sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A jantarada para escolher o gestor

Com a devida vénia ao DN e ao especialista de economia André Macedo, cito a sua crónica sobre as jantaradas.

O tema é, para mim, de importância extrema, porque mostra uma das razões principais de oposição ao progresso das instituições nacionais.
Trata-se do modo de nomeação dos gestores, seja do que for, mas com consequências particularmente gravosas quando a coisa é pública.
Diz o cronista que a escolha dos gestores se faz normalmente por conhecimentos, diretos ou indiretos, cultivados em jantaradas e decidida, a escolha por quem tem o poder para isso, depois de muito secretismo, em mais uma jantarada.
Isto por oposição a exemplos como os de Inglaterra. Em que chega a ser publicado um anuncio de receção de candidaturas para o preenchimento do cargo de governador do banco de Inglaterra.

Por simples aplicação da teoria das probabilidades, considerando que o universo das pessoas que dominam a problemática de um negócio, e são conhecidas direta ou indiretamente pelos decisores, é limitado, quando comparado com o universo de pessoas que dominam a problemática de um negócio, e que essa limitação se agrava quando o universo dos potenciais escolhidos por serem conhecidos, se restringe ainda mais porque têm de oferecer garantias de não se afastarem dos preceitos ideológicos dos decisores, então não há dúvida que as probabilidades de sucesso são pequenas e as probabilidades de impacto negativo em toda a comunidade são grandes.

Lembrei-me que é assim que são escolhidos ministros, dirigentes partidários, gestores de cargos-chave públicos.
Mas também reconheço que num país em que se respeita pouco a cultura científica, em que não se aplica a dúvida metódica nem se analisam e testam os dados reais, em que se criam consensos de competência técnica por “ouvir dizer” ou por coincidências temporais de sucessos, em que a maioria das pessoas escolhe por fé ou por instinto (o que até poderia ser eficaz se se respeitasse mais a cultura científica) é difícil modificar este estado de coisas.

Recordo alguns dos gestores do metropolitano nomeados por razões politicas ao longo de 36 anos.
Alguns foram exemplo da mais declarada inépcia na perceção da problemática dos transportes e das suas questões técnicas.
Houve um que teve o despudor de começar uma reunião sobre um assunto que dependia das soluções técnicas com esta frase dinâmica: “Vamos lá resolver hoje esta questão, mas não vamos perder tempo a discutir questões técnicas”.
Outros acabaram por revelar a sua incompetência noutros negócios, completamente diferentes.
Embora, duma maneira geral, tenham servido bem alguns interesses instalados das forças políticas que os tinham lá posto.

Recordo ainda um episódio que se passou comigo, no ano seguinte ao da revolução de 25 de abril. Fui chamado ao ministério dos transportes para o ministro me perguntar se podia integrar a comissão administrativa do operador único da área metropolitana de Lisboa, resultante da fusão da Carris e do Metropolitano de Lisboa. Por um pouco tinha ficado administrador. Apesar da minha pouca experiencia em transportes (tinha 30 anos de idade e um ano e meio de vida profissional no metro), o convite advinha do facto de havia pouco tempo ter encontrado uma colega do IST casada com um capitão de Abril. Estivemos à conversa sobre a problemática dos transportes e ela deve ter gostado de me ouvir dizer que uma frota de Fiats 126 ficava mais barata para transportar a população trabalhadora de Lisboa e gerava grande receita em imposto sobre produtos petrolíferos para o governo, mas que ficava mais dispendiosa em energia consumida e em tempo perdido nos engarrafamentos do que uma rede de metro (por sinal devidamente planificada na altura, graças ao trabalho do grupo alemão Deconsult, que elaborou um plano de expansão estimado em 75 milhões de euros a preços da altura). Era à mesma a teoria dos conhecimentos e da confiança ideológica a funcionar.
Mas nada aconteceu, porque o IV governo provisório caiu na semana seguinte, em Julho de 1975, e o V governo provisório, de vida efémera, teve assuntos mais urgentes a despachar.
Por isso não posso criticar a fusão da carris e do metro em curso.
Mas a forma como está a ser feita, com profunda desmotivação dos seus trabalhadores, sem canalizar a força de trabalho para a normalização segundo os padrões internacionais e para a internacionalização da sua capacidade de projeto, deixando antever sem pudor a vontade de oferecer áreas rentáveis à privatização ou concessão a privados, e com pouco declarada orientação no sentido da eficiência energética (ver a comparação entre a eficiência energética de um veículo com rodas de borracha com um veículo com rodas de ferro:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2012/04/comparacao-das-rodas-de-borracha-e-de.html ) ,

posso sim criticar, com o máximo de empenho.

Tudo isto a propósito da forma de seleção de gestores.
Por abertura de concurso de candidaturas e de ideias, é isso, seria a solução , de momento, embora pareça que os senhores dos partidos não concordem.

Curiosa, esta ideia.

Escolher os gestores públicos por concurso seria um fator de progresso.
Os partidos não querem escolher os gestores públicos por concurso público.
Logo, os partidos não querem o progresso que lhe estaria ligado.

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