segunda-feira, 29 de junho de 2009

Economicómio XI – O monte dos perdigões

Tive o prazer de encontrar hoje uma colega economista que muito admiro.
Aproveitei para provocá-la, como representante dos economistas, dizendo que eles só pensam na estatística do PIB, sem se ralarem se o que para lá entra é ou não produtivo.
Contratacou ela que a causa principal do atraso português é a dificuldade em nos adaptarmos às novas condições da economia, e que os dirigentes das empresas se demitem da tomada de decisões para essa adaptação.
Sem pôr em causa a justeza do diagnóstico, e até concordando que nos falha em toda a linha a metodologia para a tomada de decisões, acho que vem a propósito o caso da herdade do monte dos perdigões.
Nesta herdade, próximo de Reguengos de Monsaraz, começou a produzir-se o vinho que leva o nome da herdade no rótulo.
A herdade pertence a Henrique Granadeiro, anterior presidente executivo da PT.
Questionado pelos jornalistas sobre a momentosa disputa dos 30% do capital da TVI ambicionado pela PT, fez o diagnóstico, julgo que com alguma autoridade devida à sua experiencia: “O que disseram o presidente da Republica, o primeiro ministro, o governo, e a presidente do principal partido da oposição, ou está fora do contexto ou está fora da realidade”.
Tenho de tirar o chapéu à afirmação, até porque é isso que eu sinto quando qualquer daquelas entidades se pronuncia sobre questões de transportes. E a hipótese de estar fora do contexto funciona como um capuz eficaz para quem se poderia queixar de estar a ser acusado de vítima de doença psiquiátrica de alheamento da realidade.
Todas as entidades citadas mereceram a frase. Pois não é certo que fugiram à recomendação de Melo Antunes (o sector publico deve conviver naturalmente com o sector privado; há espaço para todos)? Se bem que pode ser que não haja o mercado de que estão à espera…
Estar fora da realidade pode não ser doença.
A realidade pode ser pior do que Platão intuiu com as sombras nas cavernas. O nosso cérebro engana-nos. Pode tomar amostras da realidade em pontos isolados. Mas depois une-os com construções virtuais e imaginárias que nos afastam da realidade. E só com uma probabilidade muito pequena poderemos atingir uma boa decisão como somatório de decisões erradas.
E assim contesto a minha colega economista que muito admiro.
Não é a incapacidade de adaptação a novas situações que nos trama a vida económica (ora, ora, houve alguma dificuldade em criar contas “off-shore” quando o contexto se proporcionou?), é os tomadores de decisão estarem fora da realidade.
Como dizia o professor Carvalho Rodrigues, os decisores não utilizam ou não sabem pôr a Ciência na equação; e, como dizia o professor António Câmara, os decisores não conhecem o negócio sobre o qual tomam decisões.
É mesmo um interessante problema de economia, não é?
Fascinante, como dizia Mr.Spock, analisando a trajectória de colisão com o cometa destruidor…

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Energis II – Homenagem ao Prof.Ilharco

O professor Ilharco dava a cadeira de Quimica Geral do primeiro ano dos cursos de engenharia civil, electrotécnica e mecânica do Instituto Superior Técnico nos anos 60.
Fazia-o de acordo com o modelo universitário da época, que ao que parece, felizmente mudou um pouco no nosso país, melhorando a ligação com a economia real (pelo menos, quero crer).
Como em qualquer análise histórica, devemos considerar o contexto da época em que o modelo funcionava, embora na altura já sonhássemos com os campus das universidades norte-americanas.
O professor Ilharco era irmão do director do Hospital psiquiátrico Julio de Matos e esse facto, juntamente com uma preocupação em exigir aos alunos a apresentação uniformizada dos cadernos de apontamentos, contribuía para uma fama injusta.
Porém nesta história o porém é mesmo importante.
E tive a sorte de me explicarem o porém (foi um colega já com o curso concluído) ainda era eu aluno do primeiro ano.
O porém era que o professor Ilharco aproveitava a sua cadeira para injectar logo à entrada do programa dois grandes enunciados (que ele insistia para que os alunos sublinhassem duas vezes):
Um, era o problema fundamental da Humanidade. E embora eu na altura pudesse pensar que o problema fundamental fosse o Amor, a verdade era que o que ficava escrito nos cadernos era qualquer coisa como isto:
- O problema fundamental da Humanidade é a Energia. A sua produção e a sua utilização.
Sem entrar em pormenores explícitos, o professor dava-nos assim as bases para, caso inisistissemos que o problema fundamental era o Amor, analisarmos as kcalorias dos alimentos necessárias para repor a energia muscular consumida, por exemplo, num acto de Amor. Ou calcular as kcalorias para recuperar dum exame e garantir a oxigenação dos tecidos e dos neurónios. Ou entender por que a chita só corre atrás do antílope diminuido se as kcalorias que tiver de dispender na corrida forem menos do que as kcalorias que puder obter ao devorar o antílope. Ou ver com olhos de físico o que Karl Marx queria dizer com aquela de ser necessário fornecer ao produtor energia para repor a capacidade de produção e, mais qualquer coisa. O professor Ilharco não falava em Marx, mas nós falávamos.
O outro enunciado, era o problema fundamental do engenheiro. Coisa que para todos nós na altura estava um pouco distante e, infelizmente para uma maioria, se revelou como a linha do horizonte, afastando-se à medida que nos tentávamos aproximar dela. Por outras palavras, muitos de nós foram sendo impedidos de exercer efectivamente a profissão , e levados a ser gestores virtuais da burocracia, sem utilizar as ferramentas da arte nem instrumentos de medida. Ditava o professor:
- O problema fundamental do engenheiro é a utilização da matéria e da energia de modo a obter benefícios para a comunidade da forma razoavelmente mais económica possível.
As primeiras aulas eram dedicadas ao panorama energético na Terra.
E , num tempo em que o pico da produção de petróleo nos campos do Texas ainda não tinha sido atingido (i,é, em que a produção crescia a olhos vistos de ano para ano antes de entrar em declínio no fim do século XX), e em que a produção dos campos de petróleo da Arábia Saudita ainda balbuciava, longe do pico e do declínio que só agora surgiu, já o professor Ilharco anunciava que os engenheiros não podiam concentrar-se apenas na petroquímica, mas tinham de, o mais tardar no princípio do século XXI, atacar em força a carboquímica.
Nos tempos que correm a informação já foi passada e está ao alcance de qualquer um: o primeiro combustível fóssil a desaparecer será o petróleo (não vai chegar ao fim do século XXI…mesmo que existam reservas), e o seu uso devia ser disciplinado e racionalizado. Depois desaparecerá o carvão (não vai chegar ao fim do século XXII…). Mas tem de ser estudado o seu aproveitamento de modo a não poluir muito.
O professor Ilharco escrevia os seus apontamentos no quadro e repetia martelando as sílabas:
A carboquímica. Será o grande desafio dos engenheiros nos próximos anos.
Estranho mundo este, em que uns quantos diagnosticam os problemas, traçam esquemas de procura de soluções, alguns encontram-nas, mas quando chega a altura de passar à fase seguinte entra em funções uma maldição incógnita.
Será a mão invisível do Adam Smith? (já vos contei que a mão invisível não é a intervenção divina que premeia os justos que crêem firmemente nos mercados? Adam Smith criou o conceito da mão invisível depois de ver Lady Macabeth de Shakespeare, e o castigo implacável e misterioso que se abateu como força invisível sobre o casal oportunista, como metáfora do castigo que aguarda quem se porta mal na economia , ou finanças também, está bem de ver).
E então a mão invisível lançou a insensatez sobre os actores dos mercados dos grandes consumos. Por um lado os rendimentos dos motores de gasolina e de gasóleo subiram dramaticamente, como dizem os anglo-saxónicos, para isso servem os engenheiros, que com o mesmo litro de gasolina põem o carro agora a percorrer o dobro da distancia de há 20 anos. Mas puseram mais potência no motor, tentaram os utilizadores a acelerar mais e mais. Aumentaram a produção e querem vender cada vez mais . O combustível escoa-se. A poluição aumenta. É insustentável. Mas continua a vender-se o sonho do automóvel eterno.
Terá sido a tentação “Tudo isto será teu se prostrado me adorares, a mim ao objecto de grande consumo, se cortares no bife para poderes pagar a prestação do carro”?
A carboquímica não se desenvolveu como o professor esperava. E a petroquímica ignorou o convite à racionalização.
A mão invisível traiu a herança do professor. Mais uma vez se verificou que o caminho descoberto numa dada altura do processo é esquecido depois. O nome deste blogue ilustra o facto: o diâmetro da Terra e o comprimento da milha ou do arco do minuto foram calculados por Eratóstenes no século III A.C. Vieram depois uns ignorantes com capacidade de tomar decisões que decretaram que o sol andava à volta da Terra, e mais disseram que a milha tinha 1609 metros (ou o equivalente em estádios, que era o que se usava na altura). Enganaram-se. Só no fim do século XVIII se confirmou a correcção do cálculo de Eratostenes. A milha tem 1852 metros. Deve ter sido a mão invisível, a baixar um véu sobre a compreensão dos povos.
A mão invisível tramou por exemplo o projecto interessantíssimo do presidente Carter, antigo engenheiro naval que percebeu os dados do problema. Entre as medidas que propôs ao congresso estava o desenvolvimento da carboquímica, concretamente a transformação maciça de carvão em petróleo e em gás (lembram-se de ouvir falar nos gasogéneos que convertiam madeira em gás e punham os automóveis a andar durante a segunda guerra mundial?).
A mão invisível e o congresso chumbaram a proposta. Depois veio o reaganismo e tatcherismo ricos em petróleo e no seu desperdício. Será possível estabelecer uma correlação entre a política energética errada dos USA e as guerras no médio Oriente?
Assim parece, o que só viria confirmar a tese do professor Ilharco, de que a energia (logo, a Paz) é o problema fundamental da Humanidade.
Saravá, professor Ilharco.

