segunda-feira, 29 de junho de 2015

Recordando o acidente de Hatfield, na Inglaterra pós-privatização da British Rail

A propósito da fúria privatizadora do atual governo, recordo o acidente de Hatfield em outubro de 2000, com descarrilamento por motivo de carril fraturado por fadiga mecânica.
Os economistas e financeiros políticos que incluiram no catálogo do consenso de Washington de 1990 a privatização dos transportes públicos não tinham obrigação de conhecer a teoria da fadiga mecânica.
Tinham porém o dever cívico de perguntar aos técnicos da especialidade ferroviária se eram toleráveis os riscos de entregar a manutenção da via férrea da British Rail a empresas privadas, cujo objetivo final é dar lucro aos seus acionistas.
Mas não quiseram saber disso, tal como os decisores que os seguem não se importam de entregar a gestão do metropolitano a uma empresa que só tem experiencia da manutenção de autocarros.
São assim coerentes com os princípios do neoliberalismo, de que o catálogo dos consenso de Washington são as suas tábuas da lei, escrupulosamente aplicadas por reaganistas, thatcheristas, troikistas, gasparistas, albuquerquistas e passistas.
No caso do acidente de Hatfield, com o desmantelamento da estrutura de manutenção da empresa pública, ao ser privatizada em 1993 (os efeitos da falta de manutenção num sistema ferroviário demoram muitos anos a revelar-se, dada a inércia do sistema), e da não transmissão dos critérios de manutenção e do "know how" para a empresa privada que passou a fazer  manutenção, foi negligenciada  a monitorização do estado de resistencia dos carris.
No caso do metropolitano, agora que a sua manutenção (à exceção do material circulante e dos viadutos e galerias) transita para um subconcessionário, recordo que em alinhamento reto o critério de substituição de carris (em curva é  mais restritivo, havendo zonas balastradas como entre Anjos e Rossio, em que o estado do balastro, por se ter desagregado, tambem reduz o período de substituição) é o da passagem de 200 milhões de toneladas pelo carril - considerando 12 toneladas por eixo e 300 comboios de 6 carruagens por dia, temos cerca de 7 anos como período mandatório para substituição. Considerando as contas que registo no PS do texto em http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2015/06/evidentemente-que-tenho-de-fazer.html
duvido que no período de 8 anos da subconcessão seja dada a devida atenção à segurança dos carris.
Recordo ainda que este é o principal argumento para a separação de modos do transporte ferroviário de passageiros e do transporte de carga. A utilização mista implica custos de manutenção mais elevados em termos de substituição de carris e em indisponibilidade durante a realização da manutenções.


Para ver detalhes do consenso de Washington, ver:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=consenso+de+washington
http://en.wikipedia.org/wiki/Washington_Consensus

Para ver detalhes do acidente de Hatfield, ver:
https://en.wikipedia.org/wiki/Hatfield_rail_crash.
https://en.wikipedia.org/wiki/Privatisation_of_British_Rail , de que retiro este excerto:

in July 2006 the Conservative Party's shadow transport spokesman, Chris Grayling, admitted that the 1996 split of the rail industry into track and train components was a mistake which had increased costs: "We think, with hindsight, that the complete separation of track and train into separate businesses at the time of privatisation was not right for our railways. We think that the separation has helped push up the cost of running the railways—and hence fares

Citação de Plutarco (séc.II DC)

Este blogue confessa-se desanimado com a incapacidad de obtenção de um acordo minimamente satisfatório para as duas partes, as instituições a troika e o governo grego.
Confesso que esperava que, entre tantos especialistas da teoria dos jogos e dos dilemas morais, se contabilizasse bem todos os componentes e se avaliasse se os prejuízos de não se ter uma coisa são inferiores ou superiores aos benefícios de se ter outra coisa.
Mas enfim, talvez seja como o senhor comentador Marcelo Rebelo de Sousa diz, independentemente dos erros dos gregos, os eurocratas são uns mangas de alpaca...
Dedico aos eurocratas, se bem que não acredite que, mesmo que lessem, a entendessem, uma citação de Plutarco, por sua vez citando Empedocles:
"Empedocles, filho de Meton, nativo de Agrigento, diz que existem 4 elementos, o fogo, o ar, a água e a terra, e dois princípios ou faculdades e potencias principais, acordo e desacordo, um dos quais tem o poder de juntar e de unir, e o outro de separar e de desunir".
                                         citado em "História das ciencias, dir.Philippe Coatrdière, II volume,                                                                                                                  ed.Texto e Grafia
Ou de como foi possível à mente humana, durante a antiguidade grega, apesar de não dispor dos meios experimentais que permitiram explicar a água, o fogo, o ar e a terra pela tabela periódica dos elementos e pela mecânica quântica, compreender a essência da questão dialética, os princípios do acordo e do desacordo...
Pobres mentes tão pequeninas dos mangas de alpaca de Bruxelas e do consenso de Washington.
Não compreendem Empedocles, nem tão pouco terão lido o Mercador de Veneza, de Shakespeare, que também explica a questão.
Vamos ver se afinal não acontece como no Mercador de Veneza, ainda aparece uma advogada a salvar a situação...

sábado, 27 de junho de 2015

Contas da subconcessão do metro de Lisboa

Citação de Fernanda Cancio, no DN de 26 de junho de 2015:
                             
                         "... cansa anotar mentiras do governo, números martelados, inanidades e desaforos quase todos os dias, e perceber que têm disso fábrica em laboração contínua e são mesmo bons no mister, bem melhores e bem mais incansáveis que quem os desmente ... sabem que só podem ganhar mentindo".

Vou eu correr o risco de os desmentir, ou apenas de lhes retirar o brilho com que se auto-elogiam, apesar de não ter acesso aos elementos fiáveis, apenas me baseando nas informações disponíveis na comunicação social e na análise promovida pela comissão de trabalhadores do caderno de encargos da subconcessão do metropolitano de Lisboa.

Mandou o senhor secretário de Estado aos orgãos de comunicação social dizer que obteria uma poupança anual de 25 milhões de euros, relativamente ao exercício de 2014, ao longo dos 8 anos da subconcessão, para as duas empresas, a Carris e o Metro. Um desses jornais até foi mais longe no zelo e escreveu que a taxa de cobertura das despesas pelas receitas ia passar a ser de 159% (os papistas são mais fundamentalistas que os papas).
Este é um disparate tão grande, tão fora da realidade das empresas ferroviárias de transporte, que não vou fazer contas para o desmentir.
Para avaliar a poupança dos 25 milhões de poupanças vou comparar as receitas e as despesas de 2014 do metropolitano de Lisboa, empresa pública,  com as estimativas em 2016. Concluirei que teoricamente podem prever-se poupanças da ordem de 9 milhões, mas que, considerando as receitas previsíveis e as especificidades da operação e manutenção de metropolitanos, essa poupanças só poderão ser obtidas, com elevado grau de probabilidade, com degradação ou abaixamento do nível do serviço, ou com financiamento oculto ou temporário.
Vou considerar apenas as que irão variar, em função das condições do caderno de encargos, admitindo por simplicidade que se mantêm as despesas de capitalização, do serviço da dívida, amortizações de equipamentos, amortizações financeiras, locações de material circulante e financeiras, juros, resgate de SWAP/IGRF, provisões, etc, etc, sabendo-se que basta alterar critérios, como por exemplo reestruturar dívidas, para fazer variar os encargos de ano para ano (em 2014 pagaram-se 20 milhões de locações, 95,5 milhões de juros e 129 milhões de empréstimos/capitalizações/provisões).

