sexta-feira, 30 de abril de 2021

A sociedade discreta que vela pela nossa segurança

 Confesso, desconhecia. Foi preciso ler uma indireta num artigo do Público de ontem para ir à procura.

Antigamente havia duas sociedades discretas que mexiam os cordelinhos integradas no processo histórico de tentativa de substituição das classes aristocráticas e possidentes pela burguesia empreendedora e mais ou menos aliada da industria militar, desde o colonialismo expresso pelo congresso de Berlim de 1885 à colisão frontal nas duas grandes guerras.
Nós, pequeninos, andámos entretidos com a pequena guerra da maçonaria que se meteu pelas linhas de costura do parlamento em época de bancarrota e conseguiu substituir a monarquia. Uns anos mais tarde, por necessidade de defesa e de atualização, despontou a Opus Dei.
São as duas sociedades discretas que já estão um bocadinho desatualizadas.
É preciso o aggiornamento. Muito bem, é fácil, escolas de juventudes partidárias e um prémio para a mais produtiva. É a nova sociedade discreta. Violando as disposições anti-discriminação da Constituição, cela va de soi, isso não importa.
Falo da nomeação do diretor da Segurança Social  (https://www.sabado.pt/portugal/detalhe/assessor-de-antonio-costa-nomeado-diretor-da-seguranca-social), terminando com uma citação  a propósito de outras áreas, mas aplicável neste caso:

Todos conhecemos situações de lugares de chefia eminentemente técnicos, que exigiriam o seu preenchimento por engenheiros experientes e capazes, e que são ocupados por cidadãos com qualificações inadequadas das mais diversas proveniências …

Carlos Mineiro Aires, diretor da Ingenium, nº172, abr-mai-jun2021,revista da Ordem dos Engenheiros


PS em 4 de maio de 2021 - No Público de hoje mais um exemplo da vergonha, a história das portas giratórias público privadas do padrinho do primeiro ministro, Lacerda Machado

sábado, 24 de abril de 2021

Sessão de 19abr2021 no LNEC sobre o lançamento do Plano Nacional Ferroviário


Pela leitura dos comentários dos leitores às notícias sobre as iniciativas ministeriais integradas no ano internacional da ferrovia declarado pela Comissão Europeia, vive-se um momento de entusiasmo e de esperança na correção do desinvestimento crónico na ferrovia.

Infelizmente, não tenho capacidade de me entusiasmar com as notícias. Por formação ou deformação profissional só posso discutir coisas concretas, mas fala-se muito em intenções. Que qualquer cidadão poderá dar contributos para o Plano Nacional Ferroviário que terá de estar pronto em 2022, conforme foi anunciado pelo sr MIH na sessão de 19 de abril no LNEC:

https://www.publico.pt/2021/04/19/economia/noticia/ferrovia-caminho-cidades-20-mil-habitantes-1959135

A base do meu contributo será que não deverá haver um plano ferroviário, mas dois, um centrado na rede convencional, existente, de bitola ibérica, a modernizar, e outro na rede de Alta Velocidade e novas linhas, a construir segundo os padrões europeus (todos, sem exceção) conforme os regulamentos das redes transeuropeias, o 1315 e o 1316, os quais, dizem os textos jurídicos comunitários, são vinculativos, o que tem sido soberanamente ignorado pelo poder político português e pela IP.

Esta separação (hierárquica, conforme propõem os tratados da qualidade, e orçamental, que é o que se tem praticado em Espanha, com  sucesso) é indispensável para que a ferrovia em Portugal corresponda aos objetivos comunitários da rede única europeia e do Green Deal.

