sexta-feira, 28 de outubro de 2016

uma amostragem - o metropolitano de Lisboa em 24 de outubro de 2016

Com todo o barulho à volta do orçamento e a nova palavra na moda "cativações", já se vai relacionando os cortes na despesa das empresas públicas, como o metro, com as deficientes condições do seu funcionamento.
Embora já encomendados os novos rodados, mantem-se a imobilização de comboios que fazem falta ao serviço , bem como 30 maquinistas ainda não formados. Faltam comboios, faltam maquinistas, com a agravante destes não terem um sistema de controle automático (ATP) mais perfeito que os dispositivos de travagem automática por ultrapassagem de sinais vermelhos e de controle pontual de velocidade em poucos locais.
Por isso as pessoas protestam pelas perturbações do serviço e criticam os cortes financeiros e os senhores jornalistas e comentadores já descobriram que o problema está nas cativações para equilibrar o défice.
 Pena não se obter de Bruxelas, tão ciosa das suas responsabilidades ecológicas, uma exceção para financiar a operação de modos de transporte mais eficientes e menos poluidores do que os automóveis e os autocarros. A menos que se prefira o desperdício de continuar  a andar de carro em vez de metro, talvez por causa dos impostos sobre os combustíveis. O que não admiraria, dada a miopia, como diz o senhor ministro Centeno, lá de alguns em Bruxelas.
Resolvi fazer uma amostragem do funcionamento do metro. Sentei-me em bancos de 5 estações no dia 24 de outubro de 2016, entre as 17 e as 20 e anotei a passagem dos comboios.
É apenas uma amostragem, mas deu para calcular o intervalo médio entre comboios e concluir que apesar de tudo, e graças ao esforço de quem trabalha, os comboios vão circulando, penalizando os seus passageiros porque são menos do que deviam e gerando atrasos que se acumulam, mas circulando, à espera de melhores dias, sem cortes no orçamento.




Infelizmente, depois de 3 horas em que apesar da grande afluência de passageiros ir provocando alguns atrasos, lá apareceu, antipaticamente insistente,  o aviso temido, que nas linhas azul, amarela e verde existiam perturbações na circulação. Embora, apesar de tudo, os comboios continuassem a circular, com intervalos maiores, mas a circular, uns demasiado cheios, outros com mais comodidade.

Entre as 17:23 e as 17:58 na estação Alameda I da linha verde, o intervalo médio que verifiquei foi de 4 minutos e 13 segundos, para um intervalo programado de 3 minutos e 50 segundos. Não é ainda uma perturbação grave, mas o facto dos comboios serem de 3 carruagens tende a aumentar o tempo de paragem por dificuldade de saída e entrada de passageiros, o que se vai repercutindo de estação para estação. Tempo médio de paragem na estação verificado: 57 segundos, muito superior ao normal, 20 segundos.
Tempo de paragem a aumentar faz aumentar o intervalo entre comboios e o tempo de percurso e baixar a velocidade comercial e seriam necessários mais comboios para o mesmo serviço  ( número de comboios = tempo total do percurso de ida e volta a dividir pelo intervalo entre comboios).
Uma forma de melhorar o serviço seria aumentar a velocidade entre estações, quebrando a proibição atual de ultrapassar os 45 km/h.  Aumentando a velocidade, pelo menos nas horas de ponta, poderá reduzir-se o número de comboios necessários ou  pelo menos, aliviar a pressão da procura (tal como assegurar o serviço com comboios de 6 carruagens, acelerando o processo de ampliação e aplicando entretanto as soluções provisórias já propostas, como serviço alternado de composições de 3  e  de 6 carruagens ou fecho da estação Arroios nas horas de ponta com serviço alternativo de autocarros elétricos Alameda-Arroios-Anjos). É verdade que a falta de manutenção na esmerilagem dos carris poderá contribuir para maior desgaste, mas talvez não seja significativo.

Entre as 18:03 e as 18:19 na estação Alameda II da linha vermelha o intervalo médio entre comboios foi de 7 minutos e 27 segundos para um intervalo programado de 6 minutos e 15 segundos.   O tempo médio de paragem foi de 40 segundos, o que está de acordo com a elevada afluência de passageiros e ocupação dos comboios.

Entre as 18:28 e 18:46 na estação S.Sebastião I da linha azul, verifiquei 5 minutos e 17 segundos na via D e 6 minutos e 35 segundos na via A, para um intervalo programado de 5 minutos e 15 segundos. O desequilíbrio indicia o início de uma perturbação na via A a montante, para o lado de Colegio Militar e Reboleira (um serviço otimizado mantem igual o intervalo entre comboios ao longo de toda a linha, acelerando os que se atrasaram mais e atrasando os menos atrasados) O tempo médio de paragem foi de 31 segundos, apesar da grande afluência de passageiros e movimento de saídas na via D.

Entre as 19:28 e 19:45 na estação Saldanha I da linha amarela, o intervalo médio foi de 5 minutos e 37 segundos na via A e 6 minutos e 5 segundos na via D para um intervalo programado de 6 minutos e 50 segundos, superior ao verificado, apesar da elevada afluência na via D. O tempo de paragem também foi razoável, 27 segundos.