A - Receitas e despesas variáveis em milhões de euros em 2014 pelo metropolitano de Lisboa EP:

- despesas:
       fornecimentos e serviços externos ..  38
       despesas de pessoal .........................  62          
(os numeros disponíveis são 43,3 milhões sem encargos indiretos; o valor de 62 foi obtido a                 partir da estimativa de 47,78 do caderno de encargos para as despesas de pessoal a suportar               pelo subconcessionário correspondentes a 1100 trabalhadores para ele transferidos do metro)
                         total ............................. 100

- receitas:
       de tráfego .....................................    87
       publicidade/alugueres ...................     9
                        total ..............................   96

- saldo em 2014 ...................96 - 100 =  - 4

B - receitas e despesas variáveis em 2016 pelo metropolitano:

- despesas:
         manutenção de material circulante e de tuneis e edificios (estimativa de forn.serv.ext. 30% relativamente a 2014) ....................0,3 x 38 = 11
        pessoal que se mantem no metro...........  14          
(valor calculado para 330 que se manterão no quadro sendo transferidos 1100 para o subconcessionário correspondendo a 47,78 milhões de euros)
        pagamento ao subconcessionário
                         1,5€/carruagem.km
                                1,5 x 21 ........................... 31
                   
                       total ..................11 + 14 + 31 = 56
- receitas:
         70% das receitas de tráfego:
                               0,7 x 87 ............................ 61

- saldo em 2016 ................................61 - 56 =  5

C - variação do saldo de 2014 para 2016
 
               variação   5 - (- 4) =  9 milhões

Isto é, graças à colaboração do subconcessionário, que prescindiu de 20% das receitas de tráfego (17 milhões) (o caderno de encargos previa uma remuneração de 50% das receitas de tráfego ou 43 milhões relativamente aos números de 2014, mas a sua proposta contenta-se com 30% ou 26 milhões), o saldo operacional melhora teoricamente 9 milhões de euros.

D - previsão de receitas do subconcessionário

- 30% das receitas de tráfego:
                        0,3 x 87 = 26
- 1,5€/carr.km:
                        1,5 x 21 = 31
- publicidade, alugueres:
                                           9
- total de receitas:
                 26 + 31 + 9 =  66 milhões

E - previsão de despesas do subconcessionário

- encargos de pessoal (1100 conforme o caderno de encargos, embora só garantido por 1 ano o respetivo acordo coletivo):
                                         48
- fornecimentos e serviços externos, incluindo segurança e vigilancia, energia de iluminação, força motriz e tração, manutenção de via,  sinalização, telecomunicações, baixa tensão, média tensão e pequena manutenção das estações (estimativa de 70% do valor de 2014, considerando que a manutenção do material circulante, viadutos e túneis foi excluida da subconcessão)
                       0,7 x 38 = 27
- total de despesas:
                                        75 milhões


Aparentemente, iremos ter um subsídio ao Estado pelo subconcessionário de 75 - 66 = 9 milhões, que serão provavelmente compensados com medidas futuras como redução dos quadros de pessoal, degradação ou abaixamento do nível do serviço ou da segurança, ou ainda compensados por excedentes de receita da Carris, ou simplesmente por acionamento das cláusulas de reequilíbrio financeiro.

Não posso portanto acreditar no senhor secretário de Estado quando afirma que obterá poupanças de 8 x 25 = 200 milhões.
Nem deixar de recordar que há alguns anos vigorava uma lei que simplesmente excluia propostas demasiado baixas. como parece ser o caso.

A manutenção dos túneis e edificios não consta das obrigações do subconcessionário, nem tampouco a atualização dos equipamentos.
Ao longo de 8 anos alguns equipamentos tornar-se-ão obsoletos e o investimento negativo pelas depreciações.
Isto são coisas para que os financeiros, os jurídicos e os especialistas em autocarros como a Avanza e o grupo ADO (Autobuses de Oriente) não estarão sensibilizados, porque não se pode estar ao corrente de tudo.
Normalmente, quem não está sensibilizado para uma coisa não se candidata a ela, mas parece ter acontecido.
Acresce o risco do subconcessionário começar a cortar na qualidade do serviço, reduzindo a oferta ou os níveis de segurança de circulação (o caderno de encargos não define os indicadores de desempenho que anteriormente se usavam).
Existem ainda cláusulas de reequilibrio financeiro (parecendo não se ter aprendido com as parcerias publico-privadas, sendo conhecida a grande experiencia do senhor secretário de Estado na elaboração de alguns projetos financeiros do passado, desde as salinas do Samouco, às portagens de agosto da Lusoponte e ao Poceirão-Caia), especialmente se a oferta ultrapassar 5% (coisa provável se os combustíveis continuarem a aumentar ou se os governos prescindirem dos ISP considerando o desperdício em combustíveis fósseis importados e em emissões de CO2).

Posso ter-me enganado nas contas, ou não ter tido acesso a dados que deveriam ser públicos, por isso serão bemvindas eventuais correções, nomeadamente quanto aos encargos indiretos de pessoal em 2014, quanto ao coeficiente de redução de encargos de manutenção/FSE devido à exclusão da manutenção do material circulante, túneis e viadutos (sendo certo que no caso dos túneis e viadutos os encargos não são constantes de ano para ano, e no caso do pessoal por um lado diminui o quadro, por outro existe a possibilidade de reposição de componentes salariais cortados no âmbito das medidas da troika).

No entanto, considerando que um transporte público não é para dar lucro (os seus custos são compensados pelos seus benefícios habitualmente não contabilizados, nomeadamente em eficiencia energética e emissões de CO2), este é um exemplo, salvo, repito, a apresentação de dados ocultos, de uma proposta enganosa e de uma gestão de contratação danosa, por ignorar a importancia da experiencia no ramo de negócio a que se concorre.


Citação de Paul Krugman

Com a devida vénia ao DN, cito Paul Krugman:
"Estão a gozar connosco? As pessoas que falharam redondamente em ver os impactos negativos que a austeridade teve estão agora a ensinar-nos sobre crescimento?".
Penso que se refere à senhora e aos senhores do FMI, desde o multiplicador 0,6 por cada euro de austeridade refletido no PIB cada vez mais pequeno, ao esquecimento de uma parte do Excel na correlação entre endividamento e crescimento de Rogof.
Que parecem ser, a senhora e os senhores do FMI, os mais empenhados em impor dificuldades à Grécia, ou ao partido do seu governo.
Se o que estão a fazer com as exigencias é aplicar as teorias de jogos e dos dilemas, atépode ser interesssante, ver a avaliação dos benefícios e dos prejuízos, mas se não for assim é muito mau.
Para um americano deve ser dificil entender porque não se faz o que o tesouro americano fez quando a California faliu (entre outras razões, na sequência da liberalização do setor elétrico), ou o que fez depois da falencia do Lehman Bros e da AIG, sempre injeção de capitais.
Parecem baratinhas tontas os senhores engravatados que mandam na Europa, contentinhos por poderem puxar as orelhas aos preguiçosos dos gregos.
Parece também que entre tantas cabeças luminosas se tenham esquecido da taxa Tobin. Que só poderá avançar se houver acordo entre todos.
Pobre União, se não se consegue um acordo sobre coisa tão simples.
No momento em que escrevo aproxima-se o termo do prazo para o acordo entre as instituições e a Grécia.
Qualquer coisa que permite à Grécia receber dinheiro (por exemplo parte dos lucros do BCE com o empréstimo) para pagar às instituições.
A Krugman já lhe passou a vontade de rir com esta tragicomédia.
E entretanto a noticia passou discreta. A Standard e Poors deu como perspetiva (outlook) para o UK: negativa. Não na perspetiva de saída da Grécia da UE, mas da saída do UK (ai o off-shore em que Londres se converteu).
Interessante a discreção da senhora Merkel. Talvez por ter formação física compreenda a lei de Fermat-Weber aplicada à economia dos países europeus. Numa economia múltipla, os países mais desenvolvidos cada vez se desenvolvem mais, enquanto os menos desenvolvidos ficam cada vez mais para trás. Mas duvido que os economistas teóricos seguidores da escola de Chicago consigam compreender a lei.
Mas são eles que orientam os centros de decisão. Como dizia Jô Soares, "e podem..."
Aguardemos os resultados de mais uma reunião do Eurogrupo.