Por deformação profissional (no metro transitei da área de manutenção para a de estudos e desenvolvimento de infraestruturas) apenas enviarei como contributo sugestões para linhas novas e, o que me parece também corresponder melhor aos objetivos comunitários, para a retirada dos metropolitanos e redes urbanas do ministério do ambiente para o ministério das infraestruturas.
Curiosamente, já em outubro de 2020 tinha sido veiculada pelo governo, a propósito do PNI 2030, a intenção de estudar a ligação ferroviária das capitais de distrito em falta. Nessa altura elaborei um pequeno esboço para 3 tipos de redes de linhas novas em Portugal, as da rede TEN-T core (principal, objetivo 2030) , as da rede TEN-T comprehensive (complementar)  e as da rede das capitais de distrito. Envio em anexo.
Como referido, estas linhas novas são propostas segundo os padrões da interoperabilidade europeia, que incluem desde a bitola UIC e alimentação 25 kVAC até aos limites dos gradiantes (1,2%), velocidades (250 km/h passageiros, 100-120 km/h mercadorias) e raios de curvas (mínimo da ordem de 5000 m). É evidente que sempre que estes padrões encontram condições topográficas desfavoráveis, os custos sobem, mas não parece acertado estar a poupar agora para termos linhas com severas limitações operacionais (caso da recuperação da linha da Beira Alta, por exemplo, quando para corresponder ao objetivo comunitário de transferência de 30% da carga rodoviária para a ferrovia (ou marítimo) quando se espera, para reequilibrio da economia nacional, o crescimento das exportações para a Europa. Contrariamente à ideia difundida, as exportações, mesmo terrestres, para a Europa além da  Espanha superam já em tonelagem e valor as exportações para Espanha. 
É este o principal argumento, além do carater vinculativo dos regulamentos 1315 e 1316, para a reivindicação de ligações ferroviárias à Europa além Pirineus em bitola UIC.
Porque só devo discutir coisas concretas, como disse, no esboço seguinte faço uma estimativa por alto, de cerca de, para as novas 3 redes, cerca de 22.800 milhões de euros com um esforço anual de 1.400 milhões de euros durante 16 anos. É uma perspetiva diferente da apresentada pelo sr MIH e seu assessor.
Mas claro que as nossas dificuldades financeiras são muito grandes, se bem que para fazer os projetos não seria necessário muito dinheiro, mas também há dificuldades para isso.

Rede básica (core) 2030 »1000km x 20M€/km = 20.000M€ » cofinanc.40% » 12.000M€ » 12 anos (2021-2027) + (2028-2034) » 1.000M€/ano Rede complementar (comprehensive) 2050 » 400km x 20M€/km = 8.000M€ » cofinanc.40% » 4.800M€ » 6 anos (2034-2040) » 800M€/ano Rede adicional cap.distritos » 400km x 15M€/km = 6.000M€ » s/cofinanc. 10 anos 2035-2045 » 600M€/ano Esforço máximo 1.400M€/ano ca. 0,8% PIB


Comentário à intervenção do vice presidente da IP Carlos Fernandes

De acordo com a notícia em 
https://revistacargo.pt/carlos-fernandes-ip-ferrovia-com-investimento-sem-paralelo-e-foco-na-resolucao-das-cargas/