Economicómio X – os 28 magníficos

Economicómio X – os 28 magníficos

A mensagem atroa os ares porque as vozes são estentóricas. Quase todos já passaram pelo Prós e Contras e já fizeram um riso amarelo quando a apresentadora lhes diz: mas o ano passado vieram cá e as soluções que propuseram não funcionaram (não são bem estas as palavras, mas também eles depois desculpam-se que nem o povo nem o governo fizeram nada do que eles disseram, mas fizeram ,pelo menos o governo, as coisas que eram concretas, e as abstractas, não, claro, porque eram abstractas).
Por exemplo: o manifesto começa por dizer (e bem, claro, que a competência técnica não está em causa) que a média anual da taxa potencial de crescimento da economia caiu de 3% para 1% ainda antes da crise internacional. A proposta para contrariar isto é reavaliar, com o concurso dos especialistas (lá está, é uma boa solução, mas como e quem vai atar o guizo no pescoço do gato?). É capaz de ser um pouco abstracto...Depois desatam a desancar os investimentos públicos e a propor reavaliações dos ditos e dos PPPs . Noto uma desilusão quando falam em PPPs, será que, parafraseando Sarkozy (este não é o capitalismo que desejávamos) estes não são os PPPs que queríamos? Desancam especialmente os transportes, o que me leva a parafrasear Pancho Guedes (os políticos não percebem nada de cidades) os políticos não percebem nada de transportes.
Reavaliações são o pensamento português no seu melhor: “O que era bom era…” (lembram-se de Armando Cortês, há muitos, muitos anos, num programa de fim de ano em que uma colectividadezinha rural de cultura e recreio organizava uma festa. Em todas as reuniões preparatórias o Armando Cortês interrompia as discussões das pessoas importantes e repisava: “O que era bom era que a televisão transmitisse”.
Vá, estudem o Armando Cortês, ele era profundo nas caricaturas que fazia…
Mas como sou eu que não percebo nada de economia, tenho de me contentar em fazer uma reflexão sobre um defeito que me ficou da infância: uma vez dita ou combinada uma coisa, as pessoas que a apoiaram ou que a contrariaram ou que se estiveram nas tintas ficam retidas na minha memória. É um defeito, eu sei, será uma zona de neurónios do meu cérebro que se distorceu no período de formação, mas é um facto.
E do que eu me lembro é, no tempo em que a crise internacional ainda não falava nem tinha sido anunciada pelos senhores economistas sábios, um deputado da Nação foi repreendido pelo ministro das Finanças sobranceiramente nestes termos: “Senhor deputado, tenha termos, não chame criminosos aos banqueiros”. Não consta que o ministro tenha pedido desculpa ao deputado, nem os banqueiros pediram (os banqueiros de que se falava, claro).
Eu lembrei-me desta porque o Ministério Público acusou ontem de burla uns senhores gestores de um banco muito conhecido, por criarem 17 contas “off-shore” para manipularem as cotações da Bolsa.
Senhores economistas. Eu agradecia que na altura tivessem dado uma ajuda.
Agora…
Mas enfim, vou seguir a vossa recomendação e entrarei em http://www.reavaliarinvpublicos.com/
A ver se depois digo alguma coisa. Assim como assim, pode ser que me considerem especialista de alguma coisa. Há sempre uma especialidade desconhecida em cada português. É por isso que o problema é principalmente de organização. Como dizia o outro, deixem trabalhar os portugueses (já viram isto, eu a inspirar-me no Adam Smith...).

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Energis I – O petróleo das areias do Canadá

Energis I – O petróleo das areias do Canadá

Sugiro a leitura de:
http://www.energytomorrow.org/Canadian_Oil_Sands.aspx?utm_source=website&utm_medium=banner&utm_content=oil%2Bsands&utm_campaign=March%2B2009

Vejam como se abre à industria do petróleo e do gás natural dos USA um futuro radioso.
Radioso a curto prazo, claro.
Depois de passado o pico da produção nos próprios USA e de nos aproximarmos do pico na Arábia Saudita, eis que o Canadá é o redentor fornecedor de petróleo dos USA.
Sorry, folks, it’s not fair.
Let’s study this case togheter.
Forget the profit for a while.
Explore Canada sands oil, OK, but let’s study how.
Togheter, please.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Nefertiti em Paris




Salam uleikum (saúdo-te) Sheika Muza Nasser Al Misnad.


Baraka lau fik (que as bençãos do céu desçam sobre ti e sobre os teus descendentes).


Eu por mim, viva a república, mas atendendo ao contexto, apoio.


Transformarás o Qatar sem burkas nem chadors, nem grandes hijabs, que a filha do profeta quando não estava vento também não precisava.


Nefertiti também tentou, cada qual no seu milénio, claro.


A coisa há-de ir.




Esta mensagem é dedicada a uma colega a trabalhar na Argélia.


Sheika Muza é mulher do Sheik do Qatar e tem contribuido para o desenvolvimento educacional do país.


Nefertiti, mulher do faraó Akhenaton, juntamente com o marido, contribuiu para uma mudança de mentalidade no Antigo Egipto (século XIV A.C.)

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Economicómio IX- Nortel, Nortel, também tu?

A Nortel canadiana era uma das principais empresas fabricantes de telecomunicações do mundo.
Está à beira da falência.
As telecomunicações, nomeadamente as radiocomunicações de que a Nortel era expoente, não são propriamente automóveis.
Por que razão abrem falência?
Estava tão saturado o mercado , e nós não víamos?
Nada é viável neste mundo, nem as vigarices do Madoff?
Será tudo uma questão de tempo?
Eu diria que os senhores economistas deviam deixar-se de manifestos e tentar perceber estas coisas.
Depois expliquem.
Ou expliquem que não percebem, pelo menos com as leis vigentes e aceites da economia actual.

O surpreendente metro de Madrid – II

O surpreendente metro de Madrid – II

Já se conhece qualquer coisa da carta que Manuel Melis, presidente não executivo do metro de Madrid enviou ao senhor conselheiro da assembleia da região autónoma de Madrid e que foi considerado por este como incompreeensível (pobres conselheiros da comissão de transportes, queriam que eles percebessem de transportes; malvados). Não esquecer que Manuel Melis confessou-se muito farto da “pomposidade e suficiência com que falam os conselheiros de transportes” (referindo-se à região de Madrid, claro).
Ver em: http://www.ines-sabanes.net/?p=1043
Quer dizer que as causas do descarrilamento estão mais ou menos no domínio do catálogo. Será que não existe uma articulação eficaz entre os serviços do metro de Madrid e o seu presidente não executivo? Será que a teoria dos compartimentos estanques e a falta de qualidades de trabalho em equipa se verificam também no metro de Madrid?
– primeira hipótese: galgamento da cabeça do carril pelo verdugo (o verdugo - pestaña em castelhano - é aquela circunferência maior do lado de dentro da roda que mantem o rodado dentro dos carris); na realidade, há muitas hipóteses dentro desta, desde o desalinhamento ou desnivelamento de uma das rodas relativamente às outras, defeito da suspensão, defeito de nivelamento da via, gripagem do verdugo com a cabeça de carril…); o próprio Manuel Melis explica que vem tudo explicado no livro dele: “Ferrocarriles Metropolitanos”, 3ª edição. Acho que vou encomendar
- segunda hipótese: problemas de dinâmica vertical da via e variações da rigidez vertical da via
(aqui convem esclarecer que o sistema de fixação da via no metro de Madrid é radicalmente diferente do que se usa em Portugal: fora das zonas de agulhas, os carris estão assentes em sapatas – tacos em castelhano - embebidas no betão através de elastómeros amortecedores de ruidos e vibrações, sem travessa de sujeição entre sapatas; para conhecer o sistema de via férrea do metro de Madrid ver em: http://www.railforum.net/PresentacionesPonencias/2004/12%20-%20Via%20-%20Mayo%202004/PRESENTACION%20RENOVACION%20DE%20VIA%20Metro%20de%20Madrid%202004.pdf)
- medidas a executar: Manuel Melis quer medir as rigidezes e as elasticidades das sapatas e das travessas quando existentes no troço do descarrilamento, bem como as elasticidades das suspensões (exige o desmonte dos bogies), seguindo-se a introdução destes dados num simulador Simpack de vibrações (para conhecer o funcionamento do simulador Simpack ver em: http://www.simpack.com/uploads/media/um06_dc-meljnikov_10.pdf).
Da análise dos resultados do simulador sairá a tal causa a explicar ao senhor conselheiro numa Hamburgeria.
Isto é, ainda não houve tempo para medir os parâmetros que o homem quer? Será que alguém com funções executivas no metro de Madrid acha que não é preciso?
Realmente, La Palice poderia dizer que o descarrilamento se deu por defeito da via, ou por defeito da suspensão ou do material circulante, ou por incompatibilidade entre material circulante e via.
Mas isso era La Palice (ou eu). Parece não ser o caso de Manuel Melis, a quem tiro o chapéu.

Ainda a Airbus e os seus automatismos

Mais um incidente com um Airbus 330. Num voo da Qantas houve uma descida brusca do avião, em automático, fora do controle dos pilotos, que conseguiram recuperá-lo.
Provavelmente não se vai conseguir recuperar as caixas negras do voo 447.
A Airbus já teve tempo para esclarecer o público, e deveria tê-lo feito, sobre uma hipótese que, não podendo afirmar-se que provocou o acidente, pode afirmar-se, com base nas informações disponíveis, que poderia tê-lo provocado.
De facto, as centrais de inércia ADIRU da Airbus estão programadas, no caso dos sensores de velocidade aerodinâmica Pitot detectarem velocidade baixa próximo do ponto de perda (ou no caso delas avariarem e darem informações erradas por defeito) para provocar o abaixamento do focinho do avião e acelerar para ganhar velocidade. E esta manobra acontece sem que os pilotos possam evitá-lo (parece que isso não sucede com a Boeing). Só depois de desligarem a alimentação dos computadores de bordo podem retomar o voo normal.
Os elevados padrões de fiabilidade são responsáveis por raramente existirem incidentes. E assim, a taxa de acidentes é muito reduzida e a confiança nos automatismos quase integrais da Airbus é razoável.
Mas convinha esclarecer isto. Quiçá não ter tanta confiança nos automatismos integrais, apesar da falibilidade humana (i.é, por concepção de um sistema, a situação ideal seria o sistema evitar as consequencias de um erro humano, em vez de estar à espera de que o homem corrija os erros dos sistema ou que não haja ninguém para corrigir os erros do sistema ou para detectar uma situação perigosa em automatismo integral).
É possível que a situação se agrave para a Airbus se mantiver o seu secretismo.

MARCOS ANA - Creio na Humanidade

Deu-se o caso de na crónica de Cidália Dias, de sábado, do DN, se falar em Marcos Ana, que não conhecia. Por coincidencia, no meu blogue de dia 19 sobre o caso do metro de Madrid, citei um verso duma canção de resistencia ao franquismo ("igual qu'el pino en la ribera, no nos moveran"). Encontrei agora o blogue de Marcos Ana (http://www.marcos-ana.com/?cat=6).
Não conhecia a história de Marcos Ana e espero que Pedro Almodovar realize o filme e o divulgue.
Como é possível ter estado preso 23 anos (só libertado em 1961 por pressão internacional) e não ter nenhum desejo de ajuste de contas.
Vou ver se leio o seu livro "Diz-me como é uma árvore".
E quero partilhar a fé na Humanidade, que é capaz de produzir homens assim.

Securitarium I - OSCOT, OSCOT, porque nos atormentas?