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Greve no metro

Greve no metro

Greve no metro, dia 26 de junho de 2015, contra a privatização (transferir para uma entidade privada a gestão de uma rede de transporte também é privatizar, pelo menos parcialmente).
Estaria provavelmente a pensar em mais uma greve no metro, a passageira que, lesta no  caminho para o seu trabalho, subindo a escada do cais ascendente da estação Marquês de Pombal, e contornando o pequeno grupo de reformados e pensionistas do metropolitano, apertados em torno do orador que empunhava um megafone rouco, para entrar no tapete ainda rolante que dá acesso á outra linha, a azul, gritava espaçadamente, ao mesmo tempo que ria : “Vão trabalhar”.
O grupo tentava apenas, dois dias antes e fora da ação concreta da greve de dia 26 de junho, chamar a atenção da opinião pública, através de reportagens da TV, devidamente convocada, para o incumprimento do contrato de trabalho que previa complementos de reforma.
Ao argumento do atual governo, que repete que a maioria dos beneficiários não descontou para os complementos que recebia, respondemos nós que foi a própria empresa que convidou os seus funcionários a sair antes da idade da reforma, pagando-lhes os complementos de reforma, para poder mostrar nos congressos e seminários de “benchmarking” os indicadores de pessoal a reduzirem-se.
Ou que a média dos complementos cortados é superior à média das pensões nacionais (e isso não quereria dizer apenas que as pensões neste país são escandalosamente baixas?).
Mas não vale a pena perder tempo. Este tipo de argumentações é como o motor cujo veio roda em vazio, sem trabalho útil fornecido a qualquer mecanismo beneficiário de movimento.
Por isso, e porque as ações judiciais se arrastam na burocracia impenitente, a conclusão da reunião foi a de que só mudando de governo poderemos reaver os nossos complementos de reforma.
Mas eis que se levanta aí uma preocupação.
Em quem irá votar a passageira dos gritos risonhos de “Vão trabalhar”? Burguesinha de cintura cingida e sandálias de tiras (terá sido por usar um vestido como uma túnica que me recordou  a heroína do Cântico dos cânticos?) funcionária nos serviços de uma grande financeira? Classe média alta que só esporadicamente viaja de metro quando tem o carro na revisão? Exemplo, num país em que se desperdiçam os combustíveis fósseis no transporte individual maciço, de que desenvolvido não é o país em que pobre anda de carro, desenvolvido é o país em que rico anda de transporte coletivo?
Votará provavelmente na coligação que nos desgoverna. E como ela tantos passageiros escandalizados com as greves.
Lá continuaremos sem complementos de reforma. Já não iremos trabalhar, nós, velhos de 70 anos. Será que a passageira nos achou ainda com ar robusto, saudável o suficiente para produzir mais valias em horários prolongados, digo prolongados porque com a redução constante do valor da hora de mão de obra ainda teremos de trabalhar durante muitas horas?
Então o seu grito risonho “Vão trabalhar” não foi uma provocação de burguesa votante na coligação conservadora, antes terá sido o riso que se escapa, correndo e furtando-se à perseguição, duma ninfa provocadora do canto nono, como Julio Pomar desenhou na estação Alto dos Moinhos.
Terá sido assim um elogio. Mas, mas… onde trabalhar? Se nem a nossa empresa nos quer…

Regresso a casa e dou por mim a pensar, na carruagem meio vazia (pois, o arrefecimento da economia e a loucura de privilegiar o transporte individual para cobrar o ISP dá nisto, decréscimo de passageiros) se não será chocante eu estar a ironizar, quando o nosso grupo se vai paulatinamente reduzindo. Uns vão deixando de aparecer porque se sentem doentes, outros envergonhados por não poderem manter-se em Lisboa, exilaram-se na terra, outros porque já atingiram o fim da sua estrada.

Mas não, vou continuar. A ironia é uma arma, contra a impreparação e a prepotência de quem nos desgoverna. Têm o direito de governar como governam, com insensibilidade e desumanidade, e nós temos o direito de exprimir a nossa indignação e o nosso desprezo pela sua falta de qualidades humanas, com ou sem apoio  da ninfa do grito “Vão trabalhar”.

terça-feira, 23 de junho de 2015

Os negócios globais nos editoriais dos jornais e a subconcessão do metro de Lisboa

A jornalista, segura de si, das suas convicções e do seu entendimento dos factos, discorreu do alto da sua cátedra.
Primeiro listou as últimas privatizações, sem recordar que o seu produto foi cerca do dobro do previsto no memorando com a troika.
Depois justificou-as com a necessidade do investimento estrangeiro.
E concluiu que, vivendo num mundo globalizado, o dinheiro não tem nacionalidade e "quanto mais cedo o entendermos, melhor."
Dando de barato que eu não entendo , certamente por limitações próprias, porque temos de suportar os inconvenientes da globalização sem ter os seus beneficios, começo por recordar a lista que a senhora jornalista coligiu:
- Autobuses de Oriente - subconcessões do metro e carris de Lisboa
- Azul/Barraqueiro - TAP
- Isabel dos Santos - EFACEC
- Camargo Correa - CIMPOR
- Altice - PT
- Vinci - ANA
- Apollo - Tranquilidade
- Fosun - Fidelidade e Luz Saúde
- State Grid/Three Gorges - REN/EDP
Certamente que a senhora jornalista conhece a teoria da vantagem comparativa de David Ricardo. Que justificaria haver uma lista semelhante de empresas portuguesas, privadas e públicas como aquela, detendo posições estratégicas em outros países. Mas que não existe porque, como escrevi, colhemos os prejuizos da globalização mas não os seus benefícios.
Ignorará provavelmente, dada a sua formação afastada da realidade industrial, que o que ensinam aos técnicos nas universidades e nas escolas profissionais é a capacidade de pôr as coisas a funcionar, a capacidade de apreender e usar conhecimento e de decidir segundo as regras da arte e do negócio.
Acontece que por simples aplicação da regra da estrutura acionista das empresas, os portugueses perderam a capacidade de decisão em questões estratégicas.
Que o mesmo é dizer, os técnicos portugueses são tratados como incompetentes incapazes de tomar decisões importantes nas suas empresas.
O que não admira, o poder está nos financeiros, os políticos validam isso e os meios de comunicação social veiculam os argumentos e as mentiras da propaganda oficial.
A coisa chegou ao ponto de um jornal divulgar o contentamento do senhor secretário de Estado dos Transportes com o negócio do grupo Autobuses de Oriente, dona da Avanza, por a taxa de cobertura das despesas pelas receitas passar a ser, no caso do metro de Lisboa, de 159%. Para quem conhece minimamente o mundo dos transportes, esta afirmação nem merece resposta (receitas em 2014: 96 milhões; gastos operacionais: 83 milhões; juros 95 milhões, locação do material circulante: 20 milhões; empréstimos: 129 milhões). Acresce que o caderno de encargos da subconcessão isenta o subconcessionário dos custos da manutenção e gestão do material circulante, o que torna mais longínquo aquele valor da taxa de cobertura das despesas pelas receitas. Mas penso que merece uma citação da nossa história literária: Mofina Mendes, com o pote á cabeça, a fazer contas deste género, e o pote a cair ao chão e a partir-se. Como se espera que aconteça nas próximas eleições (esperando-se também que o novo poder político concorde que os gestores das empresas não devem ser comissários políticos e que devem fazer uma gestão participada).
Para fecho desta nota, duas notícias: uma, que o grupo Mota Engil, mais ou menos como consequencia do colapso do grupo BES, pensa vender uma participação decisiva da TERTIR (os contentores de Alcantara, os tais do prolongamento da concessão por tratamento assimétrico; parece que a Takargo não é para vender, pelo menos para já, quando há esperança de transformar a atual cooperação com a CP Carga na absorção desta) ao grupo turco Yldirim (para evitar más interpretações, este blogue apoia  a adesão da Turquia à UE).
A outra notícia é a confissão do vereador do urbanismo da câmara de Lisboa de que o objetivo é transferir o terminal de contentores de Santa Apolónia para o Barreiro para poder urbanizar a frente ribeirinha vendendo a chineses e outros estrangeiros com excedentes (eu penso que o investimento estrangeiro seria melhor aplicado na produção de bens industriais, reservando o dos fundos comunitários para infraestruturas e imobiliário, mas enfim). Como diz o provérbio, junta-se a fome de investimentos imobiliários à vontade de comer, das câmaras do Barreiro e de Lisboa.



domingo, 21 de junho de 2015

Acidentes com autocarros

Independentemente de outras motivações, é importante divulgar, por razões de segurança, a investigação às causas dos recentes acidentes de autocarros, para que não se repitam, ou pelo menos para que a probabilidade de repetição seja reduzida.
Recomendar que se espere pelos resultados dos inquéritos leva normalmente ao esquecimento e à manutenção da cultura de tolerancia com os acidentes, especialmente quando se verifica um aumento do numero de mortes na estrada (provavel correlação com o aumento de consumo de combustíveis e a prática de velocidade elevadas para as condições do contexto).
O que tenho observado é que são raros os passageiros de autocarros interurbanos que põem o cinto de segurança. Aliás, é de criticar que a sua operação, dada a exiguidade de espaço, é dificil. Mas não desculpa o seu não uso pelos passageiros.
Gostaria que a ANSR desencadeasse uma campanha pública neste sentido, competindo ao pessoal de terra nas estações rodoviárias a chamada  de atenção dos passageiros para o uso do cinto (já existem autocolantes nos autocarros a dizer que o seu uso é obrigatório).
Importante ainda divulgar os tempos de condução e de descanso e as velocidades registadas nos tacógrafos digitais.