Como já referido, como provável consequencia de acumulação de atrasos, a partir das 20:00 foram anunciadas perturbações nas linhas azul, amarela e verde. No entanto, na estação Alvalade da linha verde, entre as 20:10 e as 20:30, apesar desse anúncio, verifiquei um intervalo médio de  6 minutos e 5 segundos  e um tempo de paragem médio de 20 segundos na via A e um intervalo de 8 minutos e 53 segundos e um tempo de paragem de 26 segundos na via D indiciando desequilíbrio e perturbação para montante (lado de Telheiras e Campo Grande). O intervalo programado era efetivamente inferior, 4 minutos e 55 segundos (6 minutos a partir das 20:30).



Julgo que merece uma reflexão se o nível das perturbações justifica a repetição do anúncio de perturbações (o que não impede que continue a pedir-se desculpas pelos incómodos dado que o serviço não está a ser bom). É que o tempo de propagação da perturbação até à sua extinção ou atenuação pode ser inferior ao tempo de tomada de decisão de  difundir a informação de perturbação (isto é, quando se decide anunciar a perturbação já ela começou a atenuar-se) . Isto é importante porque muitos passageiros podem alterar a intenção de viajar nometro ao receber essa informação. Por maioria de razão, a informação de uma interrupção de exploração pode ocorrer quando a avaria que lhe deu origem já esteja resolvida ou contornada.
Para além do proposto, aumento da velocidade e disponibilização de mais comboios e maquinistas, exploração alternada na linha verde 3/6 carruagens, sugere-se um pequeno programa  com base nos dados que utilizei (intervalo entre comboios e tempo de paragem) referidos a um grupo de estações em cada linha, e que a informação transmitida aos passageiros seja o intervalo entre comboios estimado e não que existem perturbações. Embora essas informações possam ser retiradas  do programa do comando centralizado do sistema de sinalização, poderá ser mais fácil, a partir de detetores da paragem dos comboios, o cálculo desses parâmetros e sua centralização no sistema de anúncios aos passageiros, estabelecendo um limite para o intervalo de tempo e de paragem que, uma vez ultrapassado, corresponderia ao anuncio de interrupção momentânea da exploração. O desenvolvimento de  uma app para smartphones ligada ao sistema de cálculo de intervalo entre comboios para acesso desta informação através da internet seria interessante para uma start-up da web summit. 

Em resumo, parece exagerada a fúria com os senhores comentadores criticam a degradação do serviço do metropolitano. E pouco simpática com quem está comprometido com o seu trabalho e mantem os comboios a circular.
Efetivamente o serviço não está a ser de qualidade, mas julgo que não há indicadores de que a degradação se esteja a agravar, além de que não me parece que os senhores comentadores baseiem as suas críticas nos indicadores de fiabilidade em MTBF , de disponibilidade e de regularidade. Mas se de facto baseiam, conviria que os mostrassem em quadros comparativos.

PS em 28 de outubro - Não deixei claro no texto que se trata de uma amostragem pouco significativa que não pode generalizar-se. Pretendia apenas verificar se os comentadores, que impantes se exibem nas televisões, não teriam razão quando diziam que o metro era um desastre que estava sempre com perturbações. 
Não é verdade, não está sempre com perturbações e mesmo com perturbações continua a servir. Conviria conhecer os indicadores mais precisos de MTBF, disponibilidade, regularidade, oferta (carruagens.km) e procura (passageiros.km).
Mas a triste realidade é que é preciso repor comboios a funcionar e, para as novas extensões, comprar novos comboios (conviria pensar em comboios com alimentação por catenária rígida, eventualmente com dupla alimentação, também por 3ºcarril, para circulação nas linhas atuais, e coordenar a aquisição com os comboios para a linha de Cascais).
Para isso, seria conveniente começar a elaboração dos cadernos de encargos para aquisição ao abrigo dos programas europeus 2021-2027, uma vez que, para fins ferroviários, não foram devidamente aproveitadas, por falta de fundamento para as propostas (isto é, indefinição de planos) as oportunidades do programa 2014-2020, do CEF e do plano Juncker. Dir-se-á que ainda é muito cedo, que há tempo. E eu digo que não, que há pouco tempo.









terça-feira, 25 de outubro de 2016

Aeroporto, aeroporto

O acidente na aterragem de um ATR subcontratado à Omni para a ponte aérea Lisboa-Porto em 22 de outubro suscita-me os seguintes comentários.
Desta vez não quero colocar hipóteses ainda durante o curso do inquérito, até porque as declarações do diretor do gabinete de investigação de acidentes merecem credibilidade (não é de facto admissível a falta de meios do gabinete de investigação nem considerar-se que não se pode taxar os bilhetes de avião com 20 centimos; serviço público tem de ser financiado pelos lucros privados se não querem uma economia totalmente pública). Apenas comentários relacionados com a gestão do aeroporto de Lisboa.
1 - recentemente, numa entrevista de um sindicalista do serviço de estrangeiros, foi referido o grande investimento nas áreas de movimentação de passageiros mas a insuficencia de condições para o controle policial,incluindo de meios humanos e, especialmente, que o aeroporto não tem capacidade para o movimento crescente
2 - de acordo com informações da ANA, pretende-se fechar a pista secundária, ignorando-se se no plano de investimentos se está incluida a ligação do fim da pista principal à área de estacionamento para evitar o cruzamento da pista principal; o acidente do ATR ilustra a vantagem de uma segunda pista (apesar de ser convergente) a comparar com o que se pretende com o seu fecho, aumentar a área de estacionamento (coisa muito útil para planeamento dos horários das low-cost)
3 - seria interessante comparar os custos das remodelações no aeroporto de Lisboa, que me parece ter atingido o seu limite (a menos que se autorize, ao arrepio da lei do ruído (mesmo assim, não é admissível a rota de aproximaão passar por cima de 3 hospitais nem o aeroporto funcionar às duas da manhã) e das diretivas europeias) com os custos da 1ªfase da construção de um novo aeroporto multi-pistas (embora com o inconveniente dos custos adicionais para a ligação ferroviária a Lisboa, mas com os benefícios da ausência de ruído e riscos de acidentes)
4 - idem para os custos elevados da opção  portela+1 relativamente à adaptação do aeroporto do Montijo (incluir a ligação a Lisboa)

