Não faças mal (do not harm), histórias de vida e de morte da neurocirurgia, de Henry Marsh, ed. Lua de Papel.
Trata-se de um livro muito interessante, com memórias do neurocirurgião Henry Marsh. Apesar dos livros de memórias não serem muito apreciados pelos especialistas de literatura, este foi premiado em Inglaterra e até escritores fizeram recensões elogiosas.
O autor é um prestigiado neurocirurgião inglês que trabalhou no serviço nacional de saúde e que conta com humildade os seus sucessos e insucessos.
Pessoalmente aprecio livros de memórias. Contêm informações mais rigorosas sobre a vida das pesoas do que os romances. E no caso dos médicos é interessante ver como escrevem Fernando Namora, Miguel Torga, A.J.Cronin, Axel Munthe, António Lobo Antunes. Isto para não recordar o dr Kildare.
Mas cito o livro para falar de transportes. Numa das suas crónicas, o autor conta que terminou o seu dia de trabalho no hospital, meteu-se no metropolitano com a sua bicicleta dobrável e foi da estação até ao local em que tinha uma reunião na bicicleta.
De facto, lembro-me de ter participado num congresso em Londres e de ter encontrado depois no metro conferencistas e assistentes. Sempre que vou a congressos em Portugal, vejo a maior parte dos conferencistas e assistentes entrar nos seus carros depois das sessões.
Recordo ainda o ar enjoado de um senhor professor de economia, ex-ministro das finanças , queixando-se que o seu motorista tinha muitas dificuldades com o transito entre o Areeiro e o Chiado, para as suas aulas (e contudo, tem uma linha de metro entre esses dois pontos).
Recordo ainda o diretos do laboratório de alta tensão na Holanda em que fiz um estágio.Algumas vezes aparecia de carro,mas a maior parte das vezes de bicicleta.
Tive pena, na minha vida profissional, de não ter usado a bicicleta, mas confesso que nunca fui muito bom a conduzi-la. Lembro-me das quedas na adolescencia, receei enfiar-me debaixo de um carro lisboeta...
Espero que o exemplo do dr Marsh possa convencer os técnicos de transporte que as deslocações numa área metropolitana devem ser estudadas incluindo vários modos. A bicicleta dobrável é um componente de uma deslocação (na Holanda, no Japão e na Dinamarca são enormes os parques de estacionamento para bicicletas junto de estações ferroviárias), como automóveis elétricos partilháveis, cabinas autónomas guiadas, carros autónomos,etc, etc. Mas claro, dir-se-á sempre que não há dinheiro, pese embora pensar e fazer projetos não ser assim tão caro.
quarta-feira, 31 de agosto de 2016
Não faças mal, de Henry Marsh
sábado, 27 de agosto de 2016
Acidente ferroviário na linha Bari-Barletta em 12 de julho de 2016
Em 12 de julho a comunidade ferroviária internacional voltou a estar de luto com o acidente na linha Bari-Barletta, em itália.
O acidente ficou a dever-se à sobrecarga da exploração de um troço em via única não equipado com sinalização automática. A autorização de entrada neste troço de cerca de 15km é dada por cantonamento telefónico.Devido à acumulação de atrasos os chefes de estação das extremidades do troço confundiram os números das composições. Um dos chefes mandou avançar dois comboios seguidos num dos sentidos, e o o chefe da outra estação mandou avançar em sentido contrário outro comboio quano o segundo ainda não tinha completado o percurso.
A linha tem uma carga diária por sentido de cerca de 100 comboios. Admitindo 10 comboios por hora de ponta, ou 6 minutos de intervalo, é evidente que um troço que leva a percorrer 10 minutos só pode gerar atrasos.
Este troço de via única é dos poucos existentes mas foi alvo de uma derrogação da aplicação da diretiva europeia que obriga à instalação de sistemas de controle de velocidade.
Trata-se assim de mais um acidente que ocorre enquanto se está à espera de novos investimentos (duplicação da linha e instalação de controle de velocidade).
Recordo a propósito o acidente na Bélgica de 5 de junho de 2016, que ocorreu também enquanto os caminhos de ferro belgas vão gerindo um contrato burocratizado e demorado para instalação do sistema TBL1+ de controle de velocidade.
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/06/acidente-ferroviario-em-saint-georges.html
E sublinho a diferença no tratamento oficial dos dois acidentes. Enquanto na Bélgica continua o secretismo (foi prometido divulgar o inquérito 3 meses depois do acidente) e são publicadas informações sobre o não cumprimento dos procedimentos pelo maquinista falecido (que inclusivmente terá sido distraídopelo telemóvel, ignorando o facto de que um sistema ferroviário seguro impõe a travagem automática por ultrapassagem de um sinal vermelho e que subsistem dúvidas sobre o projeto de sinalização na zona do acidente) , em Itália 3 dias depois a imprensa divulgou todos os pormenores, nomeadamente a intolerável existencia de um troço de via única e a intolerável sobrecarga com risco de falha humana do excesso de circulações num troço de via única com cantonamento telefónico.
http://bari.repubblica.it/cronaca/2016/07/15/news/scontro_treni_puglia_errori-144127671/?refresh_ce
Aguardemos o inquérito do gabinete de acidentes belga e o anuncio dos trabalhos de duplicação da via e instalação do sistema de controle de velocidade na linha italiana.
O acidente ficou a dever-se à sobrecarga da exploração de um troço em via única não equipado com sinalização automática. A autorização de entrada neste troço de cerca de 15km é dada por cantonamento telefónico.Devido à acumulação de atrasos os chefes de estação das extremidades do troço confundiram os números das composições. Um dos chefes mandou avançar dois comboios seguidos num dos sentidos, e o o chefe da outra estação mandou avançar em sentido contrário outro comboio quano o segundo ainda não tinha completado o percurso.
A linha tem uma carga diária por sentido de cerca de 100 comboios. Admitindo 10 comboios por hora de ponta, ou 6 minutos de intervalo, é evidente que um troço que leva a percorrer 10 minutos só pode gerar atrasos.
Este troço de via única é dos poucos existentes mas foi alvo de uma derrogação da aplicação da diretiva europeia que obriga à instalação de sistemas de controle de velocidade.
Trata-se assim de mais um acidente que ocorre enquanto se está à espera de novos investimentos (duplicação da linha e instalação de controle de velocidade).
