quarta-feira, 30 de setembro de 2020

O acidente em 29 de setembro de 2020 com o tunel do metropolitano sob a Praça de Espanha

 A comunicação social fez uma boa cobertura do acidente e os comentadores convidados foram esclarecedores.

Parece confirmar-se que a rotura de uma parte da abóbada do metro, junto da saída da estação Praça de Espanha para S.Sebastião, sentido norte-sul, se deveu a uma máquina pesada de furação, conhecida como pica-pau, que demolia uma estrutura de acesso a um coletor (correção posterior: é mais correto dizer sumidouro ou entubamento de uma pequena bacia de retenção para um descarregador a cota inferior no pequeno vale entre o Instituto da Habitação e o Teatro A Comuna), e que aprofundou a furação ou a percussão até partir o topo da abóbada, o qual estaria a cerca de 1 a 2 metros da superficie, e em condições de descompressão da abóbada por retirada de terras (o que retira resistencia à abóbada a qual deve estar comprimida).

A referida estrutura  deve ter sido executada quando da ligação da avenida Calouste Gulbenkian ao viaduto da avenida dos Combatentes nos anos 70, praticando-se então uma pequena bacia de retenção limitada pelas rodovias adjacentes, reduzindo a distancia à galeria aos referidos 2 m. (nos finais dos anos 90 houve ainda a instalação do arco de S.Bento a curta distancia do tunel). 

A pequena distancia da galeria à superficie deveu-se à necessidade da construção do tunel, nos finais dos anos 50, sobrepassar um coletor, obrigando à sobreelevação e adição de terrenos à superfície.

Da ocorrencia do acidente haverá conveniencia em esclarecer se foi cumprido o protocolo de submissão de um projeto de obra a menos de 30 m do eixo do tunel ao metropolitano para emissão de parecer..

E se o projeto foi submetido ao metro, se este emitiu parecer com a implantação e o perfil do tunel, e se foi nomeado um tecnico para acompanhamento e análise periódica dos registos da instrumentação a instalar no tunel para controle da altimetria.

A resposta a todas estas questões é essencial para prevenir a ocorrencia de acidentes semelhantes, recordando-se que nas obras de remodelação da praça da estação fluvial sul e sueste a CML não esclareceu se instalou instrumentação no torreão e ala nascente do Terreiro do Paço nem que medidas o empreiteiro tomará no caso de deformação do tunel devido à retirada de materiais na sua vertical que se tem verificado.

Recordam-se incidentes semelhantes verificados na história do metro por negligencia na operação de perfuradoras em obras adjacentes e acompanhadas, felizmente sem consequencias apesar da invasão do gabarit do comboio por brocas das perfuradoras: 

- perfuração por uma broca da galeria entre Praça de Espanha e Jardim Zoológico durante as obras da estação Sete Rios da CP

- perfuração por uma broca perto da estação S.Sebastião durante as obras do Corte Inglês

- perfuração e queda de uma broca perto da estação Quinta das Conchas numa obra de um prédio sobre a galeria

- episódios de abatimento de coberturas só ocorreram durante o período de construção, e não em exploração

- o caso dos riscos de queda de revestimentos ou tetos falsos na estação Encarnação foram devidos a construção incorreta corrigida pelo empreiteiro na receção definitiva e não era estrutural

Relativamente à reparação a executar na Praça de Espanha poderá fazer-se quer internamente que externamente com instalação de um cimbre de 20 ou 30 m e reforço da abóbada com varões ou chapa de aço 

Imagens relacionadas:

https://www.msn.com/pt-pt/noticias/ultimas/desabamento-em-linha-azul-do-metro-faz-quatro-feridos-em-lisboa/ar-BB19xkCS?li=BBoPWjC&ocid=mailsignout