PS em 22 de junho - Tendo sido divulgadas informações sobre um dos despistes, conviria ainda garantir formação aos motoristas para a reação à derrapagem do rodado traseiro para fora da estrada. Numa primeira reação, as rodas dianteiras devem ser mantidas no sentido longitudinal da estrada para diminuir a sua resistência ao deslocamento, para que a maior resistência do rodado traseiro leve o veículo a orientar-se segundo a direção da estrada. Trata-se de técnicas de condução em pavimentos de pouca aderência que deveriam merecer especial atenção na formação de profissionais.

Análise de riscos - o software que por vezes mata, menos mal que raramente

Colega atento enviou-me um interessante texto com a análise do acidente de Santiago, evidenciando a omissão de uma análise de riscos correta pela ADIF e RENFE relativamente á ausencia de automatismo de segurança para o caso de falha de atenção do maquinista à aproximação da curva (o comboio tinha o ATP/ERTMS desligado devido a deficiencias anteriores de software), e insistindo que não pode assacar-se a culpa principal ao maquinista que é o elo mais fraco, sempre que há um acidente:
http://ccaa.elpais.com/ccaa/2015/06/18/galicia/1434644914_903917.html

Ocorreu-me, ao ler o texto em que a senhora analisa a provável causa da falha de atenção, que o software, apesar das suas maravilhosas potencialidades, por vezes mata, menos mal que raramente. Neste caso da curva de Santiago, por não ter sido convenientemente desenvolvido e testado e por isso ter sido desligado.
Mas há outros exemplos recentes, de análise de riscos deficiente e de software como causa de acidentes fatais.

Já foi divulgada a causa provável da queda do Airbus 400M, ao descolar em Sevilha, num voo de testes à saída da fábrica. De assinalar a cultura de divulgação das causas de acidentes para contribuir para que eles não se repitam, em contraste com a cultura do respeito em vigor em Portugal, que deixa cair os inquéritos no esquecimento ou tem  o descaramento de apresentar como causa principal (não foi causa, foi circunstancia) do acidente de Alfarelos em 2013 o mau tempo.

O A-400M caiu porque houve um erro de procedimento relativamente aos ficheiros de consulta pelos computadores de controle e comando dos motores. A admissão de combustível a cada motor é comandada por um computador, duplicado por razões de segurança (os FADEC), que faz o mesmo que os cabos dos aceleradores nos antigos automóveis, mediante a informação recebida do piloto. Só que esta é comparada com os valores armazenados nos referidos ficheiros, os quais tinham por erro sido apagados, reduzindo a potencia em 3 dos 4 motores a valores insuficientes para  descolagem.
Sem prejuizo da engenharia da Airbus ser notável, e admitindo que decisores possam aceitar correr este nível de riscos (risco é a conjugação da probabilidade de um acidente com a gravidade das consequencias da sua ocorrencia, competindo aos decisores aceitar o risco se os custos da sua mitigação forme superiores aos prejuizos em função da sua probabilidade, isto é, se aceitam que, em milhões de voos, um ou outro caia por deficiencia da análise de riscos da componente software), conviria ampliar a divulgação das deficiencias de software responsáveis pelos, felizmente poucos, acidentes dos Airbus.
Recordo que o voo da Air France acidentado no Brasil teve origem em sondas de velocidade suscetiveis a avarias induzindo o software em erro, e sendo complicado ultrapassar o controle do computador pela tripulação (ver os comentários na altura dos pilotos da Boeing, em que os automatismos não têm essa predominancia, e dos pilotos da Qantas, que primeiro detetaram as deficiencias das sondas de velocidade).
Também o avião da Air Asia caiu porque o computador de controle do  leme   estava com intermitencias. Ao desligá-lo, o comandante provocou uma subida intempestiva e perda de sustentação que o copiloto não conseguiu evitar.

Aconteceu ainda, nos primórdios da informática na aviação, a queda de um avião de passageiros em Barcelona e de outro avião em demonstrações num festival aéreo, porque os dados armazenados nos ficheiros de altitude estavam errados.
Será que os atuais informáticos da Airbus têm memória do que se passou há 30 anos, não conseguindo evitar a mesma causa no acidente do A-400M?
 Seria interessante informar a opinião pública.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

A indignidade da entrega da exploração do metro à Avanza/ADO


Evidentemente que tenho de fazer a declaração de interesses de ter sido um ingénuo técnico ao serviço do metropolitano de Lisboa durante 36 anos em que acreditei, ingenuamente como já disse, que estava a prestar serviço público e em que, apesar de ser olhado agora pela opinião pública formatada pela comunicação social como um privilegiado,  tenho a imodéstia de ter obtido alguns resultados não por mérito meu, mas pelo mérito do coletivo em que estive integrado, do auxiliar ao diretor coordenador, passando pelos eletricistas, serralheiros, mestres e colegas de licenciatura.

A presente subconcessão da exploração do metro de Lisboa a um grupo (ADO – Avanza) que só tem experiência de exploração de redes de autocarros configura para mim uma indignidade e uma manifestação de ignorância dos requisitos de segurança de uma rede ferroviária. Parafraseando Henrique Neto, será um exemplo de impreparação dos decisores.
É verdade que o caderno de encargos definiu o preço mínimo como fator único. Qualquer técnico com um mínimo de experiência sabe que só por isso o caderno de encargos já pecava. Mas seria transparente conhecer quem elaborou o caderno de encargos e quem constituiu o júri de seleção. Incluindo as respetivas formações e experiências profissionais e quais os critérios prevalecentes na análise (recordo as discussões que tive com uma colega jurídica nas comissões de análise em que participámos: ela dizia se o concorrente diz que faz com segurança temos de acreditar e eu dizia eu acredito em função da experiência e do conhecimento que tenho do concorrente e da sua atividade).
Enfim, o governo parece ter força para levar a dele àvante.
A mim parece-me um disparate, mas posso estar enganado. E também me parece uma ofensa a quem trabalhou num metropolitano que apresentou e apresenta indicadores de desempenho aos melhores níveis, pensando que não estou enganado.
Por  exemplo, o material circulante foi escolhido com base na economia de tração é uma das melhores frotas (mérito também da Siemens, claro), sendo certo que a sua gestão está excluída da subconcessão, permitindo ao governo fazer o brilharete de dizer que deixou de pagar indemnizações compensatórias (isto é, o erário público vai continuar a pagar a manutenção do material circulante e o serviço da dívida da construção das estações e túneis).
Também não compreendo como o erário público poupa 25 milhões de euros anuais como disse o senhor secretário de Estado. Interessante que mostrasse as contas, sendo certo que os 450 milhões ganhadores para 8 anos chegam e sobram para pagar as carruagens.km com a percentagem da receita que vai para o subconcessionário ( Confesso que não li o caderno de encargos e portanto não sei se os 30% das receitas (que dariam cerca de 25 milhões de euros) estão incluidos ou não nos 56 milhões por ano, sendo que pagando 1,5 eur por carr.km já está bem pago, atendendo a que  o subconcessionário não tem de pagar a manutenção nem o leasing do material circulante nem a parte correspondente dos recursos humanos e restantes custos fixos como energia, amortizações, e juros, alem de se lhes reduzir o quadro de pessoal em cerca de 20% relativamente ao anterior. Mas o essencial é ver se os padrões de segurança vão ser alterados (por exemplo, alterar o numero de horas de condução dos maquinistas é alterar padrões de segurança) para redução de custos (a tal conversa da eficiencia do privado absorver o lucro...)).
Ver também:

