sábado, 18 de junho de 2016

Jo Cox

Inclino-me perante a memória de Jo Cox, deputada inglesa assassinada por um doente mental. Num dia em que morreram, como de costume, inocentes em atentados por psicopatas ocidentais e orientais, e mais uma criança foi vítima do homicídio piedoso pela sua mãe (em que estado mental ela estaria, que correlação se poderá estabelecer com a situação económica e social do país?), é o crime sobre Jo Cox que mais me impressiona.

Porque trabalhava por um mundo que ela acreditava ser melhor, e  porque é a barbárie da insanidade consentida que põe fim à sua vida e que ameaça manter com perenidade as desigualdades sociais e a infelicidades das comunidades.

"Foi ali (na universidade de Cambridge) que percebi como importa o sítio em que se  nasceu, que importa a forma como se fala, que importa quem conhecemos. Eu não falava bem nem conhecia as pessoas certas. Os meus verões eram passados a embalar pastas de dentes na fábrica onde o meu pai trabalhava" - de uma entrevista de Jo Cox ao Yorkshire Post.

Para além das manifestações de pesar, conviria que os senhores decisores políticos aceitassem o que os especialistas de sociologia já vêm dizendo há muito.
É um ideal de liberdade deixar ao indivíduo a escolha da forma como quer viver. mas viver em sociedade implica normas, e a simples observação (primeiro passo do método científico)  verifica que 1/4 da população sofre de perturbações mentais revelados por comportamentos desviantes que podem conduzir a violencia física e atentados.
Não vale a  pena perdermo-nos em discussões se as ideologias dominantes, nomeadamente os critérios do consenso de Washington de minimização do controle do Estado, estão ou não fortemente correlacionados com este tipo de crimes através, por exemplo, do estímulo à violência da competição em vez da cooperação nos desenhos animados que se impingem às crianças nas televisões e nos jogos de consolas, nas séries televisivas cheias de violência, ou na marginalização de grandes camadas de jovens a quem é vedada a formação.
Em vez disso, os políticos fariam bem em ouvir os sociólogos e em adotar medidas de prevenção, que são obviamente contra as regras de mercado porque implicam despesa pública na garantia de acesso de todos os jovens à educação e ao emprego.
E isso é mais importante do que lamentar a morte de Jo Cox.
Como ela dizia, em muitas circunstancias, nascer conduz a que um jovem "não fale bem".
E isto num país desenvolvido (embora vítima das medidas que a seu tempo Thatcher impôs). Tal como em Portugal.

Numa entrevista a uma das melhores alunas da escola secundária da Damaia, onde existe uma importante comunidade de origem africana, ela afirmou que tinha escolhido o curso profissional em vez seguir letras ou ciências porque tinha consciência de que "nâo falava bem" , que tinha dificuldades de linguagem, porque em casa também as tinham.
Isto não pode ser, isto é contra a Constituição, contra a Declaração universal dos direitos humanos, contra a solidariedade entre semelhantes.

E isto será tão dificil de explicar aos senhores da comissão europeia, do FMI, do BCE?
Que tem de se gastar dinheiro com a formação e ocupação dos jovens (o mercado dirá que é mais prático deixá-los na ociosidade para poderem dedicar-se ao consumo e tráfico de drogas, de música festivaleira, de filmes de culto da violência e das armas; o mercado que gosta de que o deixem em paz para promover a sua guerra,  lá saberá).

E que evidentemente tem de se gastar dinheiro público no tratamento, acompanhamento e prevenção de psicopatas como o assassino de Jo Cox,   como o norueguês Breivik, como os assassinos de Olof Palme e da ministra sueca, mesmo que os fundamentalistas dos direitos da liberdade digam que isso viola a privacidade de todos. A psicopatia da violência não é exclusiva dos autores dos atentados do Daesh.
Até podiam utilizar para isso o "dinheiro de helicóptero" de que até os próprios profetas da religião dos mercados falam...

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