O NPIU, núcleo de preservação da identidade urbanística

Espera este blogue não ser processado, dado que o que segue é pura ficção.


Vila Nova de Santa Silvana é uma cidadezinha como as outras.
As pessoas movem-se segundo os padrões da sociologia e da antropologia, sem grandes particularismos. Talvez as mudanças do 25 de abril de 1974 tenham alterado alguns comportamentos, mas isso também aconteceu nas outras cidadezinhas.
Pessoas que foram crescendo integradas nos seus grupos de interesse. Algumas que se foram deslocando de uns grupos sociais para outros, denotando atividade intensa, como movimentos moleculares em busca de estados de maior estabilidade. Fazendo-me recordar as animações dos filmes que vi quando miúdo, nos terrenos então abandonados à beira do rio, onde os exibidores ambulantes passavam filmes no verão. Lembro-me de ver, como documentários antes dos filmes da Disney, animações com movimentações de grandes manchas azuladas, representando as bactérias, enquanto outras manchas, de glóbulos vermelhos e de leucócitos, se engolfavam   umas nas outras.
As mudanças do 25 de abril deram oportunidade a alguns de intervir na coisa pública. A cidadezinha encheu-se de construções novas. Apartamentos para residencia permanente na periferia, apartamentos para aluguer na marginal, blocos disformes plantados no meio dos bairros antigos, ofuscando os modestos mas graciosos edifícios, uns do tempo da alternancia entre regeneradores e progressistas, do tempo da bancarrota do fim do século XIX, outros do tempo da I grande guerra e da belle epoque, quase todos mantendo vestígios de algum requinte com pormenores arquitetónicos que lá foram deixados; apesar das limitações financeiras da época e graças às promessas do crescimento da economia, já em globalização nessa altura, antes da grande depressão.
Cresceram pois, à medida que as estruturas municipais foram ganhando a força da democracia  local, os blocos inestéticos, enquanto se agilizavam os mecanismos de ligação entre empreiteiros e decisores e licenciadores autárquicos.
Mas precisamente por causa dessa agilização e dos seus resultados era patente a necessidade de moderar a fúria construtiva.
Formou-se assim o núcleo. Um núcleo de preservação do charme antigo da cidadezinha, dos seus pormenores mimosos, o núcleo de preservação da identidade urbanística de Vila Nova de Santa Silvana, o NPIU. Em sintonia com os princípios do controle de qualidade das grandes empresas e da supervisão pelas entidades públicas da conformidade com os padrões da legalidade urbana e do equilíbrio estético. Associado o núcleo, em interpenetração como nos desenhos animados os glóbulos e as bactérias, às forças de geração da construção civil interligadas, por sua vez, com os decisores camarários. Controlando por um lado a barbárie da destruição dos vestígios, mas ao mesmo tempo dissimulando a barbárie do ofuscamento desses vestígios pelas novas construções e pelo novo urbanismo, e legitimando a assunção do poder pelos membros do núcleo.
Foi o aproveitamento de uma oportunidade, porque nenhum dos grupos mais ou menos maçónicos, que cresceram na cidadezinha com a República como cogumelos, o podia fazer. Além de que sempre foram pouco recetivos aos recem-chegados, quer os que vinham de fora de Vila Nova de Santa Silvana, quer os que, nascidos santasilvanenses, vinham dos extratos sociais mais humildes, menos preponderantes.
Assim foram percorridos pelos entusiastas do núcleo as ruas da cidadezinha. Feito o levantamento das maravilhas dos azulejos decorativos nas pequenas fachadas, rocócó uns, art deco outros, devidamente reportados em paineis na via pública. Mas feito também o levantamento dos edificios abandonados e deixados a apodrecer com a morte dos moradores, cujos descendentes emigraram para a Europa ou para Lisboa.
Como recuperá-los? interrogaram-se no núcleo. E a resposta foi dada. Os herdeiros absentistas que não conseguiam vender os desprezados edificios, ou que apenas não tinham dinheiro para pagar sequer a pintura exterior, porque as paredes se encontravam em estado avançado de degradação, ou porque o telhado já tinha deixado entrar água suficiente para corroer os sobrados, começaram a receber intimações da câmara para fazer as obras. Caso o não fizessem, a taxa de IMI seria aumentada astronomicamente, ou teriam de pagar obras coercivas. De nada serviu aos pobres pedir apoio à câmara na obtenção de fundos comunitários para rentabilização dos seus imóveis, nem reivindicar um mercado de remodelação de edifícios com preços controlados oficialmente, ou a negociação de um seguro de bom fim para as obras, quanto mais não fosse para prevenir a fuga do empreiteiro a meio da obra.
Ao contrário, o núcleo coordenou com um empreiteiro conhecido, já com amplos negócios com a câmara a apresentação aos herdeiros proprietários de proposta de aquisição por preços francamente abaixo dos valores patrimoniais atualizados.
E assim foram sendo vendidos, à medida que os anos passavam e os IMIs subiam para quem não vendia, ao mesmo tempo que todos os anos a proposta de compra baixava de valor, afastando-se a eventual concorrência com a garantia de não aprovação dos projetos que apresentassem por não cumprirem os requisitos de preservação do núcleo.
Tendo vários empreiteiros devidamente selecionados integrado este movimento de renovação urbanística, a coisa chegou ao ponto do núcleo promover o embargo de obras de remodelação de edifícios, normalmente de acrescento de andares para aluguer a turistas, ou construção de garagens,que estivessem a cargo de empreiteiros estranhos aos seus movimentos. Por não cumprimento, claro, dos requisitos.
E mais se lembrou o núcleo de nova forma para afirmar o seu poder. O presidente da câmara e a sua vereadora do urbanismo concordaram. E na próxima assembleia municipal fizeram aprovar o novo regulamento com a atualização da tabela dos valores patrimoniais. Aqueles terrenos ali, na zona urbanizada e urbanizável onde já pululavam moradias uni-familiares de alto nível e blocos residenciais para a classe média-alta, tiveram uma subida vertiginosa do seu valor patrimonial.
Bem protestaram, mas inutilmente, os proprietários, que almejavam vender os terrenos com lucro depois de aprovado um projeto de construção. Não tiveram sorte porque os avaliadores da arbitragem estavam por demais ligados ao núcleo.  De modo que não tardaram em começar a vender os seus lotes a preços de cerca de um terço do valor patrimonial. Por coincidência, a maior parte dos compradores estava ligada ao núcleo, aguardando a aprovação de novo plano de urbanização, convenientemente compatível com novo plano municipal diretor e nova atualização, mais modesta, do valor patrimonial.
Coisa semelhante, aliás, ao que se passara anos antes, quando os terrenos junto da ETAR foram vendidos barato, e comprados pelo núcleo, para mais tarde serem vendidos com lucro, depois da mudança de local da ETAR.
Vila Nova de Santa Silvana prossegue a sua auspiciosa caminhada. Ainda recentemente o seu presidente da câmara anunciou, no auditório do palácio dos congressos da cidadezinha, a realização do próximo concurso mundial de uma modalidade desportiva ligada ao mar, mas que não tem nada que ver com o NPIU. Será uma nova oportunidade, na diversidade.

