domingo, 31 de janeiro de 2016

Um beijo para Taubira

A ministra francesa da justiça demitiu-se.
Não suportou mais a incompreensão perante a diferença.
Já passaram mais de 200 anos sobre a revolução francesa, liberdade - igualdade -fraternidade.
E ainda andamos com leis que discriminam, como por exemplo limitar a liberdade de vestir e punir crimes consoante as nacionalidades (no caso que foi a gota de água, a privação de uma de duas nacionalidades).
Por isso, sempre na esperança que, mais século menos século, a incompreensão acabe, um beijo para Taubira.

com a devida vénia ao DN

sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Alteração da 2ª circular, o debate

.Foi prolongado o período de discussão pública do projeto de intervenção da câmara municipal na 2ªcircular, assunto já tratado em
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/01/a-intervencao-municipal-na-segunda.html

Duvido que a maior parte das objeções seja acolhida pelos decisores, pelo menos a principal, de que o plano deveria ser rejeitado, ou pelo menos reduzido substancialmente o montante da obra, considerando as condições económicas e financeiras do país.

Mas é sempre bom debater as coisas, dar visibilidade a consultas públicas, tantas vezes escondidas.
Transcrevo a segunda contribuição enviada à CML:

Resumo do meu parecer: Considerando a situação financeira do país e o que parece um orçamento otimista para as ações anunciadas, julgo que a intervenção na 2ªcircular deveria ser reduzida ao mínimo: 1- abdicar do alargamento do separador central, mantendo a largura de 3,40m da via direita, com plantação de árvores apenas nas margens; 2 - renovar o pavimento e a drenagem apenas onde estiverem degradados; 3 - substituição da iluminação por mais eficiente; 4 - abdicar da ligação direta viaduto do Campo Grande-A.Padre Cruz e do novo viaduto de acesso sobre esta (sentidoA1-IC19) ; 5 - limitar a instalação de barreiras acústicas; 6 - instalar radares para 60kmh nas vias central e esquerda e para 30km/h nas zonas de aproximação e de entrecruzamentos; 7 - inscrever nos pavimentos as marcas de distância de segurança entre veículos e providenciar a fiscalização aleatória e por amostragem pela polícia do  cumprimento da distância entre veículos (art.18º) e da abstenção de mudança de via exceto em caso de saída da artéria (art.15º); 8 - estender às artérias para onde será transferido tráfego as mesmas medidas de controle e fiscalização;  9 - divulgar amplamente e com antecedência os estudos  integrados da problemática geral dos transportes, individual e coletivo, na área metropolitana de Lisboa, incluindo a 2ªcircular e as principais artérias e as redes de transporte ferroviário e rodoviário

Comentários:

1 - O que escrevo não pretende menosprezar a valia técnica dos autores do projeto da Câmara, em todas as suas especialidades, mas considero relevantes as divergências.
 2 - Aplaude-se a proposta de melhoria da eficiência da iluminação da 2ªcircular com recurso a leds. Igualmente se aplaude a redução da velocidade máxima autorizada.
3 - Duvida-se com fundamento na experiência, que o orçamento apresentado de 10 milhões de euros mais IVA seja suficiente para o programa apresentado. Considerando a necessidade de trabalho noturno e o prazo apertado de 11 meses,  provavelmente o concurso será ganho por um empreiteiro que apresentará um preço otimista e depois verificará não poder cumprir o programa. Provavelmente o custo real do programa será de 20 milhões de euros e a execução de 2 anos. Sublinha-se o elevado risco dos trabalhos noturnos devido à velocidade de alguns automobilistas.
4 - Considerando o anterior, propõe-se uma redução substancial do programa à melhoria da eficiência energética, à reparação localizada de pavimentos e circuitos de drenagem quando degradados e à colocação de barreiras acústicas e à arborização em zonas restritas, prescindindo da obra do separador central e do fecho ou abertura de acessos. Sublinho os custos e os riscos elevados da manutenção da vegetação do separador central previsto. Anoto a pouca altura do lancil  previsto para o separador central, sem capacidade de evitar o galgamento e o escorrimento de lama para as vias.
5 - Anoto as precárias condições do estudo de tráfego, não atualizado, uma vez que foi afirmado que foi realizado no pressuposto da da velocidade máxima a 50km/h e que a redução a 60km/h conduziria a uma redução de tráfego de 10% em vez de cerca de 20%. No entanto não são mostrados elementos que levem a essa conclusão. Igualmente se desejaria que fosse mostrado o diagrama de cargas da 2ªcircular por troços e não apenas por pares origem-destino.  Desejar-se-ia ainda que fosse garantido o aumento de fluidez, nomeadamente pela garantia de separação entre veículos (art.18º do código da estrada), preferencialmente equivalente a 2 segundos (44m a 80km/h; 33m  a 60km/h) e a interdição de mudança de via (art.15º do código da estrada), exceto para entrada ou saída na 2ªcircular. Anoto que nem na documentação divulgada nem nas sessões públicas de apresentação das intervenções foram identificadas (para além dos entrecruzamentos) as principais causas da falta de fluidez do tráfego: a distância entre veículos inferior ao tempo de reação médio (induzindo travagens no sentido contrário ao deslocamento de taxas de desaceleração sucessivamente mais altas até ao repouso) e mudanças de via desnecessárias (isto é, que não se destinam à saída da 2ªcircular). Anoto ainda a ausência de indicação das medidas de controle da velocidade (radares e identificação e envio da autuação automáticas) e fiscalização aleatória e por amostragem da interdição da mudança de via (por brigadas da polícia).
6 - Chamo a atenção para a atual saturação nas horas de ponta das avenidas marechal Spínola e EUA, dada a sua ligação ao eixo N-S, e dos nós de Odivelas da CRIL e do entroncamento norte do eixo N-S,  que se agravará se houver transferência de tráfego da 2ªcircular. Por mais desagradável que seja, nomeadamente por não haver dinheiro para a construção de passagens desniveladas no "miolo" da cidade, artérias como a 1ªcircular (A.Ceuta-Av.Berna-Olaias-PçPaiva Couceiro-Santos o Novo), as avenidas EUA-Spínola continuarão a ser artérias de atravessamento, mesmo com o desenvolvimento das redes de transporte coletivo (se a economia estiver a funcionar, a melhoria da rede de transporte coletivo diminui numa primeura fase o tráfego do transporte individual o que aumenta a atratividade que por sua vez aumenta a procura). O exagerado peso do tráfego de atravessamento é consequência da urbanização e organização territorial distorcidas em toda a área metropolitana associada à desertificação da cidade de Lisboa (quase 500 mil habitantes ...), pelo que intervenções de vulto em qualquer artéria principal deverão ser estudadas simultaneamente com a problemática dos transportes e da organização territorial de toda a área metropolitana, sendo certo que o país não tem dinheiro para continuar a desperdiçar com a utilização intensiva do transporte individual. Por isso se desejaria a participação da CML em estudos alargados sobre estas problemáticas, sugerindo-se especial atenção para o projeto de parques de estacionamento à entrada da cidade servidos por linhas do metro (sempre que possível em viaduto ou à superfície em sítio vedado, por razões de economia construtiva), estabelecimento de portagens nos acessos ao centro da cidade e fiscalização mais rigorosa dos estacionamentos, nomeadamente em cima de passeios.
7 - Relativamente ao projetado novo acesso do Campo Grande/Churrasqueira para a 2ªcircular em novo viaduto e da ligação direta à Av.Padre cruz (sentido A1-IC19) em talude reforçado, julgo de evitar qualquer destas medidas atendendo aos custos e ao perfil desfavorável desta última ligação, com rampa de elevada inclinação que deverá garantir pelo menos 5m de altura livre (autocarros de turismo)  e curvas verticais reduzindo a visibilidade (impondo portanto limitação a 30 km/h). Trata-se de uma intervenção cara, com a agravante da destruição do antigo parque de estacionamento cuja área poderia ser aproveitada para uma futura estação de metro de superfície/sobre-elevado, de ligação por exemplo ao aeroporto, av.Santos e Castro, zona terciária do aeroporto e zona secundária do Prior Velho. A eliminação do loop de saída da 2ªcircular para a Av.Padre Cruz, sentido para o Canpo Grande implicará a autorização, ao nível do Campo Grande, de virar à esquerda em frente da Churrasqueira ou, preferencialmente, tornar sentido único o conjunto de ruas Ator António Silva - Cipriano Dourado (sentido contrário aos ponteiros do relógio)
8 – Relativamente à eliminação do acesso da Av.condes de Carnide, dada a ligação desta ao nó do IC16 e aos valores não desprezáveis do tráfego (220 veiculos na hora de ponta e mais de 100 em horas de vazio) não me parece acertada a referida eliminação, pese embora a conveniência de reduzir a interferência com as saídas para a estrada de Benfica  
9 - Finalmente, considerando anteriores intervenções da CML e a inutilidade das contribuições que apresentei, aproveito a ocasião para apelar à CML para alterar os seus processos de decisão e elaboração dos projetos, submetendo-os atempadamente a discussão pública divulgada e participativa. Cito os seguintes exemplos: 1- túnel do Marquês - iniciada a construção sem estudo de impacto ambiental, sem estudo de alternativa de traçado para comparação de custos e benefícios e com elementos errados referentes à galeria do metro; 2 - passeio da av.Liberdade fronteiro ao edifício do DN - recusada a sugestão de modelação de terreno para plantação de árvores de médio porte; 3 - praça de Alvalade - recusada a manutenção das laranjeiras, substituidas por lajes de pedra nua; 4 - Av.Rio de Janeiro - eliminação de uma via na ligação à av.EUA (sentido Av.Gago Coutinho - Entrecampos) e eliminação dos refúgios de paragem dos autocarros obrigando-os a estacionar na via de rodagem


quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Abelhas na cidade





Abelhas urbanas em fundo de estrelícia, resistindo aos pesticidas e às vespas asiáticas, amparadas pelos humanos, que aliás se deliciam com o mel. Pode parecer um exagero dizê-lo, mas será mais um fator da desertificação do interior do país, por falta de estratégia adequada. De salientar a preparação dos bombeiros para atacar os ninhos de vespa asiática, mas isso não é prevenção, que é o que combate com mais eficácia uma epidemia.


terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Conto fantástico, o petróleo, ou um dia na vida de João

dedicado aos economistas que no Eurogrupo e nos governos dos bancos centrais, sem um mandato expresso eleitoralmente, desenvolvem políticas deflacionárias, aos políticos e às administrações que nas instâncias internacionais controladoras do preço do petróleo comprimem artificialmente o seu preço, e aos que  nas universidades teorizam sobre essas políticas, todos hipocritamente apregoando as vantagens dos preços baixos, mas desprezando na realidade o interesse e o bem estar das populações                   




João, contrariamente ao habitual, passara o fim de semana em casa.
Divertiu-se quando encontrou no sótão uma coleção de revistas de 20 anos atrás.
Um dos artigos mostrava as preocupações sobre a evolução do preço do petróleo, que ameaçava baixar todos os indicadores das bolsas.
Que os governos responsáveis tomariam medidas se a cotação do petróleo continuasse a diminuir e atingisse os 20 dólares por barril.
Apenas 8 anos depois da crise financeira internacional de 2007-2008 era a descida do preço do crude que ameaçava a economia, ainda não completamente refeita, especialmente na Europa.
João recordou o ambiente internacional tenso de então, com guerras e terrorismo em demasiadas zonas estratégicas, sempre com a problemática do petróleo por trás.
Na segunda feira, João passou pelo posto de combustível antes de seguir para o trabalho, numa empresa de transportes coletivos da sua área metropolitana.
Apesar dos esforços dos movimentos ambientalistas, de alguns governos e dos fabricantes de automóveis e dos progressos na motorização elétrica e a partir do hidrogénio, a motorização térmica com combustíveis fósseis era ainda a preferida, dada a sua maior densidade energética, conforme as leis da mecânica quântica mostravam.
João encheu o depósito e recebeu do robô do posto o talão e 20 euros, pensando de si para consigo que a gasolina tinha aumentado mais do que pensava. Ainda na quinzena anterior (o rendimento dos motores térmicos era agora perto de 60%, pelo que a ida às bombas era menos frequente) tinha recebido apenas 15 euros pelo depósito cheio. Provavelmente o governo tinha aumentado o seu imposto injetando 5 euros.
Um aumento brutal, mas despreocupadamente seguiu o seu caminho, autojustificando a utilização de automóvel privado apesar de trabalhar numa empresa de transportes coletivos, com a persistente inexistência da linha circular de metro.
João tomou o seu pequeno almoço na cafetaria da empresa, a preços especiais; recebeu do robô do balcão 1 euro por ele, enquanto observava com inocente prazer os movimentos com que a eletricista da assistência externa executava as tarefas de rotina de manutenção do robô. Dava-se a coincidência dela ter sido estagiária numa das oficinas do serviço de João e ter deixado ótima impressão, não só pelas suas habilitações como pela disponibilidade para a resolução dos problemas.
O trabalho de  João era interessante e abrangente, obrigando ao constante controle de qualidade do serviço prestado e acompanhando a evolução da procura em toda a área metropolitana.
A descida contínua do preço do petróleo nos últimos anos tinha alterado totalmente a problemática dos transportes coletivos. A empresa conseguia pagar a todos os seus passageiros valores razoáveis por passageiro.km . Os fornecedores da empresa, nomeadamente a elétrica regional, pagavam regularmente e satisfatoriamente os fornecimentos necessários ao serviço de transporte.
Os receios de há 20 anos tinham-se concretizado numa descida para além do limite de 20 dólares por barril, continuando até aos 10 dólares, apesar dos esforços de grandes companhias que chegaram a manter uma centena de grandes petroleiros pós Panamá, completamente carregados, esperando vãmente nos oceanos que o preço voltasse a subir.
Mas não. Foi então que os principais governos e os produtores de petróleo reuniram uma cimeira que, surpreendentemente, proibiu o fabrico, a comercialização e a utilização de qualquer tipo de armamento fora do controle da ONU e, por proposta de um economista português da muito cotada top business school da universidade católica de Lisboa, que apresentou um estudo académico exaustivo para a fundamentar sem contestação, decretou um intervalo variável de preços negativos do petróleo à saída do poço.
A partir de então, os produtores de crude pagavam aos transportadores  e às refinarias o preço internacionalmente estabelecido do petróleo que extraíam,  que por sua vez entregavam às distribuidoras o petróleo e os outros refinados, juntamente com o valor acrescentado. Era parte deste dinheiro que os automobilistas recebiam quando enchiam os seus depósitos nos postos de combustível.
O sistema funcionava sem problemas, tal como os investidores se tinham habituado a pagar pelos seus investimentos em vez de receber juros,
  com uma continuada deflação, não só porque a guerra do petróleo tinha cessado nas respetivas áreas estratégicas, mas também porque se tinham encontrado formas de extração por fratura hidráulica sem contaminação dos aquíferos e sem provocar terramotos, e de extração das areias betuminosas sem poluição de partículas, óxidos de azoto e dióxido de carbono. O predomínio das energias limpas e renováveis na produção de energia primária estava assim adiado.
Além disso, os fabricantes de equipamentos pesados para a extração do petróleo cumpriam religiosamente os seus contratos, entregando dentro dos prazos o equipamento e o dinheiro do valor correspondente, proveniente maioritariamente dos seus funcionários e dos fornecedores de robôs e dos outros fatores de produção.
Todos os economistas e académicos tiveram de se reciclar para compreenderem que ao longo dos anos o preço do petróleo sempre tinha sido enganador, uma vez que dado o seu papel central na economia, os seus custos espalharam-se lentamente e consistentemente por todos os produtos da economia.
Sendo assim, a tendência universal para redução dos custos de produção através do recurso massivo a robôs e sucessivas taxas crescentes de deflação levaram a um efeito multiplicador da redução do custo do petróleo, que por sua vez só poderia prosseguir através de valores negativos dos preços do próprio petróleo.

Ao fim do dia de trabalho João verificou o que tinha recebido e concluiu que tudo estava bem porque era mais do que suficiente para entregar ao robô de controle da empresa para crédito desta. Se o resto do mês corresse bem poderia destinar as sobras para o pequeno gabinete de engenharia com que de vez em quando colaborava e o restante seria para a simpática inquilina da casinha que tinha herdado já arrendada. A continuar assim poderia escolher ainda nesse ano a agência de viagens que mais lhe oferecesse por um programa de férias no estrangeiro ou, até, escolher a marca do novo carro que mais dinheiro oferecesse com o carro.
Calmamente passou pelo supermercado para recolher as compras que a mulher lhe tinha pedido para o jantar, e achou que, graças à campanha de promoções da semana, o dinheiro que recebeu do robô do supermercado com as compras foi razoável , embora tivesse de lá deixar 1 euro correspondente ao vale de pontos que a mulher andava a juntar para ter mais um pirex.
De facto, os produtores de leite e de carne de porco cada vez ofereciam mais dinheiro para os supermercados lhes ficarem com os produtos, para que os seus funcionários pudessem depois receber dinheiro quando fizessem compras no supermercado, dinheiro esse que depois iria para os produtores, que depois iria para os supermercados, que depois iria para os compradores como o João... e assim sucessivamente.