OSCOT, OSCOT, porque nos atormentas?
O General Garcia Leandro era o presidente do OSCOT.
O OSCOT é o Observatório de segurança, criminalidade organizada e terrorismo.
Não confundir com o muito brasileiro neologismo Convescote (significado: piquenique; formação: conv (ívio) + escote (quota parte de cada um)).
O general chegou ao fim da sua comissão de serviço e deixou várias mensagens.
Os relatórios que sob a sua coordenação foram sendo produzidos cobrem os domínios do objectivo do observatório e são muito válidos, especialmente quando revelam as dificuldades de recolha de informação fundamentadora e as de coordenação inter-entidades.
Também de destacar a imagem que o general utilizou: o emprego é um dique que sustem o eclodir da criminalidade.
É uma pena não lhe darem ouvidos. Era eu adolescente e já um moço do meu bairro (no meu tempo o meu bairro era composto por uma zona fina e por um bairro delata; agora só tem a zona fina; progressos…), perante o seu insucesso escolar, dedicou-se a assaltar as pessoas nas ruas mais solitárias do bairro. Depois ia vender o produto do roubo a uma ourivesaria receptadora conhecida de toda a gente. Era o filho da peixeira, conhecida de toda a gente. Um belo dia arranjou emprego e deixou de assaltar pessoas (Prudhon e Bianqui diriam que passou a ser ele o assaltado pelo apropriador das mais valias). Era a isto que o director geral da segurança interna se referia como salto geracional para justificar um súbito crescimento da criminalidade juvenil.
Voltando ao nosso general, na despedida de presidente do OSCOT, pediu (este pedir é uma forma minha de dizer que todos nós devíamos exigir) que as pessoas ligadas à resolução dos problemas de segurança estivessem menos dependentes dos corredores ministeriais (não foi bem assim que ele disse, mas sou eu a tentar traduzir).
De modo que já temos um novo director do OSCOT, que vem hoje nas noticias a anunciar que agora é que vai ser bom, a criminalidade no Verão vai ser contida porque as forças de segurança vão cercar e vigiar as saídas dos bairros onde moram os criminosos.
Não estou seguro de terem dado ouvidos ao general.
Ouve-se e custa a acreditar. Até porque se calhar é mesmo verdade. As forças de segurança sabem onde moram os criminosos. E assim é a prevenção. Terá aplicação à prevenção da criminalidade no metropolitano, na linha de Sintra, nas rodoviárias?
Faz-me lembrar o caso do meu vizinho, era ele adolescente, algarvio a estudar em Lisboa e a morar num quarto alugado na Baixa. Um dia chega chorosa a casa a Tatão, ou alguém por ela, mocinha empregada na Baixa que fora assaltada e ficar sem o fio de ouro. Os outros hóspedes (parece mesmo o filme da Tatão, não é?) ouvem contristados e o senhor X, inspector na polícia diz à mocinha que se acalme que ele vai ver o que se pode fazer. E no dia seguinte lá apareceu ele com o fiozinho da menina, justificando que tinha falado a uns conhecimentos.
Este tipo de casos tenta mostrar que não é aplicável a Portugal a teoria Giuliani de combate sistemático à pequena criminalidade. Por exemplo, são conhecidos os carteiristas que ganham a sua vida no metropolitano de Lisboa. Mas eu, que não tenho responsabilidades de segurança, temo que o combate à pequena marginalidade estimule o aparecimento da grande e organizada. E então lá têm de se organizar os cercos aos bairros dos criminosos em período de assaltos para conter o crime.
Em que ficamos: o dique contra a criminalidade é o emprego , conforme dizia o presidente anterior do OSCOT , ou são as carrinhas da polícia à saída do bairro (as traseiras pedonais do bairro também estarão “guarnecidas”?), conforme diz o actual?
Eu diria que façam os cercos que entenderem, até porque é uma medida de curto prazo, mas por favor desdiscriminem , desdiscriminem, (agora há bairros onde moram os criminosos…) passe mais um neologismo.
E para desdiscriminar, lá vamos ter de garantir sucesso escolar, emprego… ná, com Adam Smith, por mais Sarkozy (“não era este o capitalismo que desejávamos”… é inteligente, este senhor) e Merkel a tomar boas decisões (que as estão a tomar), não vamos lá.
Complexo, o mundo do OSCOT.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

O surpreendente Metro de Madrid - I

É extraordinário o que se pode ler nos links a seguir:

http://www.adn.es/local/madrid/20090619/NWS-1567-Esperanza-Gobierno-Aguirre-Metro-presidente.html

http://ecodiario.eleconomista.es/espana/noticias/1342895/06/09/Grupos-parlamentarios-piden-la-dimision-del-presidente-de-Metro-por-no-acudir-a-explicar-el-accidente-del-12-de-mayo.html

Em 12 de Maio de 2009, a segunda carruagem (só a segunda) de uma composição do Metro de Madrid descarrilou à entrada da estação de Moncloa e destruiu parte da borda do cais. Um descarrilamento pode ter várias causas, umas mais ligadas à via férrea e outras infraestruturas, outras mais ligadas ao material circulante, outras devidas à interacção entre via e material circulante.
Quem se interessar pode ver um catálogo de possíveis causas no relatório do acidente do Tua.
Isto para dizer que é legítimo as pessoas interrogarem-se sobre o que poderá ter provocado o descarrilamento e colocarem hipóteses indo ao catálogo, enquanto as comissões de inquérito tratam de buscar melhores certezas.
Chamo ainda a atenção para que normalmente existe em cada país uma entidade responsável pela análise das causas dos acidentes (em Portugal essa entidade é o GISAF), havendo casos em que, 24 horas depois do acidente, já existe disponível na internet informação muito próxima das causas reais.
Logo a seguir ao acidente, com base na informação recolhida na net, incluindo fotos do acidente, tentei dinamizar entre os colegas a análise do que poderia ter acontecido em Moncloa.
Fui muito criticado por alguns (apesar de também serem técnicos). Possivelmente estariam a ser de uma forma muito simples, politicamente correctos. Isto é, estariam a cultivar o secretismo que permite aos políticos fabricarem factos consumados. O metro de Madrid também não quis ajudar. Destaque-se pela positiva a informação do director Ildefonso Matias que no próprio local informou que o comboio seguia em marcha automática, pelo que não seriam imputadas as causas ao maquinista.
E digo que o metro de Madrid não quis ajudar porque veio a saber-se (não pela internet) que já tinha havido anteriormente uns descarrilamentos com aquele material circulante, e que tinha havido uns problemas de manutenção não esclarecidos ( vêem a vantagem das investigações de acidentes serem rápidas e abertas? Para que não se façam suposições negativas), com queda de motores à via, maus funcionamentos de suspensões, problemas em agulhas…
De modo que, quando não consegui recolher mais informação, desabafei: - Algo vai muito mal no metro de Madrid. Será que o sucesso subiu à cabeça destes senhores? (o metro de Madrid detem, neste momento, uma das maiores e mais modernas redes de metro do mundo.)
Também fui muito criticado por ter dito isto.
E assim chegamos ao episódio da carta de Manuel Melis, professor catedrático de Ferrovias e Geologia, presidente não executivo do metro de Madrid, relegado para a prateleira por uma reorganização de serviços de eficácia duvidosa (por exemplo: englobou na mesma direcção de manutenção as áreas de manutenção de infraestruturas e de material circulante, perdendo assim o benefício do controle mútuo de qualidade; separou os serviços ligados à rede em funcionamento dos serviços de projecto das novas linhas ou extensões, comprometendo assim, de forma dramática, o retorno de informação da experiencia de quem lida com as instalações para quem os projecta). Tudo isso sob a batuta dos políticos que muito democraticamente constituíram a Consejeria de Transportes da Comunidade de Madrid.
Dá-se agora o caso do presidente não executivo do Metro, deixado no cargo por magnanimidade dos políticos, mas sem interferência na vida do Metro, ter sido chamado à Assembleia da comunidade para “explicar” aos políticos as causas do acidente de 12 de Maio.
E o técnico enviou uma carta a explicar as causas técnicas, que foi considerada incompreensível (et pour cause, como diriam no metro de Paris, em que estas coisas parece não poderem suceder, porque até ver, os gestores e os políticos parisienses têm respeito pelos técnicos da empresa – um dia destes conto porquê) , mais escreveu que explicaria pessoalmente ao senhor conselheiro, à volta duns hamburgers, quando ele demonstrasse que tinha competências para perceber as causas.
Caiu o Carmo e a Trindade, que talvez seja o mesmo que cair a Plaza Mayor e o Palacio de Moncloa (ou o da Zarzuela? Não sei). Os políticos, irados, rasgaram as vestes, clamaram desrespeito pela assembleia democraticamente eleita e exigiram a demissão de Manuel Melis e a retirada de todas as mordomias.
Eu sinceramente penso que estos señores no saben lo que es verdaderamente la Democracia, pero como yo soy del tiempo de Salud y Republica y que igual qu'el pino junto a la ribera no nos moveran, e estos señoritos son mucho mas jovenes do que yo, entonces por supuesto que elos saberan lo que sepan.
E talvez os senhores deputados-consejeros ignorassem que o homem coitado vive do trabalho dele na Universidade, dos projectos, e que do Metro não recebe um cêntimo.
Engraçado, comparar esta estrutura de rendimentos com os rendimentos dos políticos (estoy hablando de los políticos españoles, no?).
Como dizia Pancho Guedes, os politicos não percebem nada de cidades. E de metros também não. Faz-me lembrar a triste comissão Parlamentar do acidente do tunel do Terreiro do Paço.
Confesso que tenho muita curiosidade em seguir estes acontecimentos de Madrid , e ver também quais as causas do descarrilamento.
Que a comunidade de Madrid e a sua consejeria de transportes estão descarriladas, isso já se vê.
Quanto ao descarrilamento do metro, é possível que tenha sido problema na suspensão ou rodados e engrenagens da carruagem, ou problema na via férrea… mas isso também o senhor de La Palice podia dizer.
A ver vamos.

Economicómio VIII - O banqueiro anarquista

O banqueiro anarquista, de Fernando Pessoa


Fernando Pessoa já sabia.
No "Banqueiro anarquista" , Fernando Pessoa explica muita coisa do que se passou depois (e já se tinha passado antes, mas não havia televisão para mostrar).
Ele, o banqueiro, é que é o verdadeiro e coerente anarquista.
Não são esses anarquistas que andam por aí.
Lembrei-me disto depois de ler o artigo do M.Sousa Tavares sobre o BCP, o BPN, o BPP...

Rodoviarium III - Mais acidentes rodoviários

Rodoviarium III – Mais acidentes rodoviários

Mais uma vez com a devida vénia, agora, ao colunista do Oje de ontem, retransmito a informação e o comentário: 300 mortos nas estradas, de 1 de Janeiro a 15 de Junho de 2009. Admitindo que 50% dos feridos graves faleceram no hospital, temos 450 mortos em 165 dias. Isto é, uma média de 2,7 mortos por dia para uma população de 10,5 M habitantes (o indicador correcto seria para “n” viagens ou passageiros.km, mas não existe no nosso país entidade habilitada a fornecer informação fiável, não por falta de capacidade, mas porque não há verbas canalizadas para o efeito).
O transporte individual (TI), responsável por estas mortes, é um sistema e um modo de transporte que deve ser submetido às mesmas regras de análise de acidentes que os outros modos.
Dizia o colunista do Oje que se as empresas de transporte colectivo (a CP, por exemplo, as companhias de aviação) apresentassem estas performances, os dirigentes das respectivas empresas estariam em risco.
Quem serão os dirigentes do TI? Os próprios condutores? Ou os gestores das entidades regulamentadoras?
Estarão em risco?
Sim, risco físico quando andam na estrada (lembram-se do ministro Duarte Pacheco?).
Sim, risco de manutenção dos seus lugares de gestores/decisores quando fica demasiado evidente que os meios de que o Observatório e a Prevenção Rodoviária têm não são suficientes, ou de que a extinção da BT da GNR não ajudou a combater a sinistralidade.
Sim, risco de mais cedo ou mais tarde terem os senhores condutores de se habituar à ideia de que os limites de velocidade são para baixar (já circularam na Suécia, ou nos USA?).

