Ao longo dos anos, o crescimento
da rede do metropolitano foi revelando na maior parte dos casos em que se
decidia por uma ampliação, graves erros de planeamento. Isto apesar de, felizmente,
o plano base de expansão, elaborado em 1974-1975 por um gabinete de estudos
ligado à Siemens, ter sido parcialmente
seguido nas expansões que se verificaram.
A rede atual é assim em grande
parte o resultado de acrescentos decididos pontualmente de acordo com critérios
políticos pouco fundamentados
tecnicamente.
Curiosamente, uma das medidas
prioritárias proposta por esse plano, a expansão até Alcantara, ficou por concluir.
Um dos erros mais vulgares nos
momentos de decisão consiste em querer resolver com uma linha apenas,
zigzaguiante, em boomerang em forma de “V”, ou simplesmente em círculo, o
serviço de várias zonas mais densamente habitadas ou concentradoras de emprego,
perdendo-se assim a valencia de uma verdadeira rede, de garantir percursos
múltiplos através do cruzamento de várias linhas, no pressuposto de que os
caminhos nas estações de correspondência estarão minimizados e que as circulações
em todas as linhas são regulares e frequentes.
Ficaram célebres o desvio na fase de projeto da linha do Campo
Grande para Odivelas imposto pela junta da freguesia da Ameixoeira e o desvio
da linha da Pontinha para a Amadora do seu destino ideal, a estação central da
Amadora, para a Reboleira, por imposição da respetiva câmara municipal.
O traçado proposto retoma o plano
de expanão apresentado pelo governo em 2009 apontando já para uma linha
circular, apesar dos seus inconvenientes, privilegiando a comodidade de alguns
passageiros dispensados de percursos de correspondência em detrimento de “ir
buscar” passageiros a zonas mais afastadas do centro.
Compreendem-se pois, dada a
recorrência deste tipo de erros, as palavras do senhor ministro e acredita-se
que está a ser sincero e bem
intencionado quando diz que o rio terá finalmente uma ligação direta ao centro
e que assim se resolverá o principal problema de mobilidade do metropolitano.
Infelizmente não parece ser
assim. O principal problema da mobilidade não é esse. É a falta de ligações
segundo eixos de penetração e eixos tranversais que eliminem o excesso de
penetração e de atravessamento de automóveis na cidade, com todos os custos
associados de congestionmento, de desperdício energético com combustíveis importados,
com emissões de gases de estufa. Apesar de todos os progressos da indústria automóvel,
o transporte ferroviário metropolitano continua a ser mais eficiente por
passageiro.km para fluxos elevados. Para a solução desse problema da mobilidade
em nada contribui a expansão do Rato ao
Cais do Sodré, a menos da atração de passageiros moradores nos bairros da Lapa
e de Santos ou de moradores na margem sul ou Cascais que trabalhem entre a
Estrela e o Saldanha e troquem o transporte individual pelo metro por não terem
de mudar na estação Baixa Chiado. E
evidentemente, a solução da mobilidade da área metropolitana não deverá ser
vista apenas com critérios restritos, memo que sejam os duma câmara importante
como a de Lisboa. Quanto ao problema da
ligação do rio ao centro, ele resolve-se
simplesmente, com a infraestrutura existente, com um serviço mais regular e
frequente nas linhas amarela, azul e verde, com as correspondências existentes
e, no caso da linha verde, com recurso a comboios de 6 carruagens (anote-se
que, no caso da procura de passageiros continuar a aumentar, a frota existente,
mesmo melhorando a taxa de disponibilidade, começa a ser insuficiente).
Admito, inclusivé por razões
deontológicas, que a informação recebida pelo senhor ministro esteja correta.
Mas infelizmente poderá estar incompleta. Durante a minha experiência profissional,
mais ligada à manutenção de infraestruturas e à integração de disciplinas
ferroviárias durante os trabalhos de ampliação da rede do metro, chamei por
várias vezes a atenção dos colegas projetistas que deviam ter a humildade de
reconhecer que quem faz os projetos não faz geralmente a manutenção. Ou por
outras palavras, não sente as dificuldades resultantes da desadequação entre o
projeto e as realidades do dia a dia da manutenção. Por exemplo, o declive elevado
entre Rato e Cais do Sodré implica um consumo adicional de energia; a
profundidade da estação Estrela implica gastos adicionais na ventilação e
escadas mecânicas; uma linha circular tem inconvenientes que explicitarei a
seguir.
