quinta-feira, 26 de junho de 2025

Proposta de alteração do sistema eleitoral por possível inconstitucionalidade do sistema atual

 No seguimento da publicação dos resultados finais das eleições de 18 de maio no DR de 31 de maio e da divulgação de uma proposta do PAN de alteração do sistema eleitoral no sentido do cumprimento da regra constitucional da proporcionalidade de votos e mandatos, atualizei os cálculos dos votos inúteis ou que não tiveram contribuição para a eleição de deputados em:

 https://fcsseratostenes.blogspot.com/2025/05/salamandrizacao-portuguesa-os-metodos.html

O texto contem uma referencia aos resultados das eleições em 2024 e uma crítica ao sistema eleitoral que não garante a proporcionalidade entre votantes e mandatos constituindo uma flagrante violação dos artigos da Constituição que referem explicitamente a proporcionalidade e a igualdade de direitos. Embora com o risco de ter falhado alguns cálculos, dada a sua extensão, penso ter fundamentado as conclusões de que deve ser melhorado o sistema eleitoral, principalmente reduzindo o número de circulos para evitar a perda de votos. Refiro igualmente que o argumento da ingovernabilidade, que aliás não resultou das eleições de 18 de maio por não haver maioria absoluta nem coligação que dela disponha, é apenas uma desculpa para manter o statu quo, esquecendo que a Constituição não dá aos partidos o exclusivo da ação política. Mesmo sem maiorias é possível o entendimento entre partidos desde que os seus membros sejam cidadãos civilizados e assegurem a governabilidade. Sobre a proporcionalidade constitucional, é simples provar que ela não está sequer tendencialmente a ser cumprida, nem tampouco a igualdade entre cidadãos, basta rever o seguinte quadro que poderia constituir a base de uma petição ao Tribunal Constitucional e à PGR:

Quadro 1 -  comparativo da relação entre a votação em cada partido e os mandatos que lhe foram atribuidos (nº de votos válidos por deputado eleito) em clara contradição com a regra constitucional da proporcionalidade e da igualdade entre cidadãos. Graças ao elevado número de circulos, gerando alguns de pequena dimensão, os partidos mais votados recebem um bónus que lhes aumenta o número de deputados, enquanto os partidos menos votados perdem votos em cirrculos pequenos sem conseguir eleger deputados. A inconformidade do sistema seria facilmente atenuada reduzindo o número de circulos ou criando um circulo de compensação, como pode ver-se nos quadros 2 e 3 .


No presente texto acrescento cálculos para algumas variantes de organização dos circulos, concluindo por uma proposta de 192 deputados a serem eleitos por um circulo único do Continente, mais 5 deputados pelo circulo dos Açores, 6 deputados pela Madeira, 5 deputados por um circulo único de Emigração e criação de uma segunda câmara de votação uninominal, isto é, 1 deputado por circulo, não reservada a partidos, correspondente aos atuais 22 circulos (18 no continente, 1 nos Açores, 1 na Madeira e 2 na Emigração). Total: 230 deputados. O aumento do número de emigrantes registados justifica o aumento de 4 para 5 deputados. As funções da câmara uninominal poderiam ser apenas de exigencia e análise de  planeamentos, e de monitorização e fiscalização. 


Quadro 2 - comparação dos resultados oficiais (nº de deputados por partido) com outras hipóteses de atribuição de mandatos



Quadro 3 - comparação dos resultados oficiais (critério diferença entre o nº de votos por partido e o nº de votos de que precisariam para obter o mesmo nº de deputados se a atribuição de mandatos fosse proporcional)  em termos de votos inúteis que não elegeram deputados

Resulta do quadro  2  que o número de deputados dos principais partidos na versão oficial atual (A) descerá reduzindo o número de circulos. No quadro 3 estimou-se o nº de votos inúteis do sistema oficial em 599270 considerano os votos em pequenos partidos e em 524786 descontando esses votos (74784). Trata-se de um flagarante atropelo dos direitos de igualdadde dos respetivos cidadãos.

Na hipótese B (manutenção dos 22 circulos atuais mas criação de um circulo de compensação para 20 deputados como nos Açores e redução do nº de deputados dos 22 circulos atuais para 210 deputados, resulta uma diminuição nos 3 principais partidos e uma subida na IL, L, PCP,BE,PAN e ADN. Também se verifica uma harmonização do número de votos por deputado eleito para cada partido, resolvendo a questão da proporcionalidade sem redução de circulos.  Reduzido o nº de votos inúteis a 50699. Não tendo seguido exatamente o método do circulo de compensação dos Açores mas com eliminação dos 20 piores quocientes reduziu-se a 1 o deputado do PSD/CDS/PPM e a zero do JPP.

