sexta-feira, 24 de abril de 2020

O acidente do Alfa em Vale de Santarem na passagem de nivel de Peso em 22abr2020






Caros Colegas

Muito obrigado pelas informações que me enviaram. Destaco ainda a qualidade do trabalho do Carlos Cipriano e da imprensa, nomeadamente do Correio do Ribatejo, que permitem ter alguma noção do que se passou.
A minha vida profissional decorreu no metropolitano de Lisboa onde pratiquei alguma análise de riscos  e não quero usurpar qualquer competencia aos colegas profissionalmente mais ligados que eu ao caminho de ferro interurbano. Mas a gravidade da situação leva-me a escrever alguma coisa.
Exprimo as condolências aos familiares do motorista morto no acidente em trabalho e votos de recuperação dos feridos.
Refiro a correção do relatório do GPIAAF do acidente de 2016 na mesma passagem de nível do Peso (embora no sentido nascente - poente, enquanto o acidente de 22 de abril foi de poente – nascente) e lamento não ter sido andamento às recomendações.
Consultando o Google Earth, verifica-se que no sentido sul-norte a passagem rodoviária inferior mais próxima encontra-se a 2 km de distancia (passagem limitada a 3,5 m de altura e 2,8 m de largura) e a passagem de nível mais próxima encontra.se na estação de Santarem, a 4,7 km . Estes dois locais exigem uma grande volta por Santarem ou o prolongamento de 2 km da estrada que atravessa a passagem de nível do Peso.  Existe ligação alcatroada à aldeia de Caneiras, uma aldeia junto do rio Tejo (esta também servida pela estrada que atravessa a PN do Peso).
No sentido norte-sul existe uma passagem inferior junto da ponte de Asseca, a 1,4 km da PN do Peso, mas são caminhos rurais que teriam de ser adaptados para tráfego de camiões. A passagem de nível mais próxima encontra-se a sul da estação Vale de Santarem, a cerca de 3,6 km da PN do Peso. Mas não servem estradas que liguem a Caneiras.
Igualmente não há ligação da A13 (a autoestrada que passa sobre a via férrea a 150 m da PN do Peso e que segue pela ponte Salgueiro Maia) à zona de Caneiras.
Isto é, não há alternativa económica à PN do Peso, embora sejam visíveis as intervenções rodoviárias onerosas a poente da via férrea, contrastando com a penúria rural da zona a nascente da via férrea.
Admitindo que a distancia de visibilidade é de cerca de 550 m (apesar de ser uma curva de elevado raio, existe vegetação muito crescida junto das vias ), para uma velocidade de 140 km/h e uma desaceleração de 0,8 m/s2 considerando o tempo de reação, o choque terá ocorrido a cerca de 75 km/h, tendo o Alfa embatido na zona do depósito de combustível, como se pode ver na foto do Publico, e seccionado a ligação do trator Scania ao reboque, que rodou cerca de 180º.
Isto é, para esta velocidade, um pequeno atraso na travessia da PN pode mesmo gerar um acidente. E em caso de avaria ou, como parece ter acontecido, o reboque não se ter inserido na curva apertada e parado, o aumento da temporização não resolveria .   Se um detetor de presença de obstáculo ainda no canal ferroviário emitisse uma ordem de travagem automática, o comboio teria de estar a mais de 1000 metros para uma desaceleração de 0,8 m/s2  (infelizmente, esse dispositivo teria por efeito o abuso de provocar intencionalmente a paragem dos comboios).
Vendo a passagem de nível do Peso em planta, verifica-se que as curvas são demasiado apertadas, dificultando a manobra de camiões numa zona de grande atividade agrícola.
Isto é, também por isso, a solução parece ser a de eliminar a passagem de nível, ou por construção de passagens desniveladas ou por construção de estradas de acesso a passagens desniveladas (por exemplo aproveitando a da ponte de Asseca). Nesta zona, numa extensão de 7 km, PN a eliminar: Vale de Santarem, Peso e Santarem.
Donde, tudo indica que o relatório do GPIAAF estava correto (apesar da evidente carência de meios que levou à demora na publicação) e nem a IP nem a Câmara de Dantarem resolveram o assunto.
É lamentável a justificação da IP, que fez o que estava dentro das suas competencias.
Não devia haver compartimentos estanques. Um acidente mortal numa passagem de nível diz-nos respeito a todos, ferroviários. Uma das bandeiras do transporte ferrovia´rio é a segurança,  e esta morte conta para o indicador  fatalidades por 1000 milhões de passageiros-km, que em Portugal se aproxima intoleravelmente do indicador do transporte rodoviário.
Dir-se-á que somos um país pobre, que nos países mais ricos também há acidentes nas passagens de nível (eu sei, também acompanho isso), mas neste caso não basta a justificação da IP, que está previsto no Ferrovia 2020  (previsto mas não concursado segundo o artigo de Carlos Cipriano, e muito provavelmente sem o projeto necessário para submissão a fundos comunitários. Com a agravante da associação da ferrovia com as estradas não parecer terminar com a preferência pela rodovia, e haver dificuldade em aceitar que deve haver um orçamento para a manutenção/modernização  (correção das deficiências do troço de Santarem, incluindo a separação física com vedações segregando a via férrea) e outro orçamento, independente, para linha nova (duvido que seja a melhor solução o previsto no PNI2030 de 160 km de by passes na linha do norte, incluindo o de Santarem, em vez de toda a linha nova, mesmo que de construção faseada).
Peço desculpa pelos desabafos.
Saudações e votos de saúde






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