quarta-feira, 22 de agosto de 2018

O desastre da ponte Morandi

Condolências aos familiares das vítimas mortais e votos de recuperação dos feridos.


Escrevo este texto por mais uma vez tentar divulgar a importancia da atitude anglo-saxónica perante um desastre: envio imediato para o local de técnicos de investigação de acidentes tentando obter o máximo de informação e protegendo o local de intervenções, excetuando naturalmente a busca de sobreviventes; prestação de informações sobre as possíveis causas e circunstancias do acidente em conferencia de imprensa; divulgação do avanço das investigações; objetivo: tentar evitar a repetição do acidente ou mitigar as consequencias.
Esta atitude contrasta com a prática latina, anunciar imediatamente que se vão procurar os responsáveis. Sintoma de fraqueza, de insegurança. Um inquérito não deve atribuir responsabilidades, antes determinar causas.
Por isso, embora não seja técnico de estruturas (os meus amigos estruturalistas perdoar-me-ão os erros de análise), mas tendo estudado alguma análise de risco e acompanhado algumas intervenções de manutenção nos viadutos do metropolitano, deixo registadas as seguintes observações sobre causas possíveis:

corte longitudinal da secção da ponte que desabou completamente (a secção de 200m)

 https://www.bbc.co.uk/news/amp/world-europe-45193452



1 - as juntas de dilatação limitam o troço que ruiu. Poderiam encontrar-se em mau estado e sucedendo um período chuvoso a um período quente as dilatações e contrações poderão ter originado fraturas do tabuleiro e na estrutura aparentemente hiperestática (o tabuleiro não é apenas suspenso, ele é também suportado por traves de contraventamento apoiadas nas fundações; se nas ligações não existia graus de liberdade por bloqueio dos aparelhos de apoio ou por projeto, a estrutura torna-se hiperestática e lidará mal com dilatações e contrações); o vento poderá ter ampliado o efeito dessas fraturas

2 - por ação do vento, da fadiga decorrente do tráfego e da corrosão do betão de recobrimento dos cabos de aço dos tirantes, poderá ter ocorrido uma rotura de um dos tirantes ; por efeito do vento sucederam-se roturas de elementos estruturais até à queda das torres, restando o plinto das fundações. De notar que são conhecidos os riscos de corrosão das estruturas de betão e os meios de diagnóstico e de combate. Recentemente demoliu-se em Portugal uma ponte relativamente nova por ter sido usado um betão com excesso de areia, sensível à carbonatação (formação no betão de carbonato de cálcio devido ao dióxido de carbono)

http://www.civil.ist.utl.pt/~cristina/RREst/Aulas_Apresentacoes/07_Bibliografia/_slides%20aulas/Aula_10.2_Tecnicas_reforco.pdf

3 - por ação de chuvas intensas e sucessivo descalçamento das fundações (há notícia de que a concessionária da autoestrada estava investigando o possível descalçamento das fundações das torres que abateram) as fundações abateram ligeiramente provocando a rotura das juntas de dilatação e sucessivas roturas de elementos estruturais a finalizar com a queda das torres (segundo um video, as torres foram a última coisa a cair).

Parece-me mais plausível a terceira hipótese, mas vamos aguardar.

