Existem muitos opositores à construção de linhas de alta velocidade. Um deles é autor do blogue o economista português, tendo publicado em 5 de novembro um post contra "o TGV":
Enviei-lhe o seguinte email:
Caro dr Luis Salgado de Matos
Embora o eng.Pompeu dos Santos já
tenha comentado a sua análise com informações consistentes, penso que um tema como o da alta velocidade ferroviária
justifica diversas abordagens.
Provavelmente a melhor abordagem
será a de cultores das artes e da literatura. Razão por que sugiro a releitura
da crónica de Miguel Esteves Cardoso sobre os bons comboios, ou de como
desistir de viajar no pendolino depois de duas viagens desconfortáveis, passada
que fora a época gloriosa do Glenfiddich express. Isto é, a análise de Miguel
Esteves Cardoso colide frontalmente com o ranking generoso que o dr Salgado de
Matos atribui à rede ferroviária nacional:
Mas não sendo sociólogo, nem
jurista, nem economista, também me atrevo a dar a minha abordagem de humilde
técnico, pedindo desculpa ao eng Pompeu dos Santos por alguma divergência nos
pontos de vista e aos engos Luis Cabral da Silva e Mario Ribeiro por recorrer a
um seu trabalho
Envio este texto por email dado
ter encontrado os comentários desativados no blogue.
Interpretei o texto do dr Salgado
de Matos como propondo a recusa de qualquer investimento em novas linhas
ferroviárias de alta velocidade, contentando-se com o que existe. Apesar de
reconhecer que falta material circulante, para além da degradação de que, por
falhas de manutenção, padece a infraestrutura ferroviária. Neste domínio terá
razão a dra Manuela Ferreira Leite, que diz que a falta de investimento está a
matar o nosso país, que é preciso investir na preservação do que temos.
Pessoalmente discordo em parte, porque qualquer empresa medianamente bem gerida
tem um orçamento de exploração e um orçamento de investimento. E no orçamento
de exploração, ou operação, estarão as despesas de manutenção, ou de
preservação da infraestrutura que temos de manter em funcionamento em condições de segurança e de
rendimento (performance, eficiência). E se há ou não dinheiro para uma coisa ou
outra, já foram referidas (prof.Alfredo Marvão Pereira) percentagens em relação
ao PIB para afetar à operação e ao investimento. A menos que se queira mesmo
afundar o país, uma vez que a alternativa ao transporte ferroviário é o
desperdício energético dos outros modos de transporte (exceção para o
transporte marítimo). Aqui vem-me à memória a extinção da civilização maia, no
século X DC. Uma série de anos de seca severa, numa região em que os rios
correm subterraneamente, não à superfície, e em que as classes privilegiadas
detêm o monopólio da água. Quando a água esgotou, as multidões enfurecidas
destruíram pelo caos o resto da estrutura social. Apesar do nível elevado da
civilização maia, notável na matemática e na astronomia, a sua fragilidade no
domínio dos transportes foi fatal. Não tiveram infraestruturas para irem buscar
mais longe aquilo de que precisavam. Não dispunham de cavalos, nem sequer da
elementar roda, nem da tecnologia do ferro. Um país sem infraestruturas de
transportes definha, ou é ocupado a partir do exterior… Claro que estou a
admitir que o nosso país sai grandemente prejudicado do seu desprezo pela rede
ferroviária convencional e, por maioria de razão, por uma nova rede de alta
velocidade ferroviária. E infelizmente não poderemos contar com o apoio dos
adeptos incondicionais ou dependentes forçados do automóvel, a exemplo dos
“coletes amarelos” anti-Macron.
Mas prescindindo agora da análise
histórica ou política, parece-me, por mais difícil que seja de aceitar pelo dr
Salgado de Matos, eventualmente por desprezar o ponto de vista da Física, que
há duas razões que contradizem a sua análise:
I – o consumo específico de
energia por passageiro-km (a unidade do produto de uma empresa de transporte de
passageiros) de um moderno comboio de alta velocidade é, para a mesma taxa de
ocupação, menor do que para um automóvel, para um autocarro (mesmo elétrico) ou
para um comboio convencional.
Isso deve-se, em comparação com
os veículos rodoviários, ao menor atrito da roda de ferro com o carril,
relativamente ao atrito do pneu com o asfalto (menor coeficiente de atrito ou
quociente entre a força necessária para deslocar uma massa de ferro sobre uma
superfície de ferro, comparativamente com o maior coeficiente de atrito da
mesma massa de borracha sobre uma superfície de asfalto) e, além disso, porque
o pneu, deformando-se durante a rotação, vai aumentar a superfície de contacto
com o pavimento e portanto aumentar a resistência ao movimento e o respetivo
consumo de energia.