domingo, 24 de janeiro de 2016

TAP, janeiro de 2016, continuação

Depois do relatado em
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/01/atualidade-no-nosso-mundo-dos.html

continuamos a assistir, por um lado, às negociações entre o XXI governo e os detentores atuais de 61% do capital da empresa para retoma de 51%, e por outro lado, à campanha publicitária do sr Neeleman com as suas ideias inovadoras, as quais não impediram 60 milhões de euros de prejuízo da Azul até setembro em 2015 (ou talvez et pour cause, venham a impedir prejuízos da Azul em 2016).
Parece que já vamos ter aviões da Azul na Portela (confirmando a esperança do ministro brasileiro do Ar quando ainda pensava que podia financiar a compra dos 61% da TAP);
que há rotas a abandonar pela TAP (como é que um presidente tão bom como Fernando Pinto se lembra de rotas que 1 ano depois vem dizer que não são rentáveis? ah, se fosse um gestor público, o que as caixas de comentários na internet não diriam...);
que há outras que vai ter, mas há desistência de rotas no aeroporto Sá Carneiro;
que 2 aviões A330 vêm da Azul, em leasing, reforçar a TAP, ou a Portugália em mudança de nome, não sei bem, e que vamos ter bilhetes baratissimos Liboa-Porto, insistindo na menor eficiência energética relativamente ao transporte ferroviário e consequente desperdício na importação de combustível fóssil (e depois queixar-se-ão da subida do imposto sobre os petrolíferos)

En resumo, a TAP, que não podia ser gerida por gestores públicos e técnicos competentes, pode integrar-se num grupo aéreo que já apresenta prejuízos antes da privatização da TAP, sendo o Estado português avalista.
Excelente, muito excelente negócio do XIX governo e do seu jovem secretário de Estado dos transportes.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Meditação sobre as crianças de Bombaim, União Indiana



Com a devida vénia ao DN, reproduzo a fotografia de um grupo de crianças em Bombaim.
Parece daquelas fotos que são premiadas internacionalmente.
São crianças pobres com a atenção concentrada num smartphone.
A mim sugere-me a desigualdade no tratamento das crianças, que ameaça eternizar a desigualdade entre os adultos e entre as nações.
Vejo nos olhares e nas atitudes destas crianças curiosidade e inteligência.
Nada devia impedir o seu desenvolvimento pleno.
Talvez algumas tenham sucesso, apenas algumas porque as condições adversas afetam o desenvolvimento das crianças em todas as suas componentes.
O seu país, um grande e produtivo país, continuará com indicadores de subdesenvolvimento. Continuará a viver abaixo das suas potencialidades.
Os decisores por todo o mundo continuarão com as suas políticas, enganando os eleitores com ilusões de progresso, que agora se vive melhor (pudera, com os avanços tecnológicos claro que tem de se viver melhor) e os economistas académicos continuarão servilmente a justificar as suas políticas (claro, no interesse próprio).
Tento imaginar, mas pouco entendo de sociologia, humana e animal, se nas outras espécies existe o mesmo grau de falta de solidariedade entre indivíduos, se a parte mais saudável, com mais poder físico, com mais capacidade de luta pela sobrevivência, despreza assim a parte mais fraca. Se, como se diz em coloquial, também no meio animal "chacun s'arranje".
Penso que não, que o mais parecido será o sacrifício dos animais mais velhos e doentes colocando-os na periferia da manada para proteger as crias no centro.
Agora sacrificar crianças? Com os mesmos neurónios, sinapses e estômago à nascença?
É esse o significado das estísticas da Oxfam baseadas em dados do Credit Suiss (ficando de fora as off-shores e a economia paralela):
http://www.bbc.com/news/business-35339475


Ver anteriores estudos da Oxfan em
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2015/01/da-oxfam-davos.html

Apressados, o Instituto  Adam Smith e o Instituto de Assuntos Económicos reclamam que o que interessa é melhorar as condições de vida dos pobres (já sabemos que melhoram, mas graças às tecnologia) e não nos preocuparmos com os ricos (claro, embora me pareça que invocam o nome de Adam Smith em vão, que era mais humano que eles são, mas não tinha hipóteses de saber como iriam evoluir as formas e relações de produção).
E noutra escala, é o mesmo desprezo pelas crianças que não têm pais com capacidade financeira e educacional que mostra a estatística da população escolar e docente em Portugal:


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Darcy Ribeiro, "eu detestaria estar no lugar de quem me venceu"

Com o mesmo sentimento de gratidão e descoberta referido por Pilar del Rio ao citar no DN este texto de Darcy Ribeiro para defender o seu candidato à presidência da República, reproduzo com a devida vénia:

"fracassei em tudo o que tentei na vida
tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui
tentei salvar os índios, não consegui
tentei fazer uma universidade séria e fracassei
tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei
mas os fracassos são as minhas vitórias
eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."

protesto de índios em Brasília


Darcy Ribeiro, antropólogo, ministro da educação de João Goulart, antes da ditadura militar brasileira

https://pt.wikipedia.org/wiki/Darcy_Ribeiro

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

No jardim novo do Parlamento com os reformados do metro

Nem de propósito, ter a reunião marcada para assistirmos ao debate na Assembleia da proposta de reposição do pagamento dos complementos de reforma e dois dias antes o tribunal constitucional vem declarar a inconstitucionalidade do corte das subvenções vitalícias para rendimentos do agregado familiar, não individual, superiores a 2000 euros.

Eis-nos assim no jardim novo do Parlamento enquanto uns entram e outros preferem ficar no meio das árvores, perto de José Estevão a arengar, não aos peixes, mas aos veículos de duas rodas dos funcionários e deputados da Assembleia.


Como os antigos gregos na Ágora, há os que preferem cotejar argumentos e perderem-se nos sofismas e contra-sofismas de um lado e doutro da questão, nós, os portugueses, gostamos de discutir se as subvenções vitalicias ou os complementos de reforma são prestações sociais ou se são prémios ou mordomias, e então com os comentários na internet à sua disposição, está armado o circo.
Então o poder independente do tribunal constitucional, e ainda bem que é independente, embora, de acordo com os princípios da qualidade numa empresa isso não queira dizer que não há controle mútuo horizontal, achou que uma subvenção vitalícia de um ex-político não é como um complemento de reforma, mas que é uma prestação social, uma recompensa, uma compensação por perda de oportunidades e uma proteção contra  incertezas, evitando que a pessoa caia na insustentabilidade da subsistência.
Que era uma questão de "tutela da confiança".

Terão as pessoas entendido bem? terei eu entendido bem, tanto eu como os meus colegas? Que a subvenção vitalícia é um prémio e um reconhecimento por serviços prestados, ao contrário de outras remunerações não contributivas, como os complementos de  reforma, que são uma cláusula de um contrato de trabalho.
Para o tribunal constitucional, se é uma prestação social não se pode cortar, se é uma recompensa pode, embora saibamos que a declaração de constitucionalidade do corte dos complementos de reforma se deva apenas à militancia partidária de alguns juízes.

Ou a linguagem cifrada dos jurídicos serve não só para serem independentes, e ainda bem que o poder judicial é independente do poder legislativo e executivo, embora, de acordo com os princípios da qualidade numa empresa isso não queira dizer que não há controle mútuo horizontal (perdoe-se-me a repetição, mas é para vincar bem o que falta ao poder judicial em Portugal, sem o que ele sempre impedirá mudanças democratizadoras), como serve também para justificar um tratamento diferenciado entre os políticos e os humildes servidores de um bem público, ou para desculpar a declaração de constitucionalidade do corte dos complementos de reforma em 2014?

E contudo, a contratualização de novos complementos de reforma cessou em 2004, assim como a das subvenções vitalícias em 2005. Todos (alguns...) estávamos conscientes das dificuldades financeiras que se aproximavam, mas estas coisas não podem ser, constitucionalmente, retroativas...
Nós, reformados, até concordámos em descontar, sobre os complementos, uma contribuição para a segurança social, e a conversão dos complementos não pagos nestes dois anos (isto é, perto de 26 milhões de euros) num fundo de pensões para benefício de reformados e ativos do metro.
Para nos situarmos, convém lembrar que os cerca de 340 beneficiários das subvenções vitalícias receberão anualmente cerca de 10 milhões de euros, ou 2000 euros por mês, individualmente.
Apesar do que o tribunal constitucional diz na sua linguagem de confiança cifrada, somos mais semelhantes do que diferentes, pese embora a média dos complementos cortados ser de 640 euros mensais.


Os complementos não são apenas para evitar a miséria, nem são um prémio, são uma remuneração correspondente aos menores vencimentos auferidos no metropolitano de Lisboa quando foram contratualizados desde 1973 a 2003 com quem era admitido e que optava pelo metro pela segurança da sua contratação coletiva, por oposição aos melhores vencimentos nos setores privados de qualificações profissionais equivalentes.
E são também uma remuneração equivalente aos ganhos pela empresa em "reformar" os seus profissionais antes de esgotado o prazo da sua vida útil na empresa (mas atenção, na maior parte das vezes quem saía, com pouco mais de 55 anos, já tinha 40 anos de descontos por ter começado a trabalhar aos 14 anos).

Não esquecer que os reformados com idade inferior à da reforma até se dispuseram, quando o XIX governo cortou os complementos, a regressar ao trabalho ativo. Mas a empresa não quis.
Reformado é para deixar estiolar, não é para aproveitar a sua experiência em pequenas colaborações, não querem saber do provérbio africano, quando morre um velho arde uma biblioteca.
aguardando...
entrando para a galeria da assistência

Eu aproveitei aqueles momentos no jardim para mostrar no meu grupo a linguagem cifrada de um quadro Excel com os cálculos da capitalização do diferencial de vencimentos no metro e no setor privado antes de 1995.
Enquanto lá dentro, na Assembleia, uns deputados rasgavam as vestes por não haver dinheiro e outros diziam que contratos são contratos, que podem renegociar-se, mas que são contratos, é esse o entendimento do princípio da confiança, válido para os cidadãos ex-políticos e para os cidadãos ex-maquinistas, enquanto o princípio da igualdade diz que não pode haver grupos privilegiados.

