quarta-feira, 25 de agosto de 2021

História de um processo - a linha circular do metro

 As vicissitudes deste processo pouco interessarão, mas podem servir para os cidadãos como motivo de reflexão sobre a coisa pública,  que uma linha de metro é, pelo nivel do investimento e pela utilidade pública. No que segue, não são considerados argumentos de natureza técnica.

I - Cronologia

Em dezembro de 1974 foi apresentado o plano de expansão do metro, elaborado por um gabinete de engenharia estrangeiro, selecionado por concurso público. Esse plano foi sendo seguido à medida das disponibilidades financeiras, incluindo a desconexão em duas linhas da curva do Rossio. Porém, nunca se conseguiu executar a ligação Marquês de Pombal-Alcântara Mar, considerada prioritária no plano como travessia da cidade e servindo a linha suburbana de Cascais. Apenas se conseguiu chegar ao Rato.

Em 2002 foi aprovado um PROTAML, entretanto não substituido apesar de tentativas de revisão, que incluia o prolongamento do metro a Alcântara Mar  e uma linha circular externa Algés-Loures-Sacavem, esta no modo metro ligeiro de superfície.

Em 2009, por iniciativa do governo de então e da CML foi apresentado um plano de expansão do metro com grande cobertura da cidade e periferia, incluindo uma linha circular interna com a ligação de Rato a Cais do Sodré. O plano foi desenvolvido com a participação de um gabinete de engenharia do Porto e do departamento de construção do metropolitano de Lisboa. Dada a razoável cobertura das zonas periféricas, as respetivas câmaras deram a sua aprovação ao plano, entretanto abandonado devido à situação económico financeira.

Em finais de 2016 o governo, a CML e o metro propuseram-se executar, de todo o plano, apenas a linha circular interna numa versão ligeiramente diferente prescindindo do prolongamento a Alcântara e incluindo a estação Estrela na linha circular. Foi contratado um gabinete de engenharia de Lisboa para comparar a ligação Rato-Cais do Sodré com o prolongamento da linha vermelha de S.Sebastião a Campo de Ourique, tendo o resultado servido de base ao EIA, sujeito a consulta pública em 2018. A maioria das participações foi desfavorável à linha circular, tendo o RECAPE respondido que todas as objeções estavam fora do seu âmbito, incluindo as manifestadas por moradores na colina da Estrela que recordaram os acidentes na obra do ISEG e jardim das Francesinhas.

Em 2017 iniciou-se um movimento de cidadãos moradores na linha de Odivelas-Lumiar e em Telheiras que, por se sentirem prejudicados pelo fim das ligações diretas à zona central da cidade, apresentaram petições à Assembleia da República e uma queixa no gabinete dos interesses difusos contra a linha circular. Igualmente a câmara municipal de Loures entregou uma petição na AR pelo prolongamento do metro ao concelho de Loures. 

2017, maio – Assembleia Municipal da CML com apresentação por vários técnicos, cidadãos e deputados municipais dos argumentos contrários à linha circular; exceção para o prof Alvaro Costa que tinha colaborado na preparação do mapa de 2009, do presidente da CML e de deputado do PS (https://www.youtube.com/watch?v=YL-lOp_LLQg )

2017, julho – Entrega na AR da Petição 364/XIII/2 promovida pela Câmara Municipal de Loures com cerca de 30000 assinaturas para a expansão do metro a Loures

https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalhePeticao.aspx?BID=13045

 2018 – realização de sessões de debate e esclarecimento com a apresentação dos argumentos contra a linha circular, em associações de moradores e juntas de freguesia

2018, maio  - Audição do presidente da câmara municipal de Loures na CEIOPH rejeitando a linha circular

https://www.cm-loures.pt/noticia.aspx?displayid=3987

 2018, setembro – entrega de documentação justificando a oposição à linha circular na secretaria do secretário de Estado do Ambiente

2019, janeiro – deposição no Gabinete de Interesses Difusos de participação de ilegalidade dos procedimentos para o TUA que fundamentou a linha circular e de prejuízo para o interesse coletivo 

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2019/01/copia-da-carta-recebida-de-uma-senhora.html

2019, junho - petições para debate na AR

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2019/06/debate-em-de-julho-de-2019-na-ar-sobre.html

2019, julho – aprovação pela Assembleia da República da Resolução 167/2019 recomendando ao XXI Governo a suspensão da linha circular e o estudo de um plano de mobilidade da AML

2019, julho – sessão pública de divulgação do EIA – comunicadas sem seguimento as inconformidades do EIA e aditamento

2019, 10 setembro - resolução da AR  167/2019 recomendando ao governo a suspensão da linha circular e a elaboração de um plano de mobilidade

2019, 8 outubro - declaração política na AML propondo a suspensão da atribuição de prioridades a linhas e a elaboração de um plano de mobilidade da AML

https://www.am-lisboa.pt/documentos/1570636293I2cUK6ce9Jm47BB4.pdf

2020, março – audição por deputados da AR dos proponentes da petição 612/XIII/4 do movimento  “contraofimdalinhamarela”contra a linha circular

https://www.facebook.com/ContraoFimdaLinhaAmarela/videos/206917357204024

https://www.facebook.com/ContraoFimdaLinhaAmarela/videos/347722436143200
http://fcsseratostens.bloegspot.com/2020/03/caro-colega-antes-de-mais-peco-desculpa.html