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Rodoviarium II - Adam Smith e Darwin passaram os feriados de Junho no Algarve

Rodoviarium II - Adam Smith e Darwin passaram os feriados de Junho no Algarve


Não tenho a certeza de nada, claro, mas parece-me que Adam Smith e Darwin acompanharam muitos portugueses na pequena transumancia dos feriados de Junho.
Fiz a viagem de ida na noite de 9 de Junho e o regresso no sábado, dia 13, também de noite.
É possível que de noite se viaje com mais segurança, no pressuposto de que, sendo menos favoráveis as condições nocturnas, darwinisticamente já foi feita a selecção natural dos condutores.
Assim, quando a afluência não é muita, é vulgar verem-se os automóveis em grupos dispersos pela auto-estrada circulando a velocidades médias da ordem de 130-140 km/h (eu sei que é ilegal…), e de vez em quando passarem os condutores velozes a velocidades superiores.
Como o movimento não era muito no regresso de sábado, até se verificaram esses valores de velocidade média (130-140 km/h).

Mas na viagem de ida de dia 9 havia grande afluência e os grupos deslocavam-se mais compactos, a velocidades médias entre 100 e 110 km/h.
Darwin viu logo que a espécie humana perdera a capacidade para se deslocar de forma defensiva em grupo, embora tenha conservado vestígios dos respectivos genes. As regras do movimento em grupo dos animais têm como principal objectivo a protecção contra predadores, quer seja o meio aéreo, terrestre ou aquático, sendo que a eficácia dos mecanismos de protecção diminui com a capacidade intelectual do predador, veja-se o caso dos massacres de cardumes executados pelas orcas e golfinhos (analogamente, os prejuízos dos pequenos investidores são tanto maiores quanto mais inovadoras no sentido de obtenção de grandes remunerações forem as técnicas de gestão das sociedades financeiras).
No caso das deslocações colectivas da espécie humana verifica-se o contrário: o próprio homem assume-se como predador em comportamento agressivo para o condutor da frente e auto-destrutivo para ele próprio. O gene está lá, mas sofreu inibição dos antagonistas desenvolvidos pelo próprio cérebro humano.
Por exemplo, numa rua de dois sentidos de uma cidade, a reacção primária de um condutor ao ver que o carro da frente parou ou está a abrandar, é mudar de via (agora é via que se diz, não é faixa) e tentar ultrapassar sem se inteirar primeiro do motivo por que está o carro da frente a parar, isto é, se não haverá mesmo motivos para não invadir a via contrária. A reacção primária num grupo de aves, peixes ou mamíferos é o indivíduo reproduzir o comportamento do indivíduo da frente ou ocupar o lugar dele se ele saiu do grupo. E isso protege contra predadores, sem necessidade de intervenção intelectual. No caso dos humanos, é precisamente a intervenção intelectual, ao nível primário, não secundário, que propicia o predador-acidente.

Darwin, observando o movimento da via de ultrapassagem, concluiu precisamente o que ficou escrito. Enquanto na via da direita os indivíduos procuravam manter espaços de protecção entre si, num comportamento defensivo em relação ao predador –acidente , na via da esquerda os condutores velozes acumulavam-se, chegando a reduzir a distancia para 4 metros; e muitas vezes utilizavam a via da direita para ultrapassar os carros da via da esquerda (eles sabem que é ilegal, claro).
Darwin, embora não especialista de matemática, convertia automaticamente a distancia em metros para a distancia em segundos, e relacionava essa distancia com o tempo de reacção do homem e da máquina a uma alteração das condições do movimento do carro da frente:
Tempo em segundos para percorrer uma distancia de 4 m a uma velocidade de 110 km/h: 13 centésimos de segundo
distancia em metros percorrida a 110 km/h durante o tempo de reacção, i.é, antes que haja reacção a uma alteração de movimento: 61 m

Isto é, Darwin achava que cada condutor devia guardar uma distancia de 61m relativamente ao carro da frente e, se fizesse isso, não só se protegia do predador-acidente, como progressivamente a velocidade do grupo subiria. Possivelmente e tendencialmente para os referidos 130 a 140 km/h.

Mas Adam Smith , como se diz em coloquial, atirou-se ao ar, relembrando que o interesse individual de cada condutor, expresso na sua ânsia de chegar mais depressa, mesmo que o seu comportamento pudesse ser o do investidor que investisse o que fosse preciso para ganhar o que fosse possível, seria sempre o motor do lucro para esse condutor e para os outros. Bem argumentou Darwin que esse interesse individual era o responsável pela inibição do gene das regras de protecção em movimento colectivo, mas Adam Smith manteve-se irredutível. Ele tinha sempre razão.

Como os economistas posteriores a Adam Smith não aproveitaram os feriados para irem ao Algarve, ninguém lhe lembrou que talvez os outros condutores, pelo menos os da via da direita, não sentiam, tal como a velhinha que não queria atravessar a rua, nenhuma necessidade, tangível ou não tangível, em lucrar tempo para chegar mais depressa ao Algarve, dando ampla prioridade a chegar em segurança e com o tal espaçamento de protecção, esse sim gerador de ganhos de tempo, no interesse comum, através duma subida regulada da velocidade média.

E Darwin, de facto, apesar dos parcos conhecimentos de matemática, lá foi mostrando a Adam Smith, embora com pouco sucesso, que a acumulação de carros na via da esquerda, com distancias que chegavam aos 4m, isto é, 13 centésimos de segundo, era um perigo e o principal responsável por uma média de grupo tão baixa (110 km/h velocidade baixa…quando o petróleo subir, logo se vê o que é velocidade baixa ou alta).

Porque se o carro da frente tiver de abrandar (olha, é a saída de uma área de serviço e o carro da direita fugiu ao que ía a entrar na auto-estrada e o carro da esquerda teve de abrandar, por exemplo, de 110 para 102, 6 km/h).
Se o condutor veloz do carro perseguidor a 4m não conseguir reduzir o tempo de reacção de 2 para 1 segundo, bate e bate mesmo ao fim de 1 segundo do tal abrandamento.
Para não bater, teve de aplicar travões a uma taxa de desaceleração mais elevada do que a que o carro que abrandou fez, e que foi de 2 metros por segundo quadrado.
E quando isso aconteceu (o segundo carro conseguir segurar o embate no primeiro) o terceiro carro, também perseguidor, como deixou escoar tempo de reacção, teve de travar a uma desaceleração ainda superior. E por aí fora, no sentido contrário ao movimento da fila, propagando-se a perturbação para trás, com cada carro a travar mais depressa do que o carro da frente.
Não admira assim, concluiu Darwin, como se tivesse analisado a rota de transumancia de um bando de patos, que a rectaguarda da fila acabe mesmo por parar, sem que tenha havido nenhum acidente nem nada digno de nota. Foi a ganância dos apressados que se aproximavam demasiado dos carros da frente e insignificantes abrandamentos (entradas e saídas de áreas de serviço ou acessos da auto-estrada, um mosquito a apoquentar um condutor, um micro-lapso de atenção, um atendimento do telemóvel…) que provocaram as grandes filas e as esperas para retomar o movimento.

Tudo porque o interesse individual não quis guardar a distancia de 2 segundos , ou tempo de reacção, ou 61m a 110 km/h, relativamente ao carro da frente, nem guardar o seu lugar na fila.

Esta é a metáfora da economia: o interesse individual e o mercado a funcionar, quando existem externalidades de interesse social comum (quando grandes grupos desejam chegar em segurança ao Algarve), quando existe escassez (quando faltar o petróleo, por exemplo), ou quando existe informação assimétrica (é o que faz que alguns consigam excelentes remunerações dos seus investimentos enquanto outros não), só piora as coisas.
É pois necessário um código (guardar uma distancia de segurança, não ultrapassar pela direita) com regras infelizmente limitadoras da livre iniciativa, mas que defendem o direito da vida em sociedade.

Os AdamSmithistas que me perdoem.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Economicómio VII - O TGV, a decisão, o bom senso, o adiamento


Economicómio VII – O TGV, a decisão, o bom senso, o adiamento

Vou desagradar aos amigos. Vou arvorar-me em defensor do TGV. Os meus amigos economistas vão ser os primeiros a enviar-me para as profundezas dos infernos, por estar a comprometer o futuro dos nossos netos.
Antes de prosseguir, uma pequena explicação sobre a designação do grupo de temas: Economicómio.
Sendo certo que a Economia é a ciência (felizmente não exacta) que trata das nossas coisas, dos nossos assuntos, da direcção da nossa casa ou “oikos”, como diziam os gregos, os meus amigos economistas perdoarão que eu vá buscar a primeira parte da palavra a Economia. E a segunda parte, como a nossa casa mais parece uma casa de loucos, à palavra manicómio.
Na verdade, eu nunca inventei nada, e uma rápida pesquisa mostrou-me que um cidadão catalão já tinha usado esta palavra, Economicómio, para nome de blogue. Mas não encontrei vestígios do dito blogue, e se digo que não invento nunca nada, é para ver se me dão algum crédito, porque o que eu digo já foi dito por outros, mais dignos de crédito do que eu (resultou um bocadinho evangélico, não foi? Esta tradição parabólica…).
Vamos ao TGV.

Primeira observação, o bom senso – Elevam-se os coros de aplauso pelo bom senso revelado. Viva o adiamento para a decisão ser do novo governo.
Na verdade, estou de acordo. Estou de acordo que foi uma decisão de bom senso.
Mas, o que é o bom senso?
O bom senso é colocar 10 kg de ferro numa caixa de papelão e 1 kg de algodão numa caixa igual; fechar as caixas, chegar a uma janela e lançá-las em igualdade de circunstâncias da janela abaixo; o bom senso é dizer que a caixa com o ferro dentro chega mais depressa ao chão.
De facto, Galileu teve imenso trabalho para demonstrar que o bom senso não sabia o que estava a dizer. Teve de inventar aquele esquema do plano inclinado e mesmo assim ainda há muitos cidadãos por aí que utilizam o direito constitucional ao disparate para crer firmemente que o ferro vai continuar a cair mais depressa do que o algodão.
Acham que exagero e é caso raro?
Então digam-me o que acha o bom senso sobre o sacrifício dos pobres gatos: um sádico decide lançar dum arranha céus 100 gatos, mas dá ao bom senso a oportunidade de salvar alguns gatos: ou os atira todos do 7º andar ou atira todos do 20º andar. O bom senso que escolha. O bom senso vai, a correr, todo contente, escolher o 7º andar, e a maior parte dos gatos morre.
Porque, na verdade (continua a influência bíblica, não é?) a probabilidade do gato escapar com vida é razoável se for lançado até ao 4º andar. Mas do 5º até ao 10º tem o intervalo mais perigoso. Porquê? Porque ainda não atingiu a velocidade de queda de equilíbrio e vai às voltas pelo ar sem saber como colocar as patas na melhor posição amortecedora. Depois do 10º andar, o gato tem tempo para atingir a velocidade limite de equilíbrio (i.é, por mais alto que caia, não ultrapassa a velocidade limite por causa da resistência do ar) e, nessas circunstancias, é capaz de referenciar pontos e adoptar a melhor posição para a aterragem. E a maioria dos gatos até se salvava.
Outra vez o bom senso na origem de um desastre…