E finalmente a declaração oficial, pelo secretário de Estado dos assuntos parlamentares, a reposição dos complementos de reforma está incluida no orçamento de Estado de 2016.
http://www.tsf.pt/politica/interior/governo-vai-repor-complementos-de-pensoes-a-antigos-trabalhadores-do-metro-e-carris-4991054.html

Respiramos de alívio, sentimos uma espécie de voo de inércia em silêncio, antes de ruidosamente manifestarmos o nosso apoio.

Mas ao que chegámos, ter trabalho remunerado e emprego certo foi transformado pelos decisores em privilégio, com os protestantes dos comentários na internet a dizer que como contribuintes não querem pagar os complementos de reforma, na mesma altura em que a Oxfam denuncia o crescimento da fatia de rendimento mundial absorvida pelos 1%  de maior rendimento...
E contudo, as profissões no metro têm de ser qualificadas, na construção, nos ensaios, na manutenção, na operação.
Por razões de segurança.
Um desempenho deficiente pode provocar um acidente.
Infelizmente em qualquer economia o princípio da igualdade é contrariado por um leque salarial demasiado aberto, influenciado pelas qualificações exigidas e pela oferta de candidatos.

Eis porque a tabela salarial no metro começou a ser superior à do setor privado (excluindo bancos, financeiras e orgãos de cúpula, claro) a partir do afluxo de fundos europeus para a coesão, por volta de meados dos anos 90, coincidindo com a expansão do metro à Pontinha. à Baixa, ao Parque das Nações, enquanto a dívida assacada à empresa ía subindo pelos custos de construção e pelos défices de exploração devido à venda do serviço de transporte abaixo do custo.



É um facto esquecido, mas quem trabalhava no metro até 1995 chegava a ganhar dois terços do que um profissional do mesmo nível ganhava no setor privado ou até mesmo na CP. E até na remuneração em espécie (por exemplo, carro de serviço à disposição de montador eletricista) ou em  trabalho extraordinário ou por turnos, a remuneração podia ser superior fora do metro. 
O que o quadro mostra é a capitalização desse diferencial ao longo dos anos de acordo com as tabelas de capitalização dos certificados de aforro, disponíveis no site do IGCP.

No fundo, é este o princípio dos fundos  ou planos de pensões, que investem e reinvestem capital, embora neste caso o metro nunca investiria a poupança dos baixos salários num fundo desses, quando muito apenas uma parte dessa poupança. Isso teria sido correto, mas nem os colegas financeiros tomaram a iniciativa, enquanto nós nos entretínhamos a fazer andar o metro e a construir novas linhas, que a divisão do trabalho não é uma palavra vã, nem as administrações que inscreviam  o problema nos seus relatórios anuais jamais conseguiram acordar com as tutelas nenhum plano de pensões. Aliás, a sistematização de formas de capitalização adicionais relativamente à segurança social só foi feita com a lei de 2007 da reforma da segurança social.

Mas o quadro mostra o valor das poupanças equivalentes e, no caso da subida relativa dos vencimentos no metro, o valor a descontar no resultado global.
Isto é, por cada trabalhador, teria sido gerado, em média, um capital de 180.000 euros, o que daria para pagar um complemento de reforma médio de 640 euros durante 20 anos, até 2030.
Não tem  existência real este capital, é virtual, mas traduz o valor da poupança do metro e o valor merecido dos complementos a receber.
Os cálculos não serão exatos, mas quem quiser pode entreter-se a estudar hipóteses mais plausíveis para a evolução das taxas de juro de capitalização e dos vencimentos do metro e do setor privado equivalente. Tem aqui já armado, o quadro Excel para poder substituir valores:

Será uma forma de encriptar a nossa realidade.
Embora a realidade a que assistimos é a desvalorização do fator trabalho.
Não devia a troika ter desembarcado em Lisboa em 2011 e impor que os vencimentos dos trabalhadores portugueses seriam rebaixados para os níveis da Bulgária e da Roménia. Deviam antes ter ido à Bulgária e à Roménia subi-los.
Isso é que é igualdade, não é estimular o desemprego como efetivamente e reconhecidamente pelos próprios "especialistas" do FMI fizeram.

Aguardemos então que faça efeito a inclusão no orçamento de Estado para 2016 a reposição dos complementos de reforma, com retroatividade a janeiro de 2016 (nota posterior - não confirmada a retroatividade)

padrão de azulejos, num prédio da rua de S.Bento, perto da Assembleia, que quem quiser poderá tomar por metáfora da  diversidade no Parlamento ou no tecido social, com uma harmonia que escapa aos distraídos, e que é olimpicamente desprezada, enquanto conjunto de potencialidades desperdiçadas, pelos decisores e académicos, e seus comentadores apoiantes

PS em 22 de janeiro - por informação dos deputados do PS ligados à questão dos complementos de reforma, apenas está garantido o pagamento dos complementos de reforma devidos depois da data de entrada em vigor do orçamento de Estado 

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Sejam bem-vindos, senhores comissários da troika

Sejam bem-vindos, escrevo-o com sinceridade.
Como acredito que eram sinceras as boas vindas do agricultor quando recebia a visita do senhor feudal (já no século XX...) retratado na série Downton Abbey.
Estar em lados diferentes da estrutura produtiva, agora globalizada, para o bem e para o mal, não deve impedir o relacionamento fraterno entre os homens nem deve levar à violência.
Mas graças ao progresso das ciências e das técnicas, podemos hoje falar de coisas interessantes para a questão.
Trazem vocês 18 exigências, dizem os jornais.
E eu digo que é natural que o façam, pese embora recentemente a vossa parte FMI ter reconhecido que as medidas originais dos PEC e do memorando foram mal projetadas por agravarem a nossa própria economia, isto é, tal como previram muitos de nós, sem o prestígio académico que vocês teem, a austeridade provocou uma diminuição do PIB superior à que vocês supuseram.
É natural vocês virem com essas exigências porque vocês vivem um padrão de vida com níveis de rendimento e conforto muito superiores aos que a maioria da população portuguesa consegue.
As próprias elites portuguesas que tantas vezes vos têm incensado, precisamente por viverem sem as dificuldades da maioria, tendem a desprezar os protestos desta maioria.
É muito difícil quem não vive uma situação real compreender as suas implicações no espírito e na carne de quem a sofre.
Porém, podemos dizer qualquer coisa em termos objetivos, sem emoções que tomem partido, graças ao que referi, aos progressos da ciência e da técnica.
Isto para considerar apenas o exemplo da vossa exigencia de despedir mais facilmente, individualmente, de modo a estimular o investimento privado, o qual está pelas ruas da amargura (com honrosas exceções, mesmo honrosas, também o digo com sinceridade).
Este poderá ser um exemplo de como os economistas de prestigio, como vocês, luminares sucessores de Haieck e Friedman e sólidos fundamentos do consenso de Washington, talvez revelem uma grave deficiência de apreensão de conceitos físicos.
É que não basta a matemática para entender, ou tentar entender, um fenómeno. É necessária a sua interpretação física.
Não ponho em causa a vossa preparação matemática.
Mas a vossa preparação física deixa muito a desejar.
Nada tenho a objetar que numa economia forte e com empresas a funcionar bem, a surgir e a aumentar a sua produção, seja fácil despedir individualmente.
De forma também fácil esse indivíduo arranjará emprego na empresa do lado.
Mas numa economia frágil, sem investimento significativo, com empresas a fechar, como em Portugal (não deem grande valor quando vos dizem que abrem mais empresas do que fecham; é verdade, mas são precárias, sem capacidade de captar investimento), quem é despedido dificilmente encontra outroo emprego. É a diferença entre uma economia saudável e uma economia limitada.
É um pouco como o gráfico da lei dos rendimentos decrescentes. Numa economia débil, com pouca massa crítica, estamos na zona da armadilha da pobreza, quando a curva ainda tem uma derivada de baixo valor, isto é, pouco inclinada, e os rendimentos não teem retorno, onde se paga para criar emprego e se perde esse  dinheiro. Ver:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/11/a-armadilha-da-pobreza.html

Notem que a curva de que vos falo tem um comportamento mais próximo de fenómenos físicos, como aquele da histerese magnética, do que a curva perfeitinha da saturação dos rendimentos decrescentes que vos é habitual nas vossas faculdades.
Mas eu queria chamar-vos a atenção para um fenómeno físico regido pela lei da Fermat-Weber, do tipo da gravitação ou atração universal, em que matéria atrai matéria (mais corretamente, está sujeita a campos de forças) na razão direta da massa e na razão inversa do quadrado da distancia.
É esta noção física que falta aos senhores economistas para apreenderem a realidade. Economias fortes, com excedentes (8% é o excedente da Alemanha em 2015!) têm tendencia para atrair mais investidores do que economias fracas com défices. As taxas de juro mais baixas que proporcionam a quem queira montar um negócio contribuem para atrair mais investidores que vão reforçar a economia enquanto as mais fracas mais fracas ficam.
É outra forma de justificar por que razão as cidades mais importantes de um país ficam cada vez maiores relativamente às cidades secundárias, ou por que razão as palavras mais utilizadas numa língua vão sucessivamente sendo mais utilizadas. Ver:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=weber

Era isto que vos queria dizer, com a mensagem de boas vindas, tentem compreender a realidade física, não a virtual dos manuais universitários ou dos estereotipos dos centros de estudos do FMI, do BCE, da CE ...






domingo, 17 de janeiro de 2016

Campanha eleitoral em 17 de janeiro de 2016

Disse Maria de Belém: "o mal neste país são as elites".
Não devemos generalizar, mas demasiados casos mostram que a maioria das elites portuguesas deixam muito a desejar.E são hábeis em culpar quem prejudicam (esta tradição judaico-cristã de deitar as culpas para as multidões).