Recordo a propósito o acidente na Bélgica de 5 de junho de 2016, que ocorreu também enquanto os caminhos de ferro belgas vão gerindo um contrato burocratizado e demorado para instalação do sistema TBL1+ de controle de velocidade.
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2016/06/acidente-ferroviario-em-saint-georges.html
E sublinho a diferença no tratamento oficial dos dois acidentes. Enquanto na Bélgica continua o secretismo (foi prometido divulgar o inquérito 3 meses depois do acidente) e são publicadas informações sobre o não cumprimento dos procedimentos pelo maquinista falecido (que inclusivmente terá sido distraídopelo telemóvel, ignorando o facto de que um sistema ferroviário seguro impõe a travagem automática por ultrapassagem de um sinal vermelho e que subsistem dúvidas sobre o projeto de sinalização na zona do acidente) , em Itália 3 dias depois a imprensa divulgou todos os pormenores, nomeadamente a intolerável existencia de um troço de via única e a intolerável sobrecarga com risco de falha humana do excesso de circulações num troço de via única com cantonamento telefónico.
http://bari.repubblica.it/cronaca/2016/07/15/news/scontro_treni_puglia_errori-144127671/?refresh_ce
Aguardemos o inquérito do gabinete de acidentes belga e o anuncio dos trabalhos de duplicação da via e instalação do sistema de controle de velocidade na linha italiana.
sexta-feira, 19 de agosto de 2016
Cartas ao diretor, o menosprezo de cidadãos
Transcrevo um excerto de uma das cartas ao diretor do DN.
Gosto de ler estas cartas. Refletem às vezes melhor a opinião pública dos que as doutas opiniões dos doutos comentadores, sem os excessos de alguns comentários na internet.
"Quando damos a cara por projetos em que acreditamos, mas posteriormente somos descartáveis, podemos questionar se aqueles que na classe política nos menosprezam pela nossa formação académica, pelo nosso estatuto social ou pela nossa condição social, não estarão a contribuir para passar uma imagem em que a falta de moral e ética tornam a política mais pobre."
Américo Lourenço, Sines, no DN de 19 de agosto de 2016
Gosto de ler estas cartas. Refletem às vezes melhor a opinião pública dos que as doutas opiniões dos doutos comentadores, sem os excessos de alguns comentários na internet.
"Quando damos a cara por projetos em que acreditamos, mas posteriormente somos descartáveis, podemos questionar se aqueles que na classe política nos menosprezam pela nossa formação académica, pelo nosso estatuto social ou pela nossa condição social, não estarão a contribuir para passar uma imagem em que a falta de moral e ética tornam a política mais pobre."
Américo Lourenço, Sines, no DN de 19 de agosto de 2016
quinta-feira, 18 de agosto de 2016
15 de agosto de 1936 em Badajoz
Com a devida vénia ao DN, e aplauso pela excelente reportagem, junto a ligação com a reportagem sobre o assassínio na praça de touros de Badajoz dos defensores da república espanhola em 15 de agosto de 1936:
http://www.dn.pt/mundo/interior/badajoz-sem-memoria-80-anos-depois-da-matanca-da-guerra-civil-espanhola-5338936.html
Recordo que o governo espanhol da altura tinha sido democraticamente eleito, que os "comunistas" que o apoiavam eram minoritários e que os vencedores da guerra civil eram rebeldes.
Não quero desculpar os assassínios que durante os 3 anos da guerra civil a esquerda também executou; segundo o DN, cerca de 55.000, contra 100.000 por parte da direita), mas devemos recordar sempre que possível, que o governo da república tinha sido democraticamente eleito e que Franco foi diretamente apoiado por Hitler, Mussolini e Salazar (por este último disfarçadamente, como era seu hábito, conforme ficou ilustrado pelo transporte de abastecimentos pelos navios da CUF).
Para que não se repita.
http://www.dn.pt/mundo/interior/badajoz-sem-memoria-80-anos-depois-da-matanca-da-guerra-civil-espanhola-5338936.html
Recordo que o governo espanhol da altura tinha sido democraticamente eleito, que os "comunistas" que o apoiavam eram minoritários e que os vencedores da guerra civil eram rebeldes.
Não quero desculpar os assassínios que durante os 3 anos da guerra civil a esquerda também executou; segundo o DN, cerca de 55.000, contra 100.000 por parte da direita), mas devemos recordar sempre que possível, que o governo da república tinha sido democraticamente eleito e que Franco foi diretamente apoiado por Hitler, Mussolini e Salazar (por este último disfarçadamente, como era seu hábito, conforme ficou ilustrado pelo transporte de abastecimentos pelos navios da CUF).
Para que não se repita.
sexta-feira, 12 de agosto de 2016
sexta-feira, 5 de agosto de 2016
Monocotiledónia na duna
terça-feira, 2 de agosto de 2016
Depois da reposição dos complementos de reforma - Transportes em Lisboa na perspetiva de um reformado, reflexões de umas noites de verão
Juntei num pequeno
livro de 300 páginas, "Nós, os velhos do metropolitano", cerca de 100 posts do meu blogue, com os relatos das
manifestações que nós, os reformados do metropolitano, fomos fazendo contra o
corte dos complementos de reforma e contra o processo de privatização ou
subconcessão dos operadores de transportes coletivos urbanos, desde outubro de
2013 a janeiro de 2016, quando foi aprovada a reposição dos complementos de
reforma.
Inclui ainda alguns
comentários, também retirados deste blogue, a factos ou notícias relacionados
com os transportes urbanos que foram ocorrendo nesse período, alguns desabafos,
alguns pequenos estudos ou análises técnicas sobre a problemática dos
transportes, da mobilidade, do urbanismo, da energia, e naturalmente da
situação financeira do país, para não dar um ar panfletário ao livro.
Não terá resultado
uma leitura agradável nem divertida, mas pode ser que alguns colegas ou pessoas
interessadas nestes temas encontrem utilidade no livro.
Consultando as
ligações acima poderão encomendar o livro. Não se trata de publicidade porque
prescindi dos direitos de autor para minimizar o preço.
Mas concluido o
livro, recebidas algumas amáveis e benévolas críticas de colegas e amigos, que
quem não gostou tem-se inibido de dizer mal, anuladas as subconcessões, põe-se
a questão simples de analisar a situação do metropolitano.