Segunda observação, o adiamento – sendo o processo do TGV já idoso de anos, deve chamar-se a atenção da opinião pública de que qualquer processo deve ter um planeamento credível sendo monitorizado a intervalos suficientemente curtos, quando comparados com o prazo total do empreendimento. Noutros termos, devemos ter uma planificação onde desdobremos todas as actividades ou grupos de actividades necessárias e interdependentes para que o processo avance e atinja a estrelinha do objectivo. E para onde possamos olhar de vez em quando para ver se é preciso tomar medidas para que as coisas avancem.
Qualquer grupo de técnicos a quem tenha sido cometido um projecto , a sua execução, a sua fiscalização (ou acompanhamento, para sermos mais coloquiais) tem de se basear numa coisa parecida. E se vê no meio da planificação “adiamento por causa das eleições”, só pode ficar vermelho, verde, azul ou uma mistura, conforme o seu código genético específico. A menos que já seja um técnico aderente das técnicas inovadoras de gestão mais apreciadas em Portugal.
O que estou tentando dizer é que a decisão de adiamento, do ponto de vista técnico, de quem está encarregado de atingir o objectivo, é uma decisão tão grave como uma ordem de prosseguimento.
Logo, até o bom senso claudica se partirmos deste pressuposto.
Mas não temos em Portugal a cultura do planeamento… por isso a opinião pública não ligará muito ao que eu digo…”vai-se fazendo”, “logo se vê”, “temos tempo”…

Terceira observação, critérios para tomada de decisão – avançar ou não avançar com o TGV, esta é a questão (claro que não é, mas dramaturgicamante faz grande efeito pôr a questão). Ora, reunindo um grupo de técnicos para analisar um projecto ou empreendimento, os coitados, se aplicarem aquilo que lhes ensinaram, fazem uma análise multi-critério. Numa análise multi-critério entra, para além doutras, a análise custos-benefícios.
Dizem alguns dos nossos decisores/gestores e o bom senso também que é muito dinheiro (nisso têm razão, está tudo muito caro apesar do petróleo barato; ainda por cima as orçamentações fazem-se sempre por baixo, para não assustar os decisores/gestores, e depois vem o Tribunal de Contas queixar-se de derrapagens…) e por isso nos devemos conter.
Porém, para que serve o TGV?
Resposta: é o modo de transporte para distancias entre 300 e 1800km (Porto-Lisboa, Lisboa-Paris) em rede europeia.
É o mais competitivo nesta gama de distancias?
Resposta: não tem que ser (lá vão os amigos economistas mandar vergastar-me).
Porquê?
Porque o modo de transporte TGV existe para satisfazer o direito à mobilidade na condição de que esse exercício ofenda o mínimo possível o ambiente (menor consumo específico de combustíveis fósseis por passageiro.km e menor produção de gases com efeito de estufa por passageiro.km).
Evidentemente que os meus amigos economistas vêm dizer-me cheios de razão: para pôr o TGV a andar não é só o investimento, é a exploração de empresas de pessoal intensivo e a manutenção cara (ainda não se falou do calcanhar de Aquiles do TGV em Portugal: a manutenção da via férrea tem de ser impecável porque senão só poderá andar com limitação de velocidade). Logo, o meio de transporte mais competitivo é o avião.
Será.
Mas deixa de ser se afectarmos um valor e um custo ao direito à mobilidade em ambiente sustentável. E esse valor é um custo para o avião e um benefício para o TGV. E pode fazer-se. A teoria económica moderna fez imputações mais mirabolantes. Lembram-se daquela anedota do turista que deixou um depósito de 100 euros no hotel enquanto dava uma volta na cidade para decidir se ficava ou não? O gerente do hotel pagou uma divida ao fornecedor do talho, que pagou uma dívida ao fornecedor do gás, que pagou uma dívida à senhora da peixaria, que pagou uma dívida ao electricista, que pagou uma dívida à senhora escort, que acorreu ao hotel a pagar a dívida que lá tinha. O turista regressou e decidiu partir para outra cidade, levando os 100 euros.
A teoria económica moderna diz que o volume de moeda em circulação aumentou ali 6 vezes (oops, que pressão inflaccionária; o que vale é que o petróleo está barato; e depois admiram-se do Lehman Bros e dos off-shores).
Então deixem-me imputar como custos do modo de transporte avião os prejuízos ambientais quando comparados com o TGV, correspondendo ao usufruto do direito à mobilidade (de silogismo em silogismo, poderíamos concluir que quem se opõe ao TGV está a coarctar o direito à mobilidade. Cuidado com a Declaração dos Direitos do Homem. Mas talvez fosse uma visão fundamentalista). O que me parece essencial aqui, para além duma análise de custos-benefícios que na realidade não está ao alcance do bom senso, nem parece estar, pela amostra dos argumentos que lhes ouvimos, ao alcance da maioria dos decisores/gestores (não me acusem de falta de humildade; não me ouvem perorar sobre nanobiologia molecular, nem futebol, nem semântica, nem literatura japonesa e jarros de cerâmica da dinastia Minamoto) é a aceitação dos domínios de aplicação dos diferentes modos de transporte.
A uma gama de distâncias definida, corresponde um modo de transporte preferencial.

Quarta observação, a experiência anterior dos gestores/decisores – trata-se dum factor preocupante. Tomar decisões correctas sobre modos de transporte não parece ser o forte dos nossos políticos (assim como assim, estou a recordar-me daquele parecer do arquitecto Pancho Guedes sobre os políticos e as cidades, mas não falemos agora das torres de Santos). Lembram-se do caso da Ota? Muitos dos decisores da localização do aeroporto na Ota estão agora também na pole position da decisão sobre o TGV. E o bom senso já está aplaudindo… o que pode significar proximidade de desastre. Quando a Força Aérea estudou as bases aéreas para acolher as esquadrilhas dos F-16, concluiu que a Ota tinha as piores condições meteorológicas e aeronáuticas e decidiu dispensá-la. O governo da altura achou que era um sítio óptimo para implantar um novo aeroporto (terá sido uma análise exclusivamente económica–um aeroporto pouco amigável e pouco funcional, mas barato - que me perdoem os meus amigos economistas). Mais tarde perguntaram à senhora ministra do ambiente se a localização na margem sul tinha inconvenientes ambientais (como se sabe, qualquer localização, seja do que for que seja artificial, tem inconvenientes ambientais, ou as enguias não tivessem metamorfoses), a senhora respondeu que sim (não lhe perguntaram se a Ota tinha inconvenientes) e veio a ordem: para a Ota, rapidamente e em força.
É uma pena, apesar de todos os prós e contras, a opinião pública não ter ficado com esta história esclarecida, quanto mais não seja para não ir sucessivamente embarcando em enganos.
(Dado que não sou especialista de aeronáutica nem de meteorologia, informo que a fonte das informações dessas especialidades é um colega técnico da Força Aérea, cujo relato se encontra na revista da Ordem dos Engenheiros, Ingenium; poupem-me por favor o trabalho de pesquisar o número da revista).
Conclusão desta quarta observação: que confiança pode ter-se em decisores que tão mal decidiram no caso do aeroporto, com os atrasos de todos conhecidos?

Quinta observação, a falta de dinheiro – Estou inteiramente de acordo que muitos dizem que não há dinheiro. Pode ser, como dizem muitas vezes os italianos e os brasileiros. Pode ser que seja preciso ficar a pagar empréstimos até à 5ª geração. Fizemos isso com as obras ferroviárias do Fontes Pereira de Melo, sendo eu a 4ª geração. Acharam mal? Eu confesso que me pareceu normal. Além disso a nossa bem amada tia de Bruxelas já adiantou verbas; não vão querer devolvê-las, pois não? E têm mesmo a certeza de que não há dinheiro? Quanto é que os portugueses gastaram ou comprometeram com automóveis ligeiros (considerando como ligeiros os Tuaregs, os X5, os Lamborghinis, Porches, Bentleys, Aston-Martin e Jaguares, claro) no 1º trimestre deste ano? Terão sido cerca de 4.000 milhões de euros (bolas, até parece uma conta salvadora do Lehman Bros) ? Como sabem, o transporte individual é um modo de transporte poluidor, que afecta gravemente a qualidade de vida nos centros populacionais e que não é o preferencial para os objectivos de transporte que serve, que é o de contribuir para a produção de bens úteis cativadores ou economizadores de divisas. Acham mesmo que não há dinheiro?

Sexta e última observação, que fazer para tomar decisões correctas? – Como não sou guru de gestão, o que eu costumo fazer quando me põem perguntas destas é propor a leitura de um livrinho escrito pelo colunista-comentador da bolsa da New Yorker, James Surowiecki, “A Sabedoria das Multidões”, e a aplicação dos métodos participativos e alargados de tomada de decisão que lá vêm descritos. Leiam que vale a pena. Talvez um dia eu faça um resumo.
Como não posso saber tudo nem consigo apreender tudo, tenho ainda esperança de que um senhor sociólogo de que começa agora a falar-se muito, Herbert Kindler, também possa ajudar. Vou ver se arranjo o livrito dele, “Risk taking”, precisamente sobre os critérios a utilizar nas análises e tomadas de decisões. A ver vamos. Se alguém souber pormenores, diga se acha que possa ajudar. Pode ser que as nossas fracas vozes cheguem lá acima. Nunca se sabe.

Arquitectorium 3 - Os políticos não percebem nada de cidades



Os políticos não percebem nada de cidades

Esta é dedicada aos meus amigos arquitectos.
Não fui eu que disse (não fui mas tenho pena de não ter dito, já devia ter dito). Foi Pancho Guedes, arquitecto e pintor moçambicano.
Se puderem vejam a exposição da obra dele no CCB/Colecção Berardo, até 16 de Agosto de 2009.

Ver em http://www.guedes.info/contfram.htm

Invoco assim Vitruvio e Pancho Guedes, não para que, como semi-deuses, iluminem os nossos decisores/políticos, nem para que os tornem humildes, porque sabemos bem até onde pode ir a humildade de um decisor/político, mas para que a opinião pública contribua para que os processos de tomada de decisão sejam outros. Para que o debate se alargue, mas que entrem no debate os cidadãos e os técnicos que estão dentro dos assuntos.

Será pregar no deserto?

Já ouviram falar da polémica da mudança do Museu dos Coches, do imobiliário atrás do actual local do Museu dos Coches, do pobre destino do Museu de Arte Popular?
Isto para não falar do triste plano da Baixa e frente ribeirinha…

É, Pancho Guedes tem razão, os políticos não percebem nada de cidades.

Viva Pancho Guedes.

