terça-feira, 11 de maio de 2021

Mensagem enviada ao presidente da câmara de Loures a propósito da consulta pública do planalto da Caldeira e da ligação de Loures à rede de metro

Exmo Senhor Presidente

Exmos membros do corpo técnico

 

Assunto: Ligação de Loures à rede do metropolitano de Lisboa

 

Sobre este assunto tive oportunidade de vos enviar em maio de 2020 um pequeno estudo em que analisei várias hipóteses de ligação do vosso município à rede do metropolitano de Lisboa.

Fi-lo na qualidade de antigo técnico do metropolitano, onde desempenhei funções na coordenação das colocações em serviço das novas extensões e na preparação dos processos de licenciamento. O objetivo daquele contacto foi assim o de transmitir um parecer sobre as hipóteses de expansão da rede com base em experiência efetiva, numa altura em que o processo de construção da linha circular prosseguia, não obstante o claro mandado da AR que, através da lei 2/2020, determinou a sua suspensão e o desenvolvimento de um plano de mobilidade para a Área Metropolitana de Lisboa.

Este tipo de contactos encontra-se justificado pelos artigos 37º e 48º da Constituição, que garantem o direito de expressão, de participação e de informação sobre a gestão de assuntos públicos, como é a mobilidade.

Sem que o referido plano de mobilidade para a AML tivesse sido debatido no espírito daqueles artigos da Constituição, seguiu-se a assinatura do protocolo das câmaras de Lisboa, Loures e Oeiras e definido o traçado de uma rede LRT, abrangendo o vosso município.

O desenvolvimento de um plano de mobilidade é normalmente, embora não seja obrigatório, objeto de um concurso público internacional limitado a gabinetes de engenharia de transportes com reconhecida experiência. Naturalmente que é possível esse desenvolvimento ser assegurado pelo departamento de uma empresa pública de transportes, como o metropolitano, ou ser requerido o apoio de universidades, como se pratica no Porto, mas é patente que, dadas as relações de poder hierárquico de facto, não fica garantida a independência das propostas técnicas, comprometendo-se assim um dos critérios básicos da qualidade, essa mesma independência.

Tendo o vosso município procedido, de forma correta, à consulta pública sobre as unidades de execução do planalto da caldeira, intimamente relacionada com o tema em apreço, verifiquei que, por lapso meu, deixei passar o prazo limite.

 Não obstante essa falta, a importância do tema leva-me a apresentar-vos as sugestões e os pareceres seguintes.

1 – A posição estratégica do município de Loures nas acessibilidades a Lisboa implica que qualquer plano de mobilidade deverá considerar na sua travessia um corredor ferroviário pesado. Recordando um estudo recente do prof.Viegas, direi que, pelo menos a longo prazo, está indicada a ligação da linha do oeste a Lisboa através desse corredor. Uma das hipóteses poderá ser o prolongamento da linha amarela do metropolitano de Odivelas ao Hospital Beatriz Angelo, para futura expansão à Malveira, prevendo-se desde já no HBA um parque de estacionamento dissuasor para os utilizadores de transporte individual (TI) da região oeste. A utilidade deste parque dissuasor será valorizada se entretanto, perante a inflexibilidade do governo de prosseguir na construção da linha circular, se conseguir que prescinda da construção de novos viadutos no Campo Grande, viabilizando a futura ligação direta do HBA ao centro de Lisboa.

2 – Dada a orografia da zona, sugere-se considerar um traçado em planta para o metro pesado idêntico ao do estudo preliminar para o LRT. As mesmas áreas (Ramada, Bons Dias, Bela Vista, Área comercial) poderão ser servidas com acessos às estações mais no sentido horizontal do que vertical, e minimizando os gradientes da via devido à construção em subterrâneo. Sugere-se considerar utilizar para o traçado, quando possível, a proximidade das margens da ribeira da Póvoa, libertando troços da estrada N8.

3 – Relativamente ao traçado preliminar LRT entre o Infantado e a estação de metro de Odivelas, sugere-se que ele seja projetado de modo a facilitar uma futura integração na linha circular externa de LRT prevista no PROTAML  de 2002 (ainda não substituído), Algés-Loures-Sacavém.

4 – O argumento de que uma linha de LRT é mais barata do que de metro subterrâneo (estimativa de 20 a 30 milhões de euros por km contra 60 a 80 milhões por km), deve ser cotejado, numa análise de custos benefícios (teoricamente obrigatória para cofinanciamento comunitário) que tenha em atenção uma zona em que devido aos processos urbanísticos predomina o transporte individual e em que as vias de comunicação não são largas e a convivência do LRT com o TI será sempre difícil, com as vantagens da linha de metro:

4.1 – maior velocidade comercial por inexistência de constrangimentos de transito, e consequente poupança de tempo para os passageiros

4.2 – maior economia de energia atendendo a que os gradientes são menores graças ao percurso subterrâneo (4% contra 7-8% do percurso LRT à superfície, admitindo-se uma extensão significativa de túnel sob o IC22 no traçado previsto para o LRT HBA-est.Odivelas)

4.3 – maior fluidez de transito à superfície e disponibilidade do espaço para ciclovias e percursos pedonais, e maior atratividade pela rapidez e possibilidade de taxação/portagens do transito automóvel por existência de alternativa

5 – Considerando um percurso tipo composto por 3 troços:

5.1 - casa-estação de comboio

5.2 - percurso de comboio

5.3 - estação de comboio-emprego,

verifica-se que não é suficiente um bom traçado de comboio para substituir o TI. Admitindo que a “first mile” corresponda predominantemente ao TI, a “last mile” necessita de ser dotada de modos complementares, que por razões económicas deverão ser automatizados e “self-service”, sem prejuízo, por razões de segurança, de monitorização por sala de controle central guarnecida.

