Mostrar mensagens com a etiqueta sociologia. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta sociologia. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Sociologia para diagnosticar e tratar este país, precisa-se: o suicidio, o ensino, a delinquencia, os lemingues, a emigração e a importância de ser mulher para a tomada de decisões


Comecemos pelo fim, da importância de ser mulher para tomar decisões: a evolução desenvolveu nas espécies mecanismos de proteção e de manutenção das espécies, adaptando o género feminino a esse objetivo.
O organismo feminino, nas espécies em que a estatura está a aumentar, tem tendência para ser de menor dimensão do que o organismo masculino. Mas nas espécies em que a tendência é para diminuir de tamanho, como nos aracnídeos, a fêmea é maior do que o macho.
Isto quer dizer que as experiencias e as tentativas de inovação da evolução da espécie não trazem riscos para a sua conservação porque a parte feminina conserva os genes que já provaram que funcionavam. Se a experiencia correr mal, é a tendência masculina que é abandonada.
Na espécie humana, o fenómeno estendeu-se à capacidade de análise de ameaças para a espécie. Podemos imaginar como se estivéssemos num programa do National Geographic, o conselho de mulheres a criticar as decisões impulsivas dos chefes da tribo nómada na escolher precipitada de um caminho a tomar, só porque os chefes acham que uma decisão rápida é uma manifestação de liderança.
Num antigo concurso de televisão de grande audiência, uma das concorrentes que manteve uma presença prolongada, tinha um bordão ao comentar factos e ditos infelizes da nossa sociedade: “isto é normal?”. Na aparente boçalidade da expressão estava contida essa capacidade de análise feminina que define a linha da normalidade, de garantia do equilíbrio e de conservação da espécie.
Já a minha mulher, com um sorriso triste de quem na sua vida de professora assistiu a demasiados exemplos de alunos desviados do curso “normal” do ensino e do sucesso escolar, comenta que pessoas normais nunca diriam o que os senhores governantes dizem e nunca resistiriam agarrados aos seus lugares às críticas fundamentadas que lhes são feitas (o facto de os senhores governantes reagirem sistematicamente às criticas reafirmando que são eles que estão certos e não os críticos é um dos sintomas mais fáceis de interpretar em psiquiatria).
Por tudo isto, não surpreende a tomada de decisão do presidente da junta de freguesia de Castelo de Neiva, Viana do Castelo, que depois de reduzir a divida da freguesia de 33%, sem conseguir derrotar as burocracias que impedem a correção da barra onde morre gente, fechou o seu restaurante por não aguentar a subida do IVA e  volta a emigrar para o Canadá, onde já se encontra a sua esposa. Também neste caso a sabedoria feminina não terá andado arredia da tomada de decisão, depois de análise irremediavelmente critica.
Temos assim que os senhores governantes deveriam dar mais atenção a este tipo de análise feminina, para combater a metáfora dos lemingues, roedores na tundra escandinava (ver http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%AAmingue     ). Embora a observação cientifica tenha provado que era um mito o suicídio coletivo dos lemingues, interessa reter que a falta de controle na taxa de crescimento da espécie em períodos de abundância de alimento conduz a um excesso de população que obriga a deslocações maciças em busca de alimento. E é nessas deslocações que ocorre grande numero de mortes por afogamento nos lagos da tundra devido à pressão da multidão.
O que nos leva, a propósito do descontrole em períodos de abundância, aos restantes temas do título, suicídio, ensino e delinquencia.
A comunicação social gosta de apresentar a perspetiva individual em cada noticia de suicídio, ensino ou delinquencia.
Tende a esquecer a componente social de cada fenómeno.
Em Sociologia, com Durkheim, desenvolveram-se técnicas de abordagem destas problemáticas com a análise dos dados estatísticos segundo perspetivas e hipóteses associadas à sociedade, para alem das causas e circunstancias individuais.
O suicídio, sempre estudado com base na recolha histórica de dados, poderá assim resultar mais da desestruturação social, como a falta de meios para prestar uma assistência digna aos idosos com menores recursos ou em arranjar empregos para os jovens, do que de uma desestruturação psicológica, aliás ela própria resultante da desestruturação social.
Temos assim que num meio social de fraca coesão social os suicídios tenderão para serem de natureza individualista; numa comunidade de coesão social forte o suicídio poderá ser altruísta, como o caso de um  membro de uma familiar se suicidar de pois de matar os familiares, por desistência de lutar contra as adversidades.
Poderá concluir-se que uma tendência para o aumento de suicídios individuais corresponda a um fenómeno de suicídio coletivo, e seria muito interessante ouvir o que os senhores governantes da área respetiva pensam sobre a problemática do suicidio. Persistindo o silencio, a ignorância e ausência de iniciativas dos governantes perante a problemática do suicídio estaremos numa situação arripiante.
Quanto ao ensino, as técnicas sociológicas podem concluir que a organização do ensino utiliza o insucesso escolar para perpetuar a estrutura de classes existente e selecionar e distibuir os alunos pelos diferentes tipos de profissão, impondo uma cultura estratificada em que a capacidade financeira e cultural dos encarregados de educação condiciona o sucesso dos alunos (pais com menores habilitações literárias batem mais nos filhos;  filhos de pais com menores habilitações literárias têm maior predominancia de obesidade infantil - resultados de 2000 entrevistas a crianças e familias pela Faculdade de Medicina da universidade do Porto). O que secundarizará a discussão que os senhores governantes gostam de ter sobre as medidas que eles próprios implementarão para  melhorar a eficácia do ensino (melhor se dirá: para melhorar a eficácia da distribuição dos alunos pelos diferentes tipos de profissão).
Quanto à delinquência, considerada como uma reação e uma adaptação a um processo de decomposição das relações sociais com recurso a violência, parecerá existir uma forte correlação entre o insucesso escolar e o desemprego. Para se ter uma ideia do lugar ocupado pelos atores sociais neste tipo de relações sociais, sendo certo que é dificil um país produzir o suficiente em ambiente de delinquencia dominante, poderá utilizar-se o gráfico seguinte, com 2 escalas de variação de  conceitos de relações sociais:
                        Integração social - marginalidade
                        Cooperação – contestação      :

