terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Inside job II - Inside job, a verdade da crise

Não é um filme de Michael Moore. É um filme de Charles Ferguson.
É um filme pesado e deprimente. O tema é o mesmo do livro Capital offense, de Michael Hirsh. Como os principais responsáveis pela crise financeira que culminou em Setembro de 2008 com a falencia do Lehman Bros, do Merryl Lynch e da seguradora AIG, continuam em lugares chave a impor as mesmas ideias que conduziram ao desastre.
Este tema deixou de ser uma discussão ideológica. Passou a ser uma descrição de factos e de relações e correlações entre eles.
Mas infelizmente não é uma descrição simples.
Os fenómenos da economia, finanças e política são complexos.
O filme está em exibição em Lisboa. Durante quase duas horas  filme massacra os espetadores com informação sobre o desastre. Ainda não vi comentários nos nossos meios de comunicação social. Possivelmente estão os comentadores prudentemente à espera que as opiniões críticas se polarizem, para não fazerem má figura.
Não é possível seguir ao longo do filme todos os dados e todos os raciocínios.
Vou ter de lá voltar , com uma pequena lanterna e um caderno de apontamentos para tomar notas e pô-las aqui no blogue.Na verdade, parece-me um filme fascinante. Que diz respeito a todos. Que leva a discussão a um nível elevado. Que termina voando à volta da estátua da Liberdade (deixem vir a mim as massas exaustas, pobres e confusas ansiando por respirar liberdade; venham a mim os sem abrigo, os que estão sob a tempestade; eu os guiarei com a minha tocha), com uma mensagem de esperança, apesar de dizer que não é fácil. Que só ouve alguns reponsáveis de segunda linha pela política do desastre porque os responsáveis de primeira linha  recusaram os convites para as entrevistas. Mas os testemunhos apresentados são sufcientes para fazermos um juízo, apesar da dificuldade do tema.
O fime começa com uma pequena reportagem sobre a Islandia: 13 mil milhões de euros de PIB, 320.000 habitantes, 100 mil milhões de euros de dívida pública quando os bancos faliram. Desregulação financeira e privatização dos 3 principais bancos em 2000. Concessões de empréstimos para além das capacidades de pagamento dos devedores. Notações de rating e relatórios altamente favoráveis 2 meses antes da falencia, elaborados por professores universitários de economia altamente cotados, pagos pela câmara de comércio islandesa. Nunca acreditem em professores universitários de economia pagos por gestores. O exemplo da Islandia é apresentado como demonstração laboratorial de que a desregulação e a privatização das principais instituições financeiras (deixem o mercado funcionar, não é o que dizem os professores universitários de economia com mais prestígio?) conduz à falencia, ao aumento da desigualdade de rendimentos e à recessão.  Se já tinha sido assim em 1929, por que haveria agora de ser diferente? as leis da física ter-se-iam alterado?
Refiro as leis da física porque nada podemos criar dentro de um sistema conservativo como é o mundo da economia, e o que este monumental esquema de D.Branca/Ponzi supunha era que o dinheiro nascesse do nada.
Da análise do caso islandês o filme salta para o caso norte americano, mostrando como os responsáveis da reserva federal se opuseram sempre ao reforço da regulação para evitar os COS e os CDS, e  para limitar os indices de "leverage" (alavancagem - relação entre o montante emprestado e os capitais próprios) e os recurso aos "derivativos" (o que serão derivativos no mundo físico?).
Não se admirem de não saber o que são os COS (collateralized obligations  ou títulos de dívida ou hipoteca transacionável, normalmente vendidos a investidores enganados) e os CDS (credit default swap, ou seguros dos COS).
George Soros, entrevistado no fime, diz que é da velha escola e também não sabia o que eram.
A ciência económica criou assim monstrozinhos que rapidamente cresceram até rebentar com o negócio. Mas não rebentaram com o sistema porque Larry Summers e Tin Geithner, que impediram a regulação no tempo de Bush, estão agora no governo de Obama. Porque Bernanke mantem na Reserva Federal as ideias de desregulação de Greenspan. Porque os professores de Harvard continuam a vender as mesmas ideias neo liberais. Desconfiem dos professores universitários de economia muito prestigiados. Nos USA, 1% de cidadãos retêm 23% do rendimento total. O numero d ehoras trabalhadas vem subindo e o poder de compra diminuindo.
O grande mérito do filme é revelar que antes da crise rebentar, houve quem chamasse a atenção do governo americano e da reserva federal para os riscos que se corriam. Por exemplo, a ministra das finanças de França, na reunião de Fevereiro de 2008 do G7, pediu garantias a Hank Paulsen, o homem da Goldman Sachs no governo de Bush, e este disse que estava tudo controlado.  Não estava, e em Setembro do mesmo ano extorquiu 700 mil milhões de dólares aos contribuintes para salvar os banqueiros fraudulentos e os seus negócios .
Raghuran Rajan , professor de economia (mas tambem engenheiro eletrotécnico), ex-economista chefe do FMI, publicou um trabalho em 2005 afirmando que a desregulação conduziria à crise. O depoimento de Strauss Kahn, diretor do FMI, tambem não é abonatório para os desreguladores (talvez que o FMI não ande tão neo liberal como iss, nos dias que correm, talvez não obrigue a privatizar serviços públicos).
No filme, o responsável pela agencia chinesa de regulação interroga-se: por que há-de um "engenheiro" financeiro das grandes firmas americanas ganhar entre 4 a 100 vezes mais do que um engenheiro que faz pontes?
Não percam o filme, mas levem uma lanterninha e um caderno de apontamentos.
Distrai dos nossos problemas internos.
Como disse acima, um filme fascinante, sobre um tema que já não é ideológico. É sobre factos.

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