terça-feira, 25 de agosto de 2015

Os decisores - hipócritas e especialistas de ressemantização



Não vale a pena gastar cera com ruins defuntos, sempre disse o meu amigo, mas eu não resisto.
Vocês, os decisores de Bruxelas e os vossos seguidores locais, sois uns hipócritas.
Hipócrita - que demonstra um pensamento diferente do que realmente tem
Dizem que querem combater o desemprego, mas quando pregam as vossas reformas, isto é, a desvalorização do fator trabalho e a baixa dos salários e das pensões, sabem muito bem que estimular o desemprego faz baixar os custos dos salários e dos preços (é a lei de Philips, como muito bem sabem mas nunca citam, invocando o mandato do BCE para manter o indice de preços no máximo de 1,9% ).
A experiencia já demonstrou que isso já não é inflação, é deflação. Pelo que seria interessante subir o objetivo do nivel de preços, até porque as taxas de juro têm margem para subir  para o controlar.
Vocês são assim especialistas na arte da sangria, que de facto faz baixar a tensão arterial do sangrado, permitindo-lhe retomar esforços, mas à custa de sangue.
Vocês também conhecem a fórmula do saldo orçamental, investimento menos poupanças mais exportações menos importações. Mas insistem em não facilitar os investidores (quem investe? sabendo que os produtos que iria fabricar seriam vendidos muito, muito baratos, graças aos salários baixos e ao desemprego elevado; só em procuras rígidas, mas essas já estão tomadas...).
E então repetem sem cessar, é preciso continuar as reformas, as reestruturações e a competitividade.
Tudo isso tem uma tradução: cortes, redução de custos do trabalho, dos salários à facilidade de despedimento. O que quer dizer que vocês são também, para além de hipócritas, especialistas de ressemantização.
Ressemantização - neologismo semântico, atribuição a uma palavra de outro significado para além do existente.
Eu acho que a Academia das Ciências (das Letras, no Brasil), devia proibir. Chamem as coisas pelos seus nomes.
PS - Devo a aprendizagem da palavra ressemantização ao programa da Antena 2 Páginas de português, transmitido aos domingos.

Os decisores - Metternich

Que podia um pobre cidadão fazer ao assistir contrariado à tortura dos negociadores gregos submetidos ao poder tão firmemente estabelecido dos decisores na Europa?
Meditar um pouco nos mecanismos de legitimação dos decisores, não eleitos pelos cidadãos mas nomeados e nalguns casos eleitos pelos representantes dos partidos mais votados.
Também Bossuet legitimava o poder absoluto pelo desígnio divino e as pessoas (algumas) acreditavam.
Também Metternich, chanceler emergente do congresso de Viena como representante da grande aristocracia alemã e vienense, estava legitimado pelo seu imperador, o "pai" dos seus súbditos.
Atribuo aos atuais decisores da União Europeia, sucessores de Metternich, a mesma legitimidade que os poderes contrarevolucionários apostados em anular as ideias da revolução francesa tiveram?
Sim, atribuo, isto é, nenhuma.
Como pobre cidadão impotente entretive-me a ler algumas passagens dum livro que descreve o declínio da Austria como potencia aglutinadora da ideia de Europa no século XIX, até à explosão na derrota na primeira guerra mundial - Declínio e queda do império dos Habsburgo. 1815 -1918, de Alan Sked.
Lá se descreve o reacionarismo de Metternich, ilustrado com o facto de ter cortado relações com Portugal depois da queda de D.Miguel.
Os cidadãos conformistas da altura também achavam que Metternich era um grande político.
Como agora os cidadãos conformistas acham que os decisores do Eurogrupo e os seus suportes bancários e financeiros têm razão.
O conformismo faz parte da psicologia da espécie humana. Perante um assunto complexo (e como é complexa a ideia de uma Europa unida, que já era a do império austro hungaro, embora de uma forma autocrática), o movimento do individuo aguarda a formação da opinião pelo grupo e depois obedece à orientação da autoridade, ou de quem em quem confia. Por isso os eleitores se conformam com os seus dirigentes, mesmo que eles os conduzam aos infernos austeritários e à desvalorizaçõ dos seus salários e pensões em detrimento dos equilíbrios orçamentais dos bancos e grupos financeiros.
Pôde portanto Meternich pavonear-se e ostentar o seu poder tentando conduzir a politica europeia pós Napoleão.
Porém, a revolução de 1848 forçou a sua destituição e a abdicação do imperador.
Mas o sistema imperial manteve-se, reprimindo a democracia, dissipando dinheiro com os gastos militares (ocupação da Itália, por exemplo), assistindo à ascensão prussiana e conduzindo a Austria à decadencia e guerra. Apesar da vida cultural e científica florescer em Viena, de Mahler, Klimt a Freud.
Habilmente, as "santas" democracias ocidentais aproveitaram para dividir os restos do império, atrasando a concretização da ideia europeia, seguindo as suas politicas anteriores (guerra da Crimeia, guerra dos Balcans).
Esperemos que os burocratas de Bruxelas, aparentemente tão preclaros como os imperadores austríacos, não produzam os mesmos efeitos.
Dependerá dos eleitores conformistas e dos não conformistas.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Os decisores - as bolinhas e os tributários das praias

