segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Comentários ao seminário "Shaping the future of mobility" no LNEC de 10 a 12nov2021 de iniciativa do CRP e da UIC

 

                                          ÍNDICE

 

Shaping the future of Mobility”

1º dia
Que futuro para o transporte ferroviário em Portugal e Espanha
para passageiros e mercadorias?

2º dia
Financiamento das infraestruturas de transporte
Futuro do transporte urbano de passageiros
Equipamentos e serviços no transporte do futuro
Inovação e desafios tecnológicos do sistema de transportes europeu

3º dia
Arquitetura e regulação dos transportes
Impacto do Green Deal no sistema de transportes europeu


Fecho pelo ministro das Infraestruturas e Habitação



                                      “Shaping the future of Mobility”

 

 

Nota:   O presente texto não relata em pormenor as intervenções no seminário, embora reproduza o programa detalhado, a relação dos participantes e alguns dos diapositivos apresentados; pretende apenas deixar o registo dos comentários a algumas das intervenções, nomeadamente as que diziam respeito à política ferroviária portuguesa, internacional, nacional, regional e urbana, sublinhando algumas propostas. Os interessados poderão obter mais informação quando as apresentações estiverem no sítio do CRP. As opiniões expressas vinculam apenas o autor e podem ser citadas mesmo sem referência da origem.

 

 

O seminário “Shaping the future of Mobility”, que decorreu no LNEC, de 10 a 12nov2021, organizado pelo CRP e UIC, foi um interessante ponto de encontro e de situação da ferrovia em Portugal e na Europa, de passageiros e mercadorias, internacional, nacional, regional e urbana. Pelo nível dos participantes nacionais e comunitários, pela atualidade dos temas no contexto da descarbonização, do Green Deal e do Fit for 55, e pela abrangência dos temas, tratou-se  de um importante seminário que poderá estimular um desejado debate sobre a estratégia ferroviária a seguir em Portugal.

Programa detalhado, mostrando as entidades envolvidas, com destaque para as organizações da EU, mobilizadas ao abrigo do ano internacional da ferrovia :

http://futureofmobility.crp.pt/wp-content/uploads/2021/11/PROGRAMA_V2021.11.08_SIMPLES.pdf

https://europa.eu/year-of-rail/index_pt    

Sem de modo nenhum retirar mérito à iniciativa, até porque foi uma realização presencial, observo que poderia ter havido vantagem em abrir a participação pela internet, o que permitiria um debate mais alargado, e em realizá-lo com o apoio de tradução simultânea do inglês para português, pela mesma razão.

 

Comento os temas tratados:

1       - 1º dia

1– Que futuro para o transporte ferroviário em Portugal e Espanha para passageiros e mercadorias?   Moderadores J.Manuel Viegas (1.1 a 1.3) e Francisco Furtado (1.4)

1.1   – Plano ferroviário Nacional -  Frederico Francisco (MIH)

1.2   – Visão para o futuro da cooperação ibérica para a interoperabilidade da infraestrutura            - Mario Fernandes (IP) e Fernando Nicolas (ADIF)

 

Comentário :    

Recordados os objetivos comunitários (transferência de 30% até 2030 e 50% de carga rodoviária; duplicação relativamente a 2015 do tráfego de mercadorias e triplicação do tráfego de alta velocidade até 2050.

Recordadas as velocidades médias do transporte individual nas zonas urbanas, 5km/h (peão) e 10 km/h (autocarro)

A proposta linha Lisboa-Porto em 1h15min servirá também de rebatimento das ligações das capitais de distrito a Lisboa e Porto em detrimento de ligações regionais com transbordo. Isso retirará capacidade à linha que poderia ser aproveitada para o transporte de mercadorias, beneficiando dos parâmetros mais favoráveis numa linha nova para o rendimento do transporte (curvas e pendentes; no percurso para a Europa existem na rede portuguesas e espanhola troços com 2,4% quando o indicado será de 1,2%) Sines-Aveiro-Leixões.