PS em 29 de junho de 2015 - Já está amplamente esclarecido que os 30 % de receitas estão incluidos nos 56 milhões de euros anuais que foram anunciados como remuneração do subconcessionário (receita do subconcessionário: (1,5€/carruagem.km x 21 Mcarr.km = 31 M€) + (0,3 x receita de tráfego = 0,3 x 87 M€ = 26M€) + (publicidade/alugueres 9 M€) = 66 M€ ). Ora, estimando uma despesa com pessoal de 47 milhões (é o que vem no caderno de encargos) e de 28 milhões de fornecimentos e serviços externos incluindo 8 milhões com energia (FSE em 2014 incluindo toda a manutenção: 38 M€), verifica-se que se trata de um preço de dumping só recuperável ao longo de cortes drásticos ao longo do período de 8 anos da subconcessão (ausência de investimento na manutenção e nas instalações), eventualmente com recurso a lucros na gestão da Carris (mas então como renovar a frota, mesmo com autocarros usados?).
Veremos, receando uma politica de cortes conduzindo à degradação e ao desrespeito pelas pessoas, funcionários e passageiros, e à implementação das cláusulas gravosas para o erário público, de reequilíbrio financeiro, carinhosamente previstas no caderno de encargos. 

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Portugal ganhou uma medalha de ouro mas não sou patriota neste caso

Hoje, não sou patriota, apesar da primeira referência seja a de que jogadores de ténis de mesa portugueses ganharam a medalha de ouro nos jogos de Baku.
A segunda referência é que Portugal desperdiça neste momento a energia que poderia ser produzida em centrais fotovoltaicas e também nos aproveitamentos por realizar hídricos (cerca de 5 GW) e eólicos, e que poderia exportar se houvesse ligações à Europa (somos uma ilha ferroviária, somos uma ilha energética, agradecimentos sentidos aos governos ignorantes) ou utilisar na conversão descentralisada em hidrogénio (utilisável em condicionamento de ar e em transportes).

Porque relaciono estes factos?
Porque os jogadores portugueses só puderam desenvolver-se tecnicamente porque vivem e trabalham na Alemanha.
E porque é preciso um alemão como Klaus Topfer vir dizer o que diz no artigo do jornal de negócios que, com a devida vénia, transcrevo.
Nestas coisas, não me importo nada que as diretivas sejam decididas por alemães.
O facto de o articulista falar em revolução silenciosa não abona nada, mesmo nada, a comunicação social que não dá o relevo a esta questão, insistindo pelo contrário nas rendas que, obviamente, por não ser razoável pagar aos produtores o kWh a 10 centimos, têm de ser significativamente reduzidas ou, em ultimo caso, aberta a produção de energias renováveis a outras empresas.





A revolução do preço da energia solar
15 Junho 2015, 19:00 por Klaus Töpfer


Está em curso uma revolução silenciosa. Em Novembro, o Dubai anunciou a construção de um parque de energia solar que produzirá electricidade por menos de 0,06 dólares por kilowatt-hora – um custo inferior ao de uma opção de investimento alternativa, a de uma central eléctrica movida a gás ou carvão.
A central – cuja entrada em funcionamento é esperada para 2017 – é mais um sinal de um futuro em que as energias renováveis substituirão os combustíveis fósseis convencionais. Com efeito, praticamente não passa uma semana sem que haja notícias de um grande acordo para construir uma central a energia solar. Só em Fevereiro passado, houve anúncios de novos projectos de electricidade a partir de energia solar na Nigeria (1.000 megawatts)Austrália (2.000 MW) e Índia (10.000 MW).

Não restam dúvidas de que estes desenvolvimentos são positivos para a luta contra as alterações climáticas. Mas a principal consideração que os motiva é o lucro, não o ambiente, uma vez que uma maior eficiência na distribuição de energia – e, quando necessário, no armazenamento – reduz os custos da produção de energias renováveis.

À medida que os esforços para melhorar a gestão da electricidade derivada de fontes flutuantes vão trazendo mais avanços, o custo da energia solar irá continuar a diminuir. Dentro de 10 anos, será produzida em muitas regiões do mundo a 4-6 cêntimos por kilowatt-hora, segundo um estudo recente do Instituto Fraunhofer para os Sistemas de Energia Solar (encomendado pelo ‘think tank’ Agora Energiewende). Em 2050, os custos de produção terão descido para 2-4 cêntimos de dólar por kilowatt-hora.

Conforme sublinha Patrick Graichen, director executivo do Agora, a maioria das previsões internacionais sobre a oferta futura de energia no mundo não toma em consideração a vitória iminente da energia solar sobre os seus concorrentes de origem fóssil. Uma actualização desses cálculos mostraria um retrato realista dos custos e do impacto da nossa produção e consumo de energia sobre o clima do planeta, revelando a importância das energias renováveis para o desenvolvimento económico e permitindo um melhor planeamento da infra-estrutura energética.

Não devemos subestimar o enorme potencial do sol e do vento para a geração de riqueza mundial e para o combate à pobreza. À medida que a energia solar vai ficando cada vez mais economicamente viável, os países localizados na cintura solar da Terra poderão desenvolver modelos inteiramente novos de negócios, pois a energia limpa e barata permitir-lhes-á processarem as matérias-primas localmente, acrescentando valor – e lucros – antes de exportarem.

Ao contrário das grandes centrais eléctricas convencionais, as instalações solares podem ser construídas em meses; além de serem rentáveis, são um meio de resposta rápido a uma procura mundial crescente. E uma vez que as centrais solares podem, regra geral, ser operadas independentemente das complexas redes inter-regionais de electricidade, dão aos países menos desenvolvidos uma forma de electrificarem as suas economias sem construírem novas infra-estruturas dispendiosas.

As centrais solares podem, assim, desempenhar no sector energético o mesmo papel que tiveram os telemóveis nas telecomunicações: chegando rapidamente a grandes comunidades mal servidas em regiões de população dispersa, sem ser preciso investir nos cabos e nas infra-estruturas complementares que outrora eram necessárias. Em África, 66% da população passou a ter acesso a comunicações electrónicas desde o ano 2000. Não há razão para a energia solar não poder fazer o mesmo pelo acesso à electricidade.


É agora a altura de investir na produção de energia solar em grande escala. Para começar, os custos de construção de centrais eléctricas movidas a energia solar estão por fim suficientemente baixos para se poder produzir electricidade a um preço estável e competitivo por mais de 25 anos. O preço do petróleo pode ter caído por agora, mas voltará a subir. As centrais solares são uma garantia contra a inerente volatilidade do preço dos combustíveis fósseis.

Ainda mais importante, o custo de capital é actualmente bastante baixo em muitos países. Esse é um factor decisivo para a viabilidade económica das centrais solares, porque não precisam de grande manutenção mas requerem um investimento inicial relativamente alto. O estudo do Instituto Fraunhofer mostra que as diferenças de investimento de capital são tão importantes para os custos por kilowatt-hora como as diferenças na incidência de luz solar. A energia solar é actualmente mais barata na nublada Alemanha do que em regiões ensolaradas onde o custo de financiamento é maior.

A quantidade de luz solar que incide num país é impossível de mudar. Mas o custo de capital é algo sobre o qual um país pode manter algum controlo. Com a criação de uma estrutura jurídica estável, oferecendo garantias de crédito no contexto de acordos internacionais, e envolvendo bancos centrais em investimentos de grande escala, os governos podem ajudar a tornar a energia solar mais acessível.

