quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Economicómio XXXI - George Steiner

George Steiner recebe hoje, 26 de Novembro de 2009, o grau de doutor honoris causa numa universidade de Lisboa.
Interessa-me reter uma frase dele:
“Vivemos numa época selvagem. Porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência criar uma barreira contra o inumano?”
Relevemos o lugar comum de que vivemos numa época selvagem.
Sempre vivemos. La Fontaine explicava isso quando o lobo defendeu a sua, sua dele ,liberdade de comer o cordeiro, por mais argumentos que este apresentasse que ele, cordeiro, tinha direito à vida.
Primeira conclusão: os conceitos de “liberdade” e de “o mais forte” indissociam-se (claro que estou a pensar nos adam smithistas mais adam smithistas do que Adam Smith).
E porque não conseguiram as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Se Steiner não sabe a resposta, não sou eu que saberei.
Mas posso dizer o costume. Que não há uma relação de causa e efeito mas uma correlação forte entre os critérios que orientam os nossos gestores e as consequências a que assistimos.
Por via democrática temos os gestores que temos. Isso significa que os gestores que temos são a emanação das populações.
Por exemplo, se as populações privilegiarem o direito indiscriminado ao consumo (“tudo isto será teu se prostrado me adorares”), o direito de poder usufruir de privilégios de que o vizinho não pode usufruir, e o direito de supremacia deum grupo sobre outro grupo (futebolístico, bairrista, de utilizadores de uma droga específica, religioso, político, étnico), é natural que os candidatos a gestores que os defendem acabem mesmo como gestores.
E estes direitos ajustam-se como uma luva de tamanho bem escolhido, e é essa a correlação, ao que está por trás: o apelo ao mercado livre, à contenção dos preços apesar das regras económicas determinarem o seu aumento, à insensibilidade de querer conter os preços à custa do aumento do desemprego, à insensibilidade de privilegiar os indicadores económicos em detrimento da segurança das pessoas e da paz entre os povos, de recusar sistematicamente o desarmamento e o predomínio da escola.
Porque não conseguem as Humanidades e a Ciência vencer o inumano?
Por existir esta correlação: a escola das Humanidades e da Ciência não é privilegiada. Os nossos gestores preferem deixar as crianças entregues ao abandono escolar ou a escolas de banditismo; e os indicadores económicos sim, são privilegiados.
No dia seguinte à administração Obama (detentor de um prémio Nobel da Paz e comandante supremo do exército que utiliza aviões telecomandados com efeitos colaterais e fatais sobre civis no Afeganistão), ter recusado o fim do fabrico de minas terrestres com o argumento de que as minas terrestres são essenciais para a defesa dos estados Unidos, e no dia em que em Portugal é lançado o livro da intolerância portuguesa, é o que se me oferece dizer em resposta à pergunta de George Steiner.

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