No seguimento da publicação dos resultados finais das eleições de 18 de maio no DR de 31 de maio e da divulgação de uma proposta do PAN de alteração do sistema eleitoral no sentido do cumprimento da regra constitucional da proporcionalidade de votos e mandatos, atualizei os cálculos dos votos inúteis ou que não tiveram contribuição para a eleição de deputados em:
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2025/05/salamandrizacao-portuguesa-os-metodos.html
O texto contem uma referencia aos resultados das eleições em 2024 e uma crítica ao sistema eleitoral que não garante a proporcionalidade entre votantes e mandatos constituindo uma flagrante violação dos artigos da Constituição que referem explicitamente a proporcionalidade e a igualdade de direitos. Embora com o risco de ter falhado alguns cálculos, dada a sua extensão, penso ter fundamentado as conclusões de que deve ser melhorado o sistema eleitoral, principalmente reduzindo o número de circulos para evitar a perda de votos. Refiro igualmente que o argumento da ingovernabilidade, que aliás não resultou das eleições de 18 de maio por não haver maioria absoluta nem coligação que dela disponha, é apenas uma desculpa para manter o statu quo, esquecendo que a Constituição não dá aos partidos o exclusivo da ação política. Mesmo sem maiorias é possível o entendimento entre partidos desde que os seus membros sejam cidadãos civilizados e assegurem a governabilidade. Sobre a proporcionalidade constitucional, é simples provar que ela não está sequer tendencialmente a ser cumprida, nem tampouco a igualdade entre cidadãos, basta rever o seguinte quadro que poderia constituir a base de uma petição ao Tribunal Constitucional e à PGR:

Quadro 1 - comparativo da relação entre a votação em cada partido e os mandatos que lhe foram atribuidos (nº de votos válidos por deputado eleito) em clara contradição com a regra constitucional da proporcionalidade e da igualdade entre cidadãos. Graças ao elevado número de circulos, gerando alguns de pequena dimensão, os partidos mais votados recebem um bónus que lhes aumenta o número de deputados, enquanto os partidos menos votados perdem votos em cirrculos pequenos sem conseguir eleger deputados. A inconformidade do sistema seria facilmente atenuada reduzindo o número de circulos ou criando um circulo de compensação, como pode ver-se nos quadros 2 e 3 .
No presente texto acrescento cálculos para algumas variantes de organização dos circulos, concluindo por uma proposta de 192 deputados a serem eleitos por um circulo único do Continente, mais 5 deputados pelo circulo dos Açores, 6 deputados pela Madeira, 5 deputados por um circulo único de Emigração e criação de uma segunda câmara de votação uninominal, isto é, 1 deputado por circulo, não reservada a partidos, correspondente aos atuais 22 circulos (18 no continente, 1 nos Açores, 1 na Madeira e 2 na Emigração). Total: 230 deputados. O aumento do número de emigrantes registados justifica o aumento de 4 para 5 deputados. As funções da câmara uninominal poderiam ser apenas de exigencia e análise de planeamentos, e de monitorização e fiscalização.
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Quadro 2 - comparação dos resultados oficiais (nº de deputados por partido) com outras hipóteses de atribuição de mandatos |
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Quadro 3 - comparação dos resultados oficiais (critério diferença entre o nº de votos por partido e o nº de votos de que precisariam para obter o mesmo nº de deputados se a atribuição de mandatos fosse proporcional) em termos de votos inúteis que não elegeram deputados
Resulta do quadro 2 que o número de deputados dos principais partidos na versão oficial atual (A) descerá reduzindo o número de circulos. No quadro 3 estimou-se o nº de votos inúteis do sistema oficial em 599270 considerano os votos em pequenos partidos e em 524786 descontando esses votos (74784). Trata-se de um flagarante atropelo dos direitos de igualdadde dos respetivos cidadãos. Na hipótese B (manutenção dos 22 circulos atuais mas criação de um circulo de compensação para 20 deputados como nos Açores e redução do nº de deputados dos 22 circulos atuais para 210 deputados, resulta uma diminuição nos 3 principais partidos e uma subida na IL, L, PCP,BE,PAN e ADN. Também se verifica uma harmonização