domingo, 23 de outubro de 2016

De Jorge de Sena, a Paz, a propósito da problemática da energia elétrica

Com os devidos agradecimentos  à antena2 e o seu programa A vida breve
http://www.rtp.pt/play/p1109/a-vida-breve

e ao amigo Mario Ribeiro, sempre atento e diligente na distribuição de informação sobre as energias e os transportes,

https://www.publico.pt/economia/noticia/governo-avanca-com-corte-de-140-milhoes-nas-renovaveis-1747382?page=-1



De Jorge de Sena,também engenheiro nos Monumentos Nacionais e na Junta Autónoma de Estradas de 1947 a 1959, com uma breve referência aos negócios das centrais elétricas e à sua sábia questão:

na insólita fortuna da desgraça
à luz do cogumelo cor de fogo
que vitrifica areias do deserto
e não distingue o livro de horas
do duque de Berry
de uma criança no berço nem a Venus de Milo duma welwichia mirabilis
nem um tigre do amor de dois gatos num pátio entre latas vazias
e que chegarão para liquidar a sábia questão 
das centrais térmicas de apoio às hidroelétricas
com as respetivas companhias de distribuição
onde não há que chegue para umas e para outras
mas é preciso comprar carvão
e as vocações de aguadeiro ainda não acabaram 
nesta insólita fortuna a luz que vem
oh em poeiras inofensivas
rezo a mim mesmo para não perder a memória por vós
para que saibais sempre lembrar-vos
de que tudo se perde onde se perde a  paz
e primeiro que tudo 
se perde a liberdade

Isto a propósito do anunciado corte de 140 milhões de euros nas rendas as empresas de renováveis (de 100€/MWh quantto terá baixado? terá chegado ao máximo dos máximos, 50€/MWh?), e que aplaudirei quando se concretizar, juntamente com cortes nos subsídios da "interruptibilidade" e "garantia de potência" (o conceito de seguro não se terá estendido infelizmente até aqui), concorrendo assim para a redução do défice tarifário.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

email para o DN de Paulo Baldaia - um dia na vida dos sindicatos, ou o silêncio dos sindicatos

