quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Da calçada portuguesa ao pavimento cimentado


Gosto de a ler e aprecio as suas  técnicas de investigação dos assuntos. Por isso não entenda o que escrevo como crítica, mas como sugestão. Aliás, costumo receber emails seus, é natural que lhe possa enviar também emails.

Durante alguns anos, antes da reforma, estive no metropolitano ligado á adaptação das estações a pessoas com mobilidade reduzida, com grandes doses de frustração porque as administrações gostavam de pôr nas "cartas do cliente" a existência de um plano de instalação de elevadores nas estações em falta, mas as escusas do costume, dificuldades orçamentais, problemas crónicos da disfuncionalidade do código da contratação pública, limitações dos fornecedores de elevadores na disponibilização de peças e na manutenção, levaram sistematicamente à situação de carência de meios adequados para  o acesso ao metro  de pessoas de mobilidade reduzida (sim, usar as escadas fixas quando se tem problemas num joelho é doloroso).

Por outro lado, sou um ferrenho defensor da arqueologia industrial, e faz-me pena pensar-se em suprimir a calçada portuguesa. Recordo-me de, quando era miúdo, ficar admirado por, à medida que se subia para o norte de Lisboa, a calçada portuguesa ir desaparecendo, substituída por pavimento cimentado, composto por quadrículas de 20 cm de lado, moldadas durante a construção do passeio, por manifesta falta de disponibilidade no norte de pedra branca calcária.

Mas anime-se, como em quase tudo há solução, construam-se parte dos passeios em calçada portuguesa preparando devidamente o solo para resistir à pressão dos carros estacionados e das carrinhas de descarga, e vedando os passeios com pilaretes, e parte em pavimento cimentado com mistura de cores (atenção que se o pavimento cimentado não é devidamente preparado, também se irá partir com os carros estacionados em cima do passeio). Tem um exemplo de sucesso que pode ver na rua Luis Augusto Palmeirim, entre o mercado de Alvalade e a escola Eugénio dos Santos. De vez em quando lá vem um ciclista no passeio, ou um skate, ou uma trotineta, mas que havemos de fazer?

Dou-lhe outro caso de sucesso da calçadinha portuguesa, no próprio metro. Por exemplo, na estação Cidade Universitária. O pavimento é liso, as pedras foram inseridas em leito de cimento e depois afagadas. Têm o nome de vidraço, não têm buracos.

Teremos provavelmente um caso de insucesso na proposta que a junta de freguesia e a CML apresentaram para a rua Ferreira Borges. As pessoas estão zangadas, e com razão, pela forma inflexível como foi decidido construir a estação de metro no jardim da Parada (não se compara com os desalojados e os expropriados de Alcântara, mas tudo se evitaria se o traçado obedecesse ao projeto antigo, anterior à febre da linha circular), e as altas instâncias talvez se tenham lembrado da remodelação da Ferreira Borges como compensação. Mas inflexíveis como sempre, acham que devem manter os dois sentidos na rua e alindarão os passeios com pavimento de lioz, onde certamente os ciclis
tas farão cortejos ameaçadores para os pobres peões, sem esquecer os amadores das trotinetas e dos skates.
https://lisboaparapessoas.pt/2023/09/19/rua-ferreira-borges-requalificacao/

Mantêm-se os lugares de estacionamento, não há ciclovias  e desaparecem os carris (os carris de ferro foram uma invenção do século XVIII para aproveitar a lei da Física que diz que o atrito e a resistência ao movimento são menores, mas os decisores não devem ter ligado muito às aulas de Física quando andaram na escola).

Mas vamos à sugestão, que é a da senhora jornalista levar a defesa dos direitos das pessoas com mobilidade reduzida ao próprio metro, com o mesmo carinho com tratou das suas dificuldades da  calçada portuguesa.
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2023/08/escadas-mecanicas-e-elevadores-do-metro.html 

Uma reportagem duma jornalista como a senhora ou uma entrevista à administração do metro terá certamente muito mais impacto do que os textos que vou escrevendo, para mais tendo eu já caído em desgraça junto da administração e da direção principal do metro por discordar publicamente das suas decisões. Claro que a administração lhe dirá que tem um programa de equipamento das estações em falta com elevadores e outro programa para modernização dos elevadores e escadas rolantes existentes. Também lhe dirão que o problema está relacionado com as dificuldades dos fornecedores e das empresas de manutenção e nunca reconhecerão que o problema é a falta de substituição de quem nisso trabalhava no metro e não foi substituído quando da reforma ou simplesmente a confiança cega no outsourcing. Infelizmente do INR lhe dirão provavelmente a mesma coisa.
https://www.msn.com/pt-pt/noticias/ultimas/circula%C3%A7%C3%A3o-restabelecida-na-linha-verde-do-metro-de-lisboa/ar-AA1gVRNn?ocid=hpmsn&cvid=70cb4c59dc914b4e8b45f3f6a116a1eb&ei=24

Então o que eu sugeria era uma série de entrevistas com associações de pessoas com mobilidade reduzida, ACAPO, APD, ADFA ... 

Para além das entrevistas podia combinar-se um percurso com cobertura fotográfica, por exemplo, supondo um cidadão ou cidadã que se desloque em cadeira de rodas, morando na margem sul, podendo  apanhar o comboio no Pragal, saindo em Sete Rios, apanhando o metro para Baixa Chiado para o seu local de trabalho perto da praça Luis de Camões. Convidar-se-iam as administrações da CP, da Fertagus e do Metro, ou quem elas delegassem no organograma da sua empresa que estivessem dentro da problemática dos elevadores e escadas mecânicas. Para além de observar o funcionamento ou ausência do equipamento, registar-se-ia também a existência ou ausência de instalações sanitárias acessíveis em cadeira de rodas (e, já agora, para qualquer pessoa, numa altura em que as instalações sanitárias no metro estão fechadas e se justifica o fecho das instalações públicas do jardim da Parada com a instalação dos elevadores da futura estação de Campo de Ourique) e tomar-se-ia boa nota do tempo necessário para a viagem e dos obstáculos encontrados, ou por outras palavras, da distancia a que se está do cumprimento da lei 125/2017 (dada a inexistência ainda por muitos anos de elevadores na estação de metro de Jardim Zoológico, terá de se prever um pequeno grupo de ajudantes).
https://www.pgdlisboa.pt/leis/lei_mostra_articulado.php?nid=3111&tabela=leis&ficha=1&pagina=1&so_miolo=

Serviria esta excursão ao menos para forçar, ou pelo menos tentar forçar, o cumprimento da primeira parte da lei 125/2017, que é a de elaborar um plano para elaboração dos projetos para a acessibilidade dos locais públicos por pessoas com mobilidade reduzida e submissão a fundos comunitários, incluindo a divulgação pública da calendarização e das soluções propostas, sendo que a questão é que estará tudo dependente do relatório de uma Comissão de Promoção da Acessibilidade que reporta, ou reportará, ao INR, e que, sinceramente, não sei se foi nomeada conforme diz a lei.

Posto isto, não esmoreça se optar por não dar seguimento à sugestão. Eu também não consegui, mas podia ser que tivesse interesse mediático.

 Ao dispor, embora com a minha idade talvez não possa ajudar muito.

Com os melhores cumprimentos


Poderia utilizar-se a realização em 7 de outubro de 2023 no Jamor do dia paralímpico jovem para divulgar a problemática da mobilidade associada

https://paralimpicos.pt/dia-paralimpico-jovem1









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