2020, 31 março - aprovação pela AR da lei 2/2020 do orçamento do Estado que nos artigos 282 e 283 manda suspender a construção da linha circular, estudar o prolongamento para Alcantara, estudar um plano de mobilidade para a AML e dotar as estações com meios de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida 

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/06/considerando-que-os-mapas-de-despesa-do.html

2020, março - email enviado ao senhor secretário de estado da Mobilidade

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/03/email-para-o-senhor-secretario-de.html

2020, abril – análise da argumentação do senhor ministro do Ambiente, recordatória que o PAMUS de 2016 da CML não referia a linha circular

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2020/04/sobre-insistencia-do-senhor-ministro-do.html

2020, 6 maio - assinatura do contrato dos toscos do 1º lote Rato-Santos excl. (48,6 M€)

2020, 27 junho - visto favorável do Tribunal de Contas sobre o contrato do 1º lote

2020, 22 setembro - contrato dos toscos do 2º lote Santos-Cais do Sodré (73,5 M€)

2020, 3 novembro - contrato dos toscos do 3º lote novos viadutos e ampliação dos cais sul da estação de Campo Grande (19,5 M€)

2020, novembro - Recomendação 122/04 (8ªCP) da Assembleia Municipal da CML  sobre a petição 25/2018       ( pedido ao metro para entregar o estudo de procura que fundamentou a linha circular e que estude soluções alternativas)                            

https://www.am-lisboa.pt/documentos/1603977782J2jQR6lk8Bw63QY5.pdf

2021, 15 fevereiro - vistos favoráveis do TdC sobre os contratos dos lotes 2 e 3

2021, fevereiro  - pedido ao Tribunal de Contas informação sobre a compatibilização dos vistos para os contratos dos 3 lotes de construção da linha circular, o primeiro ainda em 2020, face à lei 2/2020   

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2021/02/mensagem-enviada-ao-tribunal-de-contas.html

maio de 2021 - envio à Provedoria da Justiça de documentação justificativa da reclamação dos cidadãos

 https://fcsseratostenes.blogspot.com/2021/06/queixa-apresentada-senhora-provedora-da.html

2021, 20 agosto - lançamento do concurso para o 4º lote da linha circular, acabamentos e especialidades dos 2º e 3º lotes


II - Resumo das posições assumidas

Resumindo o posicionamento das instituições perante os cidadãos que reclamaram, temos:

1 - Entidades que apoiaram as reclamações e propuseram ações alternativas concretas ou pedidos de esclarecimento a que o governo e o metro não deram seguimento:

- Assembleia da República - legislou no sentido da suspensão em 2020 da construção da linha circular e elaboração de um plano de mobilidade para a AML (lei do Orçamento de Estado 2/2020, artigos 282 e 283)
- Assembleia municipal de Lisboa - em 2020 entrevistou decisores e técnicos e solicitou em vão ao metro o fornecimento do estudo do gabinete de engenharia que fundamentou o EIA

2 - Entidades que se opuseram a alterar a decisão de dar prioridade à linha circular:

- Presidente da República - promulgou a lei 2/2020 considerando que o artigo 282 que mandava suspender a construção da linha circular era uma simples recomendação
- XXII governo/MAAC - recusou conceder uma audiência para debater a argumentação dos reclamantes
- CML - a posição do executivo é de incondicional apoio à prioridade da linha circular
- APA - recusou a alteração do EIA registando no RECAPE que todas as objeções estão fora do âmbito do RECAPE
- Metropolitano de Lisboa - prosseguiu o processo de construção da linha circular depois da promulgação da lei 2/2020
- Tribunal de Contas - visou ainda em 2020 o contrato do 1ºlote dos toscos da ligação Rato-Cais do Sodré, e consultado sobre a incompatibilidade da lei 2/2020 com esse visto, respondeu que não há ilícitos financeiros, que não tem poderes consultivos e que já concedeu os vistos aos contratos dos toscos da linha circular.
- Provedoria da Justiça - considerou que o assunto ultrapassa o âmbito da sua atuação e que, nos termos do seu estatuto, a Provedoria não tem competência de fiscalização de atos dos orgãos de soberania, com exceção da atividade administrativa, o que implica considerar a decisão sobre a linha circular como exclusivamente política.

III - Situação em agosto de 2021 e sugestão

Em vigor os contratos dos 3 lotes dos toscos; lançado o concurso dos acabamentos e especialidades para os 3 lotes; adjudicado o sistema de controle de circulação e 14 unidades triplas; previsto um agravamento de custos devido à pandemia e a atrasos; aprovado o projeto de uma linha de 12 km de metro ligeiro de superfície Odivelas-Loures; segundo o metro, está em desenvolvimento o estudo da ligação na linha vermelha de S.Sebastião a Alcantara Terra.

Como sugestão, se não se quiser adjudicar o estudo da expansão do metro e de um novo plano de mobilidade na AML por concurso público internacional, ao menos que se evite a agressão visual de mais viadutos no Campo Grande (lote 3), transformando a linha circular em linha em laço (à semelhança do que se fez em Londres em 2009 com a linha circular), e aumentando o limite de controle instrumental de assentamentos de 25 para 100 m no edificado junto do novo traçado na colina da Estrela.




















  




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