Verifica-se também na área metropolitana de Lisboa uma vontade de privilegiar ligações diametrais pelo exterior do núcleo urbano em detrimento de ligações radiais, provavelmente pelo despovoamento do centro de Lisboa.

Sobre a coordenação com Espanha assinala-se a quase exclusiva preocupação em garantir o transporte de mercadorias para Espanha em detrimento da Europa além Pirineus. Foi apresentado um mapa de exportações que aparentemente deverá ser atualizado por indicar 82% de exportações para Espanha, 6% para França e 3% para a Alemanha. Segundo o INE,  o volume de exportações em 2020 para Espanha pelos modos terrestres foi de 10,1 milhões de toneladas e por modo marítimo 1,6  milhões, o que compara com as exportações para o conjunto de países europeus (FR+AL+BE+NL+UK+IT)  de 5,1 Mton por modos terrestres e 4,6 Mton por modo marítimo .  No entanto, a situação inverte-se considerando o valor das exportações em mil milhões de euros (kM€):

para Espanha:                     13 kM€   por modos terrestres e 0,9 kM€ por modo marítimo

para o grupo europeu:     18,2 kM€  por modos terrestres e 4,4 kM€ por modo marítimo

 

Considerando apenas o tráfego rodoviário, os números do INE para 2020 são:

 

para Espanha:                       9,9 Mton   e 13 kM€

para o grupo europeu:        4,7 Mton  e  17,7 kM€    

 

Admitindo uma transferência de 30% de carga rodoviária para  a ferrovia até 2030 e 1500 toneladas de carga por comboio, teríamos necessidade de 6 comboios por dia para Espanha e 3 comboios por dia para o resto da Europa. Para uma transferência de 75% teríamos 15 comboios por dia para Espanha e 6 ou 7 comboios por dia para o resto da Europa. De notar o menor valor unitário das exportações para Espanha, provavelmente confirmando o recente relatório da DG Trade da CE (EU exports to the world, effects on employment) reconhecendo o peso das baixas qualificações nas exportações portuguesas.

https://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2018/november/tradoc_157516.pdf

Estes números parecem sugerir a urgência de uma decidida implementação das redes ferroviárias de interligação com a Europa além Pirineus para suportarem sem constrangimentos o desejável aumento de tráfego ferroviário, implicando naturalmente a mudança da atual política de privilégio das ligações com Espanha em bitola ibérica (atualmente através da ação do AEIE RCF4 (agrupamento europeu de interesse económico do corredor atlantico de mercadorias RCF4) e o desenvolvimento do transporte de camiões e semirreboques por comboio (autoestradas ferroviárias).

Nada se depreendeu neste sentido das intervenções dos representantes de MIH, IP e ADIF no sentido de uma efetiva coordenação ibérica para a interoperabilidade incluindo a bitola UIC e o ERTMS. Apenas se referiram os trabalhos de adaptação da via ao aumento do comprimento dos comboios para  750m, que é na realidade um fator de aumento de rendimento.

Refiro a política diferente da ADIF, dividida em duas subempresas, a ADIF para a rede convencional e a ADIF  para a Alta Velocidade (AV) com orçamentos e gestão separados.

Relativamente à ligação Porto-Vigo, considerada prioritária pelo governo português ao arrepio do regulamento 1315, seria uma boa medida o pedido de inclusão na rede core TEN-T simultaneamente com a calendarização da rede de mercadorias em bitola UIC na Galiza.

