Devo declarar desde já que considero a iniciativa Lisbon Mobi
summit meritória.
O facto de ser utilizada para lançar ou tentar alargar uma série
de iniciativas empresariais náo lhe retira mérito.
Mas infelizmente torna-se repetitivo e monótono ouvir falar tanto
de start-ups, disrupções, automóveis partilhados, conetados, autónomos,
conceito de propriedade substituido pelo de partilha, conceito da posse do meio
de mobilidade substituido por conceito de serviço de mobilidade, triunfo em
toda a linha das app e dos smartphones concentrando todos os meios de
transporte possíveis e imagináveis, partilhados, públicos, privados. Tudo na
caixinha milagrosa do smartphone, ligado aos satélites pelo GPS e pelo GNSS,
desde que uma agressão do país mãe do sistema global de navegação a um pobre
país doutro hemisfério não desligue os satélites para uso civil (mais uma
esperança na UE, que o seu sistema Galileo seja independente das coisas
bélicas).
Não digo que estas maravilhas não sejam devidamente aproveitadas,
mas estou com o sr ministro do ambiente quando diz que a prioridade deve ser o
transporte público. Claro que já não estou com ele quando diz que a linha
circular do metro é a melhor opção. Infelizmente náo reconheço ao senhor
ministro experiencia profissional suficiente para dizer uma coisa dessas.
De modo que resolvi aproveitar o fim do colóquio no dia 14 de
setembro para testar a ligação Belem-Alvalade. Em vez de apanhar o elétrico
15-E em Belem para o Cais do Sodré, onde embarcaria no metro, apanhei em Belem,
frente ao palácio presidencial e no meio de turistas franceses, espanhois,
alemães, japoneses e portugueses e de alguns, poucos, lisboetas, o autocarro 27
(ou 727, como a Carris gosta) .
Às 18.25 na paragem, 10 minutos de espera, chegada à avenida de
Roma às 19.45 .
É verdade que era 6ªfeira, segundo dia de algumas aulas, estava um sol
magnifico e o ar condicionado do autocarro funcionava. Também é verdade que ia
cheio, que os solavancos tornavam a viagem penosa, indigna de uma sociedade bem
organizada. A incomodidade também de mede e se contabliza, mas poupemos o cálculo.
Senti-me um pouco perturbado quando uma bonita adolescente achou
que me devia ceder o lugar dada a minha condição de idoso. Felizmente, mesmo ao
lado, no corredor da parte de trás do autocarro estava uma também bonita
turista francesa a quem, por minha vez, cedi o lugar, insistindo porque ela não
queria, batendo eu no meu peito por cima do lugar do coração.
Esplanadas cheias, por nacionais e estrangeiros, de todas as
idades, ao longo da rua da Junqueira. O triunfo da economia do ócio, uma aliança das reduções do desemprego e do nível salarial.
De assinalar os tempos de demora na travessia de Alcantara e Rato.
No banco atrás do meu, uma senhora jovem, ansiosamente no telemóvel dizia para
o seu interlocutor se sair agora em Alcantara talvez apanhe o comboio da 18:56,
senão é mais meia hora. Apanho-te em Entrecampos. E assim foi, a senhora saiu
lesta em frente do Palacio de Alcantara e lá foi a correr para Alcantara-Terra.
Que não pode servir como uma linha de metro porque é via unica, um comboio que
seja expedido precisa de 6 minutos para chegar a Campolide e libertar o
itinerário para outro que faça Campolide-Alcantara, que por sua vez imporá mais
6 minutos de espera ao que queira sair de Alcantara Terra. Contar ainda com a
almofada de segurança para a comprovação das condições de segurança e para as
flutuações das perturbações de horário, 15 minutos de intervalo entre comboios.
Na rua de S.Bento, as pessoas entravam pela porta da frente e pela
porta de trás, com a maior naturalidade.
Curiosamente, a ocupação do autocarro serenou no Rato e no Marquês
de Pombal, obviamente dada a existencia de estações do metro.
Apesar da cor e movimento do espetáculo através das janelas do
autocarro, resolvi entreter-me com umas contas, que completei depois em casa.
Temos 10 km e 1hora e 10 minutos de percurso, o que dá aproximadamente uma velocidade de 9,4 km/h .
Temos 10 km e 1hora e 10 minutos de percurso, o que dá aproximadamente uma velocidade de 9,4 km/h .
Evidentemente, enquanto as estreitas ruas forem de sentido duplo e
partilháveis com o automóvel privado, será muito dificil melhorar. E não serão
autocarros novos que o poderão fazer.
Admitindo que 3000 pessoas por dia fazem o percurso (intervalos de
15 minutos na hora de ponta, contando com 80 passageiros por autocarro que se vão renovando teremos
320 passageiros/h de ponta e por sentido, ou 3200 por dia num sentido ou 6400
nos dois sentidos).
Vamos aumentar a velocidade para 14 km/h . Teremos um percurso em
cerca de 42 minutos.