Ouviu Edgar Silva as ceifeiras de Pias: "naquele monte havia tanta riqueza/hoje ninguém cultiva terra/nada é como era/cada vez há mais pobreza"

Houve de facto uma diminuição da área cultivada, compensada por aumento da produtividade de grandes produções, nomeadamente na produção de vinho, de que aliás Pias é um exemplo de qualidade.

Sobre as elites em Portugal ver:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/05/pobre-pedro-ou-negacao-das-elites.html

Citação de Henrique Neto

Citação do candidato Henrique Neto, no qual não votarei pelas razões que já expus, que não será certamente eleito, mas que veio chamar a atenção para um problema gravissimo em Portugal, a impreparação crónica dos decisores, e a indiferença não menos crónica dos eleitores e abstencionistas, nas questões práticas da  estrutura produtiva deste país; na incapacidade de debatermos as variáveis essenciais num problema, as correlações de factos e dados e as relações de causa e efeito; na incapacidade de identificarmos  o essencial dos problemas e de nos organizarmos para a sua resolução:

"Os nossos políticos padecem de outro mal... a inexistencia completa de uma verdadeira experiencia no mundo do trabalho. E isso tem uma consequencia grave: a penalização do valor do trabalho que a governação e a política em geral têm levado a cabo. É inevitável, quem nunca trabalhou numa empresa produtiva não pode nem sabe reconhecer as virtudes do trabalho".

sábado, 16 de janeiro de 2016

Senhores bem postos e ignorantes





 Graças aos gráficos publicados no Diário de Notícias posso comparar a evolução do PIB, em crescimento (positivo ou negativo), ano a ano,  de 2006 a 2014, de Portugal com as economias do mundo.
Lembrando-me daquele senhor de fala pausada que agora se dedica a contas sobre a poluição dos combustíveis fósseis (Vitor Gaspar) e de tantos senhores altamente cotados e que do alto da sua ignorância das realidades (no sentido de alienação marxista) e dos lugares de decisão da União Europeia e dos XVIII e XIX governos, nos conduziram até aqui.
É patente a proximidade das curvas do PIB de Portugal e da UE (ambos negativos em 2009) até 2010 inclusivé. Notar em 2010 a coincidência no crescimento (cerca de 2%). O que quer dizer que a ineficiência do XVIII governo ecoou a da UE.
Em 2011 e 2012, graças aos PEC e à troika, o PIB de Portugal continuou a descer, mais em Portugal do que  na UE. Claramente se vêem as consequências das medidas estranguladoras da troika, já reconhecidas, dada a evidencia pelo FMI, embora mantenham os seus juros cerca de 1,5% acima dos juros do mercado.
Em 2013 e em 2014 regressa a proximidade das curvas do crescimento do PIB de Portugal e da UE, ambos negativos em 2013 (mais em Portugal do que na UE, acentuando a divergência) e limitados a insignificante 0,9% em 2014.
Comparando a evolução com o PIB das outras regiões, que à exceção da Asia registaram acentuadas quebras em 2009, verifica-se que todas reagiram melhor do que a UE, o que confirma a inconsistência da política financeira e económica da UE, estrangulada pelos seus critérios ideológicos de privilégio da livre concorrência e globalização desregulada.
Será preciso esperar mais, numa altura em que grandes multinacionais anunciam despedimentos mundo fora, para confirmar o erro das políticas seguidas pelos senhores bem postos e ignorantes da UE e copiadas e ampliadas em Portugal pelo XIX governo?

São estes compromissos internacionais que temos de seguir? Ou não seria melhor ler com mais atenção os tratados da UE quando concede aos Estados a possibilidade de intervir na economia? 

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

O monstro no labirinto, ópera com jovens de Jonathan Dove

O monstro no labirinto, ópera com jovens, de Jonathan Dove, sobre o mito do minotauro e de Teseu, no festival de Aix-la-Provence e no canal Mezzo.



Nas primeiras cenas da ópera, os coros cantam:
"Vão sacrificar os jovens de Atenas"  (o rei de Creta, vencedor da guerra, exige um tributo anual de jovens para sacrificar ao monstro minotauro)
E os coros respondem a eles próprios:
"O rei Minos delira".

Será que o compositor, inglês de nascimento, não estaria a pensar na política da união europeia e do seu minotaurino eurogrupo? E de que ainda há Teseus?
Pode ser subversiva, a ópera.

PS - Curiosamente, a Fundação Gulbenkian "trouxe" o monstro no labirinto a Lisboa, em setembro de 2017:
https://gulbenkian.pt/noticias/o-monstro-no-labirinto/

Reportagem sobre a produção portuguesa:
https://www.youtube.com/watch?v=0bAL_0dX_VY

Os espetáculos na Gulbenkian tiveram a participação dum coro infantil, dum coro de adolescentes (elementos de 4 coros) e dum coro de adultos, cerca de 300 pessoas.

A encenadora destacou, no sacrificio dos jovens, a analogia com a exploração de jovens e de imigrantes, e com a drama dos refugiados que atravessam o Mediterraneo.
Tratando-se de uma versão de concerto, a cenografia era discreta, mas eu interrogo-me se não seria interessante montar esta ópera com uma intervenção mais forte da cenografia. Mais íntima, com pequenos coros movimentando-se entre paineis de cenários sucessivamente iluminados (ou telas de projeção de video), representando as grandes ameaças à juventude: os acidentes na estrada, a droga, a guerra, as desigualdades económicas e sociais, que impedem o acesso à saude e ao conhecimento. Estes são os deuses violentos a que se sacrificam continuamente jovens. Tal como no mito do minotauro, ou do deus Moloch da antiga Fenícia. E com menos importancia dada ao heroi salvador. É a força dos jovens que lhes dá a felicidade, não são herois que gostam de ser seguidos  a dá-la. É o conhecimento que é o verdadeiro heroi dos jovens.


https://youtu.be/oH32Z2ZebHc

https://www.monsterinthemaze.com/monster-in-the-maze/

Duas notícias discretas - a guarda costeira europeia e as taxas antidumping

Uma notícia de dezembro de 2015 - A Comissão Europeia decidiu reformular a sua agencia de controle das fronteiras Schengen e criou a European Border and Coast Guard Agency.
Dotá-la-á com meios humanos e materiais e os correspondentes fundos.
Isso incluirá a aquisição partilhada com os estados membros de, por exemplo, navios patrulheiros geridos pelos respetivos estados membros.
Isto para dizer que a Europa terá a sua guarda costeira, e que financiar a construção de navios patrulheiros não é contrariar as regras da União Europeia como  maliciosamente o XIX governo quis convencer os cidadãos.
Pena o dito governo ter conseguido o seu objetivo, de transferir a propriedade do estaleiro de Viana do Castelo.
Esperemos que ao menos os 6 patrulheiros que faltam para cumprir o plano original possam ser construidos em estaleiros portugueses beneficiando do "saber como" ganho em Viana do Castelo.
https://en.wikipedia.org/wiki/European_Border_and_Coast_Guard

"What will the pool of equipment consist of and who contributes?
The draft Regulation sets up a technical equipment pool for the Agency. The Agency will be able to acquire alone or in co-ownership with a Member State the technical equipment necessary to carry out joint operations, rapid border interventions and other operational activities.

Based on its needs and in line with its annual work programme, the Agency will define the equipment to be included in the pool. The Member States will have to contribute upon request unless they need the requested equipment for the management of their section of the external border in the face of an exceptional situation. To guarantee that the basic needs of the Agency are covered, the draft Regulation obliges the Member States to provide to the Agency the equipment purchased under the EU's Internal Security Fund."