Rodoviarium I - As estatísticas dos acidentes rodoviários

As estatísticas dos acidentes rodoviários

Com a devida vénia, como se dizia antigamente, ou tirando o chapéu, como também se dizia no tempo em que se usavam chapéus, saúdo a afirmação do antigo comandante da GNR: “…não há menos acidentes, ao contrário do que fazem crer alguns malabarismos estatísticos” (11 mortos na 1ª semana de Junho de 2009).
O antigo comandante queixava-se do mesmo que eu, do corte nos quadros de pessoal (no caso do comandante o corte foi mesmo violento: extinguiu-se a Brigada de Transito; no meu caso, do que me queixava era de que precisava de técnicos que não tinha para executar o plano de actividades… mas o controle do deficit não deixou).
Lembro-me de ver agentes da BT a explicar pacientemente: tem de se deixar uma distancia para o carro da frente equivalente à distancia percorrida durante um tempo de reacção de 2 segundos. Não é para os vivaços se “meterem” ou poderem ultrapassar pela direita. É para o transito fluir normalmente sem necessidade de travagens violentas que vão causar perturbação lá atrás, na fila, se ela for muito compacta.
Os agentes explicavam isto e os “automobilistas”, amostra fidedigna da iliteracia numérica dos portugueses, achavam que não, que tinham muito bons reflexos e por isso podiam conduzir em cima do carro da frente.
Assim é difícil, com estes Democratas do volante (guiador) e sem BT.
Mas foi a tomada de decisão de quem pode, de facto.
Mais um erro de decisão, salvo melhor opinião, claro, se bem que o meu parecer esteja fundamentado nas leis da Física.
E peço licença ao antigo comandante para passar a usar o termo “malabarismos estatísticos”.
É que as estatísticas, mesmo utilizando apenas parte dos dados, são tantas vezes utilizadas pelos técnicos “inovadores” para pôr em causa o parecer de quem tem a experiência das “frentes de trabalho”…que podem estar enganados, claro, mas as estatísticas enganam tanto…vêem-se coisas nelas que podem estar tão longe da realidade…

terça-feira, 16 de junho de 2009

No meu país morreram 3 crianças num incêndio

No meu país morreram ontem 3 crianças num incêndio num edifício abandonado, em Pinhal Novo.
No dia 22 de Maio deste ano, escrevi a propósito do incêndio de Avis:
"No meu país 3 crianças morreram há dias no incêndio de uma barraca.Bolas para os laudatórios das virtudes e dos resultados do partido no poder e do seu secretário geral.Não porque a culpa do incêndio seja do partido ou do seu secretário geral.Não é isso que eu digo, embora seja com isso que os cérebros dos seus laudatórios os estarão a enganar, a eles, laudatórios, para poderem vestir a pele da inocente vítima acusada.O que eu quero dizer, sem querer acusar ninguém, é que nós reagimos mal a estas notícias porque manifestamos o nosso desgosto e viramos a página.Há incêndios em barracas com morte de crianças porque nós portugueses não nos sabemos organizar em trabalho colectivo nem sabemos organizar-nos de modo a tomar as decisões certas."
Escrevo apenas por indignação.
Porque os jornais discutem questiúnculas.
Não questionam por que se economiza cortando nos quadros de técnicos e porque não se gasta dinheiro com equipas pluri-disciplinares, com jovens licenciados (poupem-me aos grandes gabinetes de senhores emproados que dão entrevistas a explicar que os outros são ignorantes mas têm sido eles e não os outros a conduzir "isto" ao estado em que está).
É possível em Portugal.
Não com a cultura dominante.
Vejam em qualquer empresa.
A facilidade com que se deixa cair um assunto "porque não é comigo" e "cada um no seu galho" e "ainda temos de pedir autorização para"...
É assim natural que o parque habitacional do país se degrade.
Todos diziam mal da lei das rendas. Alguns iluminados, num governo também iluminado, fizeram umas alterações. Perfeitamente inuteis, dignas de ignorantes, embora os iluminados não fossem ignorantes, claro.
A habitação continua a degradar-se.
São conhecidos exemplos históricos noutros países, de como se chegou à mesma situação e de como se saíu dela (achei interessantissimo quando me contaram o caso do bairro de Harlem, em New York, que já não é o inferno que chegou a ser).
Fala-se vagamente (a Ordem dos Engenheiros, por exemplo, algumas associações profissionais) em programas de recuperação a custos controlados.
Mas falha a capacidade de organização e o planeamento.
Surgem os senhores emproados, muitos deles eleitos, a explicar como é, i.é, como assim já não pode ser.
Mas ser possível é, até há case studies que mereciam melhor divulgação, desde as opiniões dos profs Carvalho Rodrigues e António Câmara (ver o programa da Maria Elisa também com Elvira Fortunato), até aos exemplos nalgumas câmaras do país (não olhem a partidos, por favor, olhem só ao trabalho dos técnicos que lá estão a produzir coisas úteis)...
Mas os jornais acham mais importante noticiar os incêndios em que morrem crianças, ficar-se por aí, culpar os toxico-dependentes "okupas" e garantir que as crianças já estavam sinalizadas.
Este país não é para velhos, nem para crianças, nem para doentes, nem para pobres.
E contudo, os jovens licenciados de serviço social, de sociologia, de psicologia, estudaram soluções, têm soluções.
Onde entram os economistas nesta equação?
Será que são os próprios mecanismos da Democracia que se estão a opor às soluções?
Ou será simplesmente que não pode haver Democracia sem Democratas?

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Economicómio VI – Califórnia, Califórnia

Economicómio VI – Califórnia, Califórnia

Vão mal as coisas, com a Califórnia.
O paradigma do sonho americano. A população dispersa, o predomínio do automóvel, Sillicon Valley, Hollywood. Um actor como governador do Estado.
A Califórnia, se fosse um país independente, seria o 10º em PIB.
Mas vem agora o actor governador, provavelmente depois de industriado pelos economistas neocons que lhe fazem as contas e o mapa das decisões, informar que as finanças do Estado faliram, que o deficit se tornou incomportável, e que o número de alunos por turma vai ter de aumentar.
Já tinha causado surpresa a falta de resposta dos bombeiros e da protecção civil aos incêndios que desflorestaram parte significativa da Califórnia e desalojaram muitos habitantes.
Depois, aquele acidente no suburbano de Los Angeles. Os comboios sem protecção automática nenhuma…
Mas agora compreende-se. Foi o deficit.
Isto de se ser o 10º no PIB tem os seus perigos. Foi assim que a Polónia começou, nos anos 80. Era o 10º também, na altura.
Pelos vistos não é a ideologia que resolve as coisas. O contexto multi variáveis complica tudo.
E actores como chefes de estado não ajuda, especialmente se o petróleo não está barato (seria interessante estudar a correlação entre os êxitos do reaganismo e do tatcherismo e os preços baixos do petróleo e a abundância do petróleo do mar do Norte; e também a correlação entre a crise política em Inglaterra neste ano da graça de 2009 e o declínio da produção de petróleo do mar do Norte).
De modo que os gurus economistas têm muito trabalho aqui na Califórnia para fazer.
Sugiro primeiro que vejam o “Crossing over”, como diagnóstico da imigração ilegal.
E depois, talvez rever os princípios da religião oficial, de que é preciso crescer sempre, e aumentar a produtividade.
É que se uma produção contribui para o agravamento da situação global (por exemplo, produzir automóveis agrava as coisas porque contribui para a extinção do petróleo e para o aumento da poluição), aumentar a produtividade ainda é pior.
Concordarão os distintos economistas em passar a avaliar a produção, isto é, o PIB? Em passar a calcular o valor das coisas em vez do custo e do preço da coisa? (“o economista é quem sabe o custo de todas as mercadorias, mas desconhece o valor delas”). Vale a pena investir em desenvolvimento de programas de toques e jogos para telemóvel?

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Crossing over - a imigração ilegal nos USA


Crossing over - a imigração ilegal nos USA
http://www.istosovideo.com/v/3318/crossing-over-trailer.html


Se tiverem oportunidade de ver um filmezinho chamado Crossing over (cruzamento de estradas, cruzamento, no caso, de fronteiras) com Harrison Ford, não percam.
É um amontoado de histórias de imigrantes ilegais em Los Angeles. Australiana, judeu inglês, iranianos, muçulmanos do Bangla Desh, mexicanas, sul coreanos…
Como na parábola, muitos são os que tentam mas só alguns conseguem a naturalização americana.
Entretanto vamos assistindo a várias realidades desagradáveis, comprovando que os sistemas económicos em que os decisores crêem não resolvem os problemas das comunidades.
Harrison Ford faz de agente que de vez em quando irrompe por uma fábrica e caça jovens mexicanas ilegais que depois são deportadas. Por essas e por outras é que os USA construíram o tal muro.
A crítica não gostou do filme, mas devemos saudar que pelo menos alguns americanos já fizeram o diagnóstico.
Quanto ao remédio e aos tratamentos preventivos e curativos, é mais complicado, mas demos tempo ao tempo.
Entretanto, apreciem o filme.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Economicómio V - A noite fez-se para amar (Mr Cabe & Mrs Miller)


Economicómio V – A noite fez-se para amar (Mr.Cabe e Mrs Miller)

Passou mais uma vez na televisão o filme de 1971 de Robert Altman, que em português ficou baptizado como A noite fez-se para amar.
Uma metáfora sangrenta sobre o funcionamento do mercado. O valor produzido pela empresa de jogo e lazer Cabe & Miller é a oferta que a procura da grande companhia mineira adquire, mesmo que seja preciso usar os tais métodos sangrentos.
Metáfora do que acontece a uma companhia que alcança o sucesso, como o Steve Jobs, ou como a Millbanks, que forneceu ao Metropolitano de Lisboa os primeiros sistemas de sonorização pública, e que foi comprada pelo concorrente norte-americano, que a fechou logo (faz lembrar a compra seguida do fecho da Rover pela BMW, não faz? A Rover fazia os melhores carros da classe média, não era? A BMW faz da classe acima, não é?).
É o mercado a funcionar. Maravilhas do mercado.

Mas as pessoas vêem, batem palmas ao Warren Beaty e à Julie Christie e recolhem-se.
Vivemos num mercado feroz, lá fora das paredes do nosso convento (esta fui buscar ao espaço museológico do convento de Santa Clara a Velha em Coimbra - a não perder, como dizem os críticos de arte).
Solução alienante: comprar a paz dos eleitores (e eles às vezes são sábios…) com a construção de mais e maiores conventos.
Ou interpreto mal os resultados eleitorais?