Isto é, depois de
resolvida a questão da reposição dos complementos (a devolução com
retroatividade é outra questão, e provavelmente ficará para as calendas, atendendo
à crise financeira, sem prejuízo de virem a criar-se mecanismos de
solidariedade com os colegas mais necessitados e um fundo de pensões de que
possam beneficiar os colegas admitidos depois de 2004, não abrangidos pela
contratualização dos complementos de reforma) e da anulação das subconcessões,
que fazer?
E levanta-se uma
questão. Quando um reformado fala da sua empresa pode sempre desconfiar-se que
está a dizer de uma maneira ou doutra que no seu tempo é que se trabalhava bem,
subentendendo menos consideração pelo valor dos seus colegas mais novos que se
mantêm no ativo.
Será uma questão
deontológica, especialmente se existe divergência de opiniões, ou, pelo menos,
de atitude para abordagem das questões. Mas eu garanto que, no meu caso, me
orgulho de ter colaborado nos processos de admissão dos novos colegas e de os
ter ajudado no período de formação e adaptação à empresa a torná-los melhores
do que eu. Não ponho em causa a sua formação básica e a sua capacidade técnica.
Terei talvez falhado em ajudar a disseminar na empresa as ideias de trabalho
coletivo que vi bem sistematizadas no livro A sabedoria das multidões, de James
Surowiecky, não consegui anular as barreiras que se levantam numa empresa ainda
demasiado espartilhada em esquemas hierárquicos top-down, e dividida em
compartimentos com tendência para a estanquidade. Deixam-me triste os
desabafos de excelentes técnicos, por vezes em situação de mau aproveitamento
das suas competências, quando me respondem, "isso já não é comigo".
Quando é, quando os processos são transversalmente de todos.
Quanto a eventuais
divergências, elas podem agravar-se com a prática habitual nas empresas,
o secretismo na tomada de decisões (se a informação é poder, restringir a
informação garante poder a quem pode fazê-lo, embora possa contribuir para
baixar a qualidade das decisões), o querer reservar em círculos restritos a
discussão das questões e a tomada de decisões.
Ora tal secretismo
colide com a ideia referida de transversalidade, de interessar o maior número possível
de colaboradores nos projetos e nos problemas do metro.
E como falar nos
problemas do metro sem que os arautos muito certinhos da organização clássica
não venham dizer que estaremos a desestabilizar e que compete às administrações
e às direções estudar os assuntos?
Mas se a
empresa é de serviço público (nem estou a discutir se a empresa é pública
ou privada), isto é, se até por imposição normativa da comissão europeia há que
definir e cumprir objetivos de utilidade pública, então a discussão do que lhe
diz respeito deve estar ao alcance de qualquer cidadão, reformado ou não dessa
empresa. Quer se trate de uma questão técnica, de uma questão de segurança dos
passageiros, de uma questão de organização, de eficiência ou de
produtividade dos recursos que a comunidade afeta à empresa.
E como se quebra o
secretismo, a ocultação de problemas, as prováveis ameaças? como pode abrir-se
um debate sobre questões como a gestão económica da empresa, sobre decisões
técnicas, sobre o futuro da organização da empresa e da expansão da rede?
Recebo no meu email
informação da estrutura sindical mais representativa no metro. É informação
pública. E leio preocupado, para além das eternas discussões em torno das
cláusulas da contratação coletiva (certamente que a comissão europeia, tão
ciosa dos normativos e da burocracia de Bruxelas, compreenderá que a
contratação coletiva não é só um direito de quem trabalha, é uma obrigação da
comunidade organizada, que os trabalhadores por ela abrangidos são cidadãos
dessa mesma união europeia) que a qualidade do serviço prestado á população
está ameaçada por dificuldades de afetação de verbas à compra de peças para
manutenção. Por outras palavras, para que a segurança continue garantida, há
material circulante, carecendo de grande manutenção, que foi retirado da
circulação.
Repito, é informação
pública, e do conhecimento dos deputados da Assembleia da República que se
disponham a receber a informação que a estrutura sindical lhes remeteu.
Interrogo-me se devo
perguntar aos meus colegas mais novos que peças serão essas que atingiram o fim
de vida útil, sem suscitar neles próprios receio de que sejam repreendidos pela
hierarquia por estarem a revelar fragilidades. A que sistema ou parte do
material circulante pertencerão essas peças, porque estarão falhando então
tantos contratos de manutenção adjudicados ao exterior? Porque existe ameaça à
segurança de circulação? Por se tratar de grande manutenção não há previsão
orçamental? A quanto monta a encomenda necessária para repor em circulação as
carruagens paradas? Meio milhão de euros? Um milhão de euros? A diluir num
montante global da manutenção de 50 milhões de euros anuais?
Questões que não se
poriam se não fosse este antipático secretismo.
E quanto aos
equipamentos e às partes fixas das infraestruturas? estarão também ameaçados
pelo fecho da torneira as grandes intervenções, desde as inspeções dos viadutos
aos dez anos, à reposição dos carris por tonelagem suportada, à substituição
dos balastros desagregados nos troços da rede primitiva? Falo nos carris e nos
balastros porque no último ano da minha vida profissional tive uma divergência
com a alta direção da empresa; eu pretendia manter o critério antigo, de
substituição dos carris após passagem de
200 milhões de toneladas (admitindo 10 toneladas por eixo) e a alta
direção alterou para 400 milhões. Será uma técnica de dilatação dos períodos de
grande manutenção que, felizmente, não terá sido agora seguido com o material
circulante.
Também não deu, a
alta direção que me pôs na prateleira, seguimento ao meu pedido de intervenção
para análise da desagregação e substituição do balastro da rede primitiva.
Talvez por isso se
desenhe agora uma tendência acomodada de deixar andar e manter a velocidade
limite em 45 km/h, que os desgastes de material serão grosseiramente em parte proporcionais
à velocidade, que velocidades baixas permitirão aumentar os períodos de
reperfilagem (esmerilagem) dos carris por desgaste ondulatório.
É uma caraterística
indissociável do método científico, a disseminação das causas e
circunstâncias das coisas, desde que no século XVII a academia das ciências
inglesa obrigou os seus membros a revelar todas as descobertas que cada um ou
cada grupo faziam.