Curiosamente para a hipótese C ( configuração num único circulo, incluindo Continente, ilhas e emigração), resulta a mesma distribuição de mandatos e a redução de votos inúteis, mas não será correto do ponto de vista da autonomia das regiões das ilhas.

Na hipótese D (redução do nº de circulos a 6 indicando-se entre parenteses o nº de deputados : Norte (72) + Centro (59) + Lisboa e Sul (84) + Açores(5)+Madeira(6)+Emigração (4) )  a redução dos deputados dos 3 principais partidos e o crescimento dos mais pequenos são menos significativos subindo os votos inúteis para 167571. PS e ADN ultrapassam CH e PAN, respetivamente, em número de deputados. Melhoria da proporcionalidade não muito significativa.

A hipótese E (coincide com a proposta apresentada pelo PAN:    230deputados em 10 circulos: 209 deputados/6circulos continente (40/Norte+38/Porto+50/Centro+64Lx/Setubal+8/Alentejo+9/Algarve ) + 5/Açores+6/Madeira +5/ Emigração + 5/compensação ) conduz apenas, relativamente à hipótese D, na transferencia de 1 deputado do Livre para o PAN. PS ultrapassa CH em nº de deputados. O nº de votos inúteis é o mesmo. Notar a hipótese de 5 deputados para um circulo único de Emigração, considerando a subida do nº de registos.

A hipótese F ( total de 4 circulos: 214 deputados em circulo único do continente + 5 deputados/Açores+ 6 deputados/Madeira+ 5 deputados/Emigração) conduz a uma razoável proporcionalidade e a votos inúteis de  66319.

A hipótese G ( total de 4 circulos (204 deputados/continente+5/Açores+6/Madeira+5/Emigração) mais 1 de compensação (10 deputados) ) conduz  aos melhores indicadores para a proporcionalidade, com aproximação entre os valores médios da votação por deputado, e para os votos inúteis, 30379 . PS ultrapassa CH em nº de deputados.


No entanto, considerando as vantagens da criação de uma segunda câmara, por eleição uninominal com candidaturas não reservadas exclusivamente a partidos, coomo aliás prevê a Constituição, elaborrou-se uma hipótese H, conforme o quadro 4 . Os indicadores de proporcionalidade e de utilidade de votos só após as hipotéticas eleições uninominais se poderiam definir, mas  indicam-se os valores para os votos inúteis, de 71662, muito melhores do que para o sistema atual.



Quadro 4 - Cálculo do nº de mandatos por partido, antes da atribuição de 22 mandatos de um novo circulo uninominal, em  1 circulo único continente/192 deputados + 1circulo Açores/5 deput.+ 1 circulo Madeira/6 deput.+ 1 circulo Emigração/5deputados. Estimativa de 71662 votos inúteis sem eleição de deputado.
A segunda câmara de 22 circulos uninominais corresponderia aos atuais 22 circulos (18 continente + 1 Açores + 1 Madeira + 2 Emigração)



Notas: 

1 - Os quadros Excel que serviram de base aos cálculos dos mandatos podem ver-se em:
https://1drv.ms/x/c/1ebc954ed8ae7f5f/ET-qlcIHLF9CjyFyjBTVV40BTURsmZRxq5qXfH58gJjjvw?e=PhLZ1e

os resultados finais são os do Diário da República de 31 de maio de 2025:
https://files.diariodarepublica.pt/1s/2025/05/104a00/0000200016.pdf

a determinação do número de mandatos por partido em função da votação  e a determinação do 
número de deputados por circulo em função dos eleitores inscritos fez-se pelo simulador do MAI em:
https://www.sg.mai.gov.pt/AdministracaoEleitoral/MetodoHondt/Paginas/default.aspx

2 - Dada a extensão das variáveis envolvidas e a diversidade de métodos possíveis de abordagem, bem como o teorema de Kennet Arrow sobre a impossibilidade de um sistema eleitoral preencher todos os requisitos de equlíbrio entre os diversos interesses, a que se junta a probabilidade de erros cometidos nos cálculos supra, gostaria que as minhas propostas fossem testadas, uma vez que julgo serem suficientes para justificar um estudo por especialistas e a adoção pelo Tribunal Constitucional de uma posição face à considerada inconstitucionalidade do sistema atual em termos de proporcionalidade e de igualdade. 

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