Não foi feito neste seminário o balanço dos atrasos do plano Ferrovia 2020, em que vários itens (p.ex.Linha do este Torres Vedras-Caldas da Rainha, linha do Algarve Tunes-Lagos, linha de Cascais, metrobus do Mondego) já não poderão ser concluídos em 2023, não beneficiando de fundos comunitários.

https://www.publico.pt/2021/11/18/economia/noticia/governo-falha-prazos-ferrovia-2020-projectos-derrapam-2023-1985362  

Espera-se agora a implementação do Acordo de Parceria 2030 ou a inclusão no plano Portugal 2030 (alocação aproximada de investimentos: Parceria 2030: 51 kM€ compostos por PT2030 23kM€ + PRR 17 kM + PAC 10 kM€ + REACT 2 kM€ ; PT 2030 composto por FEDER 11,5 kM€ + FSE 7,5 kM€ + F.Coesão 3,5 kM€ + F.Trans.Justa 0,2 kM€ + F.Ass.Mar 0,4 kM€).

https://www.portugal.gov.pt/pt/gc22/comunicacao/noticia?i=acordo-de-parceria-do-portugal-2030-preve-23-mil-milhoes-de-euros-em-fundos-estruturais

As razões apresentadas são “complexidade técnica”, omitindo-se as burocracias, as deficiências da lei de contratação pública e o progressivo esvaziamento da classe técnica em benefício das hierarquias políticas dificultando a organização e a coordenação de equipas de projeto. Se de facto há estes obstáculos, seria sensato, não por falta de qualificações dos técnicos, mas por falta de condições reais de trabalho, requisitar para  Portugal os programas de assistência técnica da EU.

 

   

1.3 -  Cooperação ibérica e estratégia nacional para o serviço de passageiros -  Fátima Teles (CP) e Manuel Villalante (RENFE)

1.4 -  Estratégia para o serviço de mercadorias na península ibérica e internacional – Bruno Silva (Medway), Alvaro Fonseca (Takargo) J.Gaomartin Quiñones (Transfesa)

 

Comentário :    

                                                                                                                                                                                                                     

Apesar das boas intenções demonstradas pelos oradores, será muito difícil assegurar um serviço de passageiros atrativo, entre Portugal e Espanha e com a França (comboios noturnos), com a rede existente ou projetada em Portugal e, embora com menor gravidade, também do lado de Espanha. Admitindo, o que não foi confirmado no seminário, que em 2030 estará em exploração a linha de AV entre Madrid e Badajoz, com troços em bitola ibérica/travessas polivalentes e troços exclusivamente em bitola UIC, será possível a ligação Madrid-Badajoz, por Toledo, em 2h45min com material circulante de eixos variáveis. A ligação Lisboa-Madrid poderá então fazer-se em 4h45min, o que não é competitivo com o avião. Mais um argumento para melhorar a coordenação e cooperação Portugal-Espanha em moldes diferentes dos AEIE.

Apesar da sintonia com a política do governo português dos operadores de mercadorias, foram referidas dificuldades decorrentes das limitações das infraestruturas, nomeadamente que o planeamento muitas vezes não atende aos procedimentos concretos dos operadores.

Assinalada a dificuldade de implementação do ERTMS/ETCS e do aproveitamento do CONVEL através do desenvolvimento do STM (specific transmission module).

Referidos pelo representante da Transfesa (70% DB) as potencialidades da tecnologia de eixos de bitola variável no transporte de mercadorias, permitindo a mudança de bitola em 10 minutos sem paragem  (sem contestar a valia desta solução tecnológica, e a sua operacionalidade, nem a tecnologia praticada há muito pela Transfesa, de eixos intermutáveis, recordam-se a definição de normalização e as dificuldades de assistência técnica não disponível longe do fabricante espanhol).

Recordados pelo representante da Transfesa os argumentos de defesa do transporte ferroviário de mercadorias  (combate às alterações climáticas, ao congestionamento e às mortes prematuras por poluição) curiosamente na véspera da divulgação do início de mais um processo  de infração da CE contra  Portugal devido à má qualidade do ar em várias regiões (5000 mortes prematuras por ano, ou 5% do total de mortes por ano).

https://eco.sapo.pt/2021/11/12/ue-avanca-contra-portugal-no-tribunal-de-justica-devido-a-ma-qualidade-do-ar/

 

 

Comentário sobre os debates:

Curiosamente, apesar de relativamente numerosas a assistência não colocou questões no tempo reservado ao debate no 1º dia, cabendo aos respetivos moderadores encontrar temas de diálogo com os oradores. Provavelmente isso dever-se-á à já alargada divulgação da estratégia ferroviária oficial portuguesa apresentada sistematicamente como firmemente definida e pouco sensível a argumentos contrários. Em contraste foi relativamente vivo o debate sobre a mobilidade urbana no 2º dia e deserto o debate sobre os mecanismos de regulação no 3º dia, com a particularidade de aqui a assistência ser muito reduzida, o que não é seguramente um bom sintoma.