Numa altura em que os senhores governantes debatem a estratégia de segurança e defesa nacionais da comissão que nomearam, mais ou menos perdidos em discussões académicas e bizantinas, seria muito interessante o diagnóstico com base em dados credíveis que permitissem discutir em debate alargado com fundamento as hipóteses de solução.
Seria preciso uma Sociologia ativa e dinamizadora.
Mas não sei se os senhores governantes estarão disponíveis para  o que seria uma melhoria.



Referencia: Manual de investigação em ciências sociais, de R.Quivy e L.V.Campenhoudt, ed. Gradiva

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Sociologia da base de apoio ou massa crítica de um plano de expansão de uma rede de transportes urbanos

Vamos supor que estava a doutorar-me e que o tema da tese era este que tenho em título.
Explicando melhor, o tema seria a investigação sobre o que mais agradaria a uma população enquanto plano para expansão duma rede de transportes urbanos e, portanto, o que ela gostaria de ver e ouvir para aplaudir quem lhe apresentasse esse plano.
Não seria propriamente um ensaio político. Seria mais de “marketing”… sociológico, claro.
Para fazer as coisas como deve ser, teria de operacionalizar umas quantas técnicas de análise social, passando por inquéritos e debates públicos.
Mas eu disse que era uma suposição, e por isso imaginemos que começávamos por convencer as pessoas que, ao comprarem ou alugar uma casa, há uma lista de verificações de que faz parte, por exemplo e sem que ninguém questione, a existência de uma rede de fornecimento de electricidade, de gás, de água, de comunicações. Ou nem sequer faz parte porque não passa pela cabeça de ninguém que se venda uma casa sem acesso à rede eléctrica (a menos que se pretenda o sossego absoluto numa serrania isolada).
Então operacionalizemos a consciencialização da necessidade de incluir na lista a verificação de que a casa que se pretende tem ligação à rede de esgotos e que esta está dimensionada para suportar 90% da ocupação das casas da povoação servida (não riam, especialmente se se lembrarem da resposta de um presidente de câmara do Algarve quando lhe perguntaram se ia suspender a emissão de licenças de construção até ter a rede de esgotos e de ETAR com capacidade para escoar os esgotos das casas existentes e projectadas; a resposta foi parecida com aquela do gerente do supermercado quando disse que perderia muito dinheiro se retirasse das prateleiras os iogurtes que tivessem atingido o prazo de validade).
Depois deste esforço de consciencialização, tentaríamos que a população-alvo endogeneizasse outra coisa simples: que a casa só deveria ter licença de habitação depois da respectiva câmara certificar que as vias de comunicação eram suficientes para escoar o tráfego previsível à saída de manhã para os empregos e ao fim da tarde para o regresso. E que as mesma vias suportariam com uma pequena degradação picos de fim de semana coincidente com início ou fim de férias e de realização de espectáculos de massas.
É evidente que as urbanizações da linha de Sintra ao longo do IC-19, se fosse essa a prática institucionalizada, não poderiam ter sido construídas. Mas seria interessante que a opinião pública aceitasse que o dimensionamento de uma rede de esgotos e de uma rede de transportes devem ser indissociáveis da construção das habitações. Perderíamos porém uma característica bem portuguesa: primeiro constrói-se, e depois vê-se o que falta; se for preciso construir uma via rápida, constrói-se.
(Não resisto a mais um parênteses: quando se projectou a Alta de Lisboa, os próprios empreiteiros propuseram, com alguma comparticipação, um metro ligeiro de superfície, a eixo da avenida principal, com alguns viadutos para permitir “sítio próprio” e cruzamentos desnivelados. Pois quem devia decidir decidiu mal e optou por não deixar construir. Neste momento, passados uns anos, é a própria câmara de Lisboa que pede que estudem uma linha de metro ligeiro).
Voltando à tese que dá o título a este comentário, reduzamos o nível de ambição e concretizemos.
A população adjacente ao IC-19 (e também ao IC-16, ao IC-17 e ao IC-30) sente-se feliz no casulo (“cocoon”) do seu carrinho do segmento médio, com ar condicionado e estereofonia, onde passa duas agradáveis horas por dia enquanto consome combustíveis de origem fóssil.
