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e
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2017/02/expansao-da-linha-amarela-do-metro.html
o
metro chega a Alcântara
Este texto é uma ficção. Os decisores do
governo central e da cidade ao longo dos anos nunca compreenderam o papel
estruturante da ligação de metropolitano de Alcântara ao centro de serviços de
Lisboa.
Não
foi possível prolongar a linha que ficou no Rato, embora a galeria tenha sido
construída até junto do jardim da Estrela, servindo como zona de inversão e de
garagem.
Não foi possível prolongar a linha que ficou
em S.Sebastião.
Mas este texto imagina que sim, que era para
continuar até Campolide, que, sendo a construção da estação de Campolide muito
cara por ser muito profunda, não se fez a estação e continuou-se até às
Amoreiras, e por Campo de Ourique se chegou a Alcântara, compatibilizando, num
exercício de pura ficção, o término do metro com o serviço dos terminais
marítimos de cruzeiros e de mercadorias.
É no entanto provável que haja algumas
concidências entre a realidade e a ficção, mas nem eu sei dizer quais, nem
sequer se o terminal marítimo de Alcântara, com os seus painéis de Almada
Negreiros e a memória trágica das partidas da tropa para África, ainda faz serviço
de cruzeiros ou de contentores.
Quando estava no seu gabinete, Joana tomava uma atitude de
muita concentração. Por isso mal deu por mim quando entrei e comecei a examinar
uma coleção de fósseis, encontrados nas escavações da obra.
Recusou com secura quando lhe pedi que me deixasse levar uma
turritela de dimensões razoáveis.
Disse que os fósseis já eram património do metropolitano,
pegou no capacete e no colete de segurança e rapidamente saiu do gabinete.
– Vou à obra, queres vir?
Não respondi, mas fiz menção de a acompanhar, atrasando-me,
apenas para poder vê-la afastar-se pelo corredor, deslizando compassadamente
sobre as suas botas de ir à obra, e observar as diferenças do balanço das suas
articulações em comparação com os saltos muito altos que gostava de usar.
Joana tinha o defeito de ser muito fechada no relacionamento
que tinha com a administração. Não gostava de deixar transparecer nada do que
tratava com ela.
As reuniões gerais de controle do planeamento da obra vinham
rareando, e Joana não se sentia à vontade para tomar decisões ou dar andamento
às nossas propostas.
Como diretora da obra de expansão até Alcântara, Joana
reportava diretamente ao vice-presidente da administração e coordenava a
intervenção dos projetistas de construção civil da afiliada FERCONSULT.
Eu intervinha como coordenador dos meus colegas responsáveis
pelas especialidades caraterísticas de metropolitanos, como a sinalização
ferroviária, a energia de tração, as telecomunicações aplicadas, a via férrea.
As reuniões serviam para a equipa de planeamento detetar as
ameaças ao cumprimento do cronograma e para analisarmos propostas de solução.
Era aí que Joana revelava incomodidade. O administrador
dava-lhe instruções, ou dizia-lhe para não seguir as nossas propostas, mas não
escrevia as suas ordens.
Por mais de uma vez pedi a Joana que insistisse em ordens
escritas, especialmente depois de ele ter recusado alterações importantes ao
projeto das estações para facilitar o acesso de pessoas com mobilidade
reduzida.
Joana era uma profissional
responsável, já com provas dadas em anteriores empreendimentos, com as contas
finais dentro do orçamento original.
Porém, o inicio da obra tinha sido penoso devido a
dificuldades de expropriação e de elaboração do estudo ambiental, por motivo
dos riscos de inundação da bacia de Alcântara. A zona é de terrenos aluvionares
junto da ribeira entubada e da doca de aterro, e motivou cuidados especiais na
elaboração do projeto do viaduto onde se situaria o término, com
correspondência dos passageiros com a linha suburbana de Cascais e, através de
um funicular, com a linha suburbana da ponte 25 de abril. A solução do viaduto
foi relutantemente aceite pela Câmara de Lisboa, que invocava as interferências
visuais no Palácio das Necessidades e na Fundação do Oriente. Porém, o
argumento de poupança energética ao evitar-se o maior declive se o término
fosse enterrado, e os menores custos de construção do viaduto, foram
determinantes da aprovação.
As dificuldades construtivas foram sendo ultrapassadas aos
poucos, caso a caso, complicando a evolução do cronograma contratual e
suscitando dúvidas sobre o seu cumprimento.
Sobreveio ainda outro motivo de atraso, ao partir do próprio
metro a iniciativa de alterar o projeto contratual da estação Maria Pia, na
fronteira do bairro de Campo de Ourique, junto do flanco sul do cemitério dos
Prazeres, construída já em viaduto, de modo a garantir a futura correspondência
com o prolongamento da linha do Rato para Algés.
Foi ainda moroso o processo de aprovação do projeto de um
grande parque de estacionamento junto do centro comercial das Amoreiras,
integrado no plano de urbanização da zona norte de Campo de Ourique, para
transferência para o metropolitano dos utilizadores da autoestrada de Cascais.
Tudo isto provocou atrasos, uns da responsabilidade do
metropolitano, outros da responsabilidade do consórcio de empreiteiros.
A fiscalização
demorou-se na análise.
Por essa altura tinha-se deteriorado gravemente o
relacionamento entre o presidente e o vice-presidente da administração.
O presidente suspeitava de ligações do vice-presidente com o
famoso gabinete que estivera na origem do túnel do Marquês e com grupos de
interesses imobiliários que tinham comprado extensas porções de terrenos em
Alcântara, com os restos da anterior vida industrial da zona, a preços baixos
por motivo dos condicionamentos do plano diretor municipal, e que tinham
pressionado a assembleia municipal até o alterarem. Presumiam-se elevadas mais
valias ilícitas, quiçá com destino a cofres de partidos.
Sem conseguir provar nada, o presidente, como economista,
julgou poder obter receitas que contrariassem os resultados negativos normais
num metropolitano através da aplicação de uma multa ao consórcio construtor por
não ter a obra pronta no prazo previsto e porque tinha revisto o cálculo de
betão armado da placa de cobertura da estação Maria Pia, prolongando a execução
da obra da estação.
O vice-presidente não transmitiu a ordem a Joana e, sempre
sem ordens escritas, determinou a negociação com o consórcio da aceleração dos
prazos de execução.
Quando 6 meses depois o presidente insistiu, a fiscalização
elaborou à pressa um relatório por medida, que o presidente enviou ao diretor
coordenador com ordem para aplicação da multa. Mas a ordem ficou esquecida na
lista de documentos do sistema informático de gestão documental no computador
do diretor coordenador.
Joana estava de férias, depois de ter deixado um memorando
com o ponto da situação, também ofuscado no computador do diretor pela chuva de
documentação do sistema.
No regresso de férias, tinha à sua espera um processo de
inquérito com a acusação de favorecimento indevido dos empreiteiros. Como
habitualmente, os auditores cingiramse a aspetos jurídicos e contabilísticos e
fundamentaram à administração o despedimento com justa causa.
Felizmente, veio a repetir-se o episódio da resposta do
pequeno agricultor a Frederico o Grande, “ainda há juízes em Berlim”.
Joana contestou em tribunal do trabalho o despedimento e
ganhou a ação.
O empreendimento da extensão a Alcântara foi concluído sob a
direção de outro colega, com respeito pelo orçamento inicialmente previsto,
como era timbre de Joana.
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