A ciência e a
técnica, contrariamente ao senso comum de que o segredo é a alma do negócio, ao
conceito egoísta dos teóricos do mercado liberalizado da competição em
detrimento da cooperação, e às práticas secretistas das estruturas empresariais
tradicionais, defendem a divulgação e o referendo (referee) entre pares, isto
é, só sujeitando qualquer tese ao exame dos especialistas se poderá validar a
tese, não pela autoridade de um hierarca ou de um comentador dos meios de
comunicação social.
Logo, como calar
problemas de interesse público por pudor de convenções empresariais ou
comunicacionais, mas também como
conseguir que os colegas mais novos mantenham a confiança em discuti-los com
alguém de fora? comigo?
Como, por exemplo,
não comentar a informação que recebo pelo boletim sindical, posteriormente
confirmada com a promulgação do respetivo decreto, de que as associações
sindicais são contra o operador público único de transportes da área
metropolitana, preferindo a separação das empresas Carris e Metro?
Quando foi sempre
esse o objetivo que devíamos tentar, a exemplo da RATP de Paris, os TMB de
Barcelona, a STIB de Bruxelas, os TfL de Londres, etc, etc.
É verdade que o XIX
governo tornou odiosa esta ideia através da política de adaptação das empresas ao modelo das privatizações / subconcessões
(através de uma progressiva degradação económica?), de separação da parte não
rentável (especialmente os juros da dívida) a manter na esfera pública, da
parte eventualmente rentável (após uns primeiros anos de subconcessão sem
retorno por cumprimento das cláusulas do caderno de encargos).
Mas nestas coisas a
prioridade deveria ser o interesse público e são objetivas, pela experiência
dos operadores que referi, as vantagens do operador público único.
Talvez seja mais um
exemplo da tradicional dificuldade portuguesa de, detetada uma situação
complexa, aceitá-la e desistir do diagnóstico numa perspetiva de longo prazo e
de todo e qualquer plano de transição a prazo para uma situação de nível mais elevado.
Ou por outras
palavras, já que foi reposta a autonomia jurídica dos transportadores urbanos
de Lisboa, porque não elaborar um plano de transição a prazo que responda às
necessidades de mobilidade da área metropolitana e não prejudique os direitos
que legitimamente cada operador e os seus trabalhadores detêm?
As competências do operador único dificilmente
poderão, salvo melhor opinião, ser executadas por uma Autoridade metropolitana
(isto é, quem toma decisões tem de ter a experiência real do negócio, princípio
simples que se aplica a qualquer "regulador" ou
"fiscalizador").
Mas aplaudo a posição
dos sindicatos quando contestam a pretensão da CML em querer gerir os
operadores públicos urbanos. A CML, como as outras câmaras da área, deve
participar no controle dos transportes urbanos através da Autoridade
metropolitana (ou fazer como em Londres, fundir as autarquias numa área
metropolitana), mas a titularidade deverá ser pública, dada a dimensão
financeira das operações.
Penso que o exemplo
"autárquico" do metro do Porto não recomenda o modelo, dada a
exposição à descricionaridade, aliada à natural insuficiência de habilitações
técnicas e falta de humildade em ouvir e avaliar opiniões divergentes, de
muitos dos dirigentes autárquicos que tomaram decisões cruciais.
Tenho também de tirar
o chapéu ao senhor presidente da República ao vetar o decreto que impedia a
subconcessão dos STCP a privados, embora correndo o risco dos meus amigos
sindicalistas se zangarem comigo. Mas efetivamente colidia com o tratado de
funcionamento da união, e com as diretivas europeias que falam, e bem, do
direito dos Estados a terem os seus operadores quando não há interesse
comercial (no que os meus amigos sindicalistas
certamente concordarão comigo), e um serviço público de transportes como
os STCP é disso exemplo, mas que falam também da convivência com operadores
privados (por maiores que sejam os êxitos de empresas privadas de transportes,
fica sempre por resolver a questão: têm lucro porque não investiram nas
infraestruturas, retiram a sua rentabilidade apenas da operação, da engenharia
financeira dos leasings de aviões e comboios, da benevolência de reguladores ou
de governos protecionistas da iniciativa privada, e dos custos baixos de
empresas de manutenção exauridas com os respetivos custos de construção e de
estrutura). Ver sobre esta problemática,
para não se perder muito tempo com fundamentalismos, seja de que lado for, a
introdução das diretivas 2014/23/EU e 2014/25/EU e o art.14 do tratado de
funcionamento da UE.
Como, por exemplo,
não comentar uma coisa que está tristemente à vista de todos, as obras paradas
de adaptação da estação Colégio Militar a pessoas com mobilidade reduzida, com
um estaleiro falhado à superfície (anterior ao estaleiro das obras de ampliação
da ala sul do centro comercial!), tapumes nos acessos da estação, azulejos
caídos das paredes das escadas ? (mais um exemplo da escolha de uma proposta
mais barata, sem poder contrastar com referências sólidas do empreiteiro?), a
inexistência de elevadores e de instalações sanitárias para pessoas com
mobilidade reduzida em estações de correspondência como Campo Grande, Jardim
Zoológico, Entrecampos, até mesmo Baixa Chiado (a plataforma nas escadas da rua
do Crucifixo é um recurso precário; a solução correta tem sido sucessivamente
afastada)? a inexistência dum sistema centralizado de informação ao público,
via internet em tempo real, do estado dos elevadores existentes? E são
investimentos para que já houve projetos suscetíveis de beneficiar de fundos
comunitários, precisamente porque as diretrizes comunitárias mandam garantir a
acessibilidade nos edifícios públicos.
Como calar a
indignação por se ter um caderno de encargos pronto em 2009 para concurso da
obra de adaptação à mobilidade reduzida de uma estação e a alta direção da
altura se ter oposto ao lançamento do concurso (ainda antes da entrada em vigor
do novo código da contratação pública), com o argumento de que as pessoas em
cadeira de rodas viajariam com mais segurança em mini-autocarro da Carris afeto
ao seu transporte a pedido? (quem decide se quer correr um risco é a própria
pessoa desde que informada, não é um conselho de administração).
Que tal aplicar agora
a sugestão de um concurso interno de ideias de 2010? em dia sem aviso, reunir o
conselho de administração do metro na estação do Campo Grande, no piso térreo,
sentar parte em cadeiras de rodas e selá-las, e a outra parte não. Para
simplificar fornecer a todos cartões Lisboa Viva válidos, e marcar-lhes
encontro na FNAC do Chiado. Registar os tempos de percurso, os detalhes dos
percursos e as ajudas recebidas. Enviar o relatório à APD, à ACAPO, à secretaria
de Estado da inclusão e à comissão de preparação de candidaturas a fundos
comunitários. Evitar, por favor, a utilização do termo “derrogação” de uma
transposição comunitária.