 


 

 

2          - 2º dia

2.1– Financiamento das infraestruturas de transporte     Moderadora Lidia Sequeira

2.1.1        -  Como aumentar o suporte financeiro do investimento em infraestruturas –Miguel Morgado (BEI)

2.1.2        – Experiência espanhola nos mecanismos financeiros europeus – Manuel Fresno (ADIF)

2.1.3        – Experiência europeia no apoio aos investimentos nacionais – Christian Faure (CINEA  Agencia Executiva Europeia do Clima, Infraestruturas e Ambiente)

2.1.4        – experiência portuguesa – Maria do Carmo Ferreira (IP)

 

 

Empréstimos anuais concedidos pelo BEI   66 kM€ para toda a EU, dos quais 2, 3 kM€  em 2020 para Portugal. Não há financiamento para aeroportos.

 

A ADIF mostrou o seu dinamismo através do seu representante que destacou os corredores internacionais e as áreas metropolitanas, recorrendo a green bonds.  Financiamento do BEI: 85% para a ADIF AV E 62% para a ADIF convencional.

 

A CINEA sucedeu à  INEA  Agencia Executiva de Inovação e Redes e é o organismo comunitário para apoiar a implementação do Green Deal europeu, desde o mecanismo CEF (Connecting Europe Facility)  à Transição Justa, à Inovação (Horizonte Europa, R&I), à politica marítima, às interligações de energias renváveis. O seu representante destacou como especialmente elegíveis para financiamento os “missing links”, as ligações transfronteiriças e a política de coesão. CEF1 até 2024, CEF2 desde jul2021, CEF 2021-2027   25,8 kM€ .

 

Destaque para a revelação de que a IP tinha um projeto de financiamento para a expansão do terminal da Bobadela, comprometido pela ordem de saída para as Jornadas Mundiais da Juventude e criação de zona de lazer.

 



 

 

2.2   Futuro do transporte urbano de passageiros. Oferta dos serviços urbanos e suburbanos na perspetiva da integração modal e centrada nos passageiros. Novos meios, sistemas e equipamentos para aumento da eficiência -  Moderadora Rosário Macário :

2.2.1 – Tiago Braga (Metro do Porto)

2.2.2 – Tiago Farias (Carris) 

2.2.3 – Vitor Santos (Metro de Lisboa)

2.2.4 – Cristina Dourado (Fertagus)

2.2.5 – Joaquim Guerra (CP)

 

Comentário:

 

Evidenciado pelos oradores o carater de sustentabilidade do transporte urbano no contexto do Green Deal  e do Fit for 55, a disponibilidade de novos meios de gestão e o paradoxo do transporte individual – TI – sinónimo de prosperidade, comprometer essa sustentabilidade.

O metro do Porto evidencia dinamismo, elegendo a descarbonização como grande desafio. O crescimento da sua rede tem seguido as opções da maior parte das câmaras da sua área metropolitana e não, como em Lisboa, dependente da decisão discricionária do governo. Esta opção tem o risco de alguns traçados poderem estar desintegrados dum plano geral a que se juntam as limitações da partilha de troços, comuns a várias linhas. No entanto, o que é positivo, o plano de expansão parece orientar-se no sentido de vias integralmente segregadas com ligação do centro às periferias, incluindo a segunda travessia do Douro. Poderão ter-se reservas relativamente ao conceito de futura linha circular, cobrindo pequena área, e à experiencia com o BRT, que devido à maior resistência ao movimento pneu-asfalto tem pior rendimento energético relativamente à roda-carril de material ferroviário ligeiro.