Caricatura de José de Lemos focando a modelação de terreno consequencia da sobreelevação dos terrenos devida à construção do tunel do metro nos anos 50; curiosamente parece representada tambem uma ponte provisória sobre a linha de água que motivou o coletor; retirado de "Um metro e uma cidade" de Fernanda Rollo

zona da pequena bacia de retenção onde ocorreu o acidente; a cota menor é de 65 m, 1 a 2m acima da abóbada; a cota da rodovia adjacente em segundo plano era de 67m

aspeto antes da demolição da rodovia entre as avenidas dos Combatentes e Calouste Gulbenkian


traçado do tunel do metro a amarelo assinalando-se com uma pequena circunferencia a amarelo o local da perfuração; a azul escuro o percurso do coletor; os números a amarelo são as cotas topográficas da superfície

o edificio ao fundo é o da embaixada de Espanha; é muito estranho máquinas tão pesadas estarem a escavar sobre um tunel a 2m de profundidade, parecendo que continuaram a trabalhar depois do acidente, embora afastadas




PS em 2 de outubro de 2020 - Juntam-se as seguintes fotos, incluindo uma foto de arquivo da CML, outras tiradas em 1 de outubro e da implantação dos tuneis do metro:

Foto de 1958 mostrando o tunel em via unica em construção do ramal de ligação do metro ao parque de material e oficinas de Sete Rios. Em segundo plano o edificio da embaixada de Espanha. Patente a sobreelevação dos tuneis relativamente a algumas rodovias: Foto encontrada no blogue biclaranja

foto em 1 de outubro tirada ao lado do edifico da embaixada de Espanha. O acidente ocorreu atrás do painel publicitário. A entrada sul para a estação de metro está encoberta pelas árvores à esquerda. Vêem-se duas máquinas que me parecem excessivamente pesadas para trabalharem tão perto do tunel

vista da saída poente do coletor do antigo riacho, encoberta parcialmente pela vegetação. Mostra-se assim a diferença de cotas para a superficie da Praça de Espanha

Imagem do projeto do novo parque. À esquerda a nova cobertura da entrada sul da estação de metro. Ao centro e em baixo, o riacho que reconstitui o traçado do antigo riacho (inconveniente, poderá originar infiltrações na estação e tunel). O acidente ocorreu na interseção dos eixos da estação e do arco de S.Bento, sob o novo passadiço 



outra imagem da entrada sul da estação de metro e do novo riacho.

complementos de anterior imagem Google Earth com: a amarelo continuo o tunel do metro; a amarelo traço interrompido o ramal em via unica para o parque de material e oficinas de Sete Rios (desativado, perdendo-se a valencia de garagem para flexibilização da exploração); o retangulo assinala a estação; o pequeno circulo a  amarelo o local da perfuração; os numeros representam as cotas (cota aproximada do plano base de via: 58m ; cota aproximada do topo da abóbada: 63m)

desenho de implantação da estação e acessos. Assinalado o local do acidente da perfuração, junto de uma estrutura (a qual estava a ser demolida quando ocorreu o acidente de perfuração) de recolha da pequena bacia de retenção e de proteção do desnivel de 2m para o pavimento da rodovia já desmontada. Do lado esquerdo vê-se a saida poente  do coletor/riacho.
Sugere-se ainda neste desenho, penalizando-me por não o ter feito durante a consulta pública, mas aproveitando agora a oportunidade, de construção de rampas de acesso de cadeiras de rodas ao átrio sul, num total de 100m para vencer o desnível de 5m e a construção de 2 poços de elevador do átrio sul para os dois cais; recordo que a acessibilidade dos edificios públicos é uma imposição legal cujo cumprimento integral tem vindo a ser protelado pelo metro, assinalando-se a recente entrada em serviço dos elevadores de Colegio Militar, cujo processo de consulta estava pronto em 2008


PS em 3 de outubro - já se circular no troço S.Sebastião-Praça de Espanha. É um prazer saber que os trabalhadores do metro, a todos os níveis, são competentes e capazes de trabalhos dificeis, apesar das estratégias deficientes da tutela e da câmara municipal, que secundarizam os critérios da engenharia de transportes numa área metropolitana desestruturada em termos de organização do território.

1 comentário:

  1. Caro Santos Silva
    O empreiteiro na altura da ocorrência encontrava-se na altura a demolir 2 tuneis retangulares (caneiros) de canalização da ribeira que passa na zona e que agora se quer por a descoberto. Iremos certamente sofrer com problemas de infiltração, se o projeto continuar a mostrar insuficiências como as já verificadas.

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