Como, por exemplo,
não comentar uma coisa já referida que é pública e evidente, que os comboios do
metro de Lisboa continuam limitados a circular com a velocidade máxima de 45
km/h?
Escandalizados que
andam os automobilistas porque andam a instalar radares de controle de
velocidade nas cidades e nas estradas.
Porque não escandalizarmo-nos
com esta limitação de 45 km/h?
Assim como assim, se
pensarmos que são aplicáveis aos modos de transporte as leis da concorrência,
estaremos perante um caso de discriminação contrária a essas leis. É imposta a
limitação da velocidade de um transporte coletivo a um nível inferior à da
limitação do transporte individual (50 km/h nas povoações, 80 km/h nas vias
rápidas das povoações).
É certo que o próprio
Estado, dada a elevada contribuição do imposto sobre produtos petrolíferos para
a cobrança fiscal, tem interesse (contraditório embora, dado o efeito
importação de combustíveis fósseis na balança de pagamentos) em que o
transporte individual continue a assegurar os cerca de 60% de deslocações motorizadas
todos os dias nas áreas metropolitanas. Mas o reverso dessa medalha é que, dada
a menor eficiência energética e maior emissão de gases com efeito de estufa do
transporte individual (não obstante os progressos que se vão verificando graças
ao esforço da engenharia para satisfazer os grandes fabricantes de automóveis e
os “reguladores” que os amparam em Bruxelas, sem esquecer, claro, as mentiras
sobre consumos e emissões da propaganda dos vendedores de automóveis) todos os
dias se agrava a balança de pagamentos devido à importação de combustíveis fósseis.
Ora, a limitação a 45
km/h da velocidade máxima do metro foi precisamente determinada com o objetivo
de economizar energia. A redução do consumo da energia de tração será, pelas
minhas contas, de cerca de 17%, por comparação com a velocidade máxima de 60
km/h, considerando percursos com declive médio de 2% e um rendimento médio de 0,6 da
regeneração pela travagem dos motores funcionando como geradores. Admitindo um
consumo anual de energia de tração de 45 GWh e um custo unitário de 10 cêntimos
para o kWh, teremos uma economia anual de cerca de 45 000 000 x 0,17 x 0,1 = 765 000
euros.
Penso com estes
cálculos não estar a cometer nenhuma intromissão nas tarefas dos meus jovens
colegas no ativo, uma vez que as minhas contas são teóricas, baseadas num
modelo simulando uma linha de 10 km com interestações de 830m, coisa distinta
das linhas reais do metro. Mas com o interesse de servir de termo de comparação
com as linhas reais.
Acresce ao valor ao
valor da poupança em energia uma economia decorrente de menor desgaste do
material circulante e da via férrea, como acima referi.
Como exercício
académico, arbitrando valores e estimando custos anuais de manutenção totais
(equipamentos, instalações fixas e material circulante) de 80 milhões de euros,
de que 10% correspondem a custos variáveis (isto é, mesmo sem circulação de
comboios os custos de manutenção seriam de 90%), e admitindo, também
arbitrariamente, que o fator redução de velocidade contribui em 50 % para a
redução dos custos variáveis da manutenção (outro fator será por exemplo a taxa
de ocupação ou carga transportada) teremos para a economia na manutenção devida
à redução da velocidade máxima de 60 para 45 km/h:
80 x 0,1 x 0,5 x (1 -
45/60) = 1 milhão de euros
Para avaliarmos as
vantagens e inconvenientes da limitação da velocidade a 45 km/h , tomemos o
modelo referido e as fórmulas de cálculo do número de comboios necessários numa linha:
nº comboios = tempo
do percurso de uma volta completa na linha (incluindo os tempos de inversão nos
términos) a dividir pelo intervalo entre comboios
Tomando para simplificar a aceleração e a desaceleração igual
a 1 m/s2 , o tempo de paragem nas estações igual a 18s e o tempo de inversão em
cada término 300s, teremos os seguintes tempos de uma volta completa numa linha
de 10 km:
para 45 km/h de
velocidade máxima: 2928s (~ 49 minutos)
(velocidade comercial, incluindo términos, de 24,6 km/h)
(velocidade comercial, incluindo términos, de 24,6 km/h)
para 60 km/h de
velocidade máxima: 2628s (~ 44 minutos)
(velocidade comercial, incluindo términos, de 27,4 km/h)
(velocidade comercial, incluindo términos, de 27,4 km/h)
Se considerarmos um intervalo entre comboios de cerca de 3
minutos (com inversões alternadas e 2 composições simultaneamente no término) serão
necessários os seguintes comboios:
para 45 km/h :
16 comboios
para 60 km/h : 15 comboios
No caso de adotarmos um intervalo entre comboios de cerca
de 5 minutos serão necessários os
seguintes comboios:
para 45 km/h : 10 comboios
para 60 km/h : 9 comboios
Pode portanto afirmar-se que para o modelo de simulação
considerado, o qual mais uma vez se afirma que poderá não ser confirmado pela
realidade das linhas existentes no metro, a exploração de uma linha de 10 km
com uma limitação de velocidade a 45 km/h obriga a ter em circulação, nas horas
de ponta, mais uma composição (ou 4 ,
considerando 4 linhas) . Na linguagem cara aos economistas, será um exemplo de
deficiente utilização de recursos com a consequente baixa de produtividade,
isto é, são usados mais meios do que os necessários para obter a mesma produção
(passageiros.km transportados).
Considerando um percurso médio dos passageiros de 5 km,
teremos os respetivos tempos de percurso médios para as duas velocidades
limite:
para 45 km/h : 731s
para 60 km/h : 657s
Diferença : 74s por cada passageiro
Admitindo 120 milhões de passageiros por ano, ou 400.000 por
dia, e que desses, um terço são população ativa, teremos que o prejuízo
temporal para a produção será de cerca de 800.000 horas perdidas por ano.
Estimando um salário médio de 6 euros por hora, a perda de
produção anual estimar-se-á em 4,8 milhões de euros.