Uma notícia de janeiro de 2016 - as autoridades norte americanas aplicaram uma taxa antidumping às exportações de papel e pasta de papel para os USA. Não bastava a indústria da celulose não ser das mais saudáveis em termos ambientais e de ser ainda necessário importar madeira em bruto. Agora os campeões do liberalismo acham que o papel e a pasta de papel são vendidos apreço abaixo do custo de produção. É verdade que são vendidos abaixo do preço merecido, como qualquer exportação portuguesa, porque o nível de preços depende da força da economia produtora. Mas faz pensar nos economistas que pressurosamente insistem na tecla da redução dos salários para tornar a economia mais competitiva. Parece que afinal não torna mais competitiva, torna mais sensível a taxas antidumping, as quais pelos vistos, e não parece que o novo tratado do Atlantico altere este estado de coisas, só podem ser aplicadas por economias fortes.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Atualidade no nosso mundo dos transportes na primeira semana de janeiro

1 - suspensão das greves silenciosas no porto de Lisboa (silenciosas porque se limitavam às horas extraordinárias, embora no caso do porto de Lisboa isso possa ter consequencias graves) e retoma do processo negocial da contratação coletiva - agradou-me muito a notícia. Embora tenha muitas discordancias, do ponto de vista técnico de transportes, da senhora ministra e da senhora diretora do porto de Lisboa (aquela ideia de transferir o porto de Santa Apolónia para o Barreiro de águas nada profundas...mas apreciei muito o seu trabalho nos radares de Lisboa) , apreciei a sua vontade de conseguir entendimentos entre sindicatos e operadores. Pelo menos por enquanto. Votos de que levem a bom porto a negociação das convenções de trabalho;

2 - a TAP anunciou a abertura de 600 vagas para pilotos, pessoal de cabina e manutenção - a mim parece-me estranho que uma companhia que estava à beira da falencia antes da privatização agora tenha planos como este, como a reformulação da encomenda dos 53 aviões, como a substituição dos aviões da Portugália, a renovação dos interiores dos aviões para maior ocupação, os sharklets, a concertação com a Ana para explorar o aeroporto da Portela e o do Montijo até ao tutano, tudo com milhões de euros de que o Estado é avalista. Parece-me estranho, pronto, mas como não sou especialista, só posso dizer que desconfio, que não acredito, por ordem de capacidade decisória, no senhor Neeleman, nem no senhor Barraqueiro (já chegou a acordo com a REFER sobre a taxa de uso pela FERTAGUS? já tem uma proposta para pagamento do uso dos seus autocarros das instalações públicas da central de camionagem de Sete Rios?); numa coisa estamos de acordo, a gestão das empresas públicas, demasiadas vezes, tem sido muito má; tem de se mudar a forma de escolha dos gestores das empresas públicas
3 - a anulação das concessões (subconcessões) dos transportes urbanos - apreciei a coerencia e alguma coragem do governo atual ao anular as concessões, considerando o  clima desfavorável criado pelos pensadores de direita adeptos do consenso privatizador de Washington e pelos comentadores inflamados e agressivos na internet contra os trabalhadores das empresas públicas. Votos de sucesso à nova administração, embora por razões de coerencia minha eu preferisse a nomeação após concurso público (será influencia no meu pobre espírito do exemplo do governador do banco de Inglaterra), não tivesse nada a objetar á concessão á Transdev do metro do Porto, sem prejuízo de se ir definindo o padrão futuro com a participação dos respetivos trabalhadores e alguma moderação dos desejos dos "autarcas" envolvidos, e, finalmente, eu mantivesse receios de ser lesiva das finanças municipais a responsabilidade pela gestão dos transportes urbanos, para mais havendo pouca experiencia especializada em metros na câmara de Lisboa e alguma dificuldade na articulação com as câmaras limítrofes (nestas coisas, os modelos a considerar, não direi seguir cegamente, mas a estudar e ver até onde pode ir entre nós, é a RATP  e Londres, esta como exemplo de grande município aglutinador de municípios originais; um país deve contar com áreas metropolitanas de peso significativo na sua economia e isso não é compatível com o atual esquema disperso de municipalidades à volta de Lisboa e do Porto, o que se reflete danosamente, como o senhor ministro do Ambiente reconhece, na organização do território e nos transportes) . Se quiserem dar alguma importancia a este pobre blogue, podem os novos decisores utilizarem como bem entenderem os argumentos a usar contra pedidos de indemnização pela reversão das concessões em:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/01/dialogo-de-reformados-do-metro-no.html
e considerarem as formas de financiamento dos transportes urbanos listadas na comunicação ao debate sobre a mobilidade em 2014 na assembleia municipal da câmara de Lisboa em:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2014/06/ultima-sessao-do-debate-sobre.html





Campanha para as presidenciais - e se...teríamos segunda volta, e então...

No post anterior
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/01/os-candidatos-presidencia-da-republica.html
escrevi que não gosto muito de falar de política.
Mas há circunstancias em que é interessante analisar formas de pensamento, de relações de forças de interesses, de conflitos entre grupos e da organização desses grupos e seus representantes.
Comento então alguns factos desta campanha, começando por confessar que fiquei mal impressionado com o contágio, para a discussão entre candidatos, da agressividade verbal de algumas figuras do futebol.
Assiste-se por vezes nos debates futebolisticos na televisão, aparentemente ocupando tempo demais (interessará aos operadores manter a trilogia dos 3 F, Fado, Fátima e Futebol...) a insultos do estilo: "você não tem capacidade para entender", sem que os moderadores intervenham.
Eis que num debate entre dois candidatos dos mais bem posicionados nas sondagens, há um que diz para o outro que é um soldado raso, que teve uma vida vazia (deuses, se o senhor candidato julga aquela vida vazia, que diria da minha, obscuro funcionário de uma empresa de transportes tão vilipendiada nos comentários da internet) e o cargo de presidente da República não  é para soldados rasos.
Imagino que o senhor candidato a esta hora já se dedicou a tapar com verniz tapa-poros as fendas do seu verniz estalado e até pode acontecer, como general que crê ser, que venha a ser presidente.
Não é que, desta vez, contrariamente à eleição anterior, me preocupe com a presidencia entregue a qualquer um dos candidatos, como já referi.
Mas o episódio de agressividade verbal sugere-me que uma das grandes vantagens de termos muitos candidatos é que nem todos pertencem às elites bem pensantes e influenciadoras dos centros de decisão. Elites essas que nos trouxeram à situação em que nos encontramos. Por força última e mais intensa do contexto internacional, mas que não souberam, as elites, minimizar essas influencias nefastas.
Por isso aplaudo a denuncia anti-corrupção de Paulo Morais e a insistencia de Henrique Neto nos investimentos produtivos, ambos advogando a colocação dos partidos num registo menos prepotente, de uma forma que assusta as elites e os seus representantes na comunicação social (que têm o desplante de considerar nos seus comentários os "outros" candidatos como fracos).
E ao mesmo tempo critico a dupla Marisa-Edgar que se esgatanha mutuamente, em vez de, já que não existe voto preferencial (o que há por fazer na reforma do sistema eleitoral...)  se fecharem numa sala com os candidatos não elitistas e não partidaristas e só sairem depois de escolherem um candidato para o qual desistiriam (como o candidato do PCP fez para apoiar Humberto Delgado, em 1958) e outro, não existindo vice-presidencia, que seria nomeado pelo primeiro para o conselho de Estado. Se o quase milhão dos eleitores teoricamente representados por Marisa e Edgar se juntassem a meio milhão de dissidentes do eleitorado PS (um bocadinho menos de um terço)... teríamos segunda volta e então...  

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Os candidatos à presidência da República


Os candidatos à presidencia da República começaram a sua campanha.
Espero que os meus amigos e amigas não façam como há 5 anos, em que a maioria se absteve.
Não gosto de falar de política, mas os temas de organização das comunidades (no caso português, mais de desorganização) são fascinantes.
Por isso me entusiasmou o aparecimento da candidatura de Henrique Neto, por fora das políticas partidárias, com um passado de iniciativas industriais, o que é importantissimo quando  a maior parte dos políticos não conhece o mundo real do trabalho produtivo, e sempre crítico da promiscuidade entre o poder económico e financeiro e o poder político.
Parecia poder desenvolver o mesmo papel de sobrevivência à crise que Giorgio Napolitano, um senhor de idade semelhante, desempenhou na Itália, aglutinando as forças interessadas em progredir, independentemente de serem de direita ou de esquerda.
Infelizmente, verifiquei que em torno da sua candidatura se agrupavam apenas sensibilidades de direita, o que se tornou patente no período pós eleitoral, em que Henrique Neto, surpreendentemente para mim, criticou a participação dos partidos mais à esquerda na solução do governo.
Não há nada de ilegítimo nisso, até porque se trata de uma direita democrática, mas eu pensava que a candidatura de Henrique Neto era aglutinadora. Certo que pelo peso da sua votação a PAF deveria participar no governo, mas a essencia da democracia é também castigar quem fez mal à população, e nunca deveriam ter o papel decisivo no novo governo.
Penso que deveriamos alterar a lei eleitoral para reduzir de 22 para 4 (continente, Açores, Madeira, emigrantes) os círculos eleitorais para aumentar o grau de proporcionalidade do método de Hondt. Que se deveria simplificar e informatizar o sistema de votação de emigrantes ou de cidadãos deslocados dos seus locais de recenseamento para reduzir a  abstenção. E como consequencia, habituarmo-nos a ter nos governos a representação de mais sensibilidades. Quanto ao sistema eleitoral para a presidência, seria desejável a introdução do voto  preferencial (por exemplo, cada eleitor pode dar, ou abster-se de dar, 4 pontos ao seu candidato preferido, 3 ao segundo preferido, 2 ao terceiro e 1 ao quarto) e a criação da figura do vice-presidente.
Lamento por isso não poder sugerir aos meus amigos e amigas a figura da pessoa mais bem preparada como conhecedora da realidade produtiva, mas certamente que dentre todos os candidatos saberão escolher. Não se abstenham.