 

 

Relativamente ao metro de Lisboa, foi mostrado o plano de expansão em curso, da linha circular (estimativa de 240 milhões de euros do fundo ambiental e do POSEUR) já em construção parcial (1º lote Rato-Santos) e do prolongamento a Alcantara Terra (300 milhões de euros).

No período de debate pedi ao representante do metro detalhes sobre o traçado da chegada a Alcantara Terra e perguntei-lhe se o metro e a Carris estavam coordenados com a atualização do PROTAML com o objetivo de elaboração do plano de mobilidade da AML conforme a diretiva da Assembleia da Republica.

Sobre a primeira questão foi-me respondido que o projeto se encontrava em fase de preparação da avaliação ambiental e portanto só depois seriam divulgados os detalhes (verifica-se assim que o metro vai cometer o mesmo erro do projeto da linha circular, decidindo o traçado da linha antes da consulta pública e todos os argumentos contra foram rejeitados no RECAPE, contrariando mais uma vez as disposições constitucionais que atribuem aos cidadãos o direito de participar nos assuntos públicos).

Sobre a segunda questão foi-me respondido que ao entrar no metro em 2017 os técnicos propuseram ao novo presidente a linha circular, decidida pela secretaria de estado dos Transportes em 2009 (curiosamente, a comunicação social em 19nov2021 dá outra versão, que a decisão foi tomada por uma administradora do metro em junho de 2016, portanto antes da entada do presidente e antes da elaboração do estudo de viabilidade pela VTM, entregue em fevereiro de 2017 e cuja divulgação tem sido recusada). O interesse de debater o plano de mobilidade prende-se com a iniciativa do LIOS, uma rede LRT que na prática poderá ser apenas a modernização da antiga linha de elétricos (tramways), limitada em termos de velocidade comercial pelo tráfego automóvel.

 

  

2.3   Equipamentos e serviços no transporte do futuro – Moderador Rui Calçada

2.3.1 – Inovação e transportes sustentáveis. Papel dos novos sistemas e soluções técnicas

2.3.1.1 – Michael Frankenberg (Siemens)

2.3.1.2 – João Salgueiro (Thales)

2.3.1.3 – Paulo Duarte (PFP)(Plataforma ferroviária portuguesa)

2.3.2 – Segurança ferroviária num mundo em automação acelerada

2.3.2.1 – Luis Gargaté (Critical Software)

 

 

Comentário:

 

Destaco pelo poder de síntese e de sistematização da apresentação do representante da Siemens centrada nas aplicações da digitalização aos transportes urbanos e em áreas de baixa densidade, nomeadamente do tipo “on demand” (áreas rurais, de baixa densidade, “first e last mile”, fora das horas de ponta, shuttles autónomos).

Insisto que este é um modo a desenvolver, de preferência através do departamento de estudos do metro, para compatibilização das suas infraestruturas com as pistas dedicadas dos PRT autónomos, “PRT lanes” (ver o último diapositivo da Siemens).

Destaque para a meritória atividade da PFP e a sua ligação ao Horizonte Europa 2021-2027.

Da intervenção da Critical Software destaco a importância dada ao ERTMS, que desde já constitui um problema para a rede nacional, e a chamada de atenção para eventuais erros de software contra a segurança por convergência de falhas (de sensores, por exemplo).

