terça-feira, 14 de novembro de 2023

Proposta de diretiva para o transporte intermodal de mercadorias (revisão da diretiva 92/106 e do regulamento 2020/1056)

 


Proposta de diretiva para o transporte intermodal de mercadorias  (revisão da diretiva 92/106 e do regulamento 2020/1056)

 

No contexto atual do transporte de mercadorias e da descarbonização na Europa e especialmente em Portugal, considerando a pequena quota modal da ferrovia e a falta de infraestruturas para o transporte intermodal (transporte de mercadorias entre a origem e o destino envolvendo mais do que um modo de transporte), esta proposta de diretiva[1] revela-se muito importante aplicando-a conjuntamente com a proposta de substituição do regulamento 1315 das redes transeuropeias TEN-T[2].

O interesse para Portugal destes documentos é o de poderem contribuir para o suporte do esforço financeiro, com apoio comunitário desde que os projetos sejam elaborados e complementados com análise de custos benefícios, para construção das infraestruturas necessárias ao crescimento da quota modal ferroviária nas exportações para a Europa além Pirineus.

Como referido no resumo do estudo da DG MOVE de maio de 2022 comparativo das modalidades de transbordo (transhipment) para maior competitividade do transporte intermodal e capacidade dos terminais da rede TEN-T[3], para distancias superiores a 600km os custos das externalidades são inferiores na maioria das cadeias de transporte intermodal relativamente ao transporte rodoviário exclusivo.

Para o caso geral da EU, é um importante argumento, de acordo com o Green Deal, para a construção da rede ferroviária  europeia conforme a proposta de substituição do regulamento 1315.

No caso português, essa conclusão é especialmente importante se considerarmos os números das exportações em 2022 pelos modos ferroviário e rodoviário para Espanha (11,3 Mton no valor de 16.820 M€) e para o resto da EU (5,9 Mton no valor de 25.770 M€) e a evolução das exportações por todos os modos em 2023[4].

A alternativa marítima, mesmo admitindo a utilização generalizada de combustíveis sustentáveis, tem a desvantagem de maior duração do percurso intermodal para o interior da Europa. Ao percurso Aveiro-Roterdão de aproximadamente 1.900km corresponderá cerca de 3 dias para uma velocidade média de 12 nós (considerando a subida do consumo para velocidades superiores e o congestionamento no canal da Mancha e no porto de Roterdão). O percurso por ferrovia Aveiro-Mannheim, cerca de 2.000km à velocidade média de 60km/h poderá fazer-se em 1,5 dia (suscetível de encurtamento com a melhoria das infraestruturas e da gestão operacional decorrentes da regulamentação).

 

 

Do que antecede pode concluir-se que o cumprimento dos objetivos da proposta de substituição do regulamento 1315 , através da implementação do corredor atlântico com as especificações de interoperabilidade do regulamento, incluindo a bitola 1435mm e o ERTMS, constitui um fator positivo para o desenvolvimento da economia nacional através das exportações de bens e da fixação de investimento estrangeiro. Apresentam-se de seguida alguns elementos relacionáveis com esta questão do transporte intermodal, retirados duma apresentação em 14set2023 na Ordem dos Engenheiros, relativa às ligações ferroviárias à Europa além Pirineus[5]

 

1 – os objetivos do Green Deal

Tal como referido no texto da proposta de diretiva COM (2023) 702 , o argumento diretor desta regulamentação, em conjunto com a proposta de revisão e substituição do regulamento 1315, é o de continuar e intensificar a ação contra as emissões de gases com efeito de estufa, no seguimento do Transport White Paper de 2011 e restantes documentos assinalados na figura seguinte.

 


O quadro seguinte mostra a crítica em março de 2023 do Tribunal de Contas Europeu  ECA à ineficiência da construção da rede única ferroviária europeia e refere os objetivos atualizados a junho de 2023 do Green Deal (transferência substancial da carga rodoviária para modos menos poluentes, crescimento relativamente à atualidade  de 50% da quota da ferrovia de mercadorias terrestres em 2030 e de 100% em 2050, duplicação da quota da ferrovia de alta velocidade de passageiros até 2030 e triplicação até 2050)


 

2 -  comparação dos consumos energéticos dos vários modos terrestres

O quadro seguinte mostra o consumo específico de energia por unidade de carga útil transportada para diferentes modos terrestres. A energia indicada é consumida no próprio veículo e depende da resistência ao movimento calculada pela fórmula empírica  R=a+bv+cv2 em que os coeficientes refletem a maior resistência ao rolamento no contacto pneu-asfalto da rodovia, mesmo eletrificada, relativamente ao contacto ferro com ferro da ferrovia. Não é indicada a energia primária, a montante do veículo.  Para o comboio supôs-se a via com as especificações de interoperabilidade da regulamentação comunitária (pendentes até 1,2%, comprimento 740m).   

                                   


    

3 – o transporte de camiões, semirreboques ou caixas móveis por comboio

Provavelmente a modalidade de transporte intermodal ou combinado que mais contribuirá para a transferência de carga rodoviária para a ferrovia será a das autoestradas ferroviárias, ou transporte de camiões, semirreboques ou caixas móveis por comboio. A sua implementação porém exige a compatibilização dos túneis com  gabarit P400 (altura do veículo transportado até 4m relativamente à altura de 33 cm sobre o plano base de via, que por sua vez exige a coordenação dos gestores de infraestruturas dos países do corredor atlântico. Conviria assim confirmar que os túneis e os viadutos de treliças da atual linha da Beira Alta são compatíveis com o gabarit P400.

No quadro seguinte mostra-se o exemplo do terminal de Calais para carga-descarga de semirreboques. Outros exemplos de linhas de transporte de semirreboques, tecnologias de transbordo e terminais intermodais (marítimo-rodoviário-ferroviário) em[6]


No quadro seguinte reproduz-se o artigo 19 da proposta de revisão e substituição do regulamento 1315, especificando o recurso ao transporte por comboio de semirreboques para desenvolvimento da rede única ferroviária europeia.


 

4 – comparando o percurso atual da linha da Beira Alta com um novo traçado para maior eficiência segundo o corredor atlântico norte

A figura seguinte mostra a amarelo o traçado atual da linha da Beira Alta em fase de renovação, em via simples e bitola ibérica. A vermelho uma hipótese de novo traçado conforme estudo anterior da COBA/RAVE em via dupla, bitola europeia e restantes especificações de interoperabilidade. Para além de menos 20 km de extensão, o menor consumo específico de energia decorrente da eliminação das pendentes e a maior probabilidade de obtenção de financiamento comunitário sugerem a avaliação ex post  dos custos e benefícios da hipótese nova linha comparativamente com a renovação da linha atual.

 


 

Evidentemente que a construção da nova linha teria de ser coordenada com Espanha no sentido de aproximação progressiva das plataformas logísticas espanholas, dotadas também de bitola 1435mm, da fronteira portuguesa, no pressuposto de ligação da plataforma de Vitoria a Irun em bitola 1435mm em 2025, seguindo-se as plataformas de Medina del Campo/Salamanca conforme a figura seguinte  (em que se indicam os objetivos das ligações plenamente interoperáveis à Europa além Pirineus para passageiros e mercadorias conforme o regulamento 1315).


Supôs-se a progressiva extensão da bitola UIC no sentido França-Península ibérica, com os seguintes marcos:
2025 - Vitoria
2030 - Medina del Campo + Madrid 
2035 - Mangualde+Viseu + Leixões + Badajoz + Poceirão
2040 - Vigo




















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