Não creio que os maus resultados de Portugal em comparação com os outros países resultem de incapacidades individuais ou de insuficientes qualificações.
Existe sim grande dificuldade de organização em equipa e tendencia ( exatamente porque há uma dificuldade de grupo, de organização de trabalho coletivo com explicitação de tarefas concretas e de prazos de concretização) para não responder à apropriação do poder decisório por grupos mais ou menos bem organizados mas sem grandes preocupações éticas.
Essa falta de ética e essa tendencia para o assalto ao poder decisório não são exclusivos do país, mas é mais fácil encontrar noutros países mecanismos de correção.
Ficou célebre o enunciado de 85 medidas de correção do sistema judiciário português pelo recem empossado presidente da República. Anos passaram, e nenhuma das 85 medidas foi concretizada.
Desta inércia é exemplo, por oposição, o que aconteceu em Macau na transposição do direito português para o direito da nova região. Foram aplicadas quase todas as propostas de renovação que a burocracia portuguesa não deixou implementar em Portugal.
Dou 4 exemplos de um dos mecanismos mais paralisantes utilizados nas empresas ou entidades oficiais em Portugal, e que posso designar por "isso não é comigo" - o sujeito reage a uma solicitação com algo que não a satisfaz, mas considera que a sua intervenção foi cumprida. No polo oposto mas com o mesmo efeito, existe o "isso não é consigo", igualmente paralisante porque a autogratificação ou remuneração do ego de quem impede a realização de uma coisa é proporcional à utilidade que essa coisa teria.
1 - graças aos mecanismos de ocultação muito apreciados pelos decisores, veio-se a saber anos depois que a gestão de um banco resgatado com dinheiros públicos tinha provocado prejuizos por dolo. Decorre uma auditoria na sequencia de muitas outras. Um deputado questiona o primeiro ministro pedindo acesso aos relatórios dos auditores. O primeiro ministro responde: quem fez as auditorias foram personalidades altamente qualificadas, e o governo não tem que as ter, não é com o governo, vá pedi-las aos auditores. Este é um exemplo do "magister dixit", que a minha professora de história e filosofia se apressou a explicar aos seus alunos que era uma carateristica da escolástica da Idade Média, que tinha acabado quando a humanidade acordou o método cientifico, observação, hipótese, ensaio, verificação.
2 - o ministro do Ambiente repete perante os deputados que os estudos feitos demonstram que a opção pela linha circular é a melhor para a expansão de metropolitano de Lisboa e que isso já foi divulgado publicamente. O ministro omite que o que foi divulgado foram os resultados do estudo encomendado, náo foi o estudo, para ser analisado por outros técnicos, num processo de "peer referendum" carateristico do método cientifico, por oposição ao "magister dixit", que na realidade é o que o ministro defende, que não é com ele a divulgação completa desses estudos
3 - é enviado à CML um texto documentado com imagens que refere eventuais riscos para o tunel do metropolitano na empreitada em curso de embelezamento do Terreiro do Paço e estação sul e sueste com retirada de aterros suscetível de descompressáo do tunel. A CML responde, cumprindo a lei mas informando que não é com ela, e que a gestão da obra é com a ATL (Associação de Turismo de Lisboa) , para quem reenviou o texto. É um pouco estranho, uma obra desta envergadura não ter um responsável técnico ou pelo menos operacional do dono da obra, a CML, delegando sem informar os pormenores e os atores dessa delegação numa entidade que não dve ter recursos humanos qualificados para o efeito. Provavelmente a ATL terá delegado a competencia técnica por outsourcing em empresa de fiscalização. Para quem aliás o texto tambem foi enviado, assim como ao empreiteiro. Sem resposta, acho que náo era com a empresa de fiscalização, nem com o empreiteiro. Tão ciosos, os decisores, da sua sintonia com a União Europeia, este é um comportamento perfeitamente espúrio de acordo com as diretivas comunitárias.
4 - noticia do Publico de 21 de maio - Uma mãe portuguesa e o seu bébé de um mês foram retidos sem condições anitárias 4 dias á chegada ao aeroporto Charles De Gaulle quando iam ter com o pai da criança, cidadão caboverdiano. Não vale a pena eufemismos, trata-se simplesmente de xenofobia ordinária. O consulado português propôs-se ajudar mas a família informou que já tinha advogado Então o consulado informou a comunicação social que tinha fornecido os seus contactos e que perante essa resposta , "não era com ele", era com o advogado. Por piores que sejam as razões por uma resposta incorreta da parte da familia (aliás compreensível) o consulado está equivocado, é com ele, qualquer que seja a resposta e qualquer que seja a ação do advogado, é com o tribunal dos direitos humanos, é com todos nós. Que "magister" terá dito que nestes casos não é com o consulado?
Sem comentários:
Enviar um comentário