terça-feira, 5 de abril de 2011

Terras sem sombra - 7º festival de musica sacra do Baixo Alentejo - 2011

Eu, ateu confesso, por força da teoria das probabilidades que não me deixa ficar pelo agnosticismo discreto e respeitador, estou agora em dívida para com o senhor bispo de Beja.
E tambem para com o Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja e todos os mecenas que viabilizaram  mais esta edição do festival de musica sacra do Baixo Alentejo, incluindo os senhores presidentes das câmaras municipais da região.
A ideia é realizar concertos de musica sacra nalgumas igrejas de interesse histórico.
Consideremos o programa, todo ele de assistencia gratuita, desde que os interessados consigam lugar na igreja:
2 de Abril  - igreja matriz de Santiago do Cacem - Vivaldi, Ferrandini e Alexandre delgado com a soprano Maria Bayo e o Divino sospiro (orquestra de câmara barroca do CCB)
16 de Abril - igreja matriz de Almodovar - Bach, Handel e Scarlatti em cravo
30 de Abril - basílica real de Castro Verde - Morton Feldman e Liszt com o coro da arena de Verona
28 de Maio - igreja matriz de S.Cucufate (Vila de Frades,Vidigueira) - Gyogy Kurtag, Bach e Olivier Messiaen em piano, celesta e violoncelos
18 de Junho - igreja matriz de Grandola - Bach, Sofia Gubaidolina em violoncelo e acordeão
9 de Julho - igreja da Misericórdia de Beja - Marcello Panni e Berlioz, com o tenor Mário Alves e a banda sinfónica da GNR

A verdade é que por esse país fora deveria haver mais realizações como esta.
Até as posições oficiais do senhor presidente da comissão europeia e do senhor presidente da republica concordam.
Pelo menos é o que dizem as respetivas mensagens, justificadoras do "alto patrocínio".
Eu detesto esta expressão "alto patrocínio", bem como a seletividade dos mecenatos.
Acabam por ser  manifestações para as senhoras finas das vilas e cidades, dum lado , e do outro, para as pessoas que podem prescindir das preocupações com a subsistencia, que é assim que Eduardo Lourenço define a cultura.
Em tudo isto se vê a ausencia do ministério da cultura.
Não interessa democratizar a cultura, nem a preocupação com o património.
Tampouco aplicar as conclusões do estudo sobre a cultura do gabinete Mateus e Associados, cuja mensagem é identica à do presidente da republica no programa deste festival: "A produção cultural ... conduz... a uma revitalização económica".
Estou de acordo, mas infelizmente vejo muito limitada a ação do festival sobre as populações, embora não tivesse sido o unico, nem o mais velho, a fazer os 300 km necessários para assistir ao concerto.


Mais informações:  
http://www.patrimoniodiocesebeja.com/


Calçada romana reconstituida nas ruinas de Mirobriga, junto de Santiago do Cacem

Igreja matriz de Santiago Maior, junto do castelo


Porta do lado sul


Antes do concerto, com girafa para  a gravação video

Aplausos para o programa e os intérpretes, com três peças de Vivaldi, o Pranto de Maria de Ferrandini, um contemporaneo de Vivaldi, em estreia em Portugal, para soprano, e o original Peregrinação interior: Cinco sonetos quinhentistas de Alexandre Delgado, compositor português atual, 
Espero que a diocese de Beja não altere os seus critérios. Gostei muito de ouvir os sonetos quinhentistas.
De Luis Vaz de Camões:

Bem sei, Amor, que é certo o que receio;
mas tu, porque com isso mais te apuras,
de manhoso mo negas, e mo juras
no teu dourado arco; e eu to creio.

A mão tenho metida no teu seio,
e não vejo meus danos às escuras;
e tu contudo tanto me asseguras,
que me digo que minto, e que m'enleio.

Não somente consinto neste engano,
mas inda to agradeço, e a mim me nego
tudo o que vejo e sinto de meu dano.

Oh poderoso mal a que me entrego!
que no meio do justo desengano,
me possa inda cegar um moço cego!

E como encerramento do concerto e extra-programa, a soprano e o Divino Sospiro ofereceram do Rinaldo de Handel:
Lascia ch'io pianga
mia cruda sorte,
e che sospiri
la libertà.

Deixa que eu chore
a minha sorte cruel,
e que suspire
pela liberdade.











http://youtu.be/kriKyxeNYng

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3 comentários:

  1. Gostei do seu comentário e a ironia fica-lhe bem. Para se gostar de boa música basta isso, não é preciso ser-se ateu ou crente.
    Em princípio, o Departamento do Património da Diocese de Beja não mudará os seus critérios, podem ser mais ou menos felizes, mas a ideia é sempre de abertura. Esperemos que o Papa não mande uma proibição "ex professo" para Beja.
    No concerto havia gente de todas as condições, desde a socialite às pessoas simples da região, paroquianos ou não...
    Todos saíram com um sorriso na cara.
    Um abraço, venha sempre até nós.

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  2. Carissimo Concidadão

    Aplaudo sinceramente a iniciativa do Departamento do Património da Diocese de Beja e espero estar presente em mais alguns dos espetáculos.
    Muito obrigado pelo seu comentário e pelo espírito de abertura.
    Não temos de pensar todos da mesma forma, mas lá que há coisas que nos unem, há.
    Cumprimentos.

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  3. Este Festival está a trazer uma enorme visibilidade ao Baixo Alentejo. É um bom serviço prestado a uma região excelente, mas algo esquecida. Tenho estado em todos os concertos e fui sempre bem recebida, sendo estupenda a programação.
    Cumprimentos

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