quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Os reformados do metro na manifestação do dia 10 de novembro de 2015



Não decorreu como habitualmente a descida da estação de metropolitano do Rato até à Assembleia da República.
Tanto os grupos de guardas da PSP como da organização da CGTP nos pediram para subirmos para ganharmos a calçada da Estrela.
E assim nos encontrámos um pouco ao lado da escadaria, naquela tarde de sol outonal, separados dos apoiantes do governo em exame.
Reencontro entre bandeiras dos sindicatos e caras amigas no meio da multidão, enquanto uma cabina sonora improvisada passava musicas de intervenção e ia dando conta do andamento da sessão que decorria no Parlamento.
Reencontro um grupo de eletricistas e mecânicos reformados que durante anos e anos asseguraram a disponibilidade das automotoras do metro.
Aos anos que não ouvia a suave e sussurrante canção do sendero... lembro-me quando a ouvi há muitos anos, numa tarde no parque da universidade de Madrid, na escola de telecomunicaciones, num encontro ibérico de muito jovens adultos deslumbrados, com o grupo Nuestro pequeño mundo...
- Lembram-se quando ardeu o comboio entre Arroios e Alameda?
- 25 de maio de... 1976, não foi?
- O convencido do diretor ainda fantasiou que tinha sido encontrada uma lata de combustível com um pano, mas depressa se encontrou a causa. Tinha-se comprado um lote de escovas novas para os motores. Os ensaios tinham sido satisfatórios, mas as escovas fornecidas deixavam a desejar. O cabo mal apertado fez salta a faísca que foi a ignição.
- E quando foi o descarrilamento, mais acima?
- Era verão e estávamos lá ao pé a trabalhar na fossa de Alvalade. Fomos ajudar os passageiros a sair para a galeria. E o Zé Pires - estávamos com aqueles fatos-macaco verdes de tecido rijo - com os movimentos os fatos-macaco tinham aquela coisa, de vez em quando descosiam-se as costuras de cima abaixo, e ele com o fato todo descosido a pedir às senhoras para descerem que ele as segurava...
Duas moças acompanham as canções da cabina sonora, dão o braço, encostam as faces e tiram selfies e deixam-se fotografar. Um pequeno cartaz que seguram diz, eles vão cair (e cairam), PAF, como no Asterix.
De vez em quando é insuportável o barulho.