Um dia na vida dos sindicatos, ou o silêncio dos sindicatos

Senhor diretor

Considere, por favor, esta missiva como um desabafo.
No dia 18 de outubro publicou um editorial perguntando onde estava Wally Nogueira e afirmando que os sindicatos da CGTP deviam ter vergonha pelo seu silêncio.
No dia seguinte o DN, honradamente, publicou uma resposta da FENPROF mostrando que tem publicitado as suas denúncias e protestos.
Atribuí o editorial a falta de assessores que preparassem o trabalho. Como hipótese, porque não conheço os pormenores.
Mas no dia seguinte, no Publico, a opinião de J.M Tavares, desvalorizando completamente as denúncias do site da FENPROF e mostrando saudades de greves.
Verifico que nas caixas de comentários há muitos que aplaudem, e nem todos estipendiados pela oposição.
Isto é, dizer que  a CGTP está em silêncio por causa da geringonça dá audiência (ou como talvez dissesse Oscar Wilde, se as caixas de comentários te aplaudem, vê onde erraste).
Há dias enviei um email a J.M.Fernandes porque também ele falava no silêncio dos sindicatos perante a degradação dos transportes públicos (degradação sim, ma non troppo porque há bons trabalhadores):
Claro que não tive resposta, mas o Observador é um jornal de fação, um bom jornal, com bons colaboradores e bem estruturado, mas de fação, cumpre a sua função.
No mesmo dia assisto ao telejornal da RTP1 e apanho, a todo o ecran, com o Wally Nogueira, anunciando que tem uma ação contra o ministério por sobrecarga dos horários dos professores do 1ºciclo (num país cujo principal problema é o desemprego e o peso da despesa pública com pessoal está na metade inferior da estatística dos países europeus), ver minuto  20.25:
Concluo, mas é também uma hipótese, que os meios de comunicação social andarão a silenciar os sindicatos porque na verdade já não via Wally há uns tempos. Mas vi-o, nesse dia.
E depois de jantar, oiço esta coisa incrível na prova dos nove, pela boca de Paulo Rangel, que zero, o Wally não aparece na televisão  e que o metro é um desastre (informe-se o senhor que os rodados novos já foram encomendados e os primeiros chegam em novembro, e o serviço entretanto vai funcionando), ver minuto 24.20:
Claro que P.Rangel é um bom deputado, mas falou como voz de uma fação (num país que precisa de colaboração/coordenação e não de competição).
Recebo ao fim do dia a informação 176 da FECTRANS (federação dos sindicatos dos transportes e comunicações), anunciando uma greve para 27 de outubro pelo desprezo a que o governo tem votado a EMEF (num país cuja situação social e financeira justifica, conforme as regras da UE, alguma proteção a empresas) e outra no MTS para 2 de novembro:
Não me parece motivo de regozijo, mas J.M.Fernandes e J.M.Tavares poderão matar saudades de greves (dirão talvez que as greves vão ser canceladas, mas então dêem atenção às greves da Portway).
Enfim, senhor diretor, o meu desabafo, em forma de voto, é este: que os senhores jornalistas e os senhores comentadores não me afirmem coisas que são o contrário do que eu vejo.
Com os melhores cumprimentos
F.Santos e Silva
Reformado do metropolitano de Lisboa com o nº 3051
Sócio 21059 do STRUP
Especialista de transportes da Ordem dos Engenheiros com o nº 10973
santos.silva45@hotmail.com



terça-feira, 11 de outubro de 2016

2030 na Alemanha de carros elétricos

Curiosa a notícia que vem da Alemanha, porque não parece ser o mercado a funcionar. 2030 é um bom marco para início da exclusividade de fabrico de automóveis elétricos, por razões ambientais.

http://observador.pt/2016/10/10/alemanha-vai-banir-carros-a-gasolina-e-gasoleo/#comment-post-1720041-1388002

Mas não resolve o problema dos engarrafamentos  do transporte individual em cidades não preparadas. Também seria interessante uma diretiva para utilização da tração elétrica em autocarros e camiões (já há troços experimentais de autoestradas eletrificadas com catenárias para camiões...).

Continuo a pensar que há espaço para a variante elétrica com alimentação por hidrogénio de células de combustível a bordo. O hidrogénio pode ser fabricado por eletrólise de forma descentralizada a partir da rede elétrica de fontes renováveis.
Quanto às baterias, duvido dos valores de autonomia anunciados (mais de 350 km), até porque o peso das baterias para a capacidade requerida (em climas quentes com necessidade de ar condicionado, estimo um consumo de 250 Wh/km, o que implicaria uma bateria com 85 kWh úteis - 500 kg? a juntar a 350 kg para 4 passageiros e bagagem...).

A seguir, com interesse.

Os 3 poderes

Ensinaram-me no liceu, na disciplina de organização política e administrativa da nação, que há 3 poderes, o executivo do governo, o legislativo do parlamento e o judicial.
E dizia a professora, que apesar de esposa de um ministro do doente de Santa Comba, tinha uma sólida formação em história e filosofia e humanista, que a independencia destes 3 poderes é essencial.
E que o problema era, tal como no caso de quem guarda o guarda de Juvenal, quem controla o judicial.
Parecerá que a resposta é ir aos fundamentos da democracia e concluir que serão os cidadãos e as cidadãs que controlarão o poder judicial através da exigência de exame de todas as decisões, ou como se diz agora, de escrutínio. Não se pretendem julgamentos populares, mas que se mostre bem quando um disparate é cometido, quando manifestamente quem tem poderes decisórios põe á frente o interesse corporativo em vez do interesse público, que as coisas fiquem bem claramente expostas.

