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domingo, 29 de maio de 2011

Die drei Pintos, ópera cómica de Carl Maria von Weber

Não conhecia esta ópera cómica de Weber, sobre a peça de Carl Seide, Der Brautkampf, mas graças à Gulbenkian tive o prazer de assistir à versão de concerto com texto-comentário de David Pountney. A ópera foi deixada incompleta por Weber, e completada por Gustav Mahler quando ainda jovem, a pedido do neto de Weber. Mahler aceitou a incumbencia e apaixonou-se por Marion, a  mulher do neto de Weber. Foi uma paixão proibida, conforme o referido texto-comentário.
Resumo: A ação passa-se em Espanha no final do século XVII (numa época em que o endividamento de Espanha era grande, apesar dos benefícios coloniais, graças às aventuras militares e imperiais e graças à política desastrosa de privilégio de grandes proprietários rurais e de proteção de monopólios privados). O grande proprietário rural da província de Salamanca, Pinto da Fonseca, combinou com o próspero comerciante de Madrid, Don Pantaleone, o casamento do seu filho com a filha deste. O casamento é uma ação win-win, visto que implicará o resgate da dívida de Pantaleone a Pinto da Fonseca que contraiu junto deste numa altura de crise do negócio, quando Don Pantaleone ainda não tinha comprado o título nobiliárquico, não podendo assim usufruir das benesses do governo. Mas a rapariga já tem um apaixonado, Don Gomez, um fidalgote, e um pretendente ocasional, Don Gaston, um recem doutor pela universidade de Salamanca (contexto que Weber aproveitou para fazer musica adequada a grupos corais universitários).O pretendente ocasional e o apaixonado recorrem sucessivamente à carta de apresentação que o pai Pinto da Fonseca entregou ao filho como credencial para Don Pantaleone. Daí o nome de três Pintos. A ópera termina com o triunfo do amor entre a rapariga e Don Gaston sobre o interesse mesquinho da liquidação da dívida. A musica de Weber e as contribuições de Mahler são uma maravilha.
E eis como uma inofensiva história para entreter a burguesia florescente alemã, gozando com o gordo e desajeitado filho de Pinto da Fonseca, se torna num perigoso convite à negociação da dívida e ao respeito pelos direitos humanos.
Infelizmente, duvido que seja essa a mensagem captada na plateia da Gulbenkian (apesar do seu presidente, Rui Vilar, em entrevista recente, ter  afirmado que é essencial manter um nível mínimo de investimento em ações produtivas, ou no setor de bens transacionáveis, como se diz agora), possivelmente porque os Pinto da Fonseca dos dias de hoje têm mais força.
Mas foi um belo espetáculo.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

No ano de 1995





No ano de 1995, em que a Austria e a Suécia entraram na União Europeia, a ABB, lembram-se, tinha uma fábrica de material circulante ferroviário na Amadora, ao pé da rua das Industrias; fabricava, ou montava, automotoras para o metropolitano, pendolinos para a ligação Porto-Lisboa, vagões de mercadorias para o Egito e para a Bósnia.
A orientação estratégica da empresa nessa altura era a de diversificar os seus fornecimentos e competir na área das infraestruturas.
 

A ABB concorreu por isso aos sistemas de sinalização ferroviária e e  
comando automático dos comboios na linha para a Exposição universal de 1998.
Não ganhou, apesar da sua proposta ser a mais equilibrada do ponto de vista do compromisso entre a qualidade técnica e o preço.






A forma como a proposta estava organizada também não ajudou; revelava pouca atenção dos técnicos suecos que não ajudaram os seus colegas portugueses a prepará-la, num tema em que não tinham experiencia. A tecnologia sueca tinha sido a primeira no mundo a instalar um sistema computorizado de sinalização ferroviária, em 1978, mas os rigores da legislação dos concursos públicos impediram uma discussão da proposta que a valorizasse.
Poucos anos depois de 1995, sobreveio a catástrofe naquela empresa.






Comprada em bolsa pela Bombardier canadiana, foi definida a estratégia de concentrar em Madrid as atividades na peninsula ibérica.
À boa maneira portuguesa, um grupo de técnicos portugueses viu nisso a oportunidade das suas vidas e quis ficar com a empresa da Amadora.









O jogo de bolsa que fizeram correu mal, a casa mãe bloqueou a circulação de informação com os servidores centrais, deixaram de se fabricar comboios e vagões e de nada serviu uma tentativa do governo de pôr a fábrica a produzir blindados para o exército.
Foi mais um exemplo do corte da capacidade produtiva portuguesa na metalomecânica pesada.





Mas em 1995 o ambiente era de esperança.
A ABB enviou-me um calendário com doze fotografias de mosaicos romanos.
De Conimbriga, à exceção de dois, retirados da Torre da Palma, os dos cavalos Hiberus e Lenobatis.
Conservei o calendário porque era uma boa metáfora para explicar o significado das tecnologias.
As tecnologias servem para as pessoas se sentirem bem. E é isso que se desprende das cenas, das figuras e das imagens geométricas dos mosaicos romanos.




Nem tudo é mau.
Não se terem perdido estes mosaicos é um facto espantoso.
Gosto especialmente de ver os olhos das personagens, muito abertos.
Também pode servir de metáfora para darmos uma olhadela à economia e aos indicadores das épocas.







No tempo de Conimbriga, a lei dos rendimentos decrescentes atacou implacavelmente a concentração urbana assente na produção esclavagista (poder-se-á dizer assente em baixa remuneração do fator trabalho?).
Conimbriga foi abandonada como as cidades maias por, atingido um estádio insustentável, não terem adotado estruturas de retribuição dos fatores de produção diferentes.




