Relativamente ao interessante artigo de
opinião do prof.Viegas na edição de 26 de fevereiro, gostaria, na qualidade de
antigo técnico do metropolitano, de referir dois aspetos técnicos em desacordo
e de comentar as sugestões descritas.
Espero que as críticas e comentários sejam
entendidos apenas como é minha intenção, isto é, restritas ao âmbito técnico da
engenharia dos transportes e fundamentadas na minha experiencia profissional e
contactos com redes homólogas.
1 - em visita de estudo ao metro de
Hamburgo há 14 anos, tive oportunidade de conduzir um comboio,
tendo a controlar-me uma bonita maquinista, ao longo de uma linha de 30
km, de metro, isto é, servindo a área metropolitana incluindo o centro da
cidade, e não de comboio suburbano
2 - os desenvolvimentos tecnológicos da
tração elétrica com eletrónica de potencia, desde os anos 70 do século XX, viabilizaram
material circulante apto para distancias interestações curtas e longas, adaptando
os binários e as velocidades ao comprimento dos percursos, sendo o tipo mais
mediático o tram-train; aliás o próprio metro de Lisboa, cujo material
circulante tem motores assíncronos com controle por variação de frequência e
regeneração na travagem, tem 6 interestações com mais de 1 km (Senhor
Roubado-Ameixoeira, Campo Grande-Cidade Universitária, Cidade
Universitária-Entrecampos, Areeiro-Roma, Alvalade-Campo Grande, Santa
Apolónia-Terreiro do Paço).
Nestas condições, não será obrigatório
optar pelo comboio suburbano para servir Loures. Deve no entanto aplaudir-se a
ideia do prolongamento ferroviário de Loures à linha do Oeste.
O prolongamento Odivelas-Loures em metro,
enterrado dada a orografia , poderia estimar-se em 300 milhões de euros, com um
parque dissuasor na zona do hospital Beatriz Angelo para absorver o tráfego
automóvel da A8 (Torres Vedras) e da A21 (Ericeira/Mafra/Malveira) e
correspondência com as rodoviárias. Dada a dispersão da habitação,
serviços e polos de emprego, será
necessário prever alimentação da linha do metro por percursos transversais em
sítio segregado do tráfego automóvel com cabinas autónomas on demand do tipo
Navya ou Easy Mile.
Dada a ocupação da encosta e o vale de
Loures, está desde 2002 prevista uma circular externa em metro de superfície
(LRT) desde Algés/Damaia, que nesta zona ligaria Odivelas ao Infantado , MARL e
retorno para Sacavem. Trata-se de um empreendimento que só poderá avançar
mediante planeamento de um faseamento rigoroso.
O prolongamento de Loures a Malveira com
correspondência com a linha do Oeste, o “brinde” citado no artigo, dado o
acidentado do terreno, obrigando a viadutos
e tuneis evitando as curvas de nível para encurtar o percurso (16 km) poderá
estimar-se em cerca de 500 milhões.
É curioso pensar que nos anos 1870 chegou
a haver um serviço ferroviário , o Larmanjat, com um carril central e o apoio
das rodas laterais das carruagens e locomotiva em pranchas de madeira fixadas à
estrada, entre Arroios e Torres Vedras. As fracas fiabilidade e eficiência
ditaram o seu fim.
Quanto ao prolongamento Campo
Grande-Odivelas, não terá sido grande erro.
Foi erro, enquanto definição de
prioridades ao ficar esquecida a extensão a Alcantara, para serviço da parte
ocidental da cidade e correspondência com a linha de Cascais numa altura,
principio dos anos 90, em que se fez uma espécie de tratado de Tordesilhas, a
parte oriental da cidade para o metro, a ocidental para a CP.
Segundo o EIA de suporte ao atual projeto
da linha circular, cerca de 18 milhões de passageiros por ano utilizam as
estações entre Odivelas e Quinta das Conchas, comparando com os 16 milhões da
estação Cais do Sodré. Aliás, é ver a quantidade de passageiros que normalmente
descem em Campo Grande e têm de esperar pelo comboio seguinte para Odivelas
porque o comboio em que vinham inverte no termino intermédio de Campo Grande.