o eng.Carlos Fernandes recorreu a alguns argumentos que pela sua consistência justificam uma análise mais próxima. Inteiramente de acordo que os traçados das linhas antigas condicionam a sua exploração com bons rendimentos. É o mesmo problema das estradas antigas e das autoestradas, tem de se adotar traçados diferentes para estas. 
Pena que só tenha utilizado este argumento para as linhas de bitola métrica. O raciocínio aplicar-se-á tambem às linhas para mercadorias existentes em bitola ibérica. No traçado antigo, com curvas e pendentes, o rendimento energético é inferior a linhas construidas de traiz com limitação das pendentes a 1,2% e do raio das curvas a 5000 m. Claro que ele argumenta que se está a corrigir o perfil da linha da Beira Alta, e a criar refúgios para cruzamento de comboios de 740m, mas o que se gasta em linhas antigas para melhorar o seu rendimento, ainda por cima mantendo a sua via única, será desperdício quando se construir a linha nova.
Por outras palavras,  discordo do colega Carlos Fernandes quando diz que se atinge o objetivo da competitividade da ferrovia com a conclusão do programa 2020. Contas que fiz há uns anos (https://1drv.ms/p/s!Al9_rthOlbwehzNhuEExKreHeAex ) dão-me para o consumo de um comboio transportando 1400 toneladas de carga nas linhas existentes cerca de 52 Wh/ton-km o que compara com cerca de 32 Wh/ton-km em linhas de gradiante inferior a 1,2% e curvas de raios maiores que 5000m. Como o custo operacional é sensivelmente proporcional ao consumo de energia, deduzi que no primeiro caso (linha existente com bitola ibérica) o custo do transporte de 1 ton-km será de 1,67 centimos e , no segundo caso (linha nova com bitola UIC) de 1,2 centimos. Seria interessante comparar com os custos reais e com a anunciada melhoria devida às intervenções de modernização das linhas existentes.
A abordagem de Carlos Fernandes ao invocar o número de comboios que saem com as exportações é muito válida porque dar condições para o aumento das exportações é essencial para o país. 
Mas, para além do esclarecimento sobre os consumos energéticos (que são um fator crítico na operação e consequentemente nos processos de decisão), penso que também deverá ser esclarecida a sua afirmação de que saem atualmente 20 comboios por dia (deduzo que quase exclusivamente por  Vilar Formoso) . podendo desde já duplicar-se este número. 40 comboios que saem diariamente significa 80 comboios por dia em circulação. 
Contas que fiz também há tempos 
dão-me para a linha da Beira Alta, em via única, uma capacidade de 15 comboios por sentido para velocidade média de 70 km/h e 3 pontos de cruzamento; para 10 pontos de cruzamento a capacidade aumenta para 37 comboios por sentido. 
Ignoro quais os parâmetros utilizados no cálculo da IP, que me parece demasiado otimista.
Mais afirmou Carlos Fernandes que as obras em curso vão permitir num futuro próximo a saída diária de 70 comboios (140 comboios por dia nos 2 sentidos, provavelmente contando com as 3 ligações transfronteiriças, Valença, Vilar Formoso e Caia) e que isso poderá absorver "100% das mercadorias que saem para a Europa", parecem novamente afirmações otimistas. 
Ora, em 2020 as exportações para a Europa pelos modos terrestres foram de 16 milhões de toneladas, o que requereria 16.000 comboios por ano, ou à volta de 50 comboios diários, um comboio de meia em meia hora. 
Mas o que impressiona é que em 2020 as exportações por ferrovia para a Europa (incluindo  Espanha) foram em 163 mil toneladas, o que requer à volta de 160 comboios por ano ou 1 comboio de 2 em 2 dias. 
Como disse o presidente da Medway noutra altura 
o transbordo em Irun não será suportável quando se atingirem 2 comboios diários (cerca 700 mil toneladas de carga ). 
Mesmo  que se possa dispor da plataforma de Vitoria ligada por bitola UIC a França, a solução mais económica para o tráfego além Pirineus , para além de comboios de 740m,  será sempre a bitola UIC desde Portugal (conclusão de um estudo da própria IP : 

Também carece de esclarecimento a afirmação de que o modo ferroviário tem uma quota modal de 9% no transporte internacional de mercadorias. Vejamos este gráfico do comércio externo com França por modo de transporte, do relatório do observatório transfronteiriço com os dados de 2017:

 Vejamos dados mais recentes do INE para o ano 2020 : 

https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=415204736&DESTAQUESmodo=2&xlang=pt

https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&indOcorrCod=0008594&contexto=bd&selTab=tab2   

                    exportações para a Europa em milhões de toneladas em 2020 por modo :                                                                      marítimo      9,29 (35,1%)                                                                                                                              ferroviário    0,16 ( 0,6%)                                                                                                                              rodoviário   15,69   (59,2%)  

Se adicionarmos o transporte nacional em milhões de toneladas (8,49 pelo modo ferroviário e 114,30 pelo modo rodoviário, a quota modal ferroviária será 6,19% para a ferrovia e 93,81% para a rodovia;

se considerarmos o transporte nacional e internacional exportador em Mton-km, então teremos 2544 pela ferrovia (9,5%) contra 24200 pela rodovia (90,5%). No entanto, o texto está a falar em comércio internacional, pelo que penso dever a questão ser esclarecida. Igualmente na sua intervenção o presidente da Medway

(https://revistacargo.pt/plano-ferroviario-nacional-deve-ser-ambicioso-ferrovia-tem-margem-para-crescer/ )  

afirmou que a ferrovia tem 14% de quota de mercado. Considerando as exportações e importações, tivemos em 2020    35,7 milhões de toneladas para e de toda a Europa, sendo pela ferrovia apenas 0,72   (2,0%) . A quota ferroviária de exportações para Espanha é apenas de 1% contra 79,6% da rodovia.