- Acham que nos vão devolver os complementos de reforma?
- Talvez não, e é preciso uma portaria só para voltar a pagá-los. Talvez apenas reponham, sim, o pagamento, talvez connosco a descontarmos uma TSU...
- Era boa ideia pegar nos dois anos que nos tiraram, vai a quase 26 milhões de euros, e formar com esse dinheiro o arranque, mais um, do plano de pensões.
- Era boa ideia, era, vamos a ver se a comissão a consegue fazer vingar.
As duas moças continuam animadas, de escuro, saias curtas e justas, de botas altas e sorrisos rasgados.
- Estes danados nunca mais se vão embora.
- Está a falar o Portas. Deve estar a meter medo com os mercados (que feio que é estar a meter medo, ameaçar com o inferno quem não pensa da mesma maneira...).
- Que disparate. Os juros subiram ontem mas hoje já baixaram.
(E foi verdade, mais tarde, à noite na TV, Ricardo Pais Mamede explicou que não existe correlação direta entre a discussão do programa do governo e a evolução da Bolsa e dos mercados internacionais. A subida dos juros e a queda da Bolsa no dia 9 deveu-se principalmente ao exame aos bancos, de que parece só a CGD e o BPI se salvaram. E que os juros estão por enquanto garantidos pela política do BCE. Até baixaram mais no dia 10. Parece impossível como os meios de comunicação social querem fazer crer que há essa correlação, embora evidentemente a Bolsa exprima um sentimento, uma espécie de sondagem, uma avaliação das empresas e das suas atividades. E claro que, se num dia as ações baixam, é provável que no dia seguinte subam por ter havido um aumento da sua procura. Outra coisa é uns quantos começarem a querer vender ao mesmo tempo, com o consequente aumento da oferta e diminuição do valor.)
- Esta gente não quer ver que foi a sua arrogância durante 4 anos, a sua insensibilidade, o fazer mal e desculparem-se por quererem ir ainda mais longe do que a troika, a culparem os cidadãos de viverem acima das possibilidades, o serem mentirosos, a impor com visão tubular, de túnel, os critérios neo-liberais de Haiek e Friedman, de acabar com tudo o que seja público. Se ao menos vissem como são fortes os departamentos federais dos Estados Unidos. Olhem, as comunicações por satélite, o Google Earth...
- Paralisaram os investimentos com financiamento comunitário... sem investimento não há PIB que se veja... mentiram quando disseram que o país já tinha gasto demais em infraestruturas, quando há tanto por fazer no transporte ferroviário, de mercadorias e de passageiros, também...
- Posso oferecer-vos estes folhetos da candidatura de Sampaio da Nóvoa?
O seu sotaque é brasileiro, será a candidata a deputada brasileira?
- Também veio de Minas Gerais?
- Não, não, de São Paulo.
- A capital financeira. Prometo que voto Sampaio da Nóvoa na segunda volta.
- Contrariamente ao que os comentadores do Observador e restantes apoiantes do governo da PAF dizem, a reposição das prestações sociais, nem o salário mínimo, não têm grande impacto no equilíbrio orçamental, até porque o dinheiro da Segurança Social não é do Estado, é-lhe confiado para administração.
Mas se de facto a despesa social desequilibrar o orçamento e não se verificar o crescimento esperado, temos por exemplo a taxa Tobin, sobre as transações na Bolsa (não confundir com as taxas sobre as mais valias), o reforço dos fundos comunitários para infraestruturas de interesse público e eficiência energética, imposto extraordinário sobre o diferencial de rentabilidade de 16% real de início e de 3% desejável das PPP, imposto extraordinário sobre o diferencial entre os 100€/MWh recebidos como renda das renováveis e os 50€/MWh desejáveis, imposto extraordinário sobre os reequilíbrios financeiros da energia, imposto sobre heranças...
- O descarrilamento não foi na agulha provisória da Alameda?
- Não, isso foi mais tarde, quando a estação ardeu. Foi ainda nos anos 70, partiu-se o veio do motor e o pinhão de ataque meteu-se debaixo do rodado. Podia ter sido uma grande chatice.
Já se vão notando alguns olhos húmidos de emoção.
A emoção nunca deve sobrepor-se à razão, mas nós, humanos, somos assim, emotivos e sentimentais.
- O Tribunal de Contas devia impor-se agora, obrigar a rever as contas das subconcessões e, se se confirmar o que a malta vem dizendo sem nunca ter sido desmentida, o Tribunal de Contas chumbava mesmo as subconcessões.
É o contrário do que o Sérgio Monteiro diz. Não iria haver poupança para as finanças públicas. Isto não pode ser dividir o metro em metro bom e metro mau e deixar o serviço da dívida, que pode ser mais de 200 milhões de euros por ano, para as contas públicas.
Pelas minhas contas o subconcessionário do metro de Lisboa perde 9 milhões de euros no primeiro ano, números equivalentes às contas de 2014, que depois vai querer recuperar nos anos seguintes, através dos cortes no pessoal, na manutenção e nas circulações. E despedir pessoas é melhorar as contas públicas? Quando vão aumentar os custos do desemprego e diminuir a receita da TSU. Uma análise completa de custos-benefícios que inclua esses custos não dá vantagem às privatizações quando elas despedem pessoas, como se está à espera na CP Carga.
Claro que no metro do Porto não tenho objeções à subconcessão da Transdev, o Estado nunca investiu nos quadros da empresa epelo menos na primeira subconcessão, á Transdev, as coisas não correram mal.
Já a subconcessão dos STCP é contra o interesse público, sem garantias de renovação da frota de acordo com os critérios de otimização energética que passam por exemplo pelos autocarros elétricos.
- Já repararam como "eles" encheram o Diários da República com nomeações dos "boys" dos gabinetes ministeriais em fim de legislatura?
- E como acabaram com o observatório da emigração, que lhes fez um relatório desagradável?
- Não, não são boa gente...
O relógio do anuncio de rua marca 17:55 . A cabina sonora anuncia que a moção de rejeição foi aprovada, sem brancas, até com o voto do PAN.
Rebenta um grito, VITÓRIA.



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