Factores como estes explicam o porquê de as políticas climáticas internacionais se focalizarem cada vez mais não apenas na energia solar mas também noutras formas de energia renovável. Os avanços tecnológicos têm melhorado a competitividade dessas fontes energéticas, em comparação com os combustíveis fósseis. Por isso, os instrumentos que tornam a sua adopção financeiramente mais acessível estão a tornar-se nalgumas das armas mais importantes de que dispomos no combate às alterações climáticas. 

Klaus Töpfer, ex-director executivo do Programa Ambiental das Nações Unidas, antigo subscretário-geral da ONU e antigo ministro alemão do Ambiente, é director executivo do Instituto de Estudos Avançados sobre Sustentabilidade, em Potsdam, e presidente do conselho da Agora Energiewende.


Direitos de autor: Project Syndicate, 2015.
www.project-syndicate.org
T
radução: Carla Pedro



sábado, 13 de junho de 2015

Paco Ibanez, no canal Mezzo, cantando Pablo Neruda

Te recuerdo como eras en el último otoño.
Eras la boina gris y el corazón en calma.
En tus ojos peleaban las llamas del crepúsculo.
Y las hojas caían en el agua de tu alma.

Apegada a mis brazos como una enredadera,
las hojas recogían tu voz lenta y en calma.
Hoguera de estupor en que mi sed ardía.
Dulce jacinto azul torcido sobre mi alma.

Siento viajar tus ojos y es distante el otoño:
boina gris, voz de pájaro y corazón de casa
hacia donde emigraban mis profundos anhelos
y caían mis besos alegres como brasas.

Cielo desde un navío. Campo desde los cerros.
Tu recuerdo es de luz, de humo, de estanque en  calma!
Más allá de tus ojos ardían los crepúsculos.
Hojas secas de otoño giraban en tu alma.

A venda da TAP por 10 milhões

Desgostam-me os comentários na internet, como se fosse um pelourinho, a aplaudir a venda da TAP para acabar com as greves.
Para mim são prova de falta de solidariedade de quem os faz. Provavelmente com empregos certos ou situação económica estável, e que não compreendem a necessidade da existencia de sindicatos.
Também me desgostam as greves decretadas por sindicatos que prejudicam a economia pública como foi o caso da greve da TAP, ou afetam a vida dos cidadãos e cidadãs que vão trabalhar e que sem transporte coletivo contribuem para o desperdício energético associado ao transporte individual. Mas é apenas uma discordancia sobre a função sindical e a sua integração na comunidade.

Com a devida vénia ao DN, tento uma análise semiótica aos três rostos.
A senhora revela na sua máscara o que realmente pensa do negócio. É uma senhora qualificada do ponto de vista financeiro, os seus olhos e os músculos faciais são incompatíveis com a serenidade de quem executou uma tarefa de acordo com as regras da sua arte. A sua expressão é assim um indício de que se trata de uma pessoa honesta. O senhor ministro revela autosatisfação própria de um professor universitário premiado que, como académico teórico, está longe do conhecimento dos problemas reais dos negócios de transportes como tem demonstrado pela forma como tem gerido a distribuição dos fundos comunitários. Finalmente, o senhor secretário dos transportes, como excelente utilizador de expressões de impacto mediático e especialista de planos de financiamento, vulgo PPP, de que são exemplos a ponte Vasco da Gama e o Caia-Poceirão, do lado do financiador que não do lado de quem conhece os problemas dos transportes, revela no seu rosto a segurança de quem tem o poder da sua razão independentemente da realidade, como tem provado à saciedade nos processos de concessão e privatização das empresas de transporte urbanas. Faz lembrar os profetas que acederam a revelações exclusivas que se sobrepõem à realidade e que lançam no inferno das penas eternas quem não os segue. Repete incessantemente que foi um bom negócio (400 milhões pagos pelo comprador, 10 milhões recebidos pelo vendedor, por causa daquela coisa subjetiva conhecida por capitais negativos) e que não há alternativa ( TINA - there is não alternative, dizia a profetisa Thatcher, quando é um princípio do conhecimento que há sempre alternativa  - TIAA - there is always alternative). 

Desgosta-me principalmente, talvez por ser velho e ter vivido num período em que acreditámos no conceitos de serviço público, de servidor público, do interesse público e do bem comum (sem a hipocrisia de justificar os sacrifícios dos pensionistas com o interesse público das novas gerações) a impotencia perante a fúria privatizadora do atual governo, sem que os orgãos públicos ligados ao setor dos transportes, as universidades, as associações profissionais, os cidadãos também ligados ao setor tivessem podido formar um corpo técnico de gestão de engenharia, de gestão financeira, de gestão económica, de gestão de recursos humanos, de aproveitamento dos funcionários para a expansão da componente turística, que assumisse a direção da TAP e a sua manutenção na esfera pública.
Se é possível ao banco de Inglaterra publicar um anúncio internacional para provimento do lugar de governador (como é diferente o amor em Portugal, dizia Julio Dantas), porque será impossível em Portugal escolher um grupo de gestores conhecedores do negócio que dirija uma empresa de interesse estratégico (como é uma empresa que tem de assegurar as ligações não rentáveis às populações portuguesas dispersas geograficamente) sem que esses gestores sejam comissários políticos ou militantes dos partidos dominantes nem tenham o lucro como principal objetivo da empresa?

PS em 15 de junho - o senhor presidente da República veio tranquilizar a opinião pública sobre a venda da TAP. Que tinha cruzado informações e que estava tudo bem. Esperemos que não aconteça  o mesmo que aconteceu com o cruzamento das informações  sobre a almofada do BES, informações baseadas num relatório do próprio BES desatualizado 4 meses. 
Por  outro lado, oiço um comentador dizer que não é sério afirmar que a venda foi por 10 milhões de euros porque o comprador vai capitalizar cerca de 400 milhões de euros. 
Não serei sério, então, porque continuo convencido que a venda foi por 10 milhões (o vendedor receberá 10 milhões), embora a compra possa ser de 410 milhões (o comprador pagará 410 milhões) (negócio um pouco diferente do BIC, em que o vendedor, antes de receber 40 milhões por ele, o capitalizou em 600 milhões). 
E diz o comentador que a avaliação da companhia foi, uma, de 200 milhões negativos, e outra, de 500 milhões negativos, logo o negócio foi bom. É possivel, do ponto de vista contabilistico. 
Do ponto de vista de cidadania, tudo depende se 75% dos representantes do povo, ou se 50,001% de eleitores em referendo, depois de apresentados publicamente os argumentos pró e contra, aprovam a venda nestas condições sendo certo que a meta de dinheiro obtido por privatizações, estabelecida no memorando da troika, já foi ultrapassada. 
Como Manuela Ferreira Leite explicou, um meio ou um sistema de transporte para garantir o direito universal à mobilidade não é para dar lucro. Depende do proprietário decidir se aceita gastar dinheiro com ele (os nossos automóveis privados dão lucro ou dão despesa?). Sendo que o proprietário não é o governo, é a nação. 
Entretanto, surgem as informações que o principal cliente da M&E, a companhia de manutenção brasileira da TAP responsável pela maior parte dos prejuízos, só está certificada para Boeing (a maioria dos aviões da TAP é Airbus), 
que o seu maior cliente é a companhia Azul (por outras palavras, o maior cliente da M&E deficitária vai poder geri-la, o que faz lembrar remotamente o processo de venda dos ENVC à Martifer e associadas), 
que a capitalização da TAP para tapar os capitais negativos parece que vai ser feita pelo banco de desenvolvimento, banco público brasileiro (é bonito não terem de se preocupar com regras externas que proibem injeção de capitais públicos, não é? mas se isso se concretizar lá se vai a satisfação do senhor presidente da República de que a maioria dos capitais da TAP permanece portuguesa),
que parece também que uma das hipóteses dos novos acionistas para tapar o buraco é a venda de aviões (como?! se vendem aviões diminuem o ativo o aumentam os capitais negativos, a menos que enganem os compradores),
que ainda não se começou a falar na reconversão da TAP, ou de grande parte dela, em agência múltipla de viagens, 
e que o senhor ministro dos transportes aéreos do Brasil, em clara oposição ao senhor presidente da República portuguesa, afirmou: "Foi uma grande conquista para a aviação civil brasileira (comentário meu: grande?! a TAP não estava desvalorizada?)... a partir de Lisboa, teremos um hub brasileiro na Europa" (comentário meu: nas doutissimas avaliações dos capitais negativos que as consultoras fizeram, esqueceram-se, certamente esqueceram-se, porque se não foi esquecimento teria de se pôr a hipótese que foi por inexperiência, impreparação ou simples incompetência, de entrar numa análise de custos-benefícios com o valor de um "hub brasileiro" na Europa).
Enfim,  evoé,  como dizem os nossos irmãos brasileiros, que nisso seguiram uma via mais respeitadora do que os portugueses da tradição latina por transposição do grego clássico. 