Estimando (ainda como hipótese num modelo de simulação, sem
eventual correspondência com a realidade, embora ajustável) o custo de utilização de cada carruagem.km em
função dos custos de manutenção anuais de 80 milhões de euros (equipamentos,
instalações fixas e material circulante) e de operação de 30 milhões de euros, teremos, para 20 milhões de
carruagens.km por ano, o valor de 5,5 euros/carr.km
Isto é, considerando 4 horas de ponta por dia em que estão na
rede mais 4 comboios do que os necessários, teremos para 245 dias úteis por
ano 3920 horas em que circulam 4
comboios dispensáveis se a velocidade máxima subisse para 60 km/h
Ou, usando o valor acima de 24,6 km/h de velocidade
comercial, serão percorridos por esses comboios cerca de 96.000 km, a que
corresponderão cerca de 480.000 carr.km
Ou 480.000 x 5,5 =
2,64 milhões de euros por ano
Em resumo, desta pequena análise de custos-benefícios da
redução da veloidade de 60 para 45km/h , realizada com critérios
necessariamente arbitrários e assente em modelo de exploração eventualmente não
aplicável diretamente às 4 linhas da rede do metropolitano, teremos como
poupanças ou benefícios, em milhões de euros anuais:
- poupança de
energia: 0,765
- poupança na
manutenção: 1,0
- poupança
total: 1,765
e como custos ou prejuízos, também em milhões de euros
anuais:
- perda de produção regional
por tempo perdido: 4,8
- custos de
circulação acrescida de comboios: 2,64
- custos
totais:
7,44
Isto é, se os raciocínios e cálculos apresentados se
aproximarem da realidade, andaremos a gastar , numa ótica supra-empresarial, o
que for preciso (7,44 milhões/ano), para poupar o que for possível (1,765
milhões).
Notar porém, em favor da redução de velocidade, que não está
contabilizado o efeito importação de combustíveis fósseis, eventualmente correspondente
a 30% dos gastos de energia, maioritariamente de origem renovável.
Como comentar o anuncio pelo ministro do Ambiente (e
Transportes), em 18 de julho de 2016, que o metro de Lisboa e o do Porto vão dispor
de 500 milhões de euros para expansões (10 km de túnel, ou 70 km em viadutos)?
sem ficar preocupado com as dificuldades de debate participativo, as indecisões
e a pretensão das câmaras municipais de escolherem os traçados?
E por falar em ambiente, como não continuar a manifestar insatisfação por se manter a ausência de produção fotovoltaica e eólica nas infraestruturas do metro (PMOs, estações à superfície)?
E numa perspetiva de atualização tecnológica, que pensar da
ausência de um sistema de controle automático da velocidade (ATP – automatic
train protection) que permita subir a velocidade máxima de exploração para 70
km/h e garantindo ele próprio, o sistema, a segurança da circulação? Em vez de castigar como
atualmente os maquinistas com a responsabilidade última dessa segurança,
sabendo-se como as tarefas repetitivas na condução podem induzir lapsos de
atenção? Como infelizmente já foi comprovado. Eis um tema, tal como a adaptação
das estações à mobilidade reduzida, que não estando diretamente ligado às
expansões, são suscetíveis de beneficiar de apoios comunitários.
O anúncio de 500 milhões para as expansões dos metropolitanos
de Lisboa e do Porto e o que referi acima sobre o bom que seria um plano de
transição para a criação de um operador único leva-me também a refletir sobre
que planos de expansão adotar.
E não posso deixar de criticar o que parece ser a reposição
do plano de expansão da rede do metro de 2009, que critiquei logo que foi
tornado público.
Porque a sua ideia central era reformular a rede existente em
torno de uma linha circular e privilegiar os movimentos intramuros municipais
em detrimento dos movimentos de penetração com origem suburbana, com custos
elevadíssimos na transformação dos principais troços das linhas existentes na
referida linha circular.
Parece agora a câmara de Lisboa, com o beneplácito do XXI
governo, chamando a si a gestão e a planificação do metropolitano, querer
reviver esse plano.
De forma acrítica, a meu ver, ignorando os anteriores planos de expansão, de que
destaco o plano de 1974/75 da Siemens/Deconsult, continuando assim a tradição
de alterações erráticas subordinadas aos decisores de cada época.
Como principal justificação apresenta a comodidade da
correspondência no Cais do Sodré da linha de Cascais com a linha amarela, servindo a zona de serviços
de Marquês de Pombal-Campo Grande.
É curioso observar que a ligação da linha amarela (que serve
a Avenida da República) a Alcântara e à linha de Cascais era a primeira
prioridade do plano de expansão de 1974/75.
O que ilustra bem a ineficiência dos decisores, que ao longo dos anos
foram acrescentando remendos (“patchwork”) para marcarem o território do seu
poder, gerando uma rede inconsistente com um plano global.
Tal como em 2009, mais uma vez se recordam os inconvenientes
de uma linha circular de pequeno diâmetro em vez de duas linhas convergentes :
uma pequena perturbação em qualquer dos seus troços afeta toda a linha
circular; são muito elevados os custos de ligação das linhas existentes aos
troços circulares (nomeadamente no Cais do Sodré); não acrescentam ao mapa da
rede áreas de influência para captação de novos passageiros e dissuasão de
automobilistas, apenas melhorando parcialmente a atratividade do tráfego
interno .
Perante isto, que assume, para mim, um elevado grau de gravidade,
penso mais uma vez de mim para mim que não devo ser eu a apresentar um plano de
expansão, pela complexidade e interdisciplinaridade das análises de
custos-benefícios que requer para cada hipótese, para que possam ser comparadas
e avaliadas, sempre numa perspetiva de integração de serviços da área
metropolitana envolvendo os outros modos de transporte complementares do
transporte de massas, incluindo os de tecnologia recente, como o transporte
autónomo a pedido guiado (não necessariamente por carris, a solução de cabo
indutor enterrado é muito interessante) ou não.
(Curiosamente desenha-se neste momento um movimento de
opinião, inspirado pelo aparente sucesso das soluções informáticas de
“partilha” e “disruptivas”, que considera inúteis os investimentos em modos de
transporte pesado em favor de uma utilização mais racional dos modos ligeiros.