O vendedor de bolinhas explica calmamente: este ano é diferente, só posso vender bolinhas, não posso vender pasteis de amendoa. É preciso uma licença para vender bolas de Berlim, que não é considerado bolo, e outra para vender pasteis e outros bolos. Ah, mas posso vender donuts, com a mesma massa das bolinhas. Mas a patroa só pagou licença para vender deste lado da praia. Do outro lado são outros colegas que vendem. E só há licenças para o conjunto dos 12 meses do ano, tivemos de pagar o ano todo.
Felicitações aos tributários que assim combatem a economia paralela e satisfazem o seu complexo de escrúpulo de regulamentar ao ínfimo pormenor (sintoma de provável insegurança com raízes em traumas de infancia), em vez de adotar critérios amigáveis de acordo mútuo por volume de vendas estimado. Os vendedores aceitam, precisamente porque o fator trabalho já foi tão desvalorizado que é a única maneira de ganhar algum dinheiro no verão.
E retiremos a lição, uma bola de Berlim não é um bolo.
Preocupante? Talvez, o surrealismo expandiu-se nos anos 30, imediatamente antes da segunda guerra mundial. Esperemos que sejam só coincidencias.

domingo, 16 de agosto de 2015

Decisores - o inexperiente Sergio Monteiro

Este blogue não se regozija por ter ficado sem efeito o contrato de subconcessão do metro do Porto e dos STCP, antes lamenta a impreparação e as desajeitadas ações do senhor secretário de Estado ao intervir em assuntos de transportes.
Mexer em empresas públicas que em comparação com homólogas estrangeiras apresentavam indicadores razoáveis com o argumento de ir poupar milhões de euros só podia revelar desconhecimento e ímpeto e fervor adolescente nas suas convicções neoliberais.
Preocupante neste momento a obsessão de lançar novo concurso "antes do fim do mês".
O que aconteceu neste concurso deslustra o governo português e o setor dos transportes nacional em geral. Quem iria responder a um concurso assim, numa altura em que ainda se discutem remunerações do anterior subconcessionário?
Também preocupante o caso da subconcessão aos especialistas de autocarros,  a Avanza, do metro de Lisboa. Estimo um prejuízo de 10 milhões de euros para o subconcessionário no primeiro ano.
E recordo a frase desalentada de Thatcher; "Não quero que os transportes sejam o meu Waterloo".
Tenhamos ao menos  a esperança deste governo perder as eleições.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Os decisores


