segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Um poema de Álvaro

Não estou pensando em nada 
E essa coisa central, que é coisa nenhuma, 
É-me agradável como o ar da noite, 
Fresco em contraste com o verão quente do dia, 

Não estou pensando em nada, e que bom! 

Pensar em nada 
É ter a alma própria e inteira. 
Pensar em nada 
É viver intimamente 
O fluxo e o refluxo da vida... 
Não estou pensando em nada. 
E como se me tivesse encostado mal. 
Uma dor nas costas, ou num lado das costas, 
Há um amargo de boca na minha alma: 
É que, no fim de contas, 
Não estou pensando em nada, 
Mas realmente em nada, 
Em nada... 


Poema de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, em "Poemas"


Fernando Pessoa aprendeu o inglês como língua natural em Durban, para onde os pais emigraram quando tinha 5 anos. 
Pensava portanto em inglês e isso foi muito bom quando voltou a Portugal com 17 anos e tomou contacto a fundo com a literatura portuguesa e com os poetas modernistas e simbolistas portugueses seus contemporâneos.
Pensar em inglês é uma forma mais económica, dado que o pensamento inglês foi estruturado à volta das trocas comerciais que o povo fazia numa linguagem contendo o máximo de informação com o mínimo de componentes, enquanto a corte inglesa falava em francês e fazia os seus jogos de poder segundo a estratégia francesa de ideias .
É portanto, o pensar em inglês,  mais eficaz ao abordar uma questão, estudá-la, propor saídas e finalmente apresentar a conclusão.
Dito assim pode parecer fácil, que sistematizar uma questão seria resolvê-la.
Nada disso, Fernando Pessoa teve de criar heterónimos para atacar de diversos pontos de perspetiva as questões.
Mas talvez tenha pensado muitas delas em inglês, "just in english", e por isso os portugueses não o tivessem compreendido na altura.
Pode ser-se incompreendido, quando se pensa em inglês.
Por exemplo, não se diz que se pôs a máquina de lavar roupa a correr, diz-se que se ligou a máquina.
Mais uma razão para, quem vem de fora, fazer  o esforço para pensar em português, para automatizar a construção das frases em português, o que só se conseguirá com o alargamento do vocabulário dominado e com a aceitação desta famosa maneira de ser, "à portuguesa". 


Tem  vantagem de não se perder tempo a "traduzir mentalmente" de inglês para português.




Nota - Dedicado ao autor , e à sua superchefe de gabinete, do neologismo "descompetividade", como sinónimo de falta de competitividade.

Sem comentários:

Enviar um comentário