Outro erro grave consiste em
privilegiar critérios financeiros em detrimento de razões técnicas.
Compreende-se que é dificil preparar processos
de financiamento e encontrar financiamentos.
Mas é um erro justificar uma expansão só porque se obteve financiamento, como é
dito agora. Um exemplo desse erro foi a expansão da estação Oriente ao
Aeroporto, envolvendo uma obra complexa e carissima, com curvas e declives
contraindicados em linhas de metro, quando teria sido muito mais económico construir
uma linha independente parcialmente em viaduto, do Campo Grande a Oriente, com
correspondencia nestas estações com as linhas verde e amarela, e a linha
vermelha, respetivamente.
No caso do plano apresentado,
aponta-se o erro grave de querer uma linha circular numa área de influencia
pequena. As linhas circulares justificam-se quando o seu “diãmetro” é
significativo, de modo a fazerem o seu papel de distribuição de fluxos de passageiros
por vários eixos de penetração. Entre
estações das linhas amarela e verde existem atualmente distancias da ordem de
600 e 900 metros com uma média, entre
Campo Grande e Baixa Chiado, de 1060 metros. Numa cidade em que a distancia
média dos habitantes a uma estação de metro é superior, parece mal empregado o
dinheiro investido na criação de uma linha circular de “diâmetro” tão pequeno. Do
ponto de vista da topologia, nas zonas de estações próximas a linha circular
corresponde a uma única linha com 2 vias no sentido sul-norte e outras 2 no
sentido norte-sul. Do ponto de vista de exploração da linha circular, o seu inconveniente
principal consiste em que uma perturbação em qualquer dos seus pontos afeta
toda a linha, coisa que não acontece com 2 linhas independentes. Numa altura em
que o metropolitano é tão acusado de
fornecer um serviço com perturbações, convem sublinhar este aspeto, apesar de,
obviamente, se poder explorar a linha parcialmente, enquanto o troço com avaria
está desativado. Porém, isso exige tempo com toda a linha parada e envolve alguns
riscos. A inexistencia de términos numa linha circular limita ainda a
capacidade de recuperação do intervalo entre comboios (a otimização da oferta
depende da regularidade da exploração) após perturbações por excesso de afluência
ou por avarias.
Anota-se que dada a natureza
aluvionar dos terrenos, os custos de construção da ligação à estação Cais do
Sodré são elevados e que, se se quiser cometer o mesmo erro na ligação das linhas
amarela e verde nos viadutos do Campo Grande, os custos de construção serão
elevadissimos e as caraterísticas resultantes de perfil horizontal e vertical
das vias não são de recomendar.
Tal como o senhor ministro
referiu, existem alternativas, várias, e a sua análise em debate alargado,
contrariamente ao secretismo que tem sido seguido, seria preferível. Como ele
próprio referiu, o prolongamento da linha vermelha a Alcantara (ou da própria
linha amarela, concretizando a proposta do estudo de 1974-75) apesar de mais
caro (4 km para a linha vermelha; 2,3 km para a linha amarela) deve fazer-se,
nomeadamente para redução do tráfego de penetração automóvel vindo da A5
(parque de estacionamento a construir integrado na urbanização de Campo de
Ourique Norte) e correspondencia com a linha de Cascais e da ponte 25 de abril
em Alcantara. Note-se que a aceitação da
ideia não fundamentalista de construção em viaduto na zona de Alcantara
minimizará os custos. Igualmente a não construção da estação de Campolide, que
tem o inconveniente de ser muito profunda, reduzirá os custos. Quanto ao
financiamento, recorda-se que as candidaturas aos programas CEF e Juncker
tiveram reduzidissima participação dos metropolitanos, que o próprio Juncker
insiste no aumento do financiamento de infraestruturas, que já deviam estar a
ser elaborados projetos para submissão como candidaturas ao programa comunitário
2021-2027 e que só há seleção de candidaturas se assentarem em projetos bem
elaborados com critérios técnicos e não políticos.
Deixo pois estas críticas à consideração dos decisores, chamando a atenção
para os erros graves que este traçado encerra enquanto utilização de dinheiros
que são para nós parcos, sem que se alargue significativamente a zona de
influencia do metropolitano de Lisboa, em detrimento dos interesses da
população residente na área metropolitana que tem de se deslocar a Lisboa e
desprezando soluções mais eficazes nesse sentido.
ver tb:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2017/11/a-expansao-da-rede-do-metropolitano-de.html
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http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2017/11/a-expansao-da-rede-do-metropolitano-de.html
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