Imagem retirada do DN, com a devida vénia, após a reeleição do senhor Daisselblum como presidente do Eurogrupo.
É talvez, se tentarmos uma abordagem semiótica,  uma boa imagem do que são os nossos decisores. Foram eleitos, não pelos cidadãos contribuintes, mas por ministros nomeados por vencedores de eleições nos respetivos países.
Decidem de modo que condicionam a vida dos cidadãos eleitores, e a verdade é que uma grande parte dos cidadãos eleitores europeus acreditam que é legitimador o vínculo entre as eleições para os governos e a eleição pelos ministros das finanças no Eurogrupo.
Bossuet também no século XVII convenceu muita gente que era legítimo o vínculo entre o nascimento do filho do rei e o poder absoluto que ele depois exerceria sobre o povo, nomeadamente exaurindo as finanças em aventuras guerreiras ou luxos na corte.
A ciencia política já evoluiu o suficiente para pôr em causa qualquer destes vínculos.
Que garantias existem, sem mecanismos referendadores como os desenvolvidos pelas comunidades científicas, que a vontade de eleitorados é respeitada por um grupo de ministros que raramente conheceu diretamente as dificuldades quotidianas dos cidadãos ou das empresas produtivas? Alguma vez estes senhores terão analisado ou resolvido problemas de pessoal numa empresa que tivesse de apresentar indicadores de produção, para virem agora pregar academicamente medidas de liberalização de despedimentos para aumento de competitividade? E eles são competitivos em quê? em ganhar eleições ou em apresentar indicadores razoáveis numa empresa de produção?
Observo a imagem e vem-me à memória um filme de guerra dos anos setenta.
Não me recordo do nome nem do realizador e atores. Recordo-me que o heroi, soldado americano prisioneiro do exercito nazi, esteve quase a ser fuzilado porque na recolha dos bens nas ruinas de uma casa destruida pelo exército alemão guardara uma estatueta que lá encontrara. Uma estatueta igual à da sua infancia (e vêm agora encher a boca com a globalização...). O filme terminava muitos anos depois, com o heroi velhinho a fazer conferencias nos USA em defesa da paz universal, e a ser assassinado por um adepto do militarismo republicano. Penso que o realizador se terá inspirado em Garry Davis (https://en.wikipedia.org/wiki/Garry_Davis ).
Recordo o filme porque o ator que fazia o papel de major das SS do destacamento que tinha o heroi como prisioneiro era extremamente parecido com o senhor ministro do canto esquerdo da imagem.E
o ator que representava o gauleiter colaboracionista da povoação mais próxima da ação era extremamente parecido com o  senhor ministro eleito presidente do Eurogrupo, zeloso cumpridor, a personagem de ficção do filme, das regras dominantes.
Mas não me lembro no filme de ninguém parecido com a terceira personagem (será o senhor ministro finlandês? tão cioso de cumprir o mandato dos seus eleitores de não emprestar a preguiçosos, ou como recordo da instrução primária, os meninos bem comportados e bem alimentados, com apoio extra em casa, que chamavam a atenção da senhora professora que já tinham a redação pronta, ou os exercícios de matemática feitos, e que nunca ajudavam o colega do lado?).  Esta figura faz-me lembrar antes uma personagem da Tosca, que vi há muitos anos no Coliseu, e que os encenadores se empenham em apoucar, o esbirro de Scarpia. Os maestros também não ajudam. Talvez até Puccini não quisesse ajudar, ele que ao princípio até se deixou hipnotizar pelo canto de sereia do duce. Põem-no sempre com voz de falsete, a papaguear as instruções contra-revolucionárias de Scarpia. E sempre com um ar de menino bem comportado apesar de sádico e bem alimentado...
Mas deixem-me deixar bem claro, são os atores que representavam aqueles papeis que me parecem parecidos com as figuras da imagem, nada mais.

PS em 12 de agosto - Em intenção de algum dos comentadores que no Observador clamam que os eleitores alemães têm o direito de não querer emprestar mais dinheiro à Grécia e que poderia escandalizar-se ao ler o meu texto, complemento-o com a convicção de que sim, o mandato dos eleitores alemães será o de quererem garantir a segurança do seu futuro. Mas também penso que esse é mandato dos eleitores gregos. Se eles são incompatíveis isso só poderá significar a incompetencia destes senhores decisores. Não são capazes , desculpando-se com o tratado de Lisboa (algum tratado é infalível e imutável?), de fazer o que os USA fizeram com a bancarrota da Califórnia...
Gostaria também de deixar registado o que vários think tanks, alguns alemães, já colocaram como hipótese com elevada probabilidade de confirmação. Se é verdade que o agravamento das taxas de juro do financiamento da Grécia coincide com a baixa das taxas de juro do financiamento alemão (o que confirmaria a natureza física da conservação da massa monetária e da sua capacidade de reprodução concentrada nas zonas de maior potencial económico, como reza o teorema de Fermat-Weber), isto é, que se não houvesse Grécia as taxas de juro da Alemanha eram superiores, então é possível contabilizar quanto esta já poupou em juros. As contas deram 100 mil milhões de euros. Ora, a contribuição da Alemanha para os resgates da Espanha, Portugal e Grécia foi de 90 mil milhões. Quer dizer que a desgraça alheia grega significou um lucro alemão de 10 mil milhões. Pegaram neles e investiram na Grecia (não me dês o peixe, dirão os gregos, dá-me a cana para pescar)? Não parece. Como pois posso deixar de chamar incompetentes a estes decisores?