Nestas condições, em conformidade e complementaridade com a nona linha de ação do ponto 4 dos Termos de Referência da consulta pública, será conveniente prever nas estações ou paragens o serviço das faixas adjacentes aos traçados previstos, da ordem de 2 km, por modos complementares como:

- cabinas autónomas (autonomous shuttles) de guiamento por GNSS (global navigation satellite system) e requisitáveis “a pedido”, em pistas tipo ciclovia com 4m de largura (veículos de 1,6m de largura e 3,5m de comprimento) de utilização preferencial pelas cabinas e bicicletas; tecnologia mais simples, por cabo embebido no pavimento e ligação por indução eletromagnética ao veículo

- frotas partilháveis “renting” de duas rodas e de automóveis elétricos em parques junto das estações

- para distancias superiores a 2 km, os modos clássicos (autocarros, miniautocarros, táxis)

Em anexo mostra-se um exercício de aplicação na ligação entre o Hospital Beatriz Angelo, a uma cota de 108m, e a área comercial do Infantado à cota 13m, com recurso à técnica do funicular ou elevador inclinado de duas pistas independentes (com utilização “a pedido” semelhante à dos elevadores num percurso de 940m seguido de uma pista dupla para cabinas autónomas de cerca de 2000m, ou de teleférico, num percurso de 1830m seguido de uma pista dupla de cabinas de 540m

6 – Relacionamento com o corpo técnico do Metropolitano de Lisboa – Nos Termos de Referência da consulta pública está patente o vosso compromisso com a correta organização do território na zona em apreço, incluindo, conforme o ponto 3, o diagnóstico das fragilidades dos transportes (predomínio do TI) e da fixação de polos geradores de emprego (atividades primária, secundária e terciária). Consequentemente, no ponto 4.2.3.3 refere-se o estudo de viabilidade do Metropolitano de Lisboa mas infere-se da sua leitura que não é clara a participação do departamento técnico do vosso município duma forma interativa com o metro no estudo e debate de soluções de mobilidade. Por maioria de razão, considerando o direito constitucional de participação e informação para qualquer cidadão, será desejável melhorar o relacionamento entre técnicos município-metro, sem prejuízo do acompanhamento pela AML e da contínua informação aos cidadãos do avanço dos anteprojetos e projetos.

7 – Relativamente à zona de Sacavém e ao proposto traçado LRT Moscavide-Portela-Sacavém-Parque das Nações, observo que, sendo mais fácil a construção do traçado, dadas as caraterísticas das vias urbanas mais recentes, ainda assim se mantem a conflitualidade com o transito rodoviário. Em alternativa poderia pensar-se no prolongamento da linha vermelha do metro como ramal, uma vez que já existe uma bifurcação a poente da estação Moscavide. Isso tem o inconveniente de reduzir a fiabilidade da ligação à estação Aeroporto (risco de perturbação por avaria dos aparelhos de mudança de via) embora o problema pudesse ser ultrapassado, se bem que com elevados custos, através da desconexão  das linhas (eventual prolongamento do troço do Aeroporto para a margem sul).

8 – Uso futuro das margens e foz do Trancão e margem do Tejo na Bobadela - Julgo ainda que deverá ter-se em atenção que a zona da foz do Trancão, onde se fará a correspondência com a linha da CP, está a ser pensada como hipótese para amarração da terceira travessia do Tejo, em túnel ou em ponte, com eventual seguimento pelo vale do Trancão. Será assunto a debater com o CSOP, a AML e, dadas as competências constitucionalmente estabelecidas para o ordenamento do território e do urbanismo, com a AR.

 

Com os melhores cumprimentos, ao dispor para eventuais esclarecimentos

 

Fernando Santos e Silva

BI 1453978

 

 

 

Em anexo:

ANEXO  I  -  Exercício para ligação entre os itinerários  Estação de Odivelas - HBA e  

                     Infantado

ANEXO  II  -  Ligações para antecedentes e informação complementar sobre                                              

                    “autonomous shuttles”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

     

               ANEXO  I  -  Exercício para ligação entre os itinerários

                                     Estação de Odivelas - HBA e Infantado

 



 

 

ANEXO  II  -  Ligações para antecedentes e informação complementar sobre     

                                                “autonomous shuttles”

 

Antecedentes

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/05/sugestoes-para-expansao-do.html

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/10/mais-um-protocolo-das-camaras-de-loures.html

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2021/02/consulta-publica-do-recape-da.html

 

“Autonomous shuttles” “a pedido”:

https://roboticsandautomationnews.com/2020/10/15/top-25-autonomous-shuttle-manufacturers/37291/

https://1drv.ms/p/s!Al9_rthOlbwerSSgD3CMjYs4nz1I    (diapositivos 11 a 16)

  

 


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