do número de votos por deputado eleito para cada partido, resolvendo a questão da proporcionalidade sem redução de circulos. Reduzido o nº de votos inúteis a 50699. Não tendo seguido exatamente o método do circulo de compensação dos Açores mas com eliminação dos 20 piores quocientes reduziu-se a 1 o deputado do PSD/CDS/PPM e a zero do JPP. Curiosamente para a hipótese C ( configuração num único circulo, incluindo Continente, ilhas e emigração), resulta a mesma distribuição de mandatos e a redução de votos inúteis, mas não será correto do ponto de vista da autonomia das regiões das ilhas. Na hipótese D (redução do nº de circulos a 6 indicando-se entre parenteses o nº de deputados : Norte (72) + Centro (59) + Lisboa e Sul (84) + Açores(5)+Madeira(6)+Emigração (4) ) a redução dos deputados dos 3 principais partidos e o crescimento dos mais pequenos são menos significativos subindo os votos inúteis para 167571. PS e ADN ultrapassam CH e PAN, respetivamente, em número de deputados. Melhoria da proporcionalidade não muito significativa. A hipótese E (coincide com a proposta apresentada pelo PAN: 230deputados em 10 circulos: 209 deputados/6circulos continente (40/Norte+38/Porto+50/Centro+64Lx/Setubal+8/Alentejo+9/Algarve ) + 5/Açores+6/Madeira +5/ Emigração + 5/compensação ) conduz apenas, relativamente à hipótese D, na transferencia de 1 deputado do Livre para o PAN. PS ultrapassa CH em nº de deputados. O nº de votos inúteis é o mesmo. Notar a hipótese de 5 deputados para um circulo único de Emigração, considerando a subida do nº de registos. A hipótese F ( total de 4 circulos: 214 deputados em circulo único do continente + 5 deputados/Açores+ 6 deputados/Madeira+ 5 deputados/Emigração) conduz a uma razoável proporcionalidade e a votos inúteis de 66319. A hipótese G ( total de 4 circulos (204 deputados/continente+5/Açores+6/Madeira+5/Emigração) mais 1 de compensação (10 deputados) ) conduz aos melhores indicadores para a proporcionalidade, com aproximação entre os valores médios da votação por deputado, e para os votos inúteis, 30379 . PS ultrapassa CH em nº de deputados.
No entanto, considerando as vantagens da criação de uma segunda câmara, por eleição uninominal com candidaturas não reservadas exclusivamente a partidos, coomo aliás prevê a Constituição, elaborrou-se uma hipótese H, conforme o quadro 4 . Os indicadores de proporcionalidade e de utilidade de votos só após as hipotéticas eleições uninominais se poderiam definir, mas indicam-se os valores para os votos inúteis, de 71662, muito melhores do que para o sistema atual.
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Quadro 4 - Cálculo do nº de mandatos por partido, antes da atribuição de 22 mandatos de um novo circulo uninominal, em 1 circulo único continente/192 deputados + 1circulo Açores/5 deput.+ 1 circulo Madeira/6 deput.+ 1 circulo Emigração/5deputados. Estimativa de 71662 votos inúteis sem eleição de deputado.
A segunda câmara de 22 circulos uninominais corresponderia aos atuais 22 circulos (18 continente + 1 Açores + 1 Madeira + 2 Emigração)
Notas:
1 - Os quadros Excel que serviram de base aos cálculos dos mandatos podem ver-se em:
https://1drv.ms/x/c/1ebc954ed8ae7f5f/ET-qlcIHLF9CjyFyjBTVV40BTURsmZRxq5qXfH58gJjjvw?e=PhLZ1e
os resultados finais são os do Diário da República de 31 de maio de 2025:
https://files.diariodarepublica.pt/1s/2025/05/104a00/0000200016.pdf
a determinação do número de mandatos por partido em função da votação e a determinação do
número de deputados por circulo em função dos eleitores inscritos fez-se pelo simulador do MAI em:
https://www.sg.mai.gov.pt/AdministracaoEleitoral/MetodoHondt/Paginas/default.aspx
2 - Dada a extensão das variáveis envolvidas e a diversidade de métodos possíveis de abordagem, bem como o teorema de Kennet Arrow sobre a impossibilidade de um sistema eleitoral preencher todos os requisitos de equlíbrio entre os diversos interesses, a que se junta a probabilidade de erros cometidos nos cálculos supra, gostaria que as minhas propostas fossem testadas, uma vez que julgo serem suficientes para justificar um estudo por especialistas e a adoção pelo Tribunal Constitucional de uma posição face à considerada inconstitucionalidade do sistema atual em termos de proporcionalidade e de igualdade.
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