Eis porque agradeço à Antena 2 , ao seu programa Um certo olhar, e ao seu  convidado Francisco Teixeira da Mota, as informações preciosas sobre algumas inconformidades gritantes do poder judicial em Portugal, com decisões do supremo condenadas pelo tribunal europeu dos direitos humanos (ver a partir do minuto 42 como se apresentam as reclamações ao tribunal pela internet e de forma gratuita).
http://www.rtp.pt/play/p304/e253557/um-certo-olhar

Assim se compreende o pobre estado da justiça em Portugal, que merece apelos do senhor presidente da República, mas que só mudará, salvo melhor opinião, se se aplicar ao poder judicial, para além do tal escrutínio público, o critério organizativo nas empresas dos departamentos de qualidade  (independentes do poder hierárquico, isto é, neste caso, nenhum orgão supremo de magistrados poderá ter poder hierárquico sobre outros magistrados que investiguem um caso ou trabalhem num processo, nem impedi-los de publicamente dizerem sobre o caso o que entenderem ser o melhor para a investigação ou o processo - lá se iria mais um sigilo, que, como se sabe, é um dos melhores meios de manter os privilégios ou a incompetência de um grupo).
Mas é difícil, seria preciso mudar de linguagem académica, acabar com o sigilo, dar mais importancia aos factos e aos dados criticamente aceites, do que às formalidades jurídicas.
Difícil, mas não impossível, pelo menos valha-nos o tribunal europeu.

No mesmo programa, centrado nas condenações devidas a liberdade de expressão, dão-se vários exemplos. Um deles em que um jornal foi condenado pelo supremo a pagar uma indemnização a um clube de futebol por ter revelado que este tinha uma dívida, o que, para o tribunal português, constituiu uma difamação contra o bom nome (!!!) . Mas o tribunal europeu, naturalmente, não concordou. Só que as indemnizações a que o estado português é condenado por não respeitar a liberdade de expressão (artigo 10 da convenção) são pagas com dinheiro dos contribuintes (!!!). Assim é difícil, pobre estado da justiça em Portugal (será este blogue processado?).

PS em 6 de novembro - Oiço admirado no programa O último apaga a luz,um dos intervenientes contar a história de um cidadão reformado que escreveu uma carta zangada ao senhor deputado que criou o termo "a peste grisalha". O senhor deputado, abstraindo que tinha sido ele a começar os insultos chamando peste a quem recebe a sua reforma de acordo com as contas legais, processou o reclamante e ganhou o processo. Que ele, convencido do seu poder, tenha insultado primeiro e humilhado depois, é com ele e a sua consciência, mas o tribunal violar o direito de expressão por indignação, e depois do tribunal dos direitos humanos ter admoestado a jurisprudencia portuguesa e condenado o Estado (os contribuintes) a indemnizar os lesados injustamente condenados, faz descrer na capacidade da instituição  integrar a equipa dos 3 poderes.
E vamos a ver se este blogue não é também processado.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Email para o Observador de José Manuel Fernandes

Comentário ao artigo de José Manuel Fernandes no Observador de 2 de outubro:




Exmo Senhor José Manuel Fernandes

Relativamente ao seu artigo no Observador de 2 de outubro sobre a degradação do serviço do metropolitano de Lisboa,

envio-lhe, na qualidade de reformado, o seguinte comentário por este meio, dada a sua extensão inviabilizar a inserção na caixa de comentários.

Duma maneira geral, como aliás não poderia deixar de ser, considerando a evidente degradação do serviço do metro, o seu artigo contem informação válida e tem interesse público.
No entanto, gostaria de mencionar três incorreções do seu texto.

Uma irrelevante, dada a pequena diferença entre os 15 milhões de euros anuais dos complementos de reforma e o valor real inferior a 13 milhões, com tendência a decrescer dada a mortalidade que já se vai verificando entre os 1400 reformados com direito ao complemento de reforma (este direito extinguiu-se em 2004, deixando os trabalhadores admitidos posteriormente de beneficiar dele).

Das outras duas, uma refere-se ao termo "exponencial" para o aumento dos custos de pessoal devido à reposição dos complementos de reforma. Não disponho dos gastos com pessoal de 2015 (não houve pagamento de complementos de reforma) nem de 2016 (já houve pagamento de complementos de reforma a partir de abril), mas estimando valores semelhantes aos de 2014 (não houve pagamento de complementos de reforma) de 68 milhões de euros, a subida devida aos complementos seria de cerca de 20%. Numa subida exponencial, é preciso que um expoente se aplique à base da potência, e não parece ser matematicamente o caso.

A terceira incorreção parece mais grave do ponto de vista jornalístico, por negar uma informação pública. Como se poderá ver por estas ligações,

Comunicado STRUP 13jul2016 degradação empresas transportes:
resolução aprovada em 14jul2016 com mensagem entregue ao 1ºministro:
carta aberta ao ministro das finanças de 20set2016:

a CGTP não esteve muda e queda quanto à degradação verificada no metro, não podendo portanto ser acusada de esconder as deficiências, embora, qualquer que seja a sua atitude, suscitará sempre críticas.
Aliás, os serviços técnicos do metro avisaram oportunamente a sua administração da necessidade de encomenda de novos rodados  por os mais antigos terem atingido o limite inferior de tolerância. Igualmente avisaram do próximo esgotamento do stock de rolos de cartolina com chip, mas não terá sido dada a devida atenção (os gastos normais com fornecimentos e serviços externos no metro são da ordem de 31 milhões de euros por ano, suficientes para cobrir uma primeira encomenda de rodados e de rolos de cartolina, sem necessidade de ir “buscar” dinheiro aos gastos com pessoal ). Como consequência, estão atualmente parados 18 comboios num total de 111. Mas já foram encomendados rodados novos, esperando-se um prazo de entrega de 4 meses mais outro tanto para reposição em serviço de todos os comboios afetados.

