domingo, 25 de junho de 2023

Comentário ao artigo no Portugal Ferroviário sobre o problema da bitola

 


Comentário ao artigo de Transmaniac no Portugal Ferroviário de 27 de janeiro de 2023 sobre a bitola,

https://portugalferroviario.net/politicas/2023/01/27/o-problema-da-bitola-ferroviaria-em-portugal/

 tentando trocar ideias, conceitos ou pragmatismos tanto quanto possível com fundamento técnico, tentando alguma convergência em substituição da desvalorização sistemática dos argumentos contrários, e enviado, o comentário, à redação por não caber na caixa de comentários.

Com os melhores cumprimentos


 

1 – um problema de perspetiva – peço desculpa, mas no grupo de críticos da estratégia oficial, estão técnicos com experiência de décadas na manutenção  e no planeamento de infraestruturas, menos na gestão da operação, mas com alguma. E não pretendemos uma migração massiva e disruptiva. Pretendemos apenas o início do planeamento credível da concretização da parte portuguesa das redes TEN-T em coordenação com Espanha, França e União Europeia cumprindo o regulamento 1315 (atualmente em fase de revisão).

No documento seguinte, apresentado em fevereiro de 2018 num debate na Ordem dos Engenheiros, pode ver-se a estimativa de 17.200 milhões de euros ao longo de 22 anos, perfeitamente exequível com financiamento europeu, perspetivando o progressivo crescimento das exportações e a eficiência energética e redução de emissões no tráfego Lisboa-Madrid e Lisboa-Porto.    Documento técnico para apoio ao debate sobre a rede de bitola UIC em Portugal.docx

É verdade que não existe em Espanha um plano de migração total da bitola nem um plano para chegar com ela à fronteira portuguesa. Mas não admira, depois dos governos portugueses terem desistido dos corredores internacionais nas sucessivas cimeiras, em dissonância com o regulamento 1315. No entanto, recordo que em Espanha há cerca de 11.000 km em bitola ibérica, 3.000 km em bitola UIC (para passageiros) e 270 km em bitola mista (3 carris, por exemplo nas Astúrias em Pajares). Concordo que a gestão de redes duais é um quebra cabeças, mas por isso existe a ADIF convencional e a ADIV AV de gestão separada. Verba orçamentada em Espanha para 2023 para o corredor atlântico 1648 milhões de euros e para o mediterrânico 1695 milhões; 2477 milhões do PRR

https://www.mitma.gob.es/el-ministerio/sala-de-prensa/noticias/lun-06032023-1400

Sendo verdade que o volume de exportações por modos terrestres para além Pirineus é inferior ao exportado para Espanha, também é verdade que o valor das exportações para Espanha é inferior ao exportado para o resto da União Europeia (INE 2022:  para Espanha 11,42 milhões de toneladas e 17.000 milhões de euros; para o resto da EU 5,97 milhões de toneladas e 26.000 milhões de euros). O que defendemos é começar desde já  a preparar as condições para que antes de 10 anos seja transferido pelo menos 30% do tráfego rodo para a ferrovia (incluindo o transporte de semirreboques, art.19.d.i do regulamento revisto), sem interrupções de transhipment (seamless numa rede única, arts 12.1.i.a  e  13.1.a).

Que diz um dos principais operadores, depois de afirmar que os críticos não percebem do negócio ferroviário? It’s evident that I, as a railway operator, would like to have standard gauge. It would be much easier. I don’t have to arrive at the border with France and change bogies or trains. It would be much easier to have standard gauge freight routes across the Iberian peninsula, but they don’t exist.                                                                                                                             https://www.railwaygazette.com/in-depth/freight-medway-takes-on-the-trucks/59909.article   

Mas é exatamente isso que pretendemos, se “não existe”, que os governos se entendam e que obtenham financiamento comunitário. No caso da parte espanhola, são 250 km de linha nova para mercadorias que faltam de Plasencia para Madrid e 420 km (330 km por Aranda de Duero) de Madrid para Vitoria. Mas os benefícios da linha nova são, por exemplo, nas mercadorias, eliminando os gradientes, passar de um consumo de 38 Wh/ton-km para 26 Wh/ton-km. Não devemos continuar a dizer que “um dia, quando for possível, quando Espanha chegar à nossa fronteira” . Não é pragmático não ter datas objetivo…

Nos passageiros, a transferência do modo aéreo para a Alta Velocidade nas ligações Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid, como no seminário de 15jun2023 da Transportes e Negócios o coordenador do corredor atlântico Carlo Secchi mais uma vez pediu aos governos português e espanhol, com a consequente economia energética e redução de emissões.

Vem a propósito citar Daniel Gros, diretor do centro de estudos europeus, em 2015:  A razão pela qual ainda não existe uma boa interface entre as redes de energia espanhola e francesa … é … a falta de vontade dos monopólios de ambos os lados da fronteira de abrir os seus mercados. Muitos projetos ferroviários e rodoviários também avançam lentamente, devido à oposição local e não à falta de financiamento. Estas são as verdadeiras barreiras ao investimento em infraestruturas na Europa…”     Não fomos nós que “inventámos” a realidade deste argumento.

Sobre a amplitude financeira incluir o material circulante, uma das vantagens da abertura das redes a vários operadores é a destes assumirem custos de aquisição do material circulante. E sobre a facilidade de mudança nas travessas polivalentes, a opinião de quem tem experiencia de trabalhos de via é a de que não é assim tão fácil como isso, com perturbações inevitáveis no serviço, para mais quando, como em Évora-Caia, se constrói apenas uma via (sem plataforma para a segunda via no caso dos viadutos). Por mais que o senhor primeiro ministro diga que é uma solução inteligente e uma mudança simples (“No dia em que haja essa mudança em Espanha, desaparafusa-se daqui e aparafusa-se aqui” – telejornal no canal 4 de 21jun2023). Notar que do lado espanhol a via já é dupla, facilitando a transição da posição dos carris nas travessas, uma via de cada vez.

Sobre os eixos variáveis, sem dúvida que é correto encarar numa fase transitória em Portugal a sua utilização no caso dos passageiros, como em Madrid-Ourense-Santiago. Porém no caso das mercadorias, por razões de manutenção a longa distancia do fabricante, não parecerá aconselhável.

 

2 – o argumento espanhol, a migração de bitola – Reconhecemos que não existem planos de ligação de bitola UIC a Portugal, mas, recordando a adjudicação em 2011 do Poceirão - Caia por 1200 milhões de euros e o programa de trabalhos então coordenado com a contraparte espanhola, essa ausência de planos é principalmente da responsabilidade dos governos portugueses conforme demonstrado nas cimeiras ibéricas (declarações do primeiro ministro em outubro de 2020 após a cimeira da Guarda: “Um dia seguramente, Portugal estará ligado à rede de Alta Velocidade” – um dia quando, de San Jamás?).

Sobre o corredor atlântico é evidente a importância da plataforma de Vitoria, e sobre o corredor mediterrânico é simples de analisar do ponto de vista do processo económico. Segundo números de 2019 o PIB da Catalunha era 213 mil milhões, Valencia 105, Andaluzia 150, Madrid e Castila la Mancha 256. Que poder atrativo têm os 71 da AML, os 98 do Norte os 21 do Algarve e Alentejo e os 19 (!) da Extremadura? Mas detenhamo-nos no site do corredor mediterrânico:

La iniciativa - El Corredor Mediterraneo

 

3 – o argumento emocional, a ilha ferroviária – Podemos de facto ter incorrido no defeito emocional ao invocarmos a imagem de ilha (perdoe-se-nos a petulância de seguir a ideia de Saramago na Jangada de Pedra), mas o argumento da competitividade está expresso no considerando 38.d do regulamento revisto (ver ponto 5), não fomos nós que o inventámos.

Quanto às Asturias, recordo a ligação de 3 carris de Pajares (não exclusiva do corredor mediterrânico), a sua inclusão no alargamento do corredor atlântico  e ligação com o Y basco, e o programa para apresentação do plano de desenvolvimento do corredor atlântico para outubro de 2023.

Mas há efetivamente muito, muito a fazer para que a situação ferroviária não “faça corar de vergonha a nossa península”. Concordamos, o ERTMS é um problema por causa do CONVEL que já impede as locomotivas EURO 6000 de entrar em Portugal (considerando 44 do regulamento revisto: os sistemas de via de classe B de controle de velocidade deverão ser removidos até 2040). Tenho reservas quanto à solução em curso (a experiência tida com os sistemas ATP e ATO no metropolitano de Lisboa de 2000 a 2009 mostrou que numa fase anterior à normalização do ERTMS qualquer solução exige o entendimento entre o fornecedor do material circulante e o fornecedor do equipamento de controle embarcado e de via ). Mas consideramos que bitola UIC e ERTMS  são componentes de interoperabilidade, a cumprir, sem necessidade de hierarquizá-los.

 

4 – o argumento da interoperabilidade em Portugal – Compreendemos a argumentação de preferência por uma rede única, de gestão evidentemente mais simples do que redes duais, e os incómodos de comboios de passageiros bibitola e intercambiadores (concordamos que bibitola de mercadorias só em casos específicos), mas divergimos na redução da área da interoperabilidade a Portugal. Defendemos a interoperabilidade com a rede de bitola UIC de Espanha com 3000 km e a interoperabilidade com a Europa além Pirineus (precisamente para  acabar com transbordos), com um volume de negócios (em euros) por modos terrestres já hoje superior aos negócios com Espanha (ver pontos 1 e 6).

Até certo ponto, concordamos. É necessário preparar gradualmente as coisas para proceder a, não uma “migração” total, mas à concretização das redes TEN-T em Portugal e Espanha, conforme a regulamentação europeia em processo de revisão e aprovação. Mas reiteramos que os números do INE para as exportações não conferem com a classificação de “esmagadora maioria”, do tráfego interno e com Espanha, redutora do potencial da negociação com a Europa além Pirineus.

 

5 – o argumento político, os regulamentos europeus – registamos com apreço a referência ao artigo 16.a . É de facto a essência da questão e também concordamos que é críptico. Mas olhe que não fomos nós que o tornámos críptico. Na sua simplicidade, nós defendemos o cumprimento do considerando 38.d : “Uma bitola ferroviária diferente da bitola nominal da norma europeia de 1 435 mm dificulta gravemente a interoperabilidade das redes ferroviárias em toda a União e afeta mesmo a competitividade dessas redes ferroviárias isoladas … as novas linhas ferroviárias devem ser exclusivamente construídas com a bitola nominal da norma europeia de 1 435 mm… os Estados‑Membros com uma rede que utiliza uma bitola diferente devem avaliar a migração das linhas existentes dos corredores europeus de transporte.”

Sobre a Finlandia, cujo governo frugal não quer gastar dinheiro com a ferrovia interoperável, registamos que não foi esse o parecer do consultor contratado pelo governo para avaliar a “migração”da rede existente (que evidentemente, como nós, o consultor não recomendou), a ligação de 814 km à fronteira do norte com a Suécia e a ligação de Helsinki a Turku, Tampere e Hamina/Kotka em bitola UIC , estas valorizadas pelo consultor:   Converting Finland’s rail network to standard gauge is not financially viable, study finds | News | Railway Gazette International

E claro que não podíamos deixar de citar os 840 km Rail Baltica em construção até 2030 (Estonia, Letonia e Lituania), e a unanimidade da EU em ter uma ligação UIC à Ucrania.

Tentemos descriptar o artigo 16.a que diz:    linhas novas ainda não autorizadas pelo Estado membro (na anterior proposta da Comissão: “cuja obra não tivesse começado”) devem ser bitola 1435mm.

Reparar na subtil  sageza de quem substituiu “linhas novas cuja obra não tivesse começado” , como é o caso da nova linha Porto-Soure-Carregado, por “linhas novas ainda não autorizadas”, portanto como já não é o caso de Porto-Soure-Carregado, pelo que, como disse a comissária Adina Valean numa primeira resposta a perguntas de eurodeputados portugueses, a linha pode ser construída em ibérica, desde que em 2030 esteja em UIC. Mas essa resposta foi sucedida por outra em que repetindo o objetivo 2030 (que como se sabe do PFN não está programada para 2030 para Carregado-Lisboa como Alta Velocidade), a comissária confirmou a possibilidade de financiamento e a de um pedido de isenção temporária . Caímos assim  no sebastiânico conceito já referido citando o senhor primeiro ministro: “Um dia” (assumindo que nenhum país ou entidade suscite um pedido de infração por  incumprimento artificioso da regulamentação) .

Voltando ao artigo 16.a vejamos os parágrafos 2 e 3:  para a linha nova Lisboa-Porto, como coincide com o traçado de um corredor ferroviário 2 anos depois da entrada em vigor da regulamentação revista (provavelmente 2024), Portugal terá de apresentar uma avaliação da viabilidade da migração para a bitola UIC (2026?). E 1 ano depois dessa data (2027?) terá de ser apresentado um plano de migração (isto é, antes de entrada ao serviço de Porto-Soure). Mais diz o artigo que o plano de migração pode ser chumbado na sequência de uma análise de custos benefícios e  de uma avaliação negativas sobre o impacto na interoperabilidade. Por outras palavras, o PFN criou artificialmente um fator de dificuldade para o plano de migração, remete para a subjetividade das ACB (eu próprio elaborei uma análise de custos benefícios com os pressupostos de crescimento das exportações e comparação entre i) a manutenção da bitola ibérica e das linhas existentes de gradientes elevados com a continuação do predomínio do transporte rodoviário e ii) a transferência para o modo ferroviário beneficiando das novas linhas de bitola 1435mm, tendo concluído por uma taxa positiva de rentabilidade. Admito que mudando os pressupostos possa mudar-se o resultado, por isso será essencial escrutinar-se passo a passo a realização dessa ACB) e remete para a subjetividade da avaliação do impacto na interoperabilidade.    

Em última análise, conforme o artigo, ficaremos dependentes da aprovação ou reprovação do pedido  de isenção por Espanha (temporária sempre, como referido pela comissária, mas sem excluir as “muitas décadas” antes da bitola UIC na ligação à Europa).

Ora, como justificar juridicamente a integração na União Europeia, se a concretização dos requisitos expressos pelo Tribunal de Contas Europeu (ECA - European Court of Auditors) no seu relatório de março de 2023 (criticando violentamente a baixa quota modal do transporte ferroviário de mercadorias (16,8%) e a inexistência de compromissos credíveis dos Estados membros para o seu desenvolvimento) é expulsa para “um dia”?.

Na nossa perspetiva, críptico é um adjetivo benigno para a inconformidade do conflito entre a revisão do art.16.a e os considerandos e os restantes artigos, mas vamos aguardar a conclusão do processo de revisão e aprovação da regulamentação.

 

6 – o argumento dos transbordos de carga –  Provavelmente por não estarem ainda disponíveis os números do INE para 2022, afirma no seu artigo, a propósito das exportações por modos terrestres, que as trocas comerciais com Espanha excedem as da soma Alemanha, França e Itália. Isso é verdade em peso (11,422 milhões de toneladas contra 3,911) mas não em valor (16986 milhões de euros contra 17653). Também em termos de percentagens, a comparação entre as exportações para Espanha e para o resto da EU é, para 2022, em peso, 65,7% (11,422 Mton) contra 34,3% (5,971 Mton), portanto menos do dobro e não mais, enquanto em valor é 39,5% (para Espanha) contra 60,5% (para o resto da EU). Isto é, enquanto ao operador interessa o volume e o peso a transportar, às contas nacionais e aos exportadores interessa o seu valor. Números do INE em jun2023 em   https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&indOcorrCod=0008594&contexto=bd&selTab=tab2

Tem também interesse analisar o que pensam os operadores da rotura de carga nos transbordos. É muito divulgada a opinião da Medway de que os custos do transbordo são residuais. Porém, num seminário da T&N o dr Carlos Vasconcelos confessou que mais de 2 comboios diários seria incomportável. Estamos de acordo, se transferirmos  30% das exportações rodoviárias além Pirineus para a ferrovia teremos cerca de 1,8 milhões de toneladas por ano ou 4 a 5 comboios por dia de 1000 a 1400 toneladas de carga útil. Vai demorar alguns anos a construir o corredor atlântico plenamente interoperável, em Portugal e em Espanha, por isso devíamos começar já. O ministério espanhol nomeou uma comissão para apresentar um programa em outubro de 2023 para o corredor atlântico, devíamos colaborar com essa comissão.

Tentando responder à sua pergunta neste capítulo, pensamos que as exportações além Pirineus não são uma minoria, pelo menos em valor, e que a gestão de uma rede de mercadorias de bitola UIC ligando os portos e as plataformas logísticas nacionais a França, Luxemburgo e Alemanha é compatível com a gestão de uma rede ibérica de operação na península. O exemplo da Medway e da Takargo/Captrain ao adquirirem as Euro 6000, umas de rodados ibéricos e outras de rodados UIC é sintomático. Vem ainda a propósito citar o estudo encomendado pelo corredor RFC4 e muitas vezes citado pelo eng.Carlos Fernandes, embora destacando o mercado ibérico em detrimento do mercado além Pirineus. O referido estudo avalia a redução do custo do transporte de mercadorias na ligação Leixões-Paris em 10% utilizando comboios de 740m, em 7% para a utilização de bitola 1435mm e em 2% para a eletrificação ERTMS e 25 kVAC para cada. Isto é, não desprezável a bitola enquanto componente da interoperabilidade, a qual consideramos um conjunto solidário.

Interessante a análise no seu artigo da utilização de material circulante de eixos variáveis, quer de passageiros, quer de mercadorias, que reputamos também como uma mais valia, mas apenas em situações temporárias ou de grande especificidade, e sempre de transição.

 

7 – o argumento da concorrência –  Julgo que nos devemos felicitar mutuamente por concordarmos. É um argumento fortíssimo, não por motivos ideológicos, mas pragmáticos, não só porque através da procura de menores custos de produção pelos operadores (assumindo não haver práticas de dumping) é possível baixar os preços para os exportadores, como também é possível reduzir os investimentos em material circulante (assumindo que este é normalizado segundo os componentes da interoperabilidade). No entanto, continuamos a pensar que o argumento da concorrência  (evitando-se um excesso de proteção do mercado nacional que só lhe retira competitividade, pelo menos no futuro), se sobrepõe ao argumento da “limitação infinitamente superior gerada pela construção de uma linha isolada em bitola europeia” (a linha Évora-Saia só é indefinidamente isolada porque não se construiu em via dupla, nomeadamente nos viadutos, com possibilidade de construção de raiz de uma das vias em UIC, e porque não se coordenou com Espanha o mesmo procedimento).

De referir, sobre a Arriva, que, quando subsidiária da DB, desistiu do mercado português, mantendo-se apenas na vertente rodoviária como empresa de capitais israelitas. Recordo a propósito a desistência de projetos ferroviários da DB quando os decisores nacionais decidiram desistir do porto de águas profundas da Golada-Bugio. A cultura portuguesa anda alinhada com o NIMBY (not in my backyard), sempre na busca implacável do que possa prejudicar o status quo.

 

8 – conclusão – reitera-se que não pretendemos a “migração” da bitola nas linhas existentes, à exceção da linha em construção Évora-Caia, isto é, tal como determinado na regulamentação comunitária em revisão, apenas pretendemos a “migração” das linhas cujo traçado coincida com o de corredores internacionais.

Não nos é possível subscrever a conclusão de que as linhas novas dos corredores internacionais devam continuar a ser em bitola ibérica. Insistimos no cumprimento da regulamentação europeia com os objetivos das redes interoperáveis, em toda a plenitude dos seus componentes, “core”, “extended core” e “comprehensive”, e na reivindicação junto da Comissão Europeia para dinamização da coordenação com Espanha e França para a máxima aproximação da realidade às datas objetivo.

Discordamos da segregação do tráfego de mercadorias na atual linha do norte, considerando que o material circulante de mercadorias para o tráfego além Pirineus  deveria poder circular pela nova linha Sines-Lisboa-Porto-Leixões-Vigo em bitola UIC, a qual integra a rede TEN-T do regulamento europeu, preferencialmente só após a conclusão da ligação em UIC a Vitoria e Irun.

Reconhecemos o conhecimento fundamentado e a capacidade de análise na elaboração do PFN, mas lamentamos a oportunidade perdida de estruturar a construção das linhas conforme os critérios de interoperabilidade do regulamento europeu, discordando de critérios como o do tronco comum da nova linha Lisboa-Porto em bitola ibérica.

E chamamos a atenção para o que o próprio PFN diz: “A criação de ligações ferroviárias em bitola padrão (1435 mm) teria inegáveis vantagens no transporte de mercadorias internacional de longa distância, contribuindo para melhorar a competitividade das exportações portuguesas…não se coloca no âmbito deste Plano planear essa migração.”  Concordamos com a primeira parte, discordamos de que o plano não planeie a interoperabilidade plena dos corredores internacionais.

 

Em resumo, propomos uma atitude do governo, da IP e dos operadores, mais recetiva aos objetivos da regulamentação europeia, substituindo a preocupação com as exceções, pela preocupação em acelerar, conforme o pedido de Carlo Secchi, o planeamento e o financiamento da rede TEN-T na península ibérica. Que seja possível termos em Portugal e na sua ligação ferroviária à Europa além Pirineus, uma infraestrutura compatível com todos os componentes, sem exceção, da interoperabilidade, não daqui a muitas décadas, mas o mais próximo possível das datas objetivo da regulamentação europeia.

 

 

 

Informação  adicional:

http://fcsseratostenes.blogspot.com/2023/06/debate-na-ordem-dos-engenheiros.html


1 comentário:

  1. Caro Fernando Santos

    Como sempre um excelente trabalho este seu................apenas com um enorme SENÃO , o de nada ter referido sobre os cofinanciamentos disponíveis no programa CEF-2 (2021-2027 ) .
    Portugal, país beneficiário dos Fundos de Coesão tem a obrigação de, no mínimo, proceder à apresentação novamente de um projecto credível como o o do consórcio ELOS, que já fora aprovado e cofinanciado pela Comissão Europeia durante o CEF -1 ( 2014-2020 ) com 600 Milhões € , para o troço Poceirão - Évora - Caia. Um actual deveria ser apresentado já com o seu prolongamento até Lisboa /Sines.
    Deste modo iríamos construir pelo menos uma ligação INTEEROPERÁVEL com a Europa, o denominado Corredor Internacional Sul, em VIA DUPLA, projectado para Alta Velocidade e Tráfego Misto, cumprindo todas as normas europeias definidas no Regulamento 1315/2013, até à data limite de 2030.
    O próximo Call está previsto para este SET 2023 e Portugal, com este novo projecto poderia receber uns 70 % de cofinanciamento europeu, para uma estimativa de custos de uns 2000 Milhões €. Dos 30 % restantes 15 % ( 300 Milhões ) viriam do IVA sobre os materiais, do IRC das empresas e do IRS dos trabalhadores. Os restantes 300 Milhões a suportar pelos Orçamento, distribuído por 6 anos da obra, dariam uns ridículos 50 Milhões / ano,
    CONCLUSÃO : - O NADA FAZER, O ARGUMENTAR CONTRA A BITOLA EUROPEIA, É UM ACTO DE LESA-PÁTRIA.

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