e nem a
IP nem a Câmara de Dantarem resolveram o assunto.
É lamentável a justificação da IP, que fez o que estava
dentro das suas competencias.
Não devia haver compartimentos estanques. Um acidente mortal
numa passagem de nível diz-nos respeito a todos, ferroviários. Uma das
bandeiras do transporte ferrovia´rio é a segurança, e esta morte conta para o indicador fatalidades por 1000 milhões de passageiros-km,
que em Portugal se aproxima intoleravelmente do indicador do transporte rodoviário.
Dir-se-á que somos um país pobre, que nos países mais ricos também
há acidentes nas passagens de nível (eu sei, também acompanho isso), mas neste
caso não basta a justificação da IP, que está previsto no Ferrovia 2020 (previsto mas não concursado segundo o artigo
de Carlos Cipriano, e muito provavelmente sem o projeto necessário para
submissão a fundos comunitários. Com a agravante da associação da ferrovia com
as estradas não parecer terminar com a preferência pela rodovia, e haver
dificuldade em aceitar que deve haver um orçamento para a
manutenção/modernização (correção das deficiências
do troço de Santarem, incluindo a separação física com vedações segregando a
via férrea) e outro orçamento, independente, para linha nova (duvido que seja a
melhor solução o previsto no PNI2030 de 160 km de by passes na linha do norte,
incluindo o de Santarem, em vez de toda a linha nova, mesmo que de construção
faseada).
Peço desculpa pelos desabafos.
Saudações e votos de saúde
Sem comentários:
Enviar um comentário