sexta-feira, 12 de junho de 2015

Vendi por 10 mil euros

Vendi o meu prédio por 10 mil euros.
Estamos em crise, porque se não estivessemos teria vendido por um preço mais justo, mais próximo do valor real.
Eu diria que o prédio valia 100 vezes mais.
Mas isto do valor real é discutível.
O montante de um ativo é sempre discutível, o valor de mercado também, normalmente acaba por prejudicar quem tem de vender num período de baixa.
As coisas estão-me correndo mal.
O meu banco diz que a culpa é minha e come-me a maior parte da minha pensão para cobrar juros e amortizações. Ainda se vangloria dos juros e das comissões serem baixos. Mas eu vejo os lucros do banco a subir.
Há dois anos tive de vender a minha oficina de carroçarias, que foi acumulando dívidas ao meu banco que ainda hoje duram e por isso vendi o prédio.
Depois dos chineses terem comprado uma concorrente no bairro do lado o negócio caiu brutalmente. Não pude competir com eles nos preços e na rapidez de execução.
Para tentar equilibrar as contas, fiz uma parceria com uma marca de eletrodomésticos que montou uma fábrica de ventoínhas nos terrenos da minha oficina.
Mas as coisas complicaram-se porque o meu primo que tinha encomendado carroçarias para dois autocarros acabou por recusá-las.
Com o peso dos equipamentos que ele foi exigindo, o pobre motor foi incapaz de alcançar a velocidade que ele queria.
Como eu sou muito distraído, esqueci-me durante a construção de substituir o motor por outro mais potente.
O golpe de misericórdia veio depois, quando a GNR encomendou oito carroçarias para viaturas rápidas que não forneceu, nem pagou os materiais que eu já tinha comprado para o trabalho.
De modo que acabei por vender a oficina de carroçarias a outro concorrente, duma cidade mais a sul, que por sinal era acionista da marca de eletrodomésticos.
Como sou muito distraído, não liguei.
Voltando ao meu prédio, fiz o negócio através de um corretor imobiliário, exatamente porque sou muito distraído e me fazem confusão as técnicas de compra e venda, especialmente quando a situação financeira associada é complexa.
A verdade é que o meu prédio era um bom negócio. Contraí uma dívida no meu banco para realizar umas obras de transformação do prédio em bloco de apartamentos individuais para aluguer a turistas, que é neste momento uma fonte de receitas para o país. Equipei os apartamentos com ar condicionado e wifi.
Digamos que a dívida era de 1 milhão de euros.
Como os ativos se foram desvalorizando com a crise, conforme me explicou o meu banco, os meus capitais eram negativos, da ordem de 500 mil euros.
O banco informou-me que, não só não me emprestaria mais dinheiro, como informaria os outros bancos que não deveriam emprestar-me dinheiro.
Nestas circunstancias, acabei por aceitar a proposta que o corretor me apresentou.
Por sinal de um conhecido dele de longa data, mas eu não reparo nessas coisas, até porque o corretor explicou que, mais importante do que o valor que eu recebo pela venda, é a manutenção do prédio no mercado.
Isto porque o comprador vai já investir nele 388 mil euros e depois renegociará com o banco a dívida, entre especialistas e não com irrelevantes financeiros como eu.
E assim a minha oficina de carroçarias e o meu prédio continuarão a viver.
Mas há um problema, a minha família pôs-me uma ação de interdição. Eu ainda lhes disse que podia ter sido pior, que podia ter conseguido apenas 5 mil euros, mas eles não se convenceram.
Está marcado o julgamento para outubro deste ano.
Vamos aguardar o resultado.


quinta-feira, 11 de junho de 2015

Um século de energia de Manoel de Oliveira

Convido o leitor a dedicar 12 minutos a ver este trabalho de Manoel de Oliveira, com uma sua reportagem de 1932 sobre um aproveitamento hidroelétrico no Ave e imagens da atualidade alusivas às energias eólica e fotovoltaica.
Independentemente do interesse e dos objetivos da empresa patrocinadora, a grande valia deste trabalho é provar que as questões técnicas também podem ser tratadas com sensibilidade artística e os objetos técnicos também podem ser belos.
Quem não compreende isto não sabe o que perde.
Um grande aplauso para um dos últimos trabalhos de Manoel de Oliveira.


https://1seculodeenergia.edp.pt/

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Evocação de Ferreira Dias

De forma oportunista, porque se baseia na evocação pela Ingenium e Maria Fernanda Rolo, do engenheiro Ferreira Dias, escrevo este pequeno texto em intenção dos meus colegas do meu tempo, a quem, por serem do meu tempo, posso azucrinar por a maioria apoiar ou ter apoiado os partidos políticos que têm condenado a ferrovia portuguesa ao isolamento da Europa (o problema da bitola) e a eletricidade portuguesa a ser um gerador de defice tarifário, mas também em intenção dos meus colegas  mais novos, que por serem mais novos talvez não liguem muito às relações de subordinação das questões de engenharias pelo poder político e pelo pensamento económico, o que para eles não será grave, mas que a mim me quer parecer que tem consequencias graves, muito graves, mais para o conjunto da sociedade, que assim fica privada da iniciativa do conhecimento técnico, do que para os jovens técnicos.

O artigo da Ingenium evocativo de Ferreira Dias tem uma sua citação, a propósito do esforço de eletrificação e de centralização da produção e distribuição da eletricidade, em que ele afirmava ser muito dificil compatibilizar a gestão da distribuição elétrica por companhias diferentes. Trata-se de um parecer oposto ao critério básico da União Europeia de privilegiar a concorrencia, independentemente da natureza técnica das coisas. É verdade que o grande teórico do interesse individualista, Adam Smith, desenvolveu o seu trabalho ainda o conhecimento da eletricidade era muito incipiente. Como podia Adam Smith prever que a lei da concorrência na união europeia iria provocar riscos graves de apagões quando as proteções de alguns ramos iam saltando, castigando cada vez mais os ramos ainda conetados, por ineficiência do comando central ao não deslastrarem? Mas ressalvo que sim, é possível compatibilizar a exploração de muitas companhias. Aliás a teleinformática é para isso que serve. É possível, não me parece que seja desejável, porque a simplicidade deve ser um critério técnico.
Vou dar um exemplo das desvantagens da lei da concorrencia que os burocratas de Bruxelas impuseram quando decretaram que as empresas produtoras de eletricidade não podem ser distribuidoras, nem estas instaladoras. É um exemplo mais pequenino mas penso que é edificante.
Tive de requisitar a uma distribuidora de eletricidade a reativação de um contador. Como a instalação estava degradada, a equipa da distribuidora (que não pode ser instaladora, o que seria lógico numa ótica de produtividade temporal) compareceu na data acordada. Informou sobre os trabalhos necessários para que eles, a distribuidora, montassem o interruptor diferencial. O eletricista instalador que contratei executou os trabalhos após o que combinei nova visita da distribuidora. Só que a segunda equipa achou que era preciso executar outros trabalhos. Pelo que chamei novamente o eletricista instalador. Perdeu-se tempo e confirmou-se a baixa produtividade. Mas os burocratas de Bruxelas acham que é melhor haver muitas empresas concorrentes, sem atender aos pormenores conhecidos por quem trabalha com coisas e dificuldades concretas.  É possível que nos países do norte as normas e as especificações permitam a existencia produtiva de empresas de distribuição e de empresas instaladoras. Mas como me permito concluir, como admirador de Ferreira Dias, é menos simples, e a simplicidade é um critério técnico. Enfim, os burocratas de Bruxelas, inspirados pelos académicos teóricos da escola de Chicago, continuam a mandar.