 


 

 

 

2.4   -  Inovação e desafios tecnológicos do sistema de transportes europeu – Moderador  Eduardo Fortunato

2.4.1 – Estratégia de inovação para a Europa – Carlo Borghini (Rail Joint Undertaking)

2.4.2 – Compromisso da UIC na estratégia digital e de inovação – François Davenne (UIC  União Internacional dos Caminhos de Ferro)

2.4.3 – O papel dos fornecedores e a estratégia europeia – Nicolas Furio (UNIFE União das Industrias Ferroviárias Europeias)

 

Comentário:

 

Como nos anteriores seminários do ano internacional da ferrovia, o representante da Rail Joint Undertaking (parcerias publico-privadas para a investigação e inovação, ex Shift2Rail) destacou a importância das passagens de fronteira sem constrangimentos, dando como exemplo o DAC, digital automatic coupling para economia de tempo no acoplamento de vagões e transferência do modo marítimo para o ferroviário. O mesmo raciocínio se aplica à diferença de bitolas ou falta de interoperabilidade dos outros parâmetros, destacando a importância da normalização de modo a que o mesmo veículo vá de uma capital a outra sem problemas de assistência específica e, no caso dos passageiros, progressivamente subindo o grau de automatização (de momento ETCS nível 2).

O representante da UIC igualmente destacou a importância das ligações sem constrangimentos, da inovação considerando o conjunto operação-manutenção,  da análise dos percursos porta a porta e da transferência de parte significativa da carga rodoviária para a ferrovia:

https://www.globalrailwayreview.com/news/126206/rail-industry-fit-for-55/

.

O representante da associação de fabricantes UNIFE realçou o papel do PRR (RRF Recovery and Resiliency Facility) na estratégia da descarbonização (redução de emissões relativamente a 1990 de 55% até 2030), mostrando alguns  valores do total de 672,5 kM€ (dos quais 55 kM€ já comprometidos) aplicáveis a vários Estados membros, incluindo Portugal (expansão dos metros de Porto e Lisboa e Light rail de Odivelas).

Um dos assistentes colocou a questão do hyperloop como probabilidade de inovação. Não havendo ainda dados seguros das experiencias em curso, nem sendo conhecido o levantamento rigoroso dos requisitos energéticos (uma das firmas em ensaios fala da força aplicada à válvula de vácuo idêntica ao esforço de tração de uma locomotiva, i.e. cerca de 300 kN, o que associado à velocidade da ordem dos 800 km/h dá cerca de 70 MW para uma cápsula de 30m de comprimento e 5m de secção) e dos parâmetros de velocidade e capacidade de transporte, é legítimo admitir que nestes critérios, apesar da velocidade máxima de 350 km/h na ferrovia de AV, esta seja competitiva relativamente ao hyperloop, nomeadamente em termos de rendimento energético (dispensa a energia para o vácuo e a energia para sustentação e afastamento da envolvente) e capacidade de transporte (produto da velocidade comercial pela densidade espacial dos veículos e pela capacidade por veículo). O hyperloop poderá ter aplicação num núcleo restrito, não para transporte massivo (não parece haver segurança se o intervalo entre cápsulas for inferior a 2 segundos, considerando as desacelerações em caso de emergência, suportáveis pelo organismo humano). Dada a complexidade deste tema seria desejável que as empresas que desenvolvem o hyperloop clarificassem o seu balanço energético, nomeadamente o indicador energia primária por passageiro-km.

 

 

 

 

3       -  3º dia

 

3.1 – Arquitetura e regulação do transporte – Moderador Luis Oliveira

3.1.1 – A área única ferroviária europeia – Keir Fitch (DG MOVE)

3.1.2 – Desafios da ERA (Agencia europeia ferroviária) para os próximos anos – J.Doppelbauer (ERA)

3.1.3 – Compromisso português da National Safety Authority – Eduardo Feio (IMT Instituto da Mobilidade e Transportes)

3.1.4 – Funcionamento do setor de regulação – Ana Paula Vitorino (AMT Autoridade da Mobilidade e Transportes)

 

Comentários:

 

A intervenção do representante da DG MOVE mostrou claramente os seus objetivos no sentido do alinhamento dos corredores internacionais de mercadorias com o plano das redes transeuropeias TEN-T com o que isso significa de normalização simplificando a travessia das fronteiras, de recurso à digitalização, nomeadamente no domínio da conetividade, da intermodalidade e da bilhética, de implementação do ERTMS e de parcerias público-privadas (Rail Joint Undertakings sucessor do Shift2Rail).

