O extraordinário potencial dos
combustíveis fósseis em termos de concentração de energia utilizável em
pequenos volumes acabou, a partir dos transportes, por condicionar toda a
economia, moldando de forma subreptícia os preços das mercadorias. Este
fenómeno manifesta-se por exemplo na absorção pelos preços das mercadorias dos
aumentos de preços do petróleo.
Não admira portanto que os
cidadãos mais preocupados com as questões económicas de um país como Portugal
se preocupem especialmente com os custos de energia associados ao transporte,
quer de passageiros, quer de mercadorias.
No domínio do transporte de
passageiros, a preocupação, partilhada aliás com a União Europeia, centra-se na
transferência da quota do transporte individual para o tansporte coletivo, e do
transporte aéreo de curta distância para o transporte ferroviário, com a
fundamentação na redução das emissões de
gases com efeito de estufa e na redução dos custos de congestionamento.
No domínio do transporte de
mercadorias, a orientação da União Europeia, depois de verificar a excessiva
quota do transporte rodoviário, mais ineficiente do ponto de vista energético
dado o maior coeficiente de atrito do pneu com o asfalto relativamente ao
coeficiente de atrito da roda de aço com o carril, é claramente no sentido do
desenvolvimento das infraestruturas do transporte ferroviário, para aumentar a
respetiva quota, demasiado pequena atualmente.
Por razões identicas, a União
Europeia pretende criar condições para o desenvolvimento do transporte marítimo
de mercadorias.
Em ambos os casos, não deveremos
ignorar a estratégia da União Europeia, não só por respeito pelos compromissos
internacionais de redução das emissões, mas também no próprio interesse
comercial do país.
Neste contexto, e na previsão,
não necessariamente otimista, de que já
nos encontramos num ciclo ascendente da economia, e que a próxima década verá
um crescimento assinalável do comércio internacional, é essencial que o país se
concentre num plano independente de ciclos eleitorais de desenvolvimento das suas
infraestruturas de transporte.
Considerando a situação do país,
esse plano terá de ser apoiado em fundos
comunitários, nomeadamente o plano Juncker, vocacionado para infraestruturas de
transportes e de energia, sendo que é condição sine qua non que para a
concessão desses fundos seja apreentado um anteprojeto bem definido das
ligações pretendidas.
Como em qualquer questão complexa
e que envolve planeamento a longo prazo, a tendencia comum é a de tentar adiar,
ou acreditar em soluções de curto prazo, ou, pior ainda, ter fé em
desenvolvimentos tecnológicos que disponibilizarão soluções quase milagrosas.
Foi assim que se criou a ilusão
de que o transporte rodoviário individual de passageiros e o de mercadorias
será resolvido com veículos elétricos e veículos autónomos, esquecendo-se a
sempre, por razões físicas, menor eficiência energética do transporte
rodoviário e os custos de congestionamento nas estradas e túneis rodoviários.
Assim também se criou a ilusão de que o porto de Sines,
tal como está, pode ser a porta da Europa para o tráfego acrescido do canal do
Panamá.
Poderá sê-lo, na verdade, mas a
Europa tem 400 portos, melhor localizados do ponto de vista logístico, porque a
competitividade de um porto depende das ligações ferroviárias aos centros
consumidores. Pelo que é indispensável corrigir o traçado da ferrovia de Sines
e dotá-la da bitola europeia.
Sendo que é provavelmente outra
ilusão, a de que basta fazer as obras de grande manutenção e reabilitação
previstas para a ferrovia, no seguimento do levantamento feito pelo GT-IEVA, esquecendo
a bitola europeia. Que bastaria instalar travessas bi-bitola nas ligações aos
portos secos de Vigo, Salamanca e Badajoz. Que a solução não disponível
comercialmente de eixos telescópicos para vagões de mercadorias acabará por
aparecer.
Infelizmente não são suficientes
estas soluções, enquanto a Espanha
cumpre um plano de execução de infraestruturas ferroviárias com bitola
europeia, que lhe assegurará ligações rápidas à Europa (já em bitola europeia
entre Barcelona e Perpignan, trabalhos em curso no “Y” basco e na ligação de
Madrid a Badajoz), sem as perdas de imobilização nos portos secos de transferencia
da bitola ibérica para a bitola europeia.
A própria 29ª cimeira luso
espanhola , em que muito se falou nas ligações ferroviárias, evitou o tema da
bitola europeia e das pendentes dos atuais traçados ferroviários que prejudicam
o transporte de mercadorias, entre Vilar Formoso e Salamanca, e à saída de
Sines. Por isso a eletrificação do troço Vilar Formoso-Salamanca não basta.
A ausência de Portugal na
EXPO2017 em Astana, capital do Kazaquistão por onde passa a nova rota da seda
ferroviária China-Europa, veio ilustrar o isolamento da atual
estratégia nacional de ligação à Europa e a ideia ilusória de que Sines
é a porta da Europa.
Impõe-se a criação de
ligações ferroviárias internas e externas em bitola europeia, definindo com
cuidado as prioridades e candidatando os anteprojetos a fundos comunitários:
ligação de mercadorias Sines-Poceirão-Caia (tráfego misto Poceirão-Caia de
passageiros e mercadorias, cerca de 2000 milhões de euros), ligação de
mercadorias Aveiro-norte de Vilar Formoso, cerca de 4000 milhões de euros),
ligação de passageiros Lisboa-Porto (cerca de 3000 milhões de euros), ligação
Porto-Leixões-Vigo (cerca de 1500 milhões de euros).
Nada se fazendo neste sentido,com o argumento de que as
nossas empresas de camionagem e as empresas de transporte ferroviário operando
em Portugal em bitola ibérica assegurarão a menores custos o serviço entre os
portos e as plataformas logísticas de Vigo, Salamanca e Badajoz, teme-se pelo
seu futuro pelo patamar de menor
competitividade e pela impossibilidade de alargar o volume de tráfego de
mercadorias pelas limitações dum sistema que obriga a imobilizações por
transbordo. Teme-se ainda pelas diretivas rigidas da União Europeia no sentido
da limitação do tráfego de camiões, quer para redução de emissões, quer para
redução do congestionamento rodoviário.
Claro que não se consegue
uma união de esforços dos técnicos e entidades (universidades, associações
profissionais, revistas técnicas) mais ou menos ligados ou interessados nesta
problemática que produzisse um plano de ação, faseado ao longo de vários ciclos
eleitorais, e suportado em programas de apoio comunitário.
É difícil chegar a um
acordo sobre a metodologia a seguir, e apontam-se sempre falhas ou omissões ao
que quer que se proponha.
Mas talvez fosse possível,
pouco a pouco, ir construindo esse tal plano, e por tentativas do tipo de resolução de problemas de Fermi, ir elaborando
umas análises de custos-benefícios que o suportassem, não obstante a
falibilidade do que possa estimar-se...
PS em 29 de julho :
PS em 29 de julho :
Exemplo de plano a 30 anos de prioridades
para a bitola europeia (a confirmar com análises custos-benefícios, insistindo
nos custos da ausencia de comboios diretos no caso da bitola ibérica):
1-Sines-Poceirão-Caia;
2- Porto-Vigo;
3-Lisboa-Poceirão;
4-Aveiro-Salamanca (a
norte de Vilar Formoso);
5-Lisboa-Porto .
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