Poderei ainda falar numa quarta incorreção, mas esta de natureza subjetiva.
Não foi o meu caso, dado ter retardado a minha reforma (mesmo assim, vi diminuído o meu rendimento de cerca de 20%, o que contraria o mito de que os reformados do metro têm uma reforma que lhes permitiu conservar o rendimento), mas muitos dos meus colegas viram o seu rendimento diminuido de cerca de 40% enquanto os complementos de reforma estiveram cortados. Recebiam 2000 euros (depois de uma carreira contributiva de 40 anos, apesar de alguns se terem reformado com 55 anos) e passaram a receber 1200 euros. Quando se lhes chama privilegiados e se responsabilizam os reformados do metro pelo colapso económico da empresa (e do país, como alguns comentadores jornalistas ou de caixa de comentário fazem) está-se, quanto a mim, a ofendê-los, embora isso não seja mais do que um esforço de desvalorização do fator trabalho.
É ainda verdade ( contudo, os artigos de opinião não devem apresentar só meias verdades) que a média dos complementos de reforma, 640 euros, é muito mais do que a maioria das pensões de reforma. Certo, mas isso demonstra o estado de penúria do país quando comparado com o resto da Europa (exceto países de leste), que os pensionistas do metro tiveram carreiras contributivas longas, que, como disse o ministro sueco a Otelo, deve nivelar-se por cima, não por baixo, e que podemos em qualquer altura abrir um debate sobre  a abertura ou fecho do leque salarial e das pensões em Portugal (comparar por exemplo os salários e as reformas do metro e do Banco de Portugal, da EDP, da TAP, os complementos de reforma do metro com as subvenções vitalícias por poucos anos de deputado…com a reforma do senhor doutor Catroga…) .

Eis porque acho deselegante o seu artigo, repetindo que é uma apreciação subjetiva, embora com base numa conceção moral, e convidativo aos comentários pouco educados que se podem ler em anexo do artigo (e contudo, alguns comentadores mostraram lucidez nas suas análises).

Gostaria ainda de chamar a sua atenção, já que se trata de dinheiros públicos, para algumas das razões da existência de complementos de reforma até 2004. Até aos anos 90, os ordenados do metro eram inferiores até aos da CP. Por isso a inclusão dos complementos no contrato de trabalho servia de atrativo.
Se calcularmos o rendimento obtido com a capitalização desse diferencial, coisa que em parte poderia ter sido feita mas não o foi por incúria de algumas administrações (outras foram sucessivamente tentando, sem sucesso junto da tutela e do ministério das finanças, a criação de fundos de pensões – como é fácil criticar quando não se está dentro do furacão, coisa aplicável ao escândalo dos swap) obteremos (obteríamos) um valor confortável para o pagamento dos complementos durante 20 anos.
Igualmente podemos dizer que a reforma antecipada de grande parte dos 1400 reformados do metro com complementos de reforma gerou poupanças para a empresa graças ao trabalho desses reformados que ao longo dos anos foram capazes de construir um metropolitano cujos indicadores ombreavam com os homólogos, que souberam manter o serviço quando empresas inglesas e americanas exerceram boicote de fornecimento de peças a seguir ao 25 de abril e que, graças à excelência do seu trabalho e à própria inércia do sistema, deixaram um sistema de transportes que pode funcionar com menos trabalhadores.
Admitindo um valor médio do complemento de reforma de 640 euros (a pagar pelo metro depois da reforma) correspondente a um salário antes da reforma de 2200 euros (incluindo descontos para a segurança social), a poupança mensal por reformado será de cerca de 1600 euros (22400 euros por ano por reformado). Se  1000 trabalhadores anteciparam a sua reforma (a empresa insistiu com eles) de 5 anos, a poupança terá sido de cerca de 110 milhões de euros. Metade bem poderia ter sido utilizada num fundo de pensões, coisa prevista na lei da reforma da segurança social de 2007, mas não se pensou nisso.
É verdade que este é um processo perverso, porque a poupança é suportada pela segurança social, mas consideremos que se tivessem permanecido na empresa ter-se-iam reformado com uma carreira contributiva de 45 anos (quando se obrigam crianças a trabalhar, como querem que haja justiça?).

Caso tenha curiosidade em conhecer outros pontos de vista sobre a problemática dos transportes, seu financiamento, condicionamentos, contexto internacional, relação com as energias e as emissões,  e sobre os reformados do metro, incluindo o cálculo dos custos das privatizações (pág.231) e da capitalização das poupanças do diferencial de salários anteriores aos anos 90 (pág.300), sugiro a leitura de

Terei muito prazer em lhe oferecer gratuitamente uma versão pdf , caso queira.

