quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Acidente ferroviário de Buenos Aires

De forma semelhante ao acidente na Saxonia-Anhalt (http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2011/02/as-mortes-na-saxonia-anhalt.html) e ao acidente com o TGV chinês (claramente motivado por inexistencia de equipamentosde segurança que evitassem as consequencias de uma avaria por descarga elétrica - http://fcsseratostenes.blogspot.com/2011/07/acidente-em-linha-de-alta-velocidade-na.html), experimento também no caso do acidente de Buenos Aires um sentimento de desgosto pelas 11 mortes e pelos erros de exploração de caminhos de ferro.
(http://aeiou.expresso.pt/argentina-comovida-com-pior-acidente-em-50-anos-videos=f673822)

As imagens  das camaras de televisão da prensagem do autocarro falam por si e dispensam grandes teorias de comissões de inquérito.
Conforme se pode ler na noticia, as linhas suburbanas atravessam a cidade cruzando-se com várias passagens de nível.
Não há tuneis nem viadutos, apenas promessas.

É verdade que a Argentina foi vitima de uma crise económica gravissima devida a deficiente taxa de cambio relativamente ao dolar americano, de que se vem libertando com crescimento económico positivo (apesar do setor terciário ter um peso demasiado elevado em detrimento do setor produtivo), pagamento das dívidas conforme as suas possibilidades e não com os juros e os prazos dos credores (os economistas da escola dominante chamam a isto bancarrota), sem comprometer algum investimento público  e, aspeto negativo, com o agravamento das desigualdades sociais.

Todavia, ainda a crise não se tinha declarado, tive ocasião de ouvir, em reunião da associação Alamys, em Lisboa, no final dos anos 90, o presidente da companhia dos trens de Buenos Aires dizer que tinha a honra de ter sido o secretário de estado dos transportes que tinha implementado a privatização dos transportes urbanos de Buenos Aires.
Na verdade, foi a confissão da proximidade promíscua entre os politicos e os grupos económicos numa matéria de interesse público.

Um sistema de transportes deve ser o meio energeticamente mais económico de colocar os volumes de trabalhadores nos seus locais de trabalho.
Dificil entender nesta perspetiva como poderão gerar lucro que não seja investido na sua manutenção e expansão (à atenção de quem vai receber as propostas da Arriva, da Veolia, da Stage Coach, da Transdev e do Barraqueiro da próxima feira de privatizações em Portugal ).
Mas na Argentina vingou a tese da privatização e da minimização do investimento.

Não é admissivel, do ponto de vista da exploração de um sistema ferroviário, que de 4 em 4 minutos passe um comboio numa passagem de nivel suscetivel de ser "transgredida" por veiculos rodoviários.
Estima-se uma morte de dois em dois dias nas passagens de nivel de Buenos Aires.
De acordo com tabelas de seguros, contabilizando uma vida em 150.000 euros, teremos um prejuizo anual de 27 milhões de euros, o que justificaria um investimento de 1.500 milhões de euros em passagens desniveladas).
A norma EN50126, que faz parte do conjunto de normas que regulam a exploração dos caminhos de ferro, define o risco de um acidente como a combinação entre a probabilidade da sua ocorrencia e a gravidade das suas consequencias.

No caso de Buenos Aires, temos um acontecimento frequente e consequencias criticas (1 morte de dois em dois em dias, ou 0,02 mortes por hora ).

De acordo com a norma, este risco é intolerável e obriga a intervenção corretiva (neste caso, passagens desniveladas, uma vez que o coeficiente de adesão das rodas da ferrovia não permitirem travagens em espaços curtos).

Conclui-se assim que a exploração em Buenos Aires está fora da norma, por mais que as autoridades invoquem os esforços de contenção económica (será mais barato perder 27 milhões de euros de vidas humanas por ano?).

Perante a penúria de recursos (ironizo, uma vez que a construção civil na Argentina é um setor pujante e existe crescimento económico positivo) para se cumprir a norma, teria de se interditar o transito rodoviário cruzando a ferrovia ou voltar às cancelas guarnecidas por pessoal,  paragem dos comboios antes de cada travessia e acompanhamento da testa do comboio por um agente durante a travessia (ver os procedimentos na travessia da rodovia em Alcantara pelo comboio dos contentores de Alcantara; mesmo assim, não se eliminarão os acidentes, que podem ocorrer numa passagem de nivel por percussão de veiculos rodoviários estacionados por condutores desatentos).

Ou então, depois da emoção popular e da presidente da Argentina e das condolencias do papa, deixar as coisas como estão, o que se lamentará.

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