Não à pena de morte

Não à pena de morte. Quer seja na Arábia Saudita, nos Estados Unidos, no Irão ou na Russia.
Cumpram a declaração universal dos direitos humanos, a começar pela liberdade de expressão.
Esperemos que a ONU tome uma posição.
E que, por falar na Arábia Saudita, que leiam as primeiras páginas do Alcorão, em que se garante a paz a quem não pensa da mesma maneira (outra coisa está escrita mais adiante, mas isso é na parte da história militar de expansão do Islão), e que negociem com o resto do mundo (não me refiro à aliança com os produtores de petróleo do Texas) um plano de transição para a economia não dependente do petróleo.
Não é uma declaração de guerra, só farão bem, agora que a dívida externa da Arábia Saudita está a subir.

Diálogo de reformados do metro no solstício de inverno

O solstício de inverno marca o início do crescimento dos dias no ciclo anual  e, nas culturas primitivas, a promessa de futuras colheitas e de melhores condições para a caça.
Desde esses tempos que no cérebro humano o solstício ficou associado à esperança e à confiança, por isso é uma época festiva.
Para os reformados do metropolitano de  Lisboa, para quem o pagamento dos complementos de reforma  continua suspenso, é também uma época de expetativa de os voltar a receber, pelo menos em parte significativa, e de que o montante que não foi pago nestes 2 anos venha a constituir um fundo de pensões.
Esta é mais uma fonte de críticas por parte dos economistas pressurosamente  cumpridores dos critérios austeritários que repetem que não há dinheiro e que não se pode renegociar a dívida, não obstante os relatórios do FMI que a justificam.
Claro que não há dinheiro se as rendas das PPP e da energia se mantiverem, se os bancos continuarem a absorver os auxílios estatais, se as isenções de IMI se mantiverem, se continuarem a ser desperdiçados os fundos comunitários que poderiam ser aplicados em investimentos de mão de obra intensiva e se se continuar a pagar a barbaridade de 8 mil milhões de euros de juros por ano.
Entretanto, pacatamente, os reformados do metro lá foram cumprindo um dos rituais anuais, a prova de que ainda estão vivos, assinando no departamento de recursos humanos a respetiva folha.
Nem todos o puderam fazer, que as leis da renovação populacional não perdoam, mas lá vamos vencendo o desânimo e a frustração da marginalização que  é imposta aos reformados.
Neste solstício de 2015 vou imaginar um desdobramento de mim próprio e um diálogo entre o eu que sou agora (E0e o eu que talvez, se lá chegar, serei daqui a dez anos (E10).