Mas não tenho grande esperança que este email chegue ao destinatário ou que este lhe preste atenção, e quando digo isto estou a manifestar grande descrença na sociedade que se diz de informação e de partilha de conhecimentos, experiências e potencialidades, o que, no fundo, virá confirmar a manutenção do estado em que vivemos de apagada e vil tristeza de que já Luis Vaz falava, e a incapacidade que nós, portugueses, temos de nos organizarmos em comunidade aberta, participativa e produtiva.

Com os melhores cumprimentos
Fernando Santos e Silva

Reformado do metropolitano de Lisboa

PS em 27 de novembro de 2016 - Será quase certo que o email não foi lido pelo destinatário, mas ele surpreendeu-me ontem, numa mesa televisiva de comentário ao aniversário do XXI governo. Voltou a falar no metro e nas excessivas regalias dos seus trabalhadores, Só que desta vez disse que as suas remunerações eram excessivas apenas por comparação com a maioria dos outros trabalhadores, que era uma coisa relativa, não um valor absoluto do seu trabalho. Como diria Fernando Pessa, e esta hein? afinal não quer desvalorizar o trabalho de quem trabalha, é só por uma questão de comparação (não claro, com o banco de Portugal ou com a EDP ou com a reforma da SAPEC). Pode ser que mais tarde venha a concordar que se deve nivelar mais por cima do que por baixo. Vamos ver.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

o acidente em Hoboken e o New Jersey Transit

Para além de lamentar amorte da jovem mãe no acidente de Hoboken, pouco há de novo a dizer. Até porque é a repetição de um acidente de 2011, por ausencia de um sistema de controle continuo de velocidade.
O desinvestimento nos sistemas de transporte ferroviário aumentam as probabilidades de acidente.
Este tipo de acidentes, num terminal ferroviário multi-via e sem distancia de segurança na travagem tem normalmente como causas a perda do sentido de localização pelo maquinista (a síndroma do risco branco) ou uma sua desatenção, ou uma deficiência no sistema de travagem, ou a inexistencia de um controle de velocidade contínuo (ATP/Automatic train control na Europa, PTC/positiv train control nos USA).
Neste caso, a composição era composta por 4 carruagens e uma locomotiva. Segundo o revisor, a omposição normal é de 5 carruagens, o que, juntamente com a informação de que a dotação oficial da transportadora (que é uma empresa oública do estado de NewJersey) é um décimo do que era em 2009, que o prejuízo este ano é de 45 milhões de dolares e que a transportador está sem diretor executivo e sem reunião da direção há meses, indicia que as condições de exploração atuais são inseguras.

Numa altura em que o desinvestimento e a desorçamentação conduziram à degradação no metro e na linha de Cascais,este é um exemplo dos riscos do subfinanciamento das transportadoras (que obviamente, por não serem rentáveis se cumprirem as regras de segurança, no caso investir no controle contínuo de velocidade, não podem interessar exploradores privados, por mais eficazes que sejam) .

Mas continua a olhar-se para o problema do transporte coletivo ferroviário na ótica da contabilidade estrita, omitindo a análise de custos benefícios que contabilize as externalidades do transporte individual (o desperdício em combustíveis fósseis) e os benefícios do coletivo (redução das emissões com efeito de estufa).

E assim é dificil.



http://www.nytimes.com/2016/09/30/nyregion/nj-transit-executive-director.html?action=click&contentCollection=N.Y.%20%2F%20Region&module=RelatedCoverage&region=EndOfArticle&pgtype=article

http://www.nytimes.com/interactive/2016/05/17/us/amtrak-train-crash-derailment-philadelphia.html

http://newyork.cbslocal.com/2016/09/30/nj-transit-hoboken-crash-investigation/


PS em 7 de outubro de 2016 - Fiel à sua prática de divulgação dos avanços da sua investigação sobre os acidentes, diametralmente oposta à prática secretista de muitos gabinetes de investigação europeus (4 meses passados sobre o acidente na Bélgica em Saint Georges sur Meuse mantem-se o segredo sobre o inquérito) o NTSB informou divulgou ontem os dados da caixa negra entretanto recuperada:
http://abcnews.go.com/US/hoboken-train-sped-crash-emergency-brake-applied-ntsb/story?id=42613630 

38 segundos antes de bater, o manípulo de comando de tração mudou da posição neutra para a posição 4 e o comboio acelerou de 12,8 km/h para 33,6 km/h . A 1 segundo antes de bater a travagem de emergencia foi acionada. Isto é, até 60 metros antes de bater o comboio cumpria a velocidade regulamentar (podia travar em 7 metros), mas acelerou até 9 metros antes de bater, quando foi atuada a travagem de emergência.
Embora ainda sem se poder ter certezas, esta informação é compatível com a hipótese da síndroma do risco branco (comportamento do maquinista como que hipnotizado momentaneamente, perdendo  a noção da localização e julgando que já tinha parado e acelerado como se estivesse no percurso para outra estação - caso semelhante ao do maquinista do Metro North em Nova York que abordou a curva a uma velocidade superior à admissível e no metro de Lisboa no término da estação Aeroporto) quando bateu no fim do término). Também é compatível com a hipótese de que um sistema ATP teria evitado o acidente. Aliás a recomendação do NTSB para instalação de ATP é recorrente.
Aguardemos a evolução da investigação.