No caso do comboio convencional,
o menor consumo específico do comboio de alta velocidade resulta das
caraterísticas mais favoráveis do traçado das novas linhas a construir (tal
como não se fazem auto-estradas aproveitando o traçado das estradas
pré-existentes) , com curvas de maior raio e com pendentes de menor inclinação,
oferecendo assim menor resistência ao movimento.
II – as novas linhas requeridas
pela exploração da alta velocidade podem ser rentabilizadas de uma forma muito
simples, através da sua utilização também por comboios de mercadorias, porque
as linhas convencionais têm pendentes superiores a 1,2% , o que limita o
comprimento dos comboios ou, em alternativa, requerem a utilização de uma segunda
ou terceira locomotiva, aumentando assim os custos de operação. Esta a razão
por que é dinheiro mal empregado a beneficiação da linha da Beira Alta em vez
da construção de uma linha de raiz com traçado otimizado. Notar que enquanto os
comboios de passageiros nas linhas de alta velocidade poderão ter como
velocidades máximas entre 250 e 350 km/h, aos comboios de mercadorias não se
requer mais de 100 a 120 km/h.
É possível que o dr Salgado de
Matos tenha escrito o seu texto influenciado pelo estudo da Fedea de 2015, por
um relatório do Tribunal de contas europeu de junho de 2018, pela atividade do
agrupamento europeu de interesse económico – alta velocidade Espanha-Portugal
(AEIE-AVEP), em quem aparentemente o governo delegou todos os assuntos de
investimento ferroviário em novas linhas, ou pela repetida defesa da bitola
ibérica pelo senhor ministro do Planeamento e Infraestruturas, pela sua
tutelada Infraestruturas de Portugal e pelas operadoras ferroviárias de mercadorias,
empresas não nacionais. Provavelmente aquele agrupamento europeu coincide no
todo ou em parte com a associação Atlantic corridor RFC4 (rail freight corridor
4) com o objetivo da UE de ligar segundo os parâmetros da interoperabilidade os
portos da costa atlântica ao porto do Havre e a Strasbourg e Mannheim, embora até
agora, cingindo-se à bitola ibérica na parte nacional, pareça preocupar-se mais
com a ligação de Espanha à Europa trans-pirinaica.
A ideia dos defensores da bitola
ibérica é a oportunidade de explorar a rede remanescente com essa bitola após o
desenvolvimento da rede de bitola UIC em Espanha e apostar no transporte,
maioritariamente diesel, para as
plataformas logísticas fronteiriças de Vigo, Salamanca, Badajoz e Huelva, e
para a de Vitoria (disponível para ligações a França em bitola UIC a partir de
2023), e no transporte de camiões em vagões do tipo do Eurotunnel (autopistas
ferroviárias). Certamente que funcionará, mas limitando o crescimento das
exportações e abrindo claramente o caminho para a operação do transporte de
passageiros ficar também, como o de mercadorias, ficar para acionistas externos.
Pareceu-me também que a principal
crítica do dr Salgado de Matos é a não geração de retorno para pagamento das
linhas de alta velocidade por insuficiência de passageiros.
Comento:
1 – o estudo da Fedea não
considerou os resultados mais recentes de EBITDA positivo nas principais linhas
espanholas (reconheço exageros nalgumas linhas da rede AVE) nem externalidades
positivas como a venda da alta velocidade à Arabia Saudita (já em operação) nem
ao Texas (já adjudicado), nem considerou os benefícios fiscais às companhias
aéreas nem em comparação o desperdício energético e emissões poluentes das
viagens aéreas de menos de 800 km (referidos estes no seu texto, diga-se em
abono do dr Salgado de Matos). Por exemplo, a estimativa por passageiro duma
viagem aérea Lisboa-Madrid é de 70 kg de CO2, enquanto numa viagem de alta
velocidade ferroviária seria de 13 kg de CO2. Citando:
registo que em 2016 o resultado
positivo da alta velocidade espanhola foi de 141 milhões de euros com 35
milhões de passageiros. Como anunciou o ministro de Fomento de então, a alta
velocidade pagou a manutenção da infraestrutura, ao contrário do transporte
rodoviário que não cobre a manutenção das estradas. Evidentemente que nesta
conta operacional não entra o serviço da dívida para a construção da
infraestrutura. Será ainda interessante estudar os consumos comparados do
comboio de alta velocidade com os outros modos de transporte:
2 – uma infraestrutura como uma
linha de alta velocidade tem de pagar o investimento? Não é critério suficiente
ter um EBITDA positivo, servir as populações e ser energeticamente eficiente e
menos poluidor? Como encarar o investimento num automóvel privado? Gera retorno
para cobrir o investimento? Um automóvel que custe 30.000 euros consome em 10
anos cerca de 16.000 euros de gasolina, mais 3.000 euros de manutenção mais
6.000 euros de seguros, num total de 55.000 euros nesses 10 anos. Ou cerca de 8%
do rendimento dos seus proprietários (estou a supor um casal com um automóvel).