 

Aparentemente, os valores apresentados pela IP e pela Medway pretenderão valorizar a ferrovia, o que será uma boa intenção, mas não parece realista, antes parecendo o velho hábito nacional de ganhar sempre nem que seja moralmente, e pela penúria, mostrando a necessidade de investimentos a sério conforme os regulamentos 1315 e 1316 com o evidentemente necessário cofinanciamento.

 

 










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quinta-feira, 22 de abril de 2021

Citações aplicáveis às ações e às intenções do XXII governo (e de outros, também)

 


 

                                                 I

Essa vacina foi aprovada sem qualquer tipo de restrições. Mas as restrições ou não restrições são uma decisão técnica em que os políticos não se devem meter.

                                        declarações do primeiro-ministro em 21abr2021

     (https://www.dn.pt/sociedade/vacina-da-janssen-sem-restricoes-mas-portugal-aguarda-mais-pareceres--13595577.html )

 

                                              II

A montanha dava à luz, no meio de gemidos medonhos, imensa era nos povos a expectativa. Mas ela pariu um rato. Isto foi escrito para ti, que, embora projetes grandes coisas, nada acertas.

                                                                          fábulas de Esopo

                     in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/artigos/rubricas/idioma/a-montanha-pariu-um-rato/3599  [consultado em 21-04-2021]

 

                                      III

Todos conhecemos situações de lugares de chefia eminentemente técnicos, que exigiriam o seu preenchimento por engenheiros experientes e capazes, e que são ocupados por cidadãos com qualificações inadequadas das mais diversas proveniências …

Carlos Mineiro Aires, diretor da Ingenium, nº172, abr-mai-jun2021,revista da Ordem dos Engenheiros


                                                                IV

Estar certo de uma coisa quando se está errado é como uma doença;
reconhecer essa doença como uma doença é livrar-se dela;
ajudar a compreender essa doença é como o velho professor que quer o bem do jovem aluno

Lao Tse , séc.VI AC

 

  V

Não sabem nada, não querem saber e têm raiva a quem sabe ... São uns perfeitos ignorantes, só fazem asneiras.

Vasco Lourenço, coronel, a propósito da reforma das Forças Armadas, referindo-se às forças políticas que têm estado no poder. Citação aplicável a outras áreas.

                                     VI

A participação pública e a opinião de especialistas são indispensáveis, mas difíceis de conseguir num país onde a prática da cidadania é ainda escassa.

                             Raquel Cavaleiro Ferreira, em Cartas ao Diretor no Público de 29abr2021

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Não aos conflitos entre países, especialmente se são vizinhos

Mensagem para deputados ao Parlamento Europeu:


Desta vez não venho insistir nas ligações ferroviárias à Europa (continuo a achar que a bitola UIC é essencial para o aumento das exportações líquidas e que o contacto com os sindicatos ferroviários da Europa seria útil para os nossos sindicatos) nem no plano de expansão do metro de Lisboa (já que sobre o metro do Porto as coisas correm melhor).

Mas foi também uma questão técnica que me levou a escrever-vos.

Há dias, segundo a newsletter Euractiv, o CEO da companhia elétrica da Estónia declarou que brevemente iriam desligar-se da rede elétrica russa e cortar todas as ligações ao passado soviético.

Misturar ideologias ou xenofobias com questões técnicas é muito mau, especialmente se há traumas do passado ( e se a história desta região é traumática, cristianizada à força nas cruzadas medievais do século XI ao século XV). 

Como engenheiro eletrotécnico (reformado) estou inteiramente de acordo com a ligação da rede elétrica estónia à rede da união europeia. 
Tal como a sua rede ferroviária que sofre do mesmo mal de ter uma bitola diferente da europeia (bitola russa de 1520mm)  está em fase de crescimento com uma nova linha de bitola europeia (o que Portugal deveria e não está a fazer), mas mantendo a ligação com o vizinho.    