Diálogo de reformados do metro no solstício de inverno

E10 - Obrigado por me vires buscar. Já me custa conduzir e vou deixar caducar a carta. A tua boleia é preciosa. Estou a ver que se não me vêm buscar fico limitado a umas voltinhas no bairro. Custa-me a descer as escadas do metro, nem todas as estações têm elevador.
E0 - Mas mexes-te bem?
E10 - Mexo, mexo, com uma bengala, mexo. Ao princípio tinha um raio de autonomia restrito por causa da próstata, de casa para o café para ler o jornal e voltar para casa, mas desde que uso as fraldas para incontinentes que me estou nas tintas para a falta de instalações sanitárias públicas.
E0  - Mais um incumprimento do nosso metro, devia ter as instalações sanitárias a funcionar, nem que fosse com moedas de 20 cêntimos. Já reparaste que fazemos 56 anos de exploração? Vamos ter de comemorar isso. Hoje almoçamos lá no refeitório, depois da prova de vida. Já que deixou de haver os almoços para todos os reformados promovidos pela administração.
E10 - É verdade, lembro-me do almoço na feira das indústrias, no pavilhão da Tapada da Ajuda, e nas naves das oficinas do PMOII e do PMOIII. Discursos finos que se faziam.
E0 - Pois era, parece que agora somos acusados de ter gasto mal o dinheiro. Tens lido as notícias sobre a reversão das concessões?
E10 - Tenho. Fiquei preocupado com a reação dos embaixadores que protestaram.
E0 - Andaste a ler os pressurosos comentadores e economistas que rasgaram as vestes escandalizados com a ameaça ao investimento externo. Eu penso que se eles estivessem mesmo preocupados com o investimento externo, todos os dias falavam nas candidaturas aos fundos comunitários para financiamento das infraestruturas ferroviárias e energéticas. Mas não, os prazos vão passando e continuam a propalar que se desbarataram os fundos do QREN em autoestradas. Quando se gastaram apenas 17% dos fundos em infraestruturas rodoviárias. Olha, quanto aos embaixadores, eu gostaria que lhes tivessem dito umas coisas. Ao embaixador inglês, que lhe recordassem o boicote que as empresas inglesas fizeram ao metro logo a seguir ao 25 de abril. Deixaram de fornecer peças de reserva para os equipamentos ingleses. Mas os comboios não pararam por causa disso. Não vamos agora parar porque a National Express perdeu uma concessão. A recordar-lhe também os acidentes que se seguiram às privatizações da Thatcher e as falencias das companhias privadas no metro de Londres. Quantos aos mexicanos, era recordar o testemunho de um colega do metro de Barcelona que tinha ido a uma reunião da associação de metros sul-americana-ibérica, Alamys e testemunhou um assalto armado à porta do hotel logo no primeiro dia. Voltou logo para Barcelona depois de informar o colega mexicano que voltaria quando o país fosse civilizado.
E10 -  Chi, essa é forte.
E0 - Pois é, mas ainda há bem pouco tempo os barões da droga mandaram matar um autocarro cheio de miúdos. Isso é civilizado? Basta ver os filmes americanos sobre os conflitos da droga no México...E para o embaixador francês a resposta era fácil. Graças aos colegas da RATP e da SNCF os burocratas de Bruxelas tiveram de moderar os seus ímpetos fundamentalistas de defesa dos mercados livres e concorrenciais. Basta ler o regulamento 1370/2007 dos transportes, quando ele diz que "numerosos serviços de transporte constituem uma necessidade em termos de interesse económico geral que não são passíveis de exploração comercial. As autoridades competentes dos Estados-Membros devem ter a possibilidade de intervir". E que "para o direito comunitário é irrelevante o operador ser público ou privado". Isto para os comentadores de direita devem ser facadas nas costas, a própria Bruxelas a passar por cima dos dogmas liberais. Valha a verdade que nas diretivas sobre a coordenação dos contratos públicos (2014/25 e 2014/24, que revogaram as diretivas 2004/17 e 2004/18) e sobre os contratos de concessões (2014/23) a linguagem é mais suave para os liberais, mas ainda assim se escrevem coisas como "nada na presente diretiva obriga os Estados-Membros a confiar a terceiros, mediante contrato, ou a externalizar a prestação de serviços que pretendam eles próprios prestar" , ou "a presente diretiva tampouco deverá prejudicar a competência das autoridades nacionais, regionais e locais para prestar, mandar executar e financiar serviços de interesse económico geral". Aliás, a companhia ligada à RATP percebeu que as condições do caderno de encargos não eram vantajosas e nem concorreu. O que não é um elogio para quem concorreu, que no fundo, por uma questão de prudência e fazendo prova de conhecimento do negócio, seria de esperar que não concorresse. Isto devia ser explicado aos embaixadores. No primeiro ano, arriscavam-se a ter um prejuízo de 9 milhões de euros se cumprissem o contrato.
E10 - E que dizes do ministro do ambiente?
E0 - É um bocadinho bisonha esta coisa dos transportes no ministério do ambiente, embora isto dos transportes seja muito responsável pelas tais emissões de CO2, e por isso mesmo me parecia mais ajustada a integração num ministério da energia, de que o ambiente também dependesse, que a energia é mesmo o problema fundamental da humanidade. Mas o que é facto é que o ministro manifesta disponibilidade para aceitação do conceito de serviço público. Talvez tenha havido alguma confusão com aquela de dizer que só um terço de um serviço pode ser concessionado. Penso que terá sido influencia de uma disposição antiga nos contratos de adjudicação de obras públicas que limitava a um mínimo de 30% a subcontratação. Mas o essencial do regulamento é que o operador que recebe a concessão ou subconcessão deve depender da autoridade pública.
E10 - Pois é, mas contratos são contratos.
E0 - Pois são, tal como o contrato dos complementos de reforma e nós estamos dispostos a renegociá-lo. Mas o texto do regulamento é claro. A entidade pública pode conceder a operação, a manutenção e o desenvolvimento de uma rede de transporte a um operador privado, que fica a chamar-se operador interno, e que ficará funcionalmente dependente da entidade concedente, incluindo através da participação no conselho de administração. É isso que vemos nos contratos do Sérgio Monteiro?
E10 - Esse senhor  convencido, coitado, portou-se como o miúdo arrogante e ignorante que achincalha os velhotes e estraga tudo em que toca, mas tem muitos fãs nos comentários na internet, a vociferar "privatizem já tudo, para acabar com as greves".
E0 - Esse é o nosso ponto fraco. Nós não devíamos fazer greves com paralisação porque desse modo não ganhamos o apoio de quem trabalha e precisa do metro para ir trabalhar. Mas há mais nos contratos de concessão que permitem anulá-los por manifesto incumprimento dos normativos comunitários, e nós não queremos faltar aos compromissos internacionais, não é?
E10 - Explica lá, que eu já não tenho idade para andar a pesquisar a legislação comunitária.
E0 - Ora, para além do que já disse, o contrato devia e não o fez, definir com clareza o grau da possível subcontratação pelo concedente ou pelo próprio subconcessionário ou operador interno; devia ter incluido a relação qualidade-preço nos critérios de avaliação e não o fez, apenas incluiu o preço; devia impor a dependencia do operador interno relativamente ao concedente e não o fez. E finalmente, por falar em concedente, legalmente o concedente não pode ser o Estado mas sim  a câmara de Lisboa ou, no limite, a área metropolitana.
E10 - O que quer dizer que o contrato é nulo.
E0 - Precisamente, por muito que desagrade aos embaixadores.
E10 - E aos economistas e comentadores pressurosos, como tu dizes. E olha, como está o ambiente aqui no metro? dos nossos colegas mais novos no ativo?
E0 - Bem, uns queixam-se da falta de planeamento e de definição de objetivos concretos, e isso pode ser mau sinal das intenções de uma administração que veio para aqui como comissários políticos para preparar o metro e a Carris para a privatização. E se queres que te diga eu até acho bem a fusão de tudo o que seja transporte urbano. Por mim até incluía os suburbanos da CP. Mas claro que  os critérios não podiam ser os de comissários políticos. Deverá haver uma gestão participada, descentralizada e desenvolvimentista, e os gestores serem nomeados após concurso. Deveria dar-se mais atenção ao conceito de engenharia, como dinâmica de resolução, não de bancos, mas de problemas, no caso de transporte de pessoas; onde há problemas complexos tem de haver engenharia. Deixarem-se da obsessão de cortar nos quadros de pessoal  Mas por outro lado há colegas que se queixam de excesso de trabalho e de prazos apertados, por exemplo a equipa responsável pelo controle das empreitadas de acabamentos e especialidades da extensão à Reboleira, que esperemos esteja a funcionar no equinócio da primavera.
E10 - Ainda chegaste a trabalhar nos projetos da Reboleira, não foi?
E0 - Não, não, os comissários políticos da altura já me tinham posto na prateleira, mas ainda acompanhei o arranque dos trabalhos e devo dizer que me deu muito prazer ver o progresso dos trabalhos, coordenados por um jovem arquiteto, demonstrando que as capacidades de trabalho não são monopólio de nenhuma formação específica.
E10 - E as estações de Arroios e Areeiro, que impedem a exploração na linha verde com comboios de 6 carruagens?
E0 - Pois, esse é um ponto negro. Aos anos que isso podia estar resolvido, o contrato para Arroios chegou a estar assinado. Mas a câmara teve medo dos protestos porque era preciso interromper o transito à superficie e nessa altura decorriam as obras de S.Sebastião e aproximavam-se umas eleições. No Areeiro apareceram os conflitos do costume com o empreiteiro , quando se adjudica ao mais barato. Neste momento, sei que outro jovem arquiteto tem o projeto pronto com uma solução relativamente económica, que as obras podem ser candidatadas a fundos europeus e que não há razão para não lançar o concurso.
E10 - Os tais pressurosos vão dizer que não há dinheiro.
E0 - Pois vão, sofrem do complexo da inibição à aproximação da obra. Vão adiando as decisões.
Outra linha de atuação com fundos comunitários era decidirem-se por cumprir a legislação comunitária e adaptar as estações principais que ainda faltam aos passageiros com limitações de mobilidade. Não se admite que estações de correspondência como o Campo Grande, Jardim Zoológico, Entrecampos, Colégio Militar, não tenham elevadores.
E10 - Sem esquecer as instalações sanitárias adaptadas também a pessoas com mobilidade reduzida.
E0 - Isso mesmo, mas voltando à estação de Arroios e à questão da greve que afasta os utilizadores dos trabalhadores do metro, até porque infelizmente para quem não trabalha no metro, o ordenado médio no metro (talvez à volta de 1200€) é superior ao ordenado médio nacional (talvez à volta de 900€): existem pareceres dos tribunais superiores proibindo greves de zelo, algumas greves intermitentes, algumas greves parciais, embora noutros países europeus sejam autorizadas.
E10 - Greve tem de ser sempre com paralisação, segundo os jurídicos, não é?
E0 - Pois é, embora eu pensasse que teria mais impacto uma greve de zelo em que os comboios sofressem uma ligeira perturbação nalgumas paragens enquanto o pessoal explicava as normas de segurança, à imagem do que se faz na aviação. Mas os jurídicos são assim, pronto. O que se podia fazer era definir serviços mínimos muito próximos dos 100%, para não prejudicar os passageiros. Ou simplesmente decretar a greve e chegar à véspera e desconvocá-la. Ou melhor ainda, no dia de greve fechavam-se as estações de Arroios e Areeiro e punham-se 90% de comboios na linha verde, mas com 6 carruagens, que ainda assim haveria maior capacidade de transporte do que atualmente com 3 carruagens.
E10 - Vamos a ver como vão correr as negociações da contratação coletiva, agora sob o novo governo, que tanto trabalho deu a conseguir. A ver se se respeitam mais os trabalhadores, em lugar de andar a desacreditá-los como se fossem uns privilegiados.
E0 - Há quem diga que a comissão sindical devia contratar uma agência de comunicação para defender a causa junto do público.
E10 - Ou formávamos uma parceria de comunicação com a doutora Raquel Varela, já que ela tem tanta visibilidade televisiva (ver a partir do minuto 28:30 as "regalias dos ferroviários"/salários em espécie à custa das reformas) .
http://www.rtp.pt/play/p2046/e217358/o-ultimo-apaga-a-luz
http://www.rtp.pt/play/p2046/e218933/o-ultimo-apaga-a-luz
http://www.rtp.pt/play/p2046/e219569/o-ultimo-apaga-a-luz
E- Atenção, finalmente chegámos ao metro, vou deixar o carro ali nos visitantes. Os recursos humanos são no rés do chão do edifício principal, ao fundo do corredor, à esquerda.
E10 - Olha, repara como são simpáticas as nossas colegas mais novas. Bem, eram mais novas quando estávamos ao serviço, mas continuam com muito boa aparência, e tratam-me melhor a mim do que a ti, por ser mais velho.
E0 - Não digo que não, mas vamos despachar isto e depois vamos almoçar ao refeitório, que também nos vão tratar lá bem. Matamos as saudades dos nossos colegas mais novos. E agora vejo que depois do almoço, ao fim da tarde, há uma pequena comemoração nas oficinas do aniversário do metro, 56 anos, como já se fazia no nosso tempo, com uns brindes ao futuro em que há que ter confiança, a comemoração do grupo dos "paparucos". Ainda há gente boa.
   

domingo, 3 de janeiro de 2016

Nem sempre o mais eficiente é o recomendável

retirado do DN

Problema de xadrez: as brancas jogam e dão mate em duas jogadas.
Claro que as brancas ganham sempre, mas o problema é saber como apenas em duas jogadas.
Pessoalmente, não gosto daquela ideia feita de que devemos sempre procurar o melhor.
Detesto a mania das revistas de eleger as figuras mais importantes do ano.
Nas empresas, não precisamos de génios, nem dos melhores.
Precisamos de pessoas comuns e de organizar o trabalho das pessoas de que se dispõe.
Selecionar os melhores é muitas vezes uma perda de tempo e um desperdício da capacidade de trabalho das pessoas comuns.
Isto é, a pessoa certa para um lugar certo é simplesmente uma pessoa, como as outras.
Isto a propósito do problema de xadrez.
Que se resolve com a jogada mais intuitiva, que é converter o peão na casa e8.
Mas não na peça mais forte, mais eficiente, com mais capacidades.
Antes num humilde cavalo, limitado nos seus movimentos, mas que é o único capaz de sacrificar o pobre rei negro na segunda jogada, quer seja o peão negro ou o próprio rei negro a comer uma das torres.
Não posso portanto concordar com o anúncio do carro de luxo, "the best or nothing", antes "the best or something".
Pena andarmos sempre a pensar nos campeões, nos mais fortes candidatos, em vez de confiar nos mais humildes.
Depois queixamo-nos...