Acidente de 1JUN09 da Air France

Custa escrever sobre o assunto.
Em primeiro lugar há que prestar homenagem à memória das 228 vítimas.
Depois aos familiares.
As reflexões que se seguem pretendem tratar alguns conceitos de análise de riscos, aplicáveis a qualquer sistema ou modo de transporte.
Não pretendem crucificar ninguém, nem a Air France, nem a Airbus, porque todos nós erramos e é muito fácil condenar os outros.
Antes pretendem insistir que os conceitos de segurança devem ser debatidos, sem que nos imponham critérios ou dogmas sem discussão.
E que é legítimo colocar hipóteses, fugir ao secretismo, abrir o debate.
Mesmo que se digam disparates ou que as hipóteses não se confirmem.
1 – Até ao momento, com base na experiencia aeronáutica, no histórico dos incidentes com o Airbus 330 e nas mensagens automáticas (estas são enviadas via satélite para a manutenção de modo a que uma equipa possa estar à espera do avião com a peça ou módulo para substituir os avariados; trata-se de um sistema que pode ser utilizado noutros modos de transporte, por exemplo ferroviário através da transmissão dos códigos de avaria por WI-FI, no sentido da optimização da mannutenção) , colocam-se as seguintes hipóteses como causas, sendo que um acidente destes ocorre sempre por convergência de várias causas ou circunstâncias e possivelmente só haverá mais certezas após leitura das caixas negras (cuja tecnologia, aliás, carece de actualização):
- não ter sido efectuado um desvio da tempestade (será normal o avião dirigir-se à tempestade em piloto automático?);
-fractura do leme de direcção devido a golpe de vento ou fenómeno atmosférico excessivos;
-falha dos sensores de velocidade, induzindo comportamento inadequado á central de inércia (ADIRU); notar que os sensores de velocidade se destinam a medir a velocidade do ar junto das asas, para prevenir a aproximação do ponto de Stall ou de perda; a indicação da velocidade por GPS de que o avião dispõe não é útil para o fim do controle aerodinâmico; os sensores de velocidade, ou tubos de Pitot, dispõem de aquecimento para evitar o congelamento, mas também esse aquecedor pode avariar;
- falha do radar meteorológico, induzindo comportamento inadequado á central de inércia (ADIRU) e aos pilotos;
-falha da central de inércia ADIRU (recolhe as informações dos sensores de velocidade , altitude, giroscópios laser, etc , e fornece-as aos computadores de bordo para os comandos);
-deficiencias no projecto de software que faça prevalecer os comandos dos computadores de bordo sobre os comandos dos pilotos mesmo em caso de falhas dos sensores ou das centrais de inércia;
-queda de raio com perfuração da chapa (apesar da espessura em alumínio da caixa ser projectada para resistir a isso e de funcionar como gaiola de Faraday) ou com indução electromagnética perturbando irreversivelmente a electrónica dos sensores ou do comando; é normal um avião de longo curso sofrer a descarga de um raio por ano, e de médio curso 3 por ano;
Não se pode afirmar, pelo menos enquanto não se lerem as caixas negras, que a causa do acidente tenha sido os tubos de Pitot (sensores anemométricos), embora se possa dizer que pode ter sido uma ou uma das causas.
Houve a coincidência de um avião Airbus da Qantas em Outubro de 2008 ter sofrido uma queda de muitos metros, em automático, devido a informações erradas dos tubos de Pitot e a deficiência das centrais ADIRU (por sinal de outro fabricante da do Airbus da Air France. Também todos os sensores dos Airbus 200 da Air France foram substituídos por deficiências evidentes. Talvez a Air France tenha sido demasiado confiante ao retardar a substituição dos sensores dos Airbus300 (os sensores deste modelo avariavam menos…).
Mais prudente foi a Qantas ao suspender os voos de um modelo dos sues Boeing quando detectou uma pequena inconformidade; ou o Metropolitano de Lisboa quando detectou uma deficiência num suporte dos seus motores, parando as automotoras com esse defeito até à substituição.
Sabe-se como qualquer paragem tem custos elevados…
Interessa, para qualquer modo de transporte, avaliar os critérios de segurança ligados aos conceitos e ao grau de automatismo utilizados. Em dois outros acidentes recentes, as causas estiveram ligadas ao piloto automático. Em Buffalo, com um avião Bombardier, terá sido a activação dos flaps no início da aterragem quando havia excesso de gelo nas asas (não terá sido eficaz o aquecimento anti-gelo) , e o automático, para ganhar velocidade, inclinou o nariz para baixo apesar da baixa altitude e o piloto reagiu mal; em Amsterdam Schipol , com um avião Boeing, foi falha da informação dos altímetros para o piloto automático.
Criou-se um padrão de segurança tão elevado (de facto o transporte aéreo é o mais seguro), que o que parece pequenas melhorias não é aplicado e conceitos como o da prevalência dos automatismos e da sua infalibilidade são aceites quase pacificamente. Por outro lado, só os automatismos permitem o volume de produção (passageiros.km transportados) que se pratica e a presença de automatismos é essencial para garantir a segurança. A questão é qual o grau de automatismo.
O critério usado pela Boeing é diferente do da Airbus. No primeiro caso o piloto tem a ultima palavra a dizer. No caso da Airbus haverá um excesso de automatismos. E há de facto registo de acidentes devidos a isso (mantendo embora o elevado padrão de segurança). Criou-se a ideia, talvez novo-rica, não só na aviação, de que os automatismos resolvem tudo. Por exemplo, já há incidentes na condução automóvel em que o controlo automático de tracção conduz à perda de aderência em curvas que poderiam ser melhor geridas manualmente. Também na técnica ferroviária se poderá discutir se o transporte de massas em metropolitanos deverá ser em automatismo integral. Situações como o inicio de um incêndio num túnel, ou a alteração altimétrica dos carris, ou fractura de uma porção do carril (risco de descarrilamento) têm sido detectadas e reportadas pelos maquinistas, sendo que é extremamente difícil e oneroso instalar e manter sistemas automáticos de detecção destas situações, com garantia de operacionalidade 24h por dia durante a vida útil do sistema de transportes.
Compreende-se a preocupação das administrações em reduzir custos. A “eliminação” do mecânico de voo (flight engineer) contribuiu para bilhetes aéreos mais baratos, mas não parece ter sido boa ideia em termos de segurança (veja-se o caso do acidente da TWA em N.York, em que o avião fez a viagem de Atenas para N.York com a luz de avaria do ar condicionado, fatal na descolagem por retirar potencia aos reactores). Atravessar em linha recta (mais precisamente, em ortodrómia) uma zona de tempestade ou de condições meteorológicas adversas pode baixar custos de combustível.
Muitas vezes não tem consequências negativas, mas não funcionou no caso do Titanic e, parece, no caso do voo da Air France.
Todas estas questões dos automatismos ligados à segurança e dos perigos das reduções de custos com as tripulações devem manter-se em debate aberto. É a minha proposta. Não acreditar em soluções universais de automatismos infalíveis. Bem basta a falibilidade do homem.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Arquitectorium 2 – O mosteiro de Seiça, o pavilhão da pala e o paço de Avis

Há dias, lancei um desafio aos meus amigos arquitectos:

"Nem no desleixo e na falta de manutenção nós somos originais. Pelos vistos os Américas não nos ficam atrás.
Aceitam o desafio de fazerem um powerPoint com 16 edificios portugueses ameaçados? Sugiro para começar a torre do castelo de Serpa. Tambem o defunto Hotel Estoril Sol, digno parceiro do Plaza Century.
Pobres estádios demolidos do Benfica e do Sporting. Até um estádio do Frank Lloyd Wright vai pelo mesmo caminho. E têm as pirâmides 7 milénios... é possível à Humanidade regredir. Com esta tecnologia toda e regride...

Check out this page on MSN:
http://cityguides.msn.com/articles/slideshow.aspx?cp-documentid=19546585&imageindex=1 "


Dado que não houve seguimento, eu insisto.

1 - Comecemos pelo mosteiro de Seiça, na freguesia de Paião, Figueira da Foz. Vejam as fotos. Conheciam?

http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=482672



É um bom exemplo de uma unidade económica que não se adaptou à evolução. Floresceu no tempo dos coutos medievais de caça sob uma ordem religiosa, depois ligado à exploração agrícola dessa ordem. Com a perda do poderio económico das ordens religiosas no século XIX, tem um pequeno período de prosperidade abrigando uma unidade fabril. Mudança de tecnologia e queda na degradação de hoje.
A Câmara da Figueira adquiriu o mosteiro por 225.000 euros mas não tem agora dinheiro para a recuperação.
Pensa-se em pousada ou em turismo rural.
Aceitam-se ideias e sugestões para investimento que justifique a recuperação.
Imaginemos o que mais falta faz no nosso país, sem ser aquela coisa intangível de capacidade de organização planificada e de tomada de decisões para objectivos úteis: talvez escolas ou hospitais. E lembremo-nos do guru Drucker, que defendia que devíamos desenvolver os nossos clusters tradicionais. Pronto. Está decidido: pode ser uma escola agrícola com terrenos suficientes para a prática de agricultura de subsistência. Digo-vos que foi das melhores aguardentes vínicas que já provei, uma destilada no Paião. Já não deve fabricar-se, mas que aguardente.
De modo que aqui fica a sugestão. Para a operacionalizar, é preciso contratar alguns jovens licenciados em várias disciplinas (arquitectos, por exemplo, agrónomos/silvicultores, advogados, ah, é verdade, economistas) para fazer os projectos, incluindo o emparcelamento dos terrenos à volta. Não deve haver entidades privadas interessadas. Pode inscrever-se no orçamento do Estado uma verba pequenina para se irem fazendo os projectos? Ah, também podemos destinar uma percentagem nas licenças de construção duma área razoável à volta para financiar os primeiros anos do projecto?
Gostaram da ideia? Querem saber donde a tirei? Das vinhas da ira, John Steinbeck, escritor de simpatia pelos conservadores/direita, anos 30, logo a seguir à grande depressão. Recomendo a frase do Henry Fonda, com ar ingénuo e incrédulo, e sem saber nada de finanças, como dizia Pessoa de Jesus Cristo: “Mas porque não faz o governo mais quintas destas?”
2 – Passemos ao pavilhão da pala. Dizem-nos que os gestores andam à procura de um destino para o pavilhão de Portugal na Expo98. E que é uma pena uma obra de arquitectura tão excelsa estar assim exposta à inutilidade e degradação. Talvez este seja um caso emblemático da imprudencia da falta de planificação que nos caracteriza agora (parece que o problema do mosteiro de Seiça, até ao dealbar do século XX, não foi a falta de planificação). Então faz-se um programa de arquitectura para um edifício servir de sede do conselho de ministros?
E não se ouve alguém perguntar: “O quê?”
Ou talvez não me tenham contado bem a história.
E depois vem aquela da pala que dá direito a fotografias nas revistas internacionais de arquitectura.
Mas o que tinham contra o outro mosteiro, o de S.Bento?
Que bom que é termos mostrado ao mundo a nossa capacidade de realizar a Expo98.
Valha a verdade que falharam a marina (gostaria muito que as obras da marina dêem resultado, mas como o projecto não circulou em debate público, está-me a fraquejar a fé; feitios), a incrível sobre-exploração das áreas de construção e a triste ideia de não substituir o oleoduto para abastecimento de combustível do aeroporto da Portela.
E falhou também o pavilhão da pala .
A pala é uma estrutura muito interessante de engenharia civil, com recurso à técnica do pré-esforçado; se ocorrer um incêndio com concentração de calor sob a pala ela corre o risco de entrar em colapso devido às características do pré-esforço, que exigem ainda uma verificação periódica do estado de tensão dos aços. Isto é, trata-se de um espaço que não pode entrar em degradação.
Se não tivessem sido construídos dois horríveis edifícios ali junto do Cais do Sodré (só são horríveis vistos do rio), eu diria que ficaria bem no pavilhão da pala o observatório da tóxico-dependencia ou a sede do controle costeiro.
Mas assim, vou ter de recorrer ao binómio, ou uma escola, ou um hospital.
Aqui, talvez apareça um privado para um hospital, não acham? Eu sugiro um hospital para tratamento de doenças do foro das carências de serotonina e outros neuro-transmissores.
Vale a sugestão?
3 – O paço de Avis . Já aqui falei no paço de Avis. Sugiro um passeio até lá. É uma sensação estranha ver um edificio tão grande e tão antigo ainda de pé, mesmo não tendo manutenção. Talvez os meus amigos economistas aprovassem um plano de viabilidade para transformar “aquilo” numa pousada para turistas alemães, chineses, japoneses, angolanos ou russos, com programas pré-estabelecidos para conhecer os castelos alentejanos (por falar em Alentejo, não é que foi um êxito o investimento num fluviário em Mora? Quem diria, ainda por cima feito sem nós nem o governo sabermos…).
Que acham os meus amigos arquitectos de tudo isto?

PS em Outubro de 2009 - Contrariando o meu pessimismo e graças ao correcto procedimento de alguns decisores, a marina da Expo reabriu em Agosto de 2009. Votos de sucesso na sua manutenção.

