segunda-feira, 10 de agosto de 2015
Os decisores
Imagem retirada do DN, com a devida vénia, após a reeleição do senhor Daisselblum como presidente do Eurogrupo.
É talvez, se tentarmos uma abordagem semiótica, uma boa imagem do que são os nossos decisores. Foram eleitos, não pelos cidadãos contribuintes, mas por ministros nomeados por vencedores de eleições nos respetivos países.
Decidem de modo que condicionam a vida dos cidadãos eleitores, e a verdade é que uma grande parte dos cidadãos eleitores europeus acreditam que é legitimador o vínculo entre as eleições para os governos e a eleição pelos ministros das finanças no Eurogrupo.
Bossuet também no século XVII convenceu muita gente que era legítimo o vínculo entre o nascimento do filho do rei e o poder absoluto que ele depois exerceria sobre o povo, nomeadamente exaurindo as finanças em aventuras guerreiras ou luxos na corte.
A ciencia política já evoluiu o suficiente para pôr em causa qualquer destes vínculos.
Que garantias existem, sem mecanismos referendadores como os desenvolvidos pelas comunidades científicas, que a vontade de eleitorados é respeitada por um grupo de ministros que raramente conheceu diretamente as dificuldades quotidianas dos cidadãos ou das empresas produtivas? Alguma vez estes senhores terão analisado ou resolvido problemas de pessoal numa empresa que tivesse de apresentar indicadores de produção, para virem agora pregar academicamente medidas de liberalização de despedimentos para aumento de competitividade? E eles são competitivos em quê? em ganhar eleições ou em apresentar indicadores razoáveis numa empresa de produção?
Observo a imagem e vem-me à memória um filme de guerra dos anos setenta.
Não me recordo do nome nem do realizador e atores. Recordo-me que o heroi, soldado americano prisioneiro do exercito nazi, esteve quase a ser fuzilado porque na recolha dos bens nas ruinas de uma casa destruida pelo exército alemão guardara uma estatueta que lá encontrara. Uma estatueta igual à da sua infancia (e vêm agora encher a boca com a globalização...). O filme terminava muitos anos depois, com o heroi velhinho a fazer conferencias nos USA em defesa da paz universal, e a ser assassinado por um adepto do militarismo republicano. Penso que o realizador se terá inspirado em Garry Davis (https://en.wikipedia.org/wiki/Garry_Davis ).
Recordo o filme porque o ator que fazia o papel de major das SS do destacamento que tinha o heroi como prisioneiro era extremamente parecido com o senhor ministro do canto esquerdo da imagem.E
o ator que representava o gauleiter colaboracionista da povoação mais próxima da ação era extremamente parecido com o senhor ministro eleito presidente do Eurogrupo, zeloso cumpridor, a personagem de ficção do filme, das regras dominantes.
Mas não me lembro no filme de ninguém parecido com a terceira personagem (será o senhor ministro finlandês? tão cioso de cumprir o mandato dos seus eleitores de não emprestar a preguiçosos, ou como recordo da instrução primária, os meninos bem comportados e bem alimentados, com apoio extra em casa, que chamavam a atenção da senhora professora que já tinham a redação pronta, ou os exercícios de matemática feitos, e que nunca ajudavam o colega do lado?). Esta figura faz-me lembrar antes uma personagem da Tosca, que vi há muitos anos no Coliseu, e que os encenadores se empenham em apoucar, o esbirro de Scarpia. Os maestros também não ajudam. Talvez até Puccini não quisesse ajudar, ele que ao princípio até se deixou hipnotizar pelo canto de sereia do duce. Põem-no sempre com voz de falsete, a papaguear as instruções contra-revolucionárias de Scarpia. E sempre com um ar de menino bem comportado apesar de sádico e bem alimentado...
Mas deixem-me deixar bem claro, são os atores que representavam aqueles papeis que me parecem parecidos com as figuras da imagem, nada mais.
PS em 12 de agosto - Em intenção de algum dos comentadores que no Observador clamam que os eleitores alemães têm o direito de não querer emprestar mais dinheiro à Grécia e que poderia escandalizar-se ao ler o meu texto, complemento-o com a convicção de que sim, o mandato dos eleitores alemães será o de quererem garantir a segurança do seu futuro. Mas também penso que esse é mandato dos eleitores gregos. Se eles são incompatíveis isso só poderá significar a incompetencia destes senhores decisores. Não são capazes , desculpando-se com o tratado de Lisboa (algum tratado é infalível e imutável?), de fazer o que os USA fizeram com a bancarrota da Califórnia...
Gostaria também de deixar registado o que vários think tanks, alguns alemães, já colocaram como hipótese com elevada probabilidade de confirmação. Se é verdade que o agravamento das taxas de juro do financiamento da Grécia coincide com a baixa das taxas de juro do financiamento alemão (o que confirmaria a natureza física da conservação da massa monetária e da sua capacidade de reprodução concentrada nas zonas de maior potencial económico, como reza o teorema de Fermat-Weber), isto é, que se não houvesse Grécia as taxas de juro da Alemanha eram superiores, então é possível contabilizar quanto esta já poupou em juros. As contas deram 100 mil milhões de euros. Ora, a contribuição da Alemanha para os resgates da Espanha, Portugal e Grécia foi de 90 mil milhões. Quer dizer que a desgraça alheia grega significou um lucro alemão de 10 mil milhões. Pegaram neles e investiram na Grecia (não me dês o peixe, dirão os gregos, dá-me a cana para pescar)? Não parece. Como pois posso deixar de chamar incompetentes a estes decisores?
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