Podem os políticos de países vizinhos não se entenderem entre eles, mas os técnicos  desses países têm mais facilidade de se entenderem entre si (no nosso caso, é o eterno problema das cimeiras com Espanha, os técnicos entendem-se sobre as ligações elétricas, sobre a gestão da água, sobre as ligações ferroviárias, mas depois vêm os senhores do governo e definem estratégias ou imobilistas ou erradas).

Porém, cortar a ligação com a outra rede elétrica, russa, é contra os princípios técnicos de defesa da estabilidade e da fiabilidade das redes elétricas (quanto mais malhada uma rede mais hipóteses de absorver perturbações e disparos de subredes evitando os apagões).

Este episódio serve também para alguns cidadãos, como eu, manifestarem grande preocupação com a escalada de  críticas, condenações e ameaças  desenvolvidas pelos países do leste europeu da União Europeia juntamente com a propaganda norte americana. 
Segundo notícias da Euractiv, já se fala em redefinição das fronteiras da antiga Jugoslávia (receando-se algo de desagradável da presidencia eslovena), de alinhamento com a política da NATO, de mais sanções económicas (que não punem os mandantes mas sim a população) , de respostas "proporcionais" na crise da Ucrania, de casos de envenenamento em 2014 (evidentemente condenáveis).



Como cidadão europeu não posso concordar que países vizinhos desenvolvam atividades que podem conduzir a uma guerra, que é o que parece que querem. E não é a NATO, cuja intervenção na ex Jugoslavia foi desastrosa que pode ajudar, nem sanções económicas que prejudicam as pessoas especialmente as crianças. 

Os conflitos entre países civilizados resolvem-se no âmbito das Nações Unidas e em tribunais internacionais com intermediação.  

Não subscrevo as políticas de Putin e condeno a atitude para com Navalny, mas sanções económicas e suspensão de trocas comerciais não concordo.

Considero que os deputados portugueses no Parlamento Europeu podem ser uma voz de sensatez no contra esta histeria xenófoba, o que é mais uma razão para que Portugal se mantenha na União Europeia para se fazer ouvir (tal como defendo para as ligações ferroviárias e elétricas nos seus quadros de cofinanciamento, mas de preferência com projetos bem feitos e não com esta desastrosa estratégia).


sexta-feira, 16 de abril de 2021

Maria da Liberdade

À aproximação das comemorações do 25 de abril, a editora "vanity"  a que eu não resisto, por fraqueza minha, a participar de vez em quando nas suas antologias temáticas, escolheu o tema da liberdade.

De modo que lhe enviei este texto, já publicado, curtinho como era exigido, que os participantes foram muitos:



                                             Maria da Liberdade


“Dêem-me as vossas multidões pobres … empurrem-nos para mim, eu erguerei a minha lanterna a indicar a porta dourada”

Ema Lazarus

A informação sobre a sessão na junta de freguesia chegou-me tarde e sem pormenores. Despachei o que estava a tratar, corri para o metropolitano e consegui chegar a tempo de ouvir a segunda oradora.

Não soube o nome, mas pelas suas palavras percebi que era funcionária na câmara que tencionava aprovar o projeto do condomínio privado, à beira do rio, que se discutia naquela sessão.

Que não era admissível, que todos devemos poder usufruir dos locais de lazer, que não devem ser reservados a alguns, que essa reivindicação poderia parecer egoísta, numa altura em que a repressão violenta se abatia sobre tantos povos ou se reprimia o seu bem-estar roubando-lhes as riquezas naturais, mas que neste caso era importante defender o interesse público, e que fora isso que, como técnica, tinha reportado à sua câmara.

Ao ouvi-la, imaginei a figura da oradora numa iconografia comemorativa da Revolução Francesa, ao lado da Igualdade e da Fraternidade.

Quando a sessão terminou, abordei-a felicitando-a pelas palavras desassombradas e perguntei-lhe se poderia enviar-lhe uns desenhos em que se via que o condomínio projetado, dada a sua altura, iria interferir com o alinhamento de apoio à navegação, o que era mais um argumento contra o aproveitamento abusivo do local.

Que sim, seria muito bom, e ditou-me o endereço do seu email:

       -   “mariadaliberdade” – tudo pegado – “arroba email ponto com”.