Não parece constituir uma base de apoio para um plano de expansão de uma rede de transportes urbanos; nem parece poder integrar uma massa crítica que debata modelos e soluções para essa rede. Quando muito, daria algum apoio a que se estudasse qualquer coisa que ajudasse a retirar do IC-19 (e também do IC-16, do IC-17 e do IC-30) aqueles automóveis mais antigos, sem ar condicionado e com rádios ordinários, conduzidos por pessoas de menor poder económico e estatuto social mais baixo que deveriam, esses sim, ser desviados para o comboio de Sintra. Por razões de segurança, o comboio da linha de Sintra deveria ser como um gueto, de onde não sairiam os grupos ou gangues de jovens organizados. Aqui estaríamos a mudar de tema, a estudar as causas e as soluções para a criminalidade juvenil, mas ainda aqui não pareceria que a população-alvo do IC-19 estivesse interessada em constituir-se massa crítica.
E a população de menores recursos económicos? Quer a parte que todos os dias dá vida aos comboios das primeiras horas da madrugada para garantir as limpezas dos escritórios das empresas de serviços onde brilham os automobilistas de ar condicionado do IC-19; quer a parte que, desempregada ou desorientada na vida vai circulando de comboio; não serão também base de apoio porque desconfiarão de qualquer coisa nova como mais uma hipótese de mais dificuldades. E como massa crítica também não, apesar de alguma população nestas condições ter ideias bem definidas. Pelo menos é o que vemos quando há eleições, embora seja claramente minoritária. Mas mais uma vez seria um desvio do tema da tese, tentar estudar a correlação entre consciência política e capacidade para integrar uma massa crítica sobre equipamento social. Abandone-se esta pista.
Mas ainda não falei nos gestores de topo. Os gestores de topo, quer sejam os das empresas privadas, das empresas públicas, ou das entidades públicas, têm um pequeno problema que os impede, na sua maioria, de entender os problemas das redes de transporte: é que só andam de BMW da série 5 para cima ou de Audi de A6 também para cima. E assim é muito difícil avaliar os constrangimentos e as deficiências das redes de transporte. Daí a dificuldade em encontrar soluções, até porque as explicações dadas pelos técnicos muitas vezes não primam pela coerência. Não podemos também contar com eles, gestores e técnicos adjacentes, para base de apoio para novos planos de expansão de redes de transportes urbanos, nem muito menos para integrar a tal massa crítica que permitiria debater os problemas até começarem a delinearem-se soluções… Poderíamos talvez tentar a solução do general De Gaulle (pediu o helicóptero e disse lá em cima para o ministro dos transportes, contemplando os engarrafamentos: “résoudrez-moi cette merde”; o ministro reuniu com meia dúzia de outros ministros, e cada um deles com meia dúzia de técnicos da RATP e da SNCF, que por sua vez reuniram várias equipas pluri-disciplinares de técnicos, que em debate e em processo iterativo fora delineando a estrutura do “Reseau Express Regional”, tudo sem génios e sem iluminados detentores da verdade), mas é um método difícil em Portugal, como difíceis são os métodos que mais uma vez cito, da “Sabedoria das multidões”, de James Surowieky (não consigo mesmo convencer ninguém, mas vou insistindo).
Em resumo, a minha tese concluiria que não é possível, neste momento, reunir uma base de apoio para um novo plano de expansão de uma rede de transportes urbanos, nem uma massa crítica que permita a sua discussão inter-activa.
O grande perigo é aparecerem novos planos com base em trabalhos de génios e de iluminados, como disse há pouco que não devia fazer-se (lembram-se dos recentes planos para a recuperação da Baixa, da zona ribeirinha, do plano estratégico da CML? Foram convidados ilustres de reconhecido mérito segundo os padrões da comunicação social, todos geniais e iluminados por ciência que não ilumina os comuns dos mortais; saiu um trabalho de teorização brilhante; atrevi-me a enviar um comentário à CML; silêncio tumular – ao menos convidassem finalistas para um concurso de ideias).
O grande perigo é também esse planos serem dominados por outros mecanismos que não os dos interesses “tout court” (eu podia ter escrito “estritamente”, mas deixem assim como homenagem à RATP) da mobilidade das populações, e das correcções urbanísticas que são indissociáveis de qualquer plano de rede de transportes.
E assim, amargamente como facilmente se depreende, se conclui a minha tese sobre
a “Sociologia da base de apoio ou massa crítica de um plano de expansão de uma rede de transportes urbanos”, pedindo aos meus amigos sociólogos que me mostrem onde falhei.