Trata-se de uma ideia, que arrasta muita gente, análoga à de que seria
suficiente melhorar a eficiência energética nos consumos para evitar a
construção de novas centrais de produção elétrica. E que se integra na
definição dos movimentos em cadeia ou em cascata que vão propagando uma
aparente solução que suscita o apoio de cada vez mais pessoas mas que se revela
um erro por não considerar os dados físicos – ver sobre o tema o livro de James
Surowiecky, “A sabedoria das multidões”. No caso dos transportes em área
urbana, os dados essenciais são o volume de deslocações horárias a realizar nos
principais percursos e a secção necessária de cada canal conforme as
caraterísticas do modo de transporte, de forma análoga ao que se passa nos
problemas de redes de fluidos, com os caudais, velocidades, secções e pressões).
Mas não vejo um grupo de estudo que aborde a questão com essa metodologia.
Que passo a passo se aproxime de um plano consistente de expansão. Não posso
dizer que não exista esse grupo, ou, em última análise, que não seja contratado
para o efeito um gabinete estrangeiro, só posso dizer que não o vejo (recordo a
“oferta” de Juncker de disponibilização de gabinetes de consultores para
apoiar a preparação dos processos de candidatura aos projetos CEF (Connecting
Europe Facilities).
Não resisto assim a sugerir a ligação para outro post do meu
blogue, com uma pequena cartilha das expansões que, havendo fundos comunitários
(os quais só são concedidos mediante apresentação de ante-projetos credíveis),
poderão resolver problemas de mobilidade em Lisboa e sua área metropolitana:
Destaco as seguintes expansões, insistindo que os períodos de
contenção de investimentos devem ser aproveitados para estudar e projetar os
empreendimentos futuros, vencendo as desculpas do imobilismo de que estão
surgindo novos modos de transporte ligeiro mais eficientes:
1 – Expansão da linha vermelha de S.Sebastião a Algés
Parece ser a intervenção prioritária considerando o
carater transversal da linha vermelha e a ausência de metropolitano na parte
ocidental da cidade. Construção faseada e recurso a viadutos, dada a sua
extensão, com prioridade à construção dum interface intermodal junto das Amoreiras
e nova urbanização de Campo de Ourique para o transporte individual (TI) vindo
da A5; objetivo: serviço da zona ocidental, turismo em Belém e interface
com a linha de Cascais em Algés e com a linha da ponte 25 de Abril no Alvito
(mediante transporte hectométrico tipo elevador, teleférico ou escadas
rolantes).
Será interessante comparar os custos e os benefícios desta
solução com a sugestão apresentada pelo presidente da Comissão coordenadora de
Lisboa e vale do Tejo: parque de estacionamento “park and ride” nos terrenos do
estádio do Jamor e transformação de parte da linha de elétrico Dafundo
(atualmente desativada entre Dafundo e Algés)-Cais do Sodré em troço de
metropolitano até Alcântara, e nesta correspondência ou ligação direta com a linha vermelha
2 – Expansão da linha
vermelha do Aeroporto a Campo Grande
Objetivo: melhoria das correspondências com as outras linhas; serviço do terminal
2 do aeroporto; liação em viaduto do terminal 2 ao Campo Grande; receção
de futuras linhas de metro de superfície servindo Sacavem, Bobadela, Frielas,
Loures, e a Alta de Lisboa
3 – Expansão da linha
azul de Reboleira ao Hospital Fernando da Fonseca
Objetivo: interface com o TI do IC19; ligação a futura linha de metro de
superfície Algés-Loures
4 – Expansão da linha amarela Rato (Av.Álvares Cabral) – Cais
do Sodré – Cacilhas
Trata-se de uma linha em espiral dado o desnível
entre Rato e Cais do Sodré, o qual desaconselha uma ligação direta Rato (aliás
Av.Álvares Cabral) ao Cais do Sodré; objetivo: serviço da Estrela, MNAA, Alcântara,
Campo de Ourique, Parlamento e, por ligação hectométrica, correspondência com a
linha verde no Cais do Sodré; futura ligação a Cacilhas e metro sul do Tejo
dependente de comparação de custos (grau de complexidade técnica da construção
do túnel afundado) com outros locais para travessia sub-aquática
(Algés-Trafaria, Beato-Montijo)
5 – Expansão da linha azul de Santa Apolónia a
Olaias
Objetivo: correção do término de S.Apolónia com
prolongamento até Comendadeiras com correspondência em estação sobre-elevada de
nova linha de metro de superfície; construção articulada com o alargamento do
terminal de contentores de S.Apolónia, no pressuposto de que este terá
prioridade relativamente ao projetado terminal de contentores do Barreiro, isto
é, que não se construirá uma urbanização de luxo no atual terminal de
S.Apolónia; nova linha em viaduto sempre que possível ao longo do vale da Avenida Mouzinho de Albuquerque, com correspondência em Olaias com a linha vermelha e a linha
de cintura da CP; objetivo: serviço da zona oriental de Lisboa, incluindo nova
urbanização em Comendadeiras
6 – Expansão da linha verde de Telheiras a Pontinha
Objetivo: interface com o TI do IC16 e IC17 e ligação a futura linha
de metro de superfície Algés-Loures; em viaduto poderá servir a nova feira
popular e ter correspondência com a estação Pontinha
|
7 - Nova linha de metro de superfície
Algés-Loures-Sacavém-Gare do Oriente
Trata-se de um
projeto já antigo, cuja fundamentação (linha distribuidora ao longo da
periferia da cidade alimentando os raios de penetração e contendo o tráfego
automóvel fora da cidade) é evidente quando se observa o mapa de estradas da
área metropolitana de Lisboa, que aliás ocupou os percursos de construção mais
fácil.
Para a sua
concretização, dada a sua extensão e custos elevados, deverá recorrer-se a um plano faseado de
construção, preferencialmente em viaduto (construção cerca de 5 a 10 vezes mais
económica do que em túnel) e em sítio próprio para evitar colisões com o tráfego
automóvel. Igualmente os custos das
expropriações deverão ser compensados com políticas de realojamento e
reurbanização habitacional e de localização de atividades secundárias (manufatureiras).
Será indispensável
a sua articulação com os restantes modos de transporte, nomeadamente a linha de
Cascais e a linha de Sintra (o que poderá justificar a não ligação direta entre
estas duas linhas em termos de exploração), a camionagem suburbana e as frotas
de aluguer de transporte a pedido.
Para isso será
importante prever interfaces intermodais em Algés, estação de Benfica (ou Damaia,
ou Reboleira), metro Pontinha, Odivelas sul, Loures, Sacavém, Gare do Oriente.