Economicómio IV - A lei de Say

Economicómio IV – A lei de Say

A lei de Say (Jean-Baptista Say, primeira metade do séc.XIX) é mais uma daquelas leis económicas polémicas e pode resumir-se assim:
“A oferta gera a sua própria procura”, i.é, o valor do que é produzido está correlacionado com o rendimento que pode comprá-lo e com o valor do que pode ser produzido graças ao seu próprio valor.
Keynes não gostava da lei (a economia também não é uma ciência exacta).
E, infelizmente quanto a mim, também não gostam dela os estrategas que procuram sistematicamente adaptar a oferta da produção à procura.
Embora os conceitos de marketing invoquem o sagrado(sagrado para eles, claro) interesse de obedecer às tendências do eleitorado, perdão, dos clientes, parece desencorajante, para quem trabalha, por exemplo, numa empresa de transportes, ver diminuir a oferta da sua produção (o produto de uma empresa de transportes é o produto do número de viajantes pela distancia média por eles percorrida, expresso em passageiros.km), com a desculpa de redução de despesas.
É que em transportes, especialmente no caso urbano, existe um fenómeno que dá pelo nome de “descompressão das pontas”. Por outras palavras, sendo difícil circular numa cidade durante as horas de ponta, os potenciais clientes sentem-se desmotivados. Se aumentarmos a oferta, melhoramos o conforto e consequentemente a procura, descomprimindo a ponta, como queríamos mostrar.
Por outro lado, pode fazer impressão transportar lugares vazios, mas é suposto que numa cidade houve concentração de pessoas para aceder a locais de trabalho onde também é suposto haver produção de valor. Se de repente a cidade desertifica e a produção de valor é deslocalizada para a periferia, há que repensar os modos (deve-se transportar o maior número de pessoas com o menor consumo de energia, não é? Isso condiciona as escolhas dos modos de transporte) e a rede de transportes e combater as causas que desertificaram a cidade.
Não vamos cair no primarismo neo-liberal de nos contentarmos com o dogma: a empresa deixou de dar lucros, fecha; a casa deixou de dar rendimento, fecha; a loja deixou de ter clientes, fecha.
Pois não?

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Economicómio III – paradoxo de sábio e ignorante

Economicómio III – paradoxo de sábio e ignorante

Mais uma provocação aos meus amigos economistas.
Andamos todos muito contentes, com aqueles senhores sábios do BCE a garantir que estão a controlar os preços baixos e a inflação (a mim, quando era novo, ensinaram-me que um investimento numa fábrica se justifica com a venda dos seus produtos, e que preços baixos têm o inconveniente de ninguém querer investir, mas serão teorias ultrapassadas) e o mesmo se passa nos USA.
Mas, ouvi hoje uma notícia insignificante, sem relevo nenhum no noticiário, que dizia que o governador da reserva federal dos USA achava que a política de endividamento dos USA era insustentável.
E eu achei engraçado pensar que também, ignorante, como sou, sou da mesma opinião. E até já era.
Porque será então que o sábio e o ignorante acham o mesmo?
Como podem os meus amigos economistas levantar este paradoxo?
Para dar uma ajuda, informo que o deficit federal dos USA previsto para 2009 é de 1750 mil milhões de dólares e para 2010 de 1170 mil milhões de dólares (a bronca do Lehman Bros foi de 700 mil milhões). E ainda que a taxa do aumento da emissão de obrigações para a segurança social federal é de 2500 mil milhões de dólares por ano.
Será possível continuar com as taxas de inflação negativas e com os preços baixos do petróleo?
Acham?
E será que o governador da reserva federal conhece a conjectura dos imperadores romanos? (a distancia das fronteiras do império ao Capitólio é definida pelo balanço da energia – no tempo deles principalmente alimentar - que se pode retirar do interior das fronteiras, versus a energia necessária para manter as fronteiras nessa posição).

?

terça-feira, 2 de junho de 2009

Economicómio II - um pequeno problema de economia

Economicómio II - Um pequeno problema de economia

Eu sei que os meus amigos economistas andam empenhados em destrinçar problemas complicadíssimos e teorias explicativas do estado global das coisas.
Mas gostava muito que me explicassem um pequeno problema que se me deparou.
Foi o caso de ter de comprar uma pulseirinha para a pequenina de uma pessoa de quem gosto muito.
Como sou muito moderno e sigo as recomendações dos meus amigos economistas, no sentido de utilizar a Internet e de dar preferência às empresas com capacidade de inovação, consultei a Swarovsky on line.
Escolhi um pequeno bracelete/pulseira de criança de zircónio (o bracelete, claro), com um pequeno coração com uns cristaizinhos incrustados. Coisa fina.
Passei pela loja do Colombo. Não tinha o modelo escolhido e os que tinha não se adequavam.
De modo que lembrei-me de passar pelo Carrefour , onde me recordava de ter comprado uma peça de ouro por um preço muito vantajoso, beneficiando das novas técnicas de marketing das grande s superfícies, e do pequeno artifício inovador de reservar para a presença do ouro apenas a capa exterior das peças.
Problema dos idosos. A memória que predomina é a do Carrefour, mas a realidade é agora mais um hipermercado do grupo Belmiro.
Em vão procurei o balcão do ouro. Uma análise de mercado do grupo terá ditado o fim da experiência.
Afinal as grandes técnicas só se aplicam ao que dá lucro imediato. Quando foi oportuno criar dificuldades ao comércio tradicional do ouro, foi dada grande importância aos balcõezinhos do grupo (não era só o Carrefour que tinha uma ourivesaria, o grupo de Belmiro copiou na altura a iniciativa). Nos tempos que correm, em que a passividade dos decisores da segurança de pessoas e bens ainda não inverteu a estatística de 2 assaltos por semana a ourives, o grupo Belmiro não tem necessidade de combater o comércio tradicional do ouro.
Certamente que os meus amigos economistas concordarão com a minha visão física de que “combater” significa a apropriação de parte importante da quota de mercado do comércio tradicional.
Ainda será válida aquela estatística de que por cada posto de trabalho criado numa grande superfície extinguem-se 2,5 postos no comércio tradicional? Os meus amigos economistas costumavam explicar-me que isso acontecia porque o comércio tradicional não tinha capacidade de se adaptar nem de inovar (leituras apressadas das “origens das espécies”?).
E então, como dizia o poema de José Régio, apanhei o metro da linha azul e fui a uma pequena ourivesaria familiar e tradicional, ali no Largo de S.Domingos, comprar pelo mesmo preço do bracelete da Swarovsky, uma pulseirinha de 18 karat . Porque a senhora da ourivesaria me explicou, como boa técnica de marketing, que aquelas mais grossas e vistosas, que via na montra, pelo mesmo preço, eram de 9 karat.
E assim vai o comércio tradicional, felizmente vendendo agora o seu ouro, sabe-se lá se ainda do que veio de Minas Gerais no século de D.João V, a turistas que têm na sua terra o ouro preto.
E assim vai a economia global, um pouco acima do nível de discussão sobre inovações, marketings e funcionamento de mercados, deixando-me perante este problema que me faz lembrar Drucker: é mais importante abrir grandes superfícies comerciais ou concentrar forças nos locais em que existe comércio tradicional?
Era importante saber a resposta para, quem trabalha em transportes, poder dimensionar as suas redes.
Mas se os meus amigos economistas não me sabem responder, quem saberá?

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Economicómio I - o jogo da bolha

Economicómio I - o jogo da bolha

Vou ter de pedir desculpa aos meus amigos economistas por lhes dirigir esta provocação a propósito do jogo da bolha. Vou tentar relacionar com a teoria , sagrada para os neo-liberais que nos puseram no estado em que estamos, do interesse individual de Adam Smith.

Será verdade que um grupo de amigos e de grupos de amigos dos amigos, reunidos numa sessão de jogo da bolha num restaurante fora de portas, no norte, rendeu 1 milhão de euros a 3 assaltantes sem que ninguém tenha apresentado queixa na polícia?

Será possível?
Será legal o jogo?
Parecerá que sim. Eu sou livre de emprestar dinheiro a um amigo.
O amigo é livre de ter um negócio inscrito nas Finanças e é legítimo que daí a uns tempos me devolva o dinheiro acrescido de mais valias devidas ao negócio e sobre as quais se possa ter pago o devido imposto.
No interesse individual de uns e de outros, foram geradas mais-valias.
Adam Smith manifestava-se embevecido, e os seus seguidores ainda mais, com as vantagens para a comunidade das mais valias que o individuo conseguiu.
Mas porque será que eu não faço esses negócios?
Provavelmente porque não tenho nenhum amigo que tenha um negócio que possa remunerar-me o empréstimo com tantas mais valias. Poderemos falar aqui em assimetria de informação, i.é, do mercado a não funcionar com a sociedade dos conhecimentos no seu melhor?
Os economistas que estudaram Adam Smith, mas que não ficaram cegos para outros economistas que apareceram por aí (Marx, p.ex), nem para o movimento científico do século XIX, sabem que na natureza nada se cria, tudo se transforma (Adam Smith não era obrigado a adivinhar, que diabo), pelo que as mais valias geradas por uma valorização de acções têm de vir de algum sítio ou de alguns bolsos).
Mas há outra resposta.
Quando ocorreu a crise da Bolsa em 1973-1974, a minha família tinha um lote de acções depositadas num banco.
Depois do “congelamento” da Bolsa em Abril de 1974, a minha família não conseguiu resgatar as acções que tinha. Os mecanismos legais entretanto instituídos permitiram à minha família recuperar, no início dos anos 90, cerca de 4.000 contos.
Deixo ao leitor o cuidado de verificar nos jornais da época, em 1974, as condições em que um lote de acções da mesma ordem de grandeza, pertença da família de um político destacado, foram adquiridas pela instituição bancária em que estavam depositadas, imediatamente a seguir ao “congelamento” da Bolsa pela Junta de Salvação Nacional emergente do 25 de Abril de 1974. Terá sido um caso de assimetria de informação.
Tomei então a decisão pessoal, perante estes factos, de adoptar um comportamento moral (moral significa apenas um procedimento, não tem qualquer intuito de hierarquizar valores) de nunca jogar na Bolsa nem de adquirir acções.
Esta decisão não tem , repito, qualquer juízo de valor que pretenda superiorizar moralmente seja o que for relativamente ao que quer que seja.
Sempre discordei do título do livro de Álvaro Cunhal, “A superioridade moral dos comunistas”, precisamente porque contrariava um dos pressupostos da ideologia, ao discriminar os indíviduos, uns melhores do que outros, quando a ideologia pretendia exactamente implementar a divisa da revolução francesa, … égalité …(em direitos, claro, em acesso a…).
Mas voltando ao jogo da bolha.
Que dizem os meus amigos economistas sobre a legalidade ou não do jogo?
Eu posso jogar a dinheiro com um amigo o que quiser, não é?
E se inscrever na declaração do IRS os rendimentos que daí obtenha, está tudo legal, não está?
Gostaria que ninguém pensasse em caça às bruxas, mas que seria muito bom que a opinião pública começasse a privilegiar outros procedimentos e outras regras económicas, acho que sim.
Estou a falhar alguma coisa, ou os intelectuais que nos dirigem de Bruxelas deviam alterar as regras económicas e deixar de acreditar tanto no poder divino do interesse individual de Adam Smith?