Que podia um pobre cidadão fazer ao assistir contrariado à tortura dos negociadores gregos submetidos ao poder tão firmemente estabelecido dos decisores na Europa?
Meditar um pouco nos mecanismos de legitimação dos decisores, não eleitos pelos cidadãos mas nomeados e nalguns casos eleitos pelos representantes dos partidos mais votados.
Também Bossuet legitimava o poder absoluto pelo desígnio divino e as pessoas (algumas) acreditavam.
Também Metternich, chanceler emergente do congresso de Viena como representante da grande aristocracia alemã e vienense, estava legitimado pelo seu imperador, o "pai" dos seus súbditos.
Atribuo aos atuais decisores da União Europeia, sucessores de Metternich, a mesma legitimidade que os poderes contrarevolucionários apostados em anular as ideias da revolução francesa tiveram?
Sim, atribuo, isto é, nenhuma.
Como pobre cidadão impotente entretive-me a ler algumas passagens dum livro que descreve o declínio da Austria como potencia aglutinadora da ideia de Europa no século XIX, até à explosão na derrota na primeira guerra mundial - Declínio e queda do império dos Habsburgo. 1815 -1918, de Alan Sked.
Lá se descreve o reacionarismo de Metternich, ilustrado com o facto de ter cortado relações com Portugal depois da queda de D.Miguel.
Os cidadãos conformistas da altura também achavam que Metternich era um grande político.
Como agora os cidadãos conformistas acham que os decisores do Eurogrupo e os seus suportes bancários e financeiros têm razão.
O conformismo faz parte da psicologia da espécie humana. Perante um assunto complexo (e como é complexa a ideia de uma Europa unida, que já era a do império austro hungaro, embora de uma forma autocrática), o movimento do individuo aguarda a formação da opinião pelo grupo e depois obedece à orientação da autoridade, ou de quem em quem confia. Por isso os eleitores se conformam com os seus dirigentes, mesmo que eles os conduzam aos infernos austeritários e à desvalorizaçõ dos seus salários e pensões em detrimento dos equilíbrios orçamentais dos bancos e grupos financeiros.
Pôde portanto Meternich pavonear-se e ostentar o seu poder tentando conduzir a politica europeia pós Napoleão.
Porém, a revolução de 1848 forçou a sua destituição e a abdicação do imperador.
Mas o sistema imperial manteve-se, reprimindo a democracia, dissipando dinheiro com os gastos militares (ocupação da Itália, por exemplo), assistindo à ascensão prussiana e conduzindo a Austria à decadencia e guerra. Apesar da vida cultural e científica florescer em Viena, de Mahler, Klimt a Freud.
Habilmente, as "santas" democracias ocidentais aproveitaram para dividir os restos do império, atrasando a concretização da ideia europeia, seguindo as suas politicas anteriores (guerra da Crimeia, guerra dos Balcans).
Esperemos que os burocratas de Bruxelas, aparentemente tão preclaros como os imperadores austríacos, não produzam os mesmos efeitos.
Dependerá dos eleitores conformistas e dos não conformistas.
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