Talvez tudo o que deixo escrito não passe de reflexões numas
noites de verão, de projeções ideais num muro intangível devolvidas com
distorção impeditiva de utilização, neste ambiente amodorrado e de prolongada
inércia que nos desculpa (?) a improdutividade.
Reflexões diluídas nos obstáculos tradicionais nas empresas e
comunidades portuguesas: a polarização progressiva (polarização:
agregação em torno de um núcleo cuja capacidade atrativa aumenta à medida que
cresce em prejuízo dos núcleos restantes) em torno de uma ideia que não teve
origem em análises de dados concretos mas em critérios subjetivos; a via sacra
dos percursos burocráticos respeitosamente subordinados à estrutura
hierárquica, culminando na definição de uma política desfasada da realidade e
do interesse da comunidade; a relutância declarada em aceitar mecanismos de efetivo
controle autónomo das estruturas hierárquicas (aos anos que foram normalizados
os procedimentos de controle de qualidade como exercício de funções técnicas de
engenharia, e não de marketing), de análise da validade dos estudos, de deteção
de inconformidades e implementação de procedimentos para os evitar, em vez de punir
os “culpados” ou simplesmente deixar a inércia persistir.
Reflexões sobre que será lançado o anátema “não há dinheiro”,
quando é esta a ocasião para realizar os projetos, para quando surgir a oportunidade
e eles possam fundamentar a candidatura aos fundos comunitários para
cumprimento dos compromissos internacionais de diminuição das emissões com
efeito de estufa. A menos que se prefira que os projetos venham feitos de fora,
esgotada e desprezada a engenharia portuguesa (contudo, ela que é uma referência internacional na disciplina de túneis).
Mas talvez não seja um sonho de uma noite de verão pensar que
tenha sido possível suscitar o debate de algumas das ideias ou motivar alguém contra
a inércia, que tenha sido possível não deixar a inquietação morrer na caixa de
entrada dos emails não lidos, na esperança de que surja uma estação temporal propícia
à concretização de um plano consistente de transportes na área metropolitana de
Lisboa.
PS em 7 de agosto –
apesar do texto ser longo, por lapso não referi uma circunstância que afeta os
utilizadores da linha verde do metro, a exploração com composições de 3
carruagens devido à limitação dos cais da estação Arroios. Estes cais têm 70
metros (capacidade para 4 carruagens) enquanto as restantes estações da linha
verde têm 105 metros (capacidade para 6 carruagens). Os custos de operação com
composições de 3 carruagens são cerca do dobro dos custos de exploração com 6
carruagens, para a mesma capacidade e passageiros por hora e sentido. Este é um
custo imputável ao atraso da obra de ampliação dos cais de Arroios.
Faz pena pensar que a
obra de ampliação dos cais (e também a remodelação da ventilação principal e
instalação de elevadores para pessoas com mobilidade reduzida) esteve
adjudicada em 2005, mas por pressão da CML, por decorrerem então as obras de remodelação
da estação de S.Sebastião da linha azul e de construção da estação de
S.Sebastião da linha vermelha, a adjudicação foi anulada.
Posteriormente, houve
algum debate sobre que decisões tomar sobre este condicionamento da exploração
da linha verde. Apesar disso, e também por pressão da própria secretaria de
estado dos transportes do XIX governo, foi decidida em 2012 a exploração com
composições de 3 carruagens. Atualmente está concluído um novo projeto de
ampliação dos cais para sul e para norte, com uma interessante solução para as
escadas do lado sul. Tanto quanto sei, vão-se preparando os projetos das
especialidades mas não haverá financiamento garantido (em princípio, trata-se
de um assunto elegível para submissão a candidatura de fundos comunitários, mas
parece que a posição oficial é menosprezar infraestruturas).
Parecerá assim que vão
continuar a ser prejudicados os utilizadores da linha verde e vai continuar a
improdutividade de se fazer com composições de 3 carruagens o que se poderia
fazer com metade das composições de 6 carruagens.
Listo as possíveis
soluções provisórias e definitivas:
1 – a mais imediata:
exploração alternada de composições de 3 carruagens, com paragem em Arroios, e
de 6 carruagens, sem paragem (exploração do tipo skip-stop, com alguns
problemas de segurança devido à não uniformidade, mas ultrapassáveis com, por
exemplo, pequeno cais de evacuação nas posições de paragem da 5ª e 6ª
carruagens, e dispositivos avisadores do maquinista de proibição de abertura de
portas no caso de engano na paragem com 6 carruagens) ; eventual complemento
com navetes de autocarros elétricos gratuitos entre Alameda e Anjos, para
experiência deste tipo de veículo e com custos suportados por publicidade;
2 - solução provisória não recomendável por
questões de segurança do software de comando de portas: paragem da composição
de 6 carruagens nos cais atuais com
inibição da abertura de portas na 5ª e 6ª carruagens; exige também a construção
de cais de evacuação;
3 – solução que
propus: ampliação da estação exclusivamente para sul, beneficiando de poupanças
significativas em custos e em tempo de construção e afetação do movimento dos passageiros
na estação Arroios; numa primeira fase demolição das paredes não resistentes do
lado sul para ampliação dos cais, obtendo-se um cais com 98 metros, suficiente
para a paragem das composições de 6 carruagens, com 99 metros testa a testa mas
com 95 metros de distância entre as extremidades das portas de passageiros; construção
de 7 metros de cais de evacuação; na segunda fase, transferência de cargas para
novos pilares, com obra realizada a céu aberto; penso que os decisores optaram
pela ampliação a norte e a sul para manterem a uniformidade dos cais de 105
metros
4 – solução já
proposta pelo próprio metro: fecho da estação Arroios durante toda a obra na
espetativa de encurtar prazos de construção. Teoricamente parece uma boa
solução, mas na prática temem-se os atrasos habituais nos processos de concurso, na
adjudicação, no arranque e na execução. Para não prejudicar os utilizadores da
estação, é possível, conforme realizado na ampliação das estações Roma e Alvalade,
manter o serviço da estação durante a
obra, desde que utilizadas as necessárias medidas de segurança.
Em resumo, parece ser
mais um assunto envolto em secretismo, ou pelo menos existe falta de divulgação
do calendário para viabilizar a exploração com 6 carruagens, para além de
compatibilizar a estação com as normas de ventilação (desenfumagem) e de
acessibilidade de pessoas com mobilidade reduzida.
Subscrever:
Mensagens (Atom)