terça-feira, 4 de junho de 2013

Fábula dos pirilampos

As alterações climatéricas vinham afetando o comportamento dos bichos insetos da floresta.
A sucessão de noites enevoadas limitava dramaticamente a capacidade de orientação dos insetos noturnos, incapazes de visualizar a lua e com ela traçarem as suas rotas de voo.
Queixavam-se igualmente os insetos predadores dos insetos mais pequenos, que os não encontravam nos locais habituais e assim não conseguiam manter o equilíbrio ecológico.
Queixavam-se os mosquitos que não conseguiam encontrar quem picar e assim os ovos não germinavam.
De modo que os bichos insetos convocaram uma assembleia para análise das questões e proposta de soluções.
A assembleia foi um desastre, não só porque a escuridão continuava na noite enevoada, mas principalmente porque os representantes de cada grupo de bichos não conseguiam entender-se uns com os outros, apesar de falarem a mesma linguagem de bichos.
Os delegados observadores convidados dos bichos não insetos, predadores sediados em locais distantes mais a norte da floresta sorriam satisfeitos com o andamento ou falta de andamento dos trabalhos.
A desorientação entre os insetos era uma mais valia para eles e uma garantia de que os insetos, os mais pequenos e os seus predadores, continuariam a ser presas fáceis do nível intermédio de predação, das aves, dos batráquios, dos repteis e dos pequenos mamíferos, e estes por sua vez poderiam continuar a ser presas fáceis dos grandes predadores sediados em locais distantes.
Foi então que o representante do grupo dos pirilampos, revelando que tinha debatido a questão com os seus representados e estudado bem as propostas de saída da crise, pediu a palavra e falou à assembleia.
Que o grupo dos pirilampos estava disposto a trabalhar em conjunto, formando pontos de difusão de luz espalhados por locais estratégicos da floresta.
Assim se constituiria uma rede de orientação geral para todos os bichos que substituiria as funções orientativas da lua e das estrelas.
As abelhas aplaudiram entusiasmadas, fazendo contas mentalmente aos ganhos de produtividade e de competitividade na produção de mel que daí adviria.
As traças rejubilavam, pensando no crescimento da sua taxa de natalidade e na ampliação da extensão geográfica dos seus voos.
Os vespões e os louva a deus sentiam as suas secreções digestivas a escorrer das mandíbulas pensando no crescimento da população  a explorar.
Mas os pirilampos punham uma condição, que era a de que os outros insetos, incluindo os seus predadores, se absteriam de perseguir os pirilampos, deixado-os em paz na sua função geradora de luz, nem que para isso tivessem de conter a sua taxa de natalidade, e que em vez de os perseguir os defendessem mediante uma eficaz rede de aviso de aproximação dos predadores do tipo aves, batráquios, répteis e pequenos  mamíferos.
A assembleia dividiu-se, gritando uns que isso era uma utopia, uma sociedade sem classes, que, por definição, não podia realizar-se; que assim o papel da lua e das estrelas era dispensável, mesmo que as nuvens se dissipassem, e que o melhor era não fazer nada.
Outros gritavam que era uma boa ideia que era preciso experimentar, inclusivé estudar formas de aumentar o rendimento de produção de luz e de sublimar o instinto da predação reduzindo as margens de lucro.

Eu penso que os bichos insetos ainda lá estão a discutir o assunto, e não faço ideia a que conclusão é que terão chegado, se é que chegarão a alguma conclusão.
Acho que estão a ficar cada vez mais parecidos com os humanos.

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