Recordou os objetivos do Green Deal e do Fit for 55, de que destacou a significativa transferência modal da carga rodoviária (atualmente 75 % do total da carga na Europa) para a ferrovia, a duplicação do tráfego de Alta Velocidade até 2030 e triplicação até 2050, a redução de 55% das emissões de CO2 até 2030 e incremento do tráfego de mercadorias 1.5 x até 2030 e 2 x até 2050.

 

 

 

  O representante da ERA sintetizou os objetivos da política comunitária ferroviária da CE, nomeadamente a interoperabilidade das redes nacionais, a passagem das fronteiras sem constrangimentos, a certificação d material circulante, a conveniência de acelerar a aplicação do ERTMS,  a regulação da segurança, a segurança cibernética, a taxação do carbono e o pagamento pelo poluidor, a necessidade da rede europeia da ferrovia a propósito do 4th railway package “mentalizar-se”  (“mindset”) para concretizar os objetivos.  

 

 

No período de debate que se seguiu às exposições dos representantes da DG MOVE  e da ERA  entendi, considerando a referência frequente pelos oradores à interoperabilidade e ao cruzamento das fronteiras sem constrangimentos, colocar a questão do incumprimento dos objetivos da rede TEN-T na península ibérica em termos de ligações além Pirineus para mercadorias em bitola UIC e ERTMS e em termos de linhas de Alta Velocidade também em bitola UIC e ERTMS no território nacional. Perguntei se a DG MOVE, apesar da sintonia com o governo português relativamente à estratégia ferroviária deste, poderia emitir uma recomendação instando o governo português a desenvolver esforços para cumprir as prioridades do regulamento 1315/2013, que incluem o uso da bitola de 1435mm, como uma das medidas para facilitar as exportações para a Europa em modos de transporte mais sustentáveis, alterando a estratégia do governo e dos agrupamentos AEIE de interesse económico AVEP (Alta velocidade Espanha-Portugal) e RCF4 corredor de mercadorias, no fundo, a exemplo do Rail Baltica. 

Como seria de esperar, a resposta foi diplomática, de quem não gostaria de criar conflitos com o governo português, dizendo que compete a este tomar as decisões e que as análises de custos benefícios não justificam os investimentos em novas linhas para o resto da Europa (observo no entanto que esta resposta contraria a natureza vinculativa dos regulamentos comunitários e que existem procedimentos na CE, os processos de infração (infringement), quando os Estados membros não os cumprem; igualmente se recorda as disposições do TFUE no sentido de investimentos para apoio às regiões periféricas).

 

 

Dada pelo representante do IMT a informação de que o IMT desempenha as funções de autoridade de segurança NSA (National Safety Autority) incluindo o gabinete de investigação de acidentes ferroviários  e que o IMT representa Portugal na ERA.

Os planos do IMT estão perfeitamente alinhados com a estratégia do MIH para o PFN, incluindo a linha Lisboa-Porto-Galiza independente do plano das redes TEN-T do regulamento 1315/2013.

 

 

Da intervenção da representante da AMT

https://www.amt-autoridade.pt/comunica%C3%A7%C3%A3o/not%C3%ADcias/semin%C3%A1rio-internacional-shaping-the-future-of-mobility/

 

parece poder concluir-se haver zonas de conflito de competências, incluindo a atribuição clara de funções como o estudo e a preparação de planos de mobilidade e de escolha de traçados e modos de transporte, entre governo, câmaras municipais, CCDRs, AMT, sem que seja possível evitar que os critérios políticos predominem sobre os critérios técnicos. Idêntico problema no domínio dos concursos públicos para as PSO (Public Services Obligations).  Trata-se de assuntos que requerem urgente esclarecimento porque, como foi dito, já não há tempo para implementar todos os meios de descarbonização se se debaterem os planos.

