quinta-feira, 12 de novembro de 2015

TAP, 12 de novembro de 2015

Circulou nas redes sociais da internet, em junho de 2015, depois da adjudicação de 61% das ações da TAP ao consórcio Barraqueiro/Neeleman, uma mensagem no facebook: "a minha irmã a vender a TAP".
Referia-se à senhora secretária de Estado das Finanças que presentava o Estado português na cerimónia e revelava o orgulho fraternal.

Hoje, 12 de novembro, a mesma senhora, com dois colegas seus do XX governo, informou que iria ser assinado o contrato e que o consórcio ia antecipar parte do pagamento da capitalização contratual cujo prazo era junho de 2016. Previa-se até esta altura o pagamento pelo consórcio de 270 milhões de euros, além de 4 pagamentos trimestrais de 17 milhões (total: 338 milhões, além dos 10 milhões correspondentes ao preço de venda dos 61%). O pagamento parcial antecipado, a 5 dias, será de 150 milhões e é justificado pela situação premente da tesouraria da TAP.
Estranha-se que só agora este argumento seja invocado, e que não se encontrem outros meios que não a conclusão apressada da privatização para prover a tesouraria.
Na verdade, como também explicaram os comentadores ouvidos, a ideia é dificultar a reversão da privatização (por exemplo, privatizar apenas 49% e não 61%), obrigando eventual novo governo que queira reverter a devolver os 150 milhões.
Mas há mais, como também explicaram os comentadores.
Foi uma forma do Estado (representado pela irmã do seu irmão orgulhoso) dar uma garantia aos bancos  sobre o empréstimo que fizeram ao consórcio. Caso o consórcio não entregue a segunda parte do pagamento (os 120 milhões), o contrato é anulado e o Estado garante a dívida dos 150 milhões (embora a senhora diga que não há garantias, isto é, sobre o mesmo facto há duas interpretações opostas), naturalmente porque retomou a posse dos 61%.
A justificação dos senhores do XX governo para o estado colapsado da tesouraria é principalmente o o prejuízo da greve decretada por sindicatos em oposição á CGTP.
No entanto, as principais razões devem-se à compra (500 milhões de euros) e prejuízos da VEM (anualmente á volta de 30  a 50 milhões; por coincidencia, a VEM faz a manutenção à companhia do senhor Neeleman), e à compra da Portugália (140 milhões ao universo do BES).
E mais uma vez o XX governo invoca as leis da UE para não poder financiar a TAP.
O Tratado da União não proibe, apenas exige uma negociação que normalmente leva a uma reestruturação. Foi por exemplo o caso de sucesso da companhia polaca.
Por outro lado, o Tratado da União permite a injeção de dinheiro público em bancos como o BANIF, em que a participação pública é de 60% e a gestão até é privada (a propósito, o estado holandês injetou há uns anos no ANRO 22 mil milhões de euros).
Mais vale confessar que a contratação do senhor Fernando Pinto se destinou a privatizar a TAP através de medidas que a justificassem.

Porque lamento a privatização da TAP e porque, em consequencia, considero este caso como de gestão danosa?
Porque a TAP, para além de ser a principal empresa exportadora de serviços (caso do turismo) tem natureza estratégica devido á existencia de:
- Madeira e Açores
- comunidades de emigrantes
- ligações a países lusófonos

Qualquer destas condições justifica, à luz do Tratado da UE, tratamento excecional de apoio estatal (tal como o facto dos estaleiros de Viana fabricarem equipamento de defesa militar justificava o apoio estatal , em vez de se negar autorização de compra de materiais para a construção os patrulheiros).
Porém, os senhores do XIX e XX governos não quiseram.
Não quiseram, pronto.
Gostam de favorecer a iniciativa privada.
É a sua opção.
Para mim, apesar da posse pública da TAP (ou, pelo menos de 51%) poder custar dinheiro aos contribuintes (a dívida é de 1000 milhões) a sua privatização retira o poder de decisão pública sobre as três questões estratégicas referidas e portanto será gestão danosa.
Qualquer meio de transporte é um fator de custo para o seu proprietário, a menos que se queira, ou possa, por falta de concorrencia, cobrar ao transportado mais do que o justo valor (atenção a que não me refiro apenas aos custos de tesouraria, mas a todos os custos, incluindo as externalidades, por exemplo das emissões de gases com efeito de estufa, do ruído, dos riscos e das infraestruturas necessárias).

Solução caso se possa reverter a privatização e negociar a reestruturação e financiamento com a UE:
- alienação da VEM
- "spin off" de pessoal para uma agencia turistica a criar
- dispersão de 49% e emissão de obrigações para subscrição pública
- parceria com países lusófonos
- parceria com companhias interessadas num hub no novo aeroporto de Lisboa

PS em 2 de dezembro - Para além da estranha situação aqui descrita de um vendedor servir de fiador ao comprador (embora tenha a possibilidade de não devolver os 150 milhões), verificou-se alguma sintonia com a ANA para o fecho da pista norte-sul para arranjar espaço de estacionamento, para venda a esta dos 22 hectares onde a TAP tem a sede e agora, o code-share com a Azul. Concretiza-se assim a ideia do ministro dos transportes brasileiro, que iriam ter um hub na Europa. Não sei o que dirão os parceiros da TAP na Star Alliance, mas enfim, serão tudo medidas normais no funcionamento do mercado. Do Porto chega a notícia de que a TAP vai reduzir os voos de longo curso no aeroporto Sá Carneiro, confirmando assim que o interesse do acionista privado está acima do interesse público. Entretanto  cresce a ameaça de utilização da base aérea do Montijo para base de low cost  em articulação com o fecho da pista norte-sul da Portela e sua transformação em estacionamento (ameaça porque tudo o que se gastar em soluções intermédias é dinheiro que devia ser utilizado na primeira fase do novo aeroporto)

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