A solução escolhida foi a de diversificarem a estrutura produtiva, concentrando a produção de bens alimentares em vilas agrícolas descentralizadas.
Quando os "bárbaros" chegaram, as cidades eram ruinas.
Ruinas maravilhosas, mas ruinas.
Em 1995, a balança de pagamentos de Portugal estava ainda razoável. E há mais de 10 anos que estava equilibrada, com governos de várias cores.
  O que significava que o país fazia o que fazem as pessoas de bem. Vivia dentro das suas posses, sem que, no entanto, nos esqueçamos do afluxo de capitais dos fundos de coesão europeia.




Mas parece que em 1996 se agudizou a crise que já vinha de trás de provincianismo novo rico neste país, o país das auto-estradas e das stações de metropolitano sibaríticas; houve um acesso de suficiencia acultural, como se a cultura não fosse precisa na equação e como se os fundos europeus que não tinham faltado, e os empréstimos, fossem suficientes para dinamizar a economia.
E 1996 é o primeiro ano oficial da crise, em que a balança de  pagamentos se desequilibra e a dívida externa, que era de 8% do PIB sobe, sobe que sobe, até hoje, até aos 110% do PIB (não esquecer que a dívida externa não é só pública, também é privada, e que os governos foram de várias cores).




E pronto.
Chegados aqui, parece-me um pouco forçado estar a querer resolver os problemas da estrutura produtiva da Conimbriga atual da mesma maneira que os romanos fizeram, há 18 séculos, fugindo para o campo, ou então, chamando os professores de economia que ensinam as ideias denunciadas no filme Inside Job.




                  Mas, infelizmente, a democracia parece não ter mecanismos para prevenir estes acessos aculturais.


Com a devida vénia ao DN e ao seu colaborador da coluna "não há almoços grátis" , o professor de economia João César das Neves, donde retirei os dados sobre a dívida externa

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Economicómio XXXVII - Uma situação explosiva 1

Uma situação explosiva

Com a devida vénia, retiro do Diario de Notícias de 2 de Janeiro de 2010 a descrição duma situação explosiva, com números do Banco de Portugal.
Provavelmente existe aqui uma analogia com a pólvora. O nitrato não explode sem um poucochinho de enxofre e outro de carvão.
Já temos o nitrato da dívida externa a que juntámos o enxofre da criminalidade/desemprego/insucesso escolar. Resta misturar o carvão que se deixa à imaginação do utilizador.

1 - Dívida da banca nacional ao estrangeiro (não esquecer que a banca pede empréstimos ao estrangeiro para emprestar aos cidadãos portugueses a uma taxa superior):
em Setembro de 2009: 47% do PIB (vá que em Setembro de 2008 era 55%;
PIB à volta de 160000 milhões de euros)

2 – Dívida pública ao estrangeiro (venda de títulos por exemplo):
em Setembro de 2009: 53% do PIB (mal que em Setembro de 2008 era 45% e
que em Dezembro de 2009 é capaz de ser 80%)

3 – Dívida das empresas privadas ao estrangeiro:
em Setembro de 2009: 12% do PIB (mal que em Setembro de 2008 eram
credoras de 0,5%)

4 – Dívida total externa:
em Setembro de 2009: 112% do PIB (mal que em Setembro de 2008 era 94%)

5 – Défice externo (importações-exportações):
em Outubro de 2009: 7% do PIB (vá que em Outubro de 2008 era 9%)

6 - Juros da dívida pagos em 2009 pela administração pública:
5000 milhões de euros (3% do PIB)

7 – Dívida das empresas públicas:
50000 milhões de euros

8 – Dívida de Estradas de Portugal, CP, Metro de Lisboa, Metro do Porto:
25000 milhões de euros

9 – Total de depósitos de cidadãos portugueses em contas “off-shore”:
16000 milhões de euros (excluídas movimentações com
sobrefaturações de falsas empresas, tipo operação furacão;
por curiosidade, o governo holandês recebeu dos seus
concidadãos, como declaração de depósitos “off-shore”, cerca
de 1600 milhões de euros)

10 – Considerando os 4600 milhões de euros movimentados pelo Multibanco em Dezembro de 2009 e os 16000 milhões de euros em “off-shores”, verifica-se que será mais uma questão de desequilíbrio distributivo e de mecanismos institucionais paralisantes do que de insuficiência de dinheiro para investimentos reprodutivos

11 – Moral da história:
Devíamos aplicar os métodos de abordagem dos problemas coletivos descritos na “Sabedoria das Multidões”. Parafraseando o autor, nenhum de nós tem uma solução para isto melhor do que o conjunto de todos nós. Apoiam?

Nota: A extensão das minhas limitações na compreeensão dos mecanismos contabilisticos faz-me passar vergonhas destas (a ideia dos especialistas também é não deixar que os leigos comentem estas coisas, porque os comentários acabam sempre em: "se os especialistas não são ignorantes, porque deixaram as coisas chegar a este ponto?") . No ponto 4, eu pensaria que a dívida total externa seria a soma das parcelas anteriores. Mas os números do Banco de Portugal não são 112% do PIB mas sim 108.9% do PIB (em Setembro de 2009), de modo a resultar o célebre indicador do défice , que em Setembro de 2009 seria de 8,9% do PIB. Assim, isto parece um pouco nebuloso. Vou ter de me informar como é que se calcula o PIB e o défice.