Será que gerou 8% desses rendimentos, quando o transporte coletivo é mais
económico e menos poluidor?
3 – O relatório de junho de 2018
do Tribunal de contas europeu (European Court of Auditors) criticava as linhas
mal planeadas, não as bem planeadas, e a ausência de soluções para as regiões
trans-fronteiriças, de que o troço Évora-Mérida, por não respeitar os critérios
de interoperabilidade é um ato falhado. Vem a propósito referir que a solução
de vagões com eixos variáveis só é rentável para menos de 900 km, logo, de
âmbito ibérico do ponto de vista nacional. E quanto aos comboios automotores de
passageiros com eixos variáveis, solução sedutora, reconheçamos que é uma
excelente solução, mas de aplicação bem limitada no tempo e no espaço, pelo
menos é a experiência espanhola.
4 – Falando em Tribunal Europeu de Contas, deve também
citar-se o relatório de 2016 sobre a insuficiência da rede europeia de
mercadorias e a necessidade, por razões de combate às alterações climáticas, de
a desenvolver: https://www.eca.europa.eu/pt/Pages/DocItem.aspx?did=36398
São incipientes as medidas que a IP vai executando, não só
pela reduzida taxa de execução do plano ferrovia 2020, incluindo o propalado
troço Évora-Mérida em bitola ibérica, como pela pequenez dos projetos para
2030. Por exemplo, a ligação de Sines ao Caia exige a construção de um troço
novo entre Sines e Grândola Norte, em vez da limitada beneficiação do troço
existente Sines-Ermidas, que chega a ter 2,2% de pendente. Idem para troços da
Beira Alta existente, em vez de avançar para a linha nova
Aveiro-Mangualde-Almeida (e não Vilar Formoso, para curvas e pendentes mais
favoráveis, nem Pampilhosa, que aumenta o percurso). Esses troços novos
poderiam beneficiar de fundos comunitários, mas eles só serão possíveis contra
a apresentação de anteprojetos bem definidos, não servindo de desculpa para não
os fazer, naturalmente, o chavão “não há dinheiro”. Cito este esboço de estudo
comparativo, em que se estima um custo de operação duma linha ferroviária nova
de mercadorias, partilhada com comboios de alta velocidade, em 1,2 cent./tonelada-km,
por comparação com uma linha convencional, estimado em 1,67 cent./tonelada-km: https://1drv.ms/p/s!Al9_rthOlbwehzNhuEExKreHeAex
5 – Para opor à política do
governo, o que temos a defender é o mapa da rede trans-europeia básica dos nove
corredores ferroviários internacionais de acordo com todos os critérios da
interoperabilidade (incluindo a bitola UIC) com o objetivo de 2030 – Trans European
Network – Transport – TEN-T). E, quanto a nós, o corredor Atlântico norte e sul
da TEN-T, no território nacional e nas suas ligações a Espanha e à Europa
trans-pirinaica, serve melhor o interesse nacional ao permitir a maior
eficiência do transporte de passageiros e de mercadorias. Junto o documento com
o plano de desenvolvimento dessa rede, elaborado pelos colegas Luis Cabral da
Silva e Mario Ribeiro: https://1drv.ms/w/s!Al9_rthOlbwenzfjzLz-uqN9PNRI
A estimativa é de 12.000 milhões
de euros a executar em 14 anos. É possível, mudando a política do governo e as
orientações dadas à IP e ao grupo AEIE-AVEP, elaborar os estudos prévios
necessários para obter cerca de 40% de comparticipação comunitária. O que
significa cerca de 500 milhões de euros por ano a cargo do país (aprox.0,3 % do
PIB). Do lado das despesas, contar para manutenção com 1 a 5% do investimento por
ano (120 a 600 milhões) e, com base na experiência espanhola, esperando 2
milhões de passageiros por ano para as linhas Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid (receita
de 150 milhões de euros) e nas
orientações europeias de transferência até 30% do transporte rodoviário de
mercadorias para o transporte ferroviário, por razões ambientais (White paper
da CE de 2010:
Considerando o valor do INE de mercadorias
internacionais por modo rodoviário em 2015 de 22.000 milhões de ton-km e
tomando 9% a 18% de transferência e um custo de venda de 10 a 15 cent./ton-km, teremos como receita anual 200 a 600 milhões
de euros). Isto é, se por milagre tivermos a infraestrutura, valerá a pena
“desempacotar o material circulante”.