PS em 22 de agosto de 2018 - Parece que os tirantes eram duplos, mantendo-se a dúvida sobre o estado de corrosão do aço e do betão de recobrimento. A rotura de qualquer dos semi-tirantes, associada aos ventos e ao tráfego, poderia ser suficiente para o desabamento.Segundo a concessionária havia monitorização, mas pelas fotografias vê-se que o tratamento (proteção do betão) só tinha ocorrido na numa das 3 secções atirantadas, a do lado oposto à que ruiu. A zona é rica em poluentes como o anidrido carbónico que ataca o betão (carbonatação), especialmente se ele tiver demasiada areia. No metropolitano existe algum "know-how" de monitorização e tratamento de corrosão do betão armado, nomeadamente adquirido nas estações de Baixa Chiado (que é uma espécie de barragem ás águas da colina do Chiado) e de Terreiro do Paço (que está "imersa" nos lodos do Tejo)*. Tudo isto serve para reforçar a ideia que qualquer investimento traz associado uma despesa com manutenção, contemos com 2 a 5% do seu montante, o que quer dizer que em 50 ou 20 anos se gastou o mesmo dinheiro do investimento. Interessava explicar isto aos senhores economistas que se entretêm com cativações para ficarem sorridentes em fotografias. Salvo melhor opinião, os critérios de contabilização para o defice, das despesas públicas com manutenção, deverão ser alterados pela UE, que não deve lavar as mãos e desculpar-se com a incapacidade dos locais gerirem os bens públicos. Se os locais não o sabem fazer, venham os senhores burocratas da UE tomar conta disto. A menos que queiram que o ministro populista (demagógico) Salvini tenha razão.

https://fcsseratostenes.blogspot.com/2011/07/o-piso-escorregadio-da-estacao-terreiro.html

PS em 30 de agosto de 2018 - graças ao envio de um colega amigo, eis alguns elementos do projeto da ponte: Das fotos da construção e do projeto das vigas de travamento e dos tirantes não parece ter havido poupança no ferro Se a causa foi a corrosão, ela deverá ter sido muito forte. Continuo a desconfiar das juntas de dilatação e do descalçamento da ponte, embora muitos acreditam na hipótese de fadiga devida ao aumento de tráfego ,dos tirantes, dos pilares e dos tabuleiros.
https://www.newcivilengineer.com/latest/revealed-collapsed-italy-bridge-construction-photos-and-designs/10034288.article

Entretanto demitiram-se ou foram demitidos da comissão de inquérito o seu chefe Roberto Ferrazza e o engenheiro Antonio Brencich por terem participado no inquérito às condições de segurança da ponte, aprovando o plano de intervenção e reforço em fevereiro deste ano e não terem proposto o seu encerramento durante as obras.

PS em 1 de setembro de 2018 - Junto ligações para alguns videos. Interessante a simulação do desabamento, mas que não corresponde ao video real em que se vê um dos lados da torre a cair no sentido longitudinal e o outro no sentido transversal, já com os tabuleiros caídos. Há tambem uma teoria de que teria sido um acidente com explosivos (será uma teoria da conspiração, mas pode pôr-se por exemplo a hipótese de os raios que cairam terem provocado uma explosão de gás em depósito defeituoso na zona industrial sob a ponte; no pequeno video que mostra o desabamento, vêem-se umas manchas antes da queda das torres que não se sabe exatamente o que são). Existe ainda o testemunho de que na noite imediatamente antes do acidente houve trabalhos no pavimento do tabuleiro que abateu (compativel com a hipótese de falha das juntas de dilatação ou abatimento das fundações do pilar central):

https://www.youtube.com/watch?v=GuFaS1_e9Sw
https://www.youtube.com/watch?v=Y6suQ0FIoIQ
https://www.youtube.com/watch?v=-AcqKpo0oiY

PS em 4 de setembro de 2018 - Junto várias ligaçóes enviadas pelo eng.João Correia (Lusoprática) que agradeço; independentemente do mérito de algumas destas contribuições da sociedade civil, lamenta-se que a entidade reponsável pela investigação de acidentes não promova sessões de informação sobre os elementos disponíveis:

https://www.youtube.com/watch?v=tz9q4jJ_L3A – imagem Google fissuras nos cabos

https://www.youtube.com/watch?v=DS-N87LrdIg – debate engenheiros italianos


https://www.youtube.com/watch?v=Y6suQ0FIoIQ – simulação do colapso



https://www.youtube.com/watch?v=uEzxg2cWgoU – análise muito detalhada do projecto

https://www.youtube.com/watch?v=oVj0qjTRULw – falta de instrumentação






L'ingegnere Riccardo Morandi spiega come nasce un Ponte Morandi: https://www.youtube.com/watch?v=8x-tNFBr_ds





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