Mas comparemos com o tempo de percurso no metropolitano, no traçado do plano de 1974 para expansão a Alcantara e agora proposto, quando se fala na linha circular, prolongar a Algés. Velocidade comercial, alargando as inter-estações para 900 metros, como mandam os bons procedimentos, 30 km/h : cerca de 20 minutos. Diferencial: 22 minutos .
Quanto ganha um cidadão, quanto vale o seu tempo? Admitamos
salário médio de 900€ e 150 horas mensais. Dá 6€/hora ou 0,1 €/minuto.
6400 pessoas por dia são cerca de 2,1 milhóes por ano. Que perdem
por ano 2,1M x 22min=46,2 M minutos. Ou 46,2M x 0,1€ = 4,6 milhões de euros por
ano.
Ou seja, o facto de não haver uma linha de metro no prolongamento da linha vermelha ou da linha amarela para Alcantara e Algés (o elevado interesse de atração de turistas que a linha teria, especialmente se tivesse uma estação próxima do museu de arte antiga...é verdade que o ameaçado de se tornar rodoviário, o suburbano de Cascais, passa próximo, mas a sua vocação é isso mesmo, suburbano, não urbano...) traduz-se por um prejuízo, para os cidadãos, de cerca de 4,6 milhões de euros por ano.
Para um rendimento de 2% teriamos a justificação de um
investimento de 230 milhões de euros.
Ah, mas falta calcular as emissões.
Considerando o consumo específico por passageiro-km por comboio e por autocarro, em energia primária, considerando as perdas desde a origem e os complementos dos operadores, e aproveitando para citar o meu livrinho "Manual condensado de transportes metropolitanos"
(ver pág.41 em https://1drv.ms/b/s!Al9_rthOlbwehWMdmBJ_Q06Wk7XH )
tomo:
155 Wh/pass-km para a ferrovia (61Wh/pass-km no veículo)
690 Wh/pass-km para a rodovia (199 Wh/pass-km no veiculo)
Ou seja, um diferencial de cerca de 500 Wh/pass-km .
Ora, admitindo um percurso médio de 4 km por passageiro, teremos 2,1M x 4 ~ 8 milhões de passageiros-km por ano.
Ou 8M pass-km x 0,5kWh = 4 GWh/ano de energia desperdiçada por ano na linha Belém-Alvalade. Ou 0,2M€/ano se contabilizarmos o kWh a 5 centimos.
Admitindo uma taxa de emissóes de 300 g/kWh para o modo elétrico e 900 g/kWh para o modo rodoviário (50l/100km), teremos um diferencial de 600 g/kWh.
Ou 4M kWh x 600g/kWh = 2400 ton CO2/ano evitáveis. Fazendo a tonelada de CO2 a 30€, para incluir os custos da poluição e das alterações climáticas, teremos um diferencial
2400 x 30 = 72000 €/ano.
Em resumo, a linha de autocarros Belém-Alvalade tem como custos adicionais relativamente à linha de metro:
4,6 M€ de tempo perdido
0,2 M€ de energia
0,07 M€ de poluição e alterações climáticas
total: 4,9 M€/ano
Esta análise de custos-benefícios (ACB) estará razoavelmente tosca e a precisar de correção, evidentemenete bem-vinda, mas o leitor interessado poderá encontrar os procedimentos mais indicados para uma boa ACB no documento da Comissão Europeia para orientação na análise de investimentos financiáveis em
http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docgener/studies/pdf/cba_guide.pdf
Nele se indicam, entre outros, os procedimentos para valoração das externalidades negativas da sinistralidade, das emissões poluentes, das emissões com efeitos nas alterações climáticas, do ruído e dos custos de construção, operação e manutenção das infraestruturas.
Mais informação sobre o plano de expansão do metro e a linha circular em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2018/01/ultima-tentativa-ultima-chamada-da.html
É verdade que o investimento na linha de metro é superior, da ordem de 60 M€/km (600 M€ mas só falta construir 5 km) , mas também é verdade que ao investimento se pode, contabilisticamente, retirar o valor residual, ou valor do ativo, o que reduziria o investimento nos 5 km que faltam para cerca de 270 milhões de euros.
Ou isso, ou continuar a deitar fora todos os anos 4,9 milhões de euros só na ligação Belém-Alvalade. Pode ser que se um decisor fizer a viagem se resolva a autorizar a candidatura a fundos comunitários.
Esta análise de custos-benefícios (ACB) estará razoavelmente tosca e a precisar de correção, evidentemenete bem-vinda, mas o leitor interessado poderá encontrar os procedimentos mais indicados para uma boa ACB no documento da Comissão Europeia para orientação na análise de investimentos financiáveis em
http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docgener/studies/pdf/cba_guide.pdf
Nele se indicam, entre outros, os procedimentos para valoração das externalidades negativas da sinistralidade, das emissões poluentes, das emissões com efeitos nas alterações climáticas, do ruído e dos custos de construção, operação e manutenção das infraestruturas.
Mais informação sobre o plano de expansão do metro e a linha circular em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2018/01/ultima-tentativa-ultima-chamada-da.html