6 – CONCLUSÃO, por hora – Como em
qualquer problema complexo como este, é fácil definir alguns pressupostos de
aceitação universal, como bem utilizar o dinheiro dos contribuintes num
investimento com riscos, ou em poupá-lo precisamente por ter esses riscos. No
problema em apreço, dum lado temos o desperdício e a poluição atuais com o
predomínio do transporte rodoviário para as mercadorias e aéreo para os
passageiros, comprometendo o referido dinheiro dos contribuintes através da
importação de combustíveis fósseis, simultaneamente com a degradação da rede
ferroviária convencional, em prejuízo dos mesmos contribuintes. Do outro, temos
um complexo e vultoso investimento que exige uma engenharia de projeto e de
execução rigorosas e uma gestão de fundos comunitários igualmente rigorosa, e
que só será justificável, mesmo que o seu retorno tenha um prazo de amortização
até ao fim do século, se do lado empresarial nacional houver uma reação
positiva e expansiva de exportações de modo a sobreporem-se ao volume de
importações.
Em resumo, a cada um a sua
escolha, retendo eu pela minha parte a memória da extinção da civilização maia
por falta de infraestruturas de transporte para resposta adequada às ameaças
externas, e a ânsia de voltar a ter um frasquinho de Glenfiddich num bom
comboio.
Aceite os melhores cumprimentos
Fernando Santos e Silva
- Post original do dr Salgado de
Matos
- Resposta do Eng.Pompeu Santos:
Exmo Senhor Dr Salgado
Matos
Não tenho por hábito
comentar os comentários de outros. Mas como fui avisado por pessoa amiga de que
o meu nome tinha sido repetidamente invocado num post de sua autoria, datado de
5 de novembro de 2018, no blog “O Economista Português”, intitulado: “Grandes
Investimentos: TGV, não, obrigado, já temos” venho prestar alguns
esclarecimentos, aos quais, agradeço seja dado relevo equivalente ao que foi
dado ao referido Post.
Desde já, registo com
apreço, a consideração com que sou tratado no post, “um divulgador inteligente
e bom argumentador”.
Vejamos então os
tópicos do Post.
1)”Já temos TGV”
O autor parece
confundir os comboios de “Alta Velocidade” com a infraestrutura onde circulam.
Como é obvio, são coisas distintas. O “TGV” é uma marca de comboios de “Alta
Velocidade”, produzidos pela francesa Alstom, mas existem outras marcas, tão ou
mais importantes, como o Velaro da Siemens, por exemplo, para já não falar dos
CR400 chineses, que são nesta altura os comboios de “Alta Velocidade” em
serviço mais rápidos do mundo. Também não se percebe a alusão ao “TGV”, pois
nos meus artigos não falo em “TGV”, mas em linhas ferroviárias de “Alta
Velocidade” (em inglês, HSRL, “High Speed Railway Lines”).
O autor diz que “o
Pendolino, o nosso Alfa Pendular, é o TGV italiano”. Não é verdade. O ETR 450
(o Pendolino), com uma velocidade máxima de 250 km/h, não é considerado um
comboio de “Alta Velocidade”. Existem, de facto, comboios de “Alta Velocidade”
em Itália, são o ETR 500, o ETR 1000 e o AGV 575 (fabricado pela Alstom), com
velocidades comerciais de 300 km/h.
Refere a seguir que
“temos o material circulante e renovámos a linha há menos de 30 anos”. Pois
renovámos, mas. Gastou-se uma fortuna e a infraestrutura permite apenas
velocidades máximas de 220 km/h e em pequenos troços; a maior parte não permite
velocidades superiores a 160 km/h. De que vale ter comboios de “Alta
Velocidade” se a infraestrutura não permitir essa “Alta Velocidade”?
2) “É excesso de falta
de memória prometer Lisboa-Porto de comboio em 90 minutos”
Como diria o outro, é
apenas “uma questão de fazer contas”. Claro que na infraestrutura atual isso
não é possível, por isso no eixo Lisboa-Porto precisamos de uma linha nova, a
qual, nos troços terminais (até para obviar o impacte ambiental), poderá (e
deverá) usar o atual canal da linha do Norte. É por isso que é referido um
tempo de 90 minutos e não os 75 minutos do plano da antiga RAVE. Convém
esclarecer que numa linha de “Alta Velocidade” Lisboa-Porto deverão circular comboios
diretos, que farão a viagem nos tais 90 minutos e comboios com paragens nas
estações intermédias (Aveiro, Coimbra e Leiria), que, obviamente demorarão mais
tempo, cerca de 5 minutos a mais por cada paragem.
