quarta-feira, 30 de março de 2016

Um jogo de palavras sobre a extensão da ignorância

As palavras, só por si próprias, enquanto instrumento do cérebro humano, precisamente porque este é uma fonte de enganos (porque não consegue processar toda a informação, tem de inventar para suprir o que lhe falta), constroem uma imagem da realidade que pode estar muito longe dela. Segue-se a análise dessa imagem, ou perceção. Nessa análise há erros de processamento da própria informação errada. Pode acontecer que erros sucessivos se anulem, mas o mais provável é amplificar o erro, isto é, o afastamento da realidade. Da perceção do resultado da análise pode resultar uma medida de intervenção, provavelmente contraproducente, pelas razões expostas. A intervenção normalmente agirá no sentido contrário ao pretendido.
Este é um jogo de palavras, provavelmente a retratar deficientemente a realidade, mas com muitos exemplos a sustentá-lo.
A extensão da ignorância por cada um de nós da maior parte dos assuntos que nos são divulgados pela comunicação social, ou ocultados ou camuflados por ela, apesar de serem de interesse coletivo, é normalmente maior do que o nosso conhecimento. E dentro de cada tema, a ignorância de um sub-tema por parte dos próprios especialistas do tema é muitas vezes superior à extensão do próprio conhecimento do especialista do sub-tema.
Bem intencionados dirão que num conjunto numeroso os erros se vão cancelando e o resultado final, miraculosa e democraticamente, corresponde ao interesse coletivo, de que a maioria pode não ter a consciência racional do que isso realmente seja. Sim, isso pode acontecer, mas apenas porque a teoria das probabilidades permite isso. Ou porque se tenha construido uma bateria de regras e procedimentos que, sem evitar os erros, os atenuam. Por exemplo, as regras do método científico. Ou, para garantir a segurança aérea, terem-se instituído procedimentos, do tipo check-list, nas descolagens. Segundo um piloto, apenas num terço dos casos os procedimentos são integralmente cumpridos. Isto é, é a redundância, não a capacidade do indivíduo operador da máquina, ou a segurança intrínseca do equipamento, que garantem a pouca sinistralidade aérea. Um pouco como os mecanismos biológicos que se auto-regulam em ambiente adverso.
Este jogo de palavras é então para observar o risco das decisões coletivas, por mais democráticas que sejam (e sim, o sistema democrático é o pior, mas os outros serão piores, sem esquecer que Hitler ganhou as eleições e o referendo que se lhe seguiu). porque estamos a decidir sobre aquilo que não conhecemos, ou que nos impingiram como sendo verdade, e não é. Por exemplo, nas últimas eleições regionais alemãs, foi divulgado um cartaz de uma rapariga loura a ser atacada por um refugiado. Depois das eleições provou-se que o cartaz era falso, mas uma das regras da democracia é respeitar as eleições, mesmo que equivocadas. O que vale também para o conflito entre petralhas e coxinhas no Brasil. Também tivemos de aguentar um primeiro ministyro que antes de eletio dizia que cortar o décimo terceiro mês era uma estupidez, e depois viu-se.
Considere-se o tema dos atentados terroristas na Europa ocidental. Dir-se-á que houve um aumento. Mas isso é a perceção. A realidade é mostrada pelo gráfico, são menos do que nos anos 90, em que a patologia dos atentados estava mais concentrada na própria Europa ocidental (Bader-Meinhof, ELP, pós guerra da Argélia):


Isto para dizer que é dificil argumentar e tomar decisões.
A extensão da ignorância sobre aquilo que temos de decidir (ou sobre o que nos ocultam, apresentando as decisões como facto consumado) é superior à extensão do que conhecemos.
O que é aproveitado por quem toma decisões (também ignorantes, mas com o poder) para continuar a enganar.
Que fazer então?
Continuar a argumentar e a recolher dados, e a discuti-los.
Até ver...

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