Novelas das privatizações - a Carristur

Surpresa: por informação do presidente da Transportes de Lisboa, R ui Poureiro, o governo desistiu da privatização da Carristur. E disse o senhor que não será privatizada nos próximos anos, porque a empresa "tem muito ainda para dar". Isto é, a razão seria a valorização da empresa para posterior venda.
Pode ser.
Mas é curiosa a desistencia.
Talvez já tenham percebido que é complexa a questão das privatizações no setor dos transportes, e não é certo que haja vantagens, e que as coisas se devem resolver com conhecimento do negócio e com a análise fundamentada dos casos. Como no caso da CP Carga, que afinal dá lucro.

Ópera - pequeno excerto de Boris Goudonov, de Mussorgsky

Pequeno excerto do Boris Goudonov, de Mussorgsky, dedicado à troika e seus seguidores:
Fala do povo - Porque nos abandonas, nosso pai, a quem deixas que nos entreguem?
Fala do patriarca - É uma infelicidade que se abate sobre o país que geme abandonado a uma cruel injustiça.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

O castelo do Barba azul e os diamantes de Angola

https://vimeo.com/30196675

http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=rafael+marques


Mais uma vez cito o canal Mezzo.  O castelo do Barba Azul, de Bela Bartok. A nova esposa pede mais uma chave das portas misteriosas do castelo. O Barba Azul oferece-lhe as joias que estavam lá. Mas Judite horroriza-se porque as joias estão manchadas de sangue. "A tua bela coroa está coberta de sangue", diz ela.
Este blogue deixa registado este momento, em que os generais denunciados por Rafael Marques (ver Diamantes de sangue, editado pela Tinta da China) chegaram a acordo com ele desistindo do processo, mas em que a procuradoria da República, formalista e burocraticamente, insiste em acusar Rafael Marques de desrespeito, em que um apelo internacional pede ao presidente da Republica indulto para esse processo indevido, em que mais uma vez se exemplifica que a independencia dos poderes legislativo, executivo e judicial não deve significar prepotencia de nenhum deles , nem que que nenhum deles está isento de controle pelos outros poderes nem, especialmente, isento de controle pelos cidadãos, e em que a familia no poder em Angola compra a maioria da EFACEC, coisa que até pode ser útil para esta.




sexta-feira, 5 de junho de 2015

Fala de Hans Sachs, nos Mestres cantores de nuremberga

Graças ao canal Mezzo, vejo uma interessante produção dos Mestres cantores, de Wagner.
Retenho uma fala de Hans Sachs: "Mais devagar, distintos mestres, nem toda a gente é da vossa opinião".
Wagner era um pouco egocentrico e a sua ópera pretendia defender a sua música contra os critérios maioritariamente adotados na época. Mas estava certo quanto à elevada probabilidade dos critérios em voga serem medíocres.
Numa altura em que os partidos que têm desempenhado funções governativas apelam a maiorias absolutas, conviria que se lembrassem dos perigos de seguir a opinião única. O "mainstream", como se costuma dizer.
Ou, como disse na televisão um comentador fora da corrente dominante das propagandas partidárias, de que não fixei o nome, a crise financeira internacional que nos trouxe aqui foi prevista por 19 economistas, nenhum deles pertencente ao "mainstream". Querem agora que se acredite nas medidas propostas pelos outros, os que não previram a crise, os que pertencem ao "mainstream", para sair da crise?
Ou como disse Pacheco Pereira, apresentam-nos propostas de programa que são insulto e demonstração de falta de respeito pelos cidadãos?

quinta-feira, 4 de junho de 2015

Privatizações e atropelos - o caso dos torniquetes do metro do Porto




http://www.rtp.pt/play/p1780/e197255/trespontos



Há duas caraterísticas do metro do Porto que eu sempre apreciei, por entender que são melhores do que no metro de Lisboa.
Uma, é que as escadas mecânicas no Porto vão até à superfície. Nunca consegui convencer quem tomava as decisões no metro de Lisboa que levar as escadas mecânicas até à superficie é o mínimo que podemos fazer como manifestação de consideração para com os passageiros. A coisa resolve-se com especificações de resistencia á intempérie ou simplesmente com coberturas ao alcance da excelente industria mecânica portuguesa.
A outra é a ausencia de torniquetes com a fiscalização feita por fiscais.
No caso de haver torniquetes, é pequena a economia de pessoal uma vez que a manutenção dos torniquetes é cara (ca 5% do investimento, já de si elevada), a fraude não é completamente eliminada e há métodos automáticos de contagem de passageiros independentemente de haver torniquetes .
Pois nem de propósito. O atual governo, em mais um atropelo das regras da contratação pública (que consagra o famoso respeito pela concorrencia) lembrou-se, eventualmente para compensar o desgosto do consórcio catalão ganhador da concessão do metro do Porto, de querer instalar torniquetes no metro do Porto. Serão torniquetes fabricados em Espanha por uma empresa de capitais estatais?
Rui Moreira, presidente da camara do Porto explica muito bem no programa três pontos a incorreção de um caderno de encargos ser diferente do contrato sem que todos os concorrentes tenham tido oportunidade de responder aos novos requisitos. É que parece haver uma indemnização compensatória para o concessionário se afinal não houver torniquetes.
Como diz Raquel Varela, continuam as PPP.
Interesse público era não haver privatizações e concessões destas.
Mas que há-de fazer-se, o atual governo tomou a peito privatizar tudo o que mexa e dê lucro ao privado?
Por mim, sem considerar que tudo isto é uma infamia, como no caso da liquidação dos ENVC, penso que no entanto é gestão danosa, com base em fundamentalismo ideológico, ignorância das caraterísticas dos sistemas de transporte pelos economistas gestores que beberam os dogmas da escola de Chicago e se intoxicaram com eles na ansia de beneficiarem investidores privados (e contudo, quem comprou a EDP é estatal, tal como quem comprou a EFACEC), ou simples impreparação, como diz Henrique Neto.
Numa altura em que deviam estar a ser desenvolvidos projetos concretos para as ligações á Europa de vias férreas de alta velocidade e bitola europeia (claro, claro, para mercadorias e passageiros), de linhas de transmissão elétrica de muito alta tensão e de sistemas ferroviários urbanos para submissão a fundos comunitários (coisa a que o atual governo, para tais fins, tem alergia, comprometendo a fórmula do saldo orçaemntal=investimento-poupança+exportações-importações) vive-se este descontrole sistémico nos transportes.

PS - por imposição deontológica escrevo este PS. Quando refiro a ignorância nos processos de privatização, devo ressalvar a competência técnica dos colegas que terão participado na elaboração dos cadernos de encargos. As suas competências foram utilizadas pelos decisores, sobrepondo-se o programa das privatizações aos critérios técnicos, um pouco à imagem do que o Estado Novo parafascista fez com os engenheiros da época nos seus programas de eletrificação e industrialização. Acrescendo que qualquer caderno de encargos deste tipo só seria razoável se elaborado por equipa pluridisciplinar com distribuição equilibrada das valias pelas diferentes disciplinas.

Também, tu, Skoda?


http://www.transportesemrevista.com/Default.aspx?tabid=210&language=pt-PT&id=46298

Decorre o concurso para mais uma privatização, a da EMEF.
Segundo a Transportes em revista, para alem da Siemens e da Alstom, há interesse da Skoda Electric, de mais uma inglesa e outra talvez chinesa (que como se sabe fabricam baratinho).
Entretanto os resultados liquidos de 2014 foram positivos: 909 mil euros.
Apenas mais uma demonstração de que é falso o argumento da inoperacionalidade da gestão pública. Não é o facto de ser pública ou privada que define a eficiência de uma empresa.
Mas o atual governo prossegue a sua fúria privatizadora.
Que culpa tem o interesse público das crenças fundamentalistas apreendidas em cursos nas faculdades?