3) “O TGV é um produto
do passado protecionista”
O autor deve andar
distraído. Hoje em dia, qualquer país que se pretende moderno possui, está a
construir, ou está a planear construir, redes ferroviárias de “Alta
Velocidade”. A China, por exemplo, construiu nos últimos 20 anos uma rede
ferroviária de “Alta Velocidade” com mais de 25 mil km, a mais extensa do
mundo. Os comboios de “Alta Velocidade”, além de ecológicos, são o meio de
transporte mais rápido e rentável para ligar grandes e médias cidades distantes
entre si 300 a 800 km. Só a partir daí o avião é mais rápido, mas levanta
problemas sérios de poluição.
4) “Sem TGV a nossa ferrovia tem cotação internacional”
Pelos vistos, existem
rankings para todos os gostos. Segundo a consultora Boston Consulting (que faz
anualmente a classificação das redes ferroviárias europeias em 25 países), a
rede ferroviária Portuguesa ocupa um modesto 23º lugar.
5) “Mesmo com o TGV em
saldo, os seus custos excedem os benefícios”
Não se percebe o que é
isso do “TGV em saldo”. Se se refere à rede de bitola UIC, racionalizada, que
preconizo para Portugal, isso nada tem a ver com saldos, mas apenas em usar bem
o dinheiro dos contribuintes e defender o interesse público.
Essa rede será para o
transporte de mercadorias (em toda a rede) e para o transporte de passageiros
nos eixos Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid. O objetivo é ligar em ferrovia de
bitola UIC Portugal às redes ferroviárias da Europa central, para que o país
deixe de ser a “Faixa da Gaza” da Europa. Apesar de dizerem o contrário, os
espanhóis não estão interessados em que Portugal se ligue à Europa em bitola
UIC. Infelizmente, também há em Portugal quem pense o mesmo.
A rede será
constituída por linhas novas e troços de linhas existentes, convertidos para
Bi-bitola. Repito, estamos a falar da infraestrutura, isto é, das linhas; não
do material circulante. Além disso, as mercadorias não precisam de “Alta
Velocidade”; apenas chegar a horas certas.
Essa rede corresponde
à implementação em Portugal do chamado “corredor Atlântico” da TEN-T da EU, um
“π” deitado, que vai do Porto a Sines e com entradas em Vilar Formoso e Caia .
Terá cerca de 920 km de extensão, dos quais 590 km serão linhas novas (de
bitola UIC ou Bi-bitola) e 330 km serão linhas existentes, convertidas para
Bi-bitola.
28/11/2018
santos.silva45@hotmail.com – Correio
https://outlook.live.com/owa/?path=/mail/inbox/rp
4/4
A rentabilidade das
redes ferroviárias é uma questão controversa, pois, globalmente, são
deficitárias em todo o mundo. Se fosse apenas uma questão de negócio, então as
linhas ferroviárias existentes eram todas fechadas. Mas, existem benefícios,
facilmente compreensíveis (as externalidades) e por isso, não existe hoje em
dia político responsável que não as defenda. Agora, os custos deverão ser
minimizados; será diferente gastar 5 mil milhões, que é o custo da rede que
preconizo, ou 15 mil milhões, que era o custo da rede de “TGV” de Sócrates.
O custo de 5 mil
milhões de euros da rede proposta foi calculado considerando os custos de
mercado, por exemplo, aqui ao lado em Espanha. Numa conferência que proferi na
Sociedade de Geografia de Lisboa em 28 de março de 2015 foi apresentado o
cálculo detalhado desses custos.
Se for conseguida uma
comparticipação da EU da ordem de um terço, o encargo para o orçamento de
Estado será de cerca de 280 milhões de euros (0,15% do PIB) por ano, durante 12
anos, até 2030, que é perfeitamente compatível com as capacidades financeiras
do país. Em breve será publicado um livro onde toda essa informação ficará à
disposição dos interessados.
Uma última nota. Em
Portugal há muita gente que gosta de falar; do que sabe, mas muitas vezes do
que não sabe. Uma vez que a questão da infraestrutura ferroviária é uma matéria
eminentemente da área da Engenharia, deveria ser deixada aos Engenheiros.
Com os melhores
cumprimentos
Silvino Pompeu Santos,
Engenheiro Civil, Membro Conselheiro da Ordem dos Engenheiros
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