A existência de términos intermédios é
aliás uma solução para atenuar os chamados “movimentos pendulares”.
Existem também modos de exploração para
linhas com estas caraterísticas. Nos anos 60 e 70 o metro de Lisboa tinha
comboios expresso de Sete Rios para a Rotunda/Marquês de Pombal, entre os
comboios com paragem em todas as estações. E existem metropolitanos que fazem
comboios com paragem nas estações, digamos, pares, e outros, cadenciadamente,
com paragem nas estações ímpares. Nada que não possa resolver-se com uma boa
planificação da operação, sem os inconvenientes das perturbações de operação de
linhas circulares de pequeno diâmetro e sem linhas transversais suficientes
para alternativas.
Além de que uma rede de metro deve ser
estruturante, isto é, viabiliza a organização do território misturando
habitação, produção secundária e terciária e os consequentes polos geradores de
emprego.
Por outras palavras, se existem períodos de
rarefação acentuada no diagrama diário de cargas, isso indiciará desorganização
do território (desertificação da cidade, predomínio do transporte individual, fecho
de industrias, deslocalização de empresas, abandono agrícola, por exemplo).
A referencia à linha do Oeste é
importante, numa altura em que se tenta a sua reabilitação, mas seria também
interessante considerar o seu prolongamento de Meleças para Oeiras ou para
Cascais, ajudando a “compor” a malha ferroviária da AML.
Relativamente às duas sugestões
de linhas suburbanas penetrando no centro da cidade anota-se apenas que teriam
de ser maioritariamente subterrâneas (exceção no vale de Alcantara), portanto
caras, e coincidindo muitas vezes com o traçado de metro existente.
Mas será interessante aprofundar as suas valências que se julga poderem ser conseguidas com uma conveniente expansão da rede do metro ( por exemplo a correspondência com a estação do Alvito) articulada com modos complementares mais ligeiros (LRT, cabinas autónomas, frotas partilhadas de automóveis elétricos e de duas rodas).
Mas será interessante aprofundar as suas valências que se julga poderem ser conseguidas com uma conveniente expansão da rede do metro ( por exemplo a correspondência com a estação do Alvito) articulada com modos complementares mais ligeiros (LRT, cabinas autónomas, frotas partilhadas de automóveis elétricos e de duas rodas).
Finalmente, é de destacar com
agrado a referencia às ligações diametrais, lembrando a travessia Crossrail em construção
em Londres e, em parte o Grand Express de Paris, o que sugere a avaliação de
novas travessias do Tejo para melhor integração da margem sul na AML (dinamizando
a expansão do metro sul do Tejo) e, evidentemente, um cuidado e
participativo planeamento estratégico da
mobilidade na AML.
PS em 29 de fevereiro de 2020 - No contexto atual de atribuição progressiva de competências no âmbito da mobilidade à AML, e de avaliação da constitucionalidade da suspensão da linha circular e de urgencia no aproveitamento dos fundos comunitários, seria interessante a própria câmara de Loures, através dos seus serviços técnicos, elaborar o estudo prévio do eixo do traçado do prolongamento do metro do término de Odivelas a Loures, respeitando os limites de pendentes (4%) e de curvas (500m), sugerindo-se como referido um parque dissuassor e de correspondencia com autocarros, junto do Hospital Beatriz Angelo e percursos transversais segregados do tráfego automóvel de modos ligeiros (LRT, cabinas autónomas on demand, frotas partilhadas). Esse estudo prévio poderia servir de base para o estudo de impacto ambiental.
Esta ligação parece prioritária relativamente ao prolongamento do metro a partir da "bifurcação" da estação Moscavide, para Portela, Sacavem e Bobadela, de que se chegaram a estudar algumas hipóteses de traçados na Ferconsult. Assunto relacionado com o previsto festival da juventude na foz do Trancão mas a integrar, juntamente com a problemática das novas travessias do Tejo e eventual desagregação da linha vermelha em Moscavide, na estratégia global da mobilidade na AML
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