Por outro lado, tendo sido citado o pedido da B-Rail de lançar serviços de passageiros em 2023 ao que a CP solicitou a análise da ameaça de falta de equilíbrio económico (EET  Economic Equilibrium Test), parece ser da máxima importância comparar com o que se passa em Espanha com a liberalização do uso das infraestruturas. Aparentemente os incumbentes não têm sofrido e os novos operadores (espanhois, franceses e italianos)têm tido proveitos sem prejuízo para os passageiros. Poderá concluir-se que o problema estará na fraca qualidade das infraestruturas em Portugal (como aliás referido neste seminário nas intervenções dos operadores de carga em Portugal), consequência não de falta de qualificações mas sim do grave desinvestimento feito ao longo de vários anos e legislaturas. Sabendo-se que, apesar de tudo, alguns dos operadores que atuam em Espanha mantêm o interesse em atuar em Portugal através de , por exemplo, intenções de compra, isso poderá ser mais um argumento para pressionar a DG MOVE no sentido de agilizar processos de assistência técnica a Portugal que por sua vez agilizariam  a assistência financeira através dos fundos comunitários (estes exigem a elaboração dos anteprojetos e das análises de custos benefícios cuja omissão induz sistematicamente atrasos na execução das obras).

  

 

 

3.2 – Impacto do Green Deal no sistema de transportes europeu - Moderador  Manuel Duarte Pinheiro (3.2.1 e 3.2.2)  e  Simon Fletcher (UIC) (3.2.3 a 3.2.6)

3.2.1 – Expetativas da DG MOVE na estratégia do Green Deal – Keir Fitch (DG MOVE)

3.2.2 - Visão do ITF (International Transportation Forum) sobre a estratégia de descarbonização e a contribuição dos transportes – Kim Young Tae (ITF)

3.2.3 – Compromissos da Comunidade europeia de operadores ferroviários (CER) – Alberto Mazzola (CER)

3.2.4 – Papel dos gestores de infraestruturas (IMs) para o aumento da eficiência operacional dos caminhos de ferro. Estado da arte  -  Bardo Schetinni  (EIM  European Rail Infrastructure Managers)

3.2.5 – O que se pode esperar da ação da UITP – Mohamed Mezghani (UITP União Internacional dos Transportes Públicos)

3.2.6 -  Expetativas dos clientes – Sandra Lima (EPF) (Federação europeia de passageiros)

 

 

 

Comentário:

 

Apresentadas pelo representante da DG MOVE  as metas para 2030-2035 em todos os modos de transporte,  30 milhões de automóveis e 80.000 camiões zero emissões, 2 x o tráfego de AV e 1,5 x o tráfego de mercadorias , transporte de carbono neutro para todos os percursos de menos de 500 km, equilíbrio no transporte de carga rodoviária e por ferrovia/canais interiores (o que deveria estimular a solução do transporte de camiões e semirreboques por comboio – autoestradas ferroviárias) , zero mortos em acidentes, ligações sem constrangimentos por falta de interoperabilidade, aviões e navios zero emissões (o que a ser possível fará sobressair as questões da eficiência energética por pass-km e ton-km e dos congestionamentos em portos e nas estradas), automação multimodal e digitalização e inteligência artificial para a mobilidade inteligente (bandeiras – flagship 6 e 7).

 

 

 

  

Teve muito interesse o contacto com o representante do ITF , uma organização sediada na OCDE em Paris, intergovernamental com 63 países entre os quais Portugal:

 https://www.itf-oecd.org

O seu representante focou a atividade do ITF em estudos de descarbonização dos transportes , digitalização (mobilidade como um serviço, veículos autónomos), conetividade, acessibilidade inclusiva, segurança, saúde. Propõe uma visão holística composta pelo desenvolvimento tecnológico e pelo aperfeiçoamento do comportamento. Citou o exemplo dos países nórdicos como uma aproximação à melhoria da mobilidade urbana.

 

 

 

Realce para a constatação do representante da CER de que a generalização do ERTMS necessita de especial  incentivo. Preocupações centradas na conclusão das redes TEN-T com a devida normalização, racionalização da bilhética, digitalização da operação e manutenