quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Diminuição de passageiros no metro de Lisboa - continuação

Em resposta a um amável comentador ao anterior "post" em
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2012/11/diminuicao-de-passageiros-no-metro-de.html

e por ela conter mais do que os 4096 carateres autorizados pelas caixas de comentários, publico agora o seguinte "post":


Caro comentador JSR

O objetivo do presente  “post” era apenas o de tentar perceber por que diminui o número de passageiros (e a subida de tarifas em Fevereiro e o arrefecimento da economia e o desemprego são já hipóteses plausíveis, independentes da gestão ser privada ou pública), mas, sem a pretensão de chegar a conclusões definitivas e garantidas, porque penso que o assunto é suficientemente complexo e não conhecemos todos os dados nem dominamos as interdependências de todas as variáveis.

Confesso que fico curioso relativamente à garantia que poderá dar sobre  a possibilidade de tornar o metro de Lisboa rentável pela entrega a privados.
Ainda me recordo de ver nos autocarros da Barraqueiro, há uns anos, um aviso: “Sem subsídios não há passe social”.
Isto é, sem indemnizações compensatórias com o dinheiro dos contribuintes não há negócio rentável para o privado.
Julgo que no meu anterior “post”

isto estava analisado.
Poderá não ter sido bem analisado, mas penso que só com base em cálculos se poderá discutir a melhor organização das empresas de transportes, e se os cálculos que apresentei não estão corretos, gostaria de saber onde,  mas com demonstrações, não com afirmações simples.

Não é o facto de uma gestão ser privada ou pública que decide se ela é boa ou má, se corresponde ou não aos interesses da comunidade.
Cada caso e cada circunstancia histórica deve ser, parece-me, analisada para ajustar a linha que separa o “privado” do “público”.
E já existe experiencia acumulada no caso dos transportes.
Thatcher dizia que não queria que os transportes fossem o seu Waterloo, porque as privatizações deram mau resultado.
Houve uma série de acidentes por economia nas manutenções e nas formações, e a principal companhia de manutenção do metro de Londres pura e simplesmente faliu, apesar das vantagens económicas e de adjudicação a membros do consórcio por ajuste direto de grandes fornecimentos.
Igualmente em Paris a RATP conseguiu opor-se à fúria privatizadora e o ultimo caso francês é interessante: a refusão da SNCF e da RFF (as equivalentes à CP e REFER).
Mas continuo a dizer que não é isso que define se as coisas devem ser privadas, publicas ou mistas.
É o conhecimento que se tem das coisas, a experiencia fundamentada e os cálculos incluindo todos os dados e variáveis que traduzem o interesse das comunidades.
Coisa que seguramente, por falta de experiencia e conhecimento direto das matérias, os senhores governantes que estão a decidir as privatizações não têm.

Quanto ao privado tornar o metro rentável, deixe-me recordar-lhe que há já vários anos o metro do Porto tem uma gestão privada da operação e da manutenção. Primeiro a Transdev e, há quase dois anos, da Barraqueiro.
Dívida do metro de Lisboa: 3.900 milhões de euros;
Divida do metro do Porto: 2700 milhões de euros
Prejuízos do metro de Lisboa no 1ºsemestre de 2012:  296,9 milhões de euros
Prejuízos do metro do Porto no 1º semestre de 2012:  247,5 milhões de euros
Passageiros.km transportados em Setembro de 2012 pelo metro de Lisboa: 64,6 milhões de pass.km       
        (-11,6% relativamente a Setembro de 2011)   com uma taxa de ocupação de 30%
Passageiros.km transportados em Setembro de 2012 pelo metro do Porto: 22,7 milhões de pass.km       
        (-5,0% relativamente a Setembro de 2011)    com uma taxa de ocupação de 17,5%
(fonte: INE)
O que agrava os prejuízos são os juros dos empréstimos (ai a semelhança com o país) , e não é a gestão ser privada ou publica que anulará isso (a menos que os bancos credores assumam a gestão dos metros e se perdoem os juros a si próprios; ou que o governo nacionalize a banca e extinga a divida, como preferir, mas não se esqueça que eu só estou a dizer quais são as soluções teóricas, não quero que sejam aplicadas).
Considerando o balanço operacional (resultados de exploração incluindo gastos de pessoal e fornecimentos e serviços externos), mesmo sem os privados, o metro de Lisboa também já obteve o equilíbrio, graças aos cortes ordenados pela tutela, à redução da oferta e à quebra da procura  (redução dos consumos de eenrgia da ordem de 20%, por exemplo).

Enfim, o objetivo do atual governo é privatizar o máximo possível, é a sua ideologia e a sua fé, e não vêem o dia em que os seus queridos consultores consigam terminar o caderno de encargos para a concessão dos transportes de Lisboa. Para obter o apoio popular para isso (na verdade, deveria obter o apoio de 2/3 dos deputados eleitos por partidos que claramente tivessem expressado na campanha eleitoral o que pretendiam privatizar) nada melhor do que desmerecer da gestão pública e difamar a competência técnica dos funcionários das empresas públicas.

Cumprimentos. 

PS 1 em 6 de dezembro - Esqueci-me de mencionar mais dois exemplos de investimento deficitário do Estado gerido por privados: a Fertagus  (a indemnização compensatória por passageiro.km que recebe do Estado é superior à que o metro de Lisboa recebe) e o Metro sul do Tejo.
ATENÇAO que não estou a dizer que são mal geridos. Apenas digo que entregar a um privado não é uma panaceia universal que resolve as coisas por milagre. Provavelmente as pessoas não gostarão, e em certas circunstancias com alguma razão porque devem combater-se as desigualdades, das "regalias" dos trabalhadores das empresas públicas (na verdade, não são regalias, são salários). Mas nestas coisas, eu sempre tentei aplicar o que aprendi na tropa: o que digo para fora do quartel, é que a minha tropa é a melhor do mundo (não no sentido de Vitor Gaspar, obviamente); mas para dentro do quartel, critico ferozmente a minha tropa. Bem vistas as coisas, é tambem o que o treinador Mourinho faz.
PS 2 em 6 de dezembro - Ainda a propósito da diminuição do número de passageiros, comento as afirmações do senhor secretário de Estado Sérgio Monteiro, ver em:

Lisboa, 03 dez (Lusa) - O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, relacionou hoje a perda de passageiros nos transportes públicos com o aumento da fraude e considerou que esta se deve essencialmente a motivos económicos.
"A redução do número de passageiros não significa uma perda. O número de validações é que está a diminuir, mas os transportes estão cheios e existe menos um quarto de automóveis a circular. Não tendo desaparecido as pessoas, nem tendo havido um aumento de automóveis, significa que continuam a andar de transportes", afirmou à Agência Lusa.
Barcos, comboios e metropolitanos de Lisboa e Porto transportaram menos 12,9 milhões de passageiros no terceiro trimestre de 2012, uma quebra que os especialistas justificam com a crise, o desemprego, a subida das tarifas e o fim dos descontos para estudantes.
(fim de citação)

Parece-me forçado estar a atribuir à fraude, se bem entendi o raciocínio, a principal causa da diminuição. É verdade que os comboios estão cheios mas também o intervalo entre comboios ou entre autocarros é grande porque a oferta diminuiu. Uma diminuição no 3º trimestre de 2012 de cerca de 12 milhões de passageiros nos barcos, comboios suburbanos e metros de Lisboa e Porto (total de viagens registadas 75 milhões)  indiciaria uma fraude de cerca de 15%, o que parece não ser confirmado pelas amostragens dos fiscais.
Estará o senhor secretário de Estado a chamar desonestos a mais cidadãos do que aqueles que são fraudulentos. Se cada passageiro fizer em média 2 viagens por dia, aos 12 milhões de viagens por trimestre corresponderão  65.000 pessoas fraudulentas.
O problema nem será o senhor secretário de Estado estar a chamar desonestas às pessoas; será o estar a fazer afirmações sem mostrar dados suficientes, como seja a análise dos fiscais e a repartição das deslocações pelos diferentes modos de transporte , o que só se consegue com a realização de inquéritos de mobilidade (ver em:
Ao longo da minha vida profissional por várias vezes apareciam jovens a fazer afirmações subjetivas. Iamos tentandocorrigir essa forma de abordagem dos problemas, sublinhando que é necessário dispor de dados concretos e tratá-los. Na sua ausência, só se podem colocar hipóteses (proxis, como os senhores economistas gostam de dizer), mas deve sempre tentar-se evitar um excesso de subjetividade como esta, de dizer que a redução do numero de passageiros não significa uma perda (como diz o outro, enterra-se a cabeça na areia para não ver o desastre). Inquéritos fiáveis, aguardam-se. Melhor conhecimento das matérias pelos senhores governantes, não sei se se poderá ter esperança nisso.


2 comentários:

  1. Existem inumeros pontos que não foram focado..Por exemplo, o investimento feito realizado pelo Metropolitano de Lx, que não é suportado pelo estado ou neste caso a CM Lisboa,tanto nas estações e troços como nos arranjos a superfice. É logico q a gasto que não fazem sentido que criam esta divida tão elevada, por exemplo as intervenções de arte nas estações já para não falar nos acabamento e no tamanho das propias estações. O metro tem de ser funcional e servir o passageiro de uma forma simples, crei que o preço até é bastante justo...agora passamos para outro factor...as reformas e as regalias que foram criadas pelo metro....que são os criadores dessas leis e que usufruem delas e todo o rebanho dos anos 80 e 90,não os trabalhadores desta geração...onde maioria dos trabalhadores são contratados e tratados como descartaveis....Este sim são os pontos que levam a este buraco infinito. que não tem luz nem será possivel de tapar neste futuros 50 anos.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Caro comentador

      Ver, por favor, a resposta, por ter mais do que os carateres autorizados, no "post"
      http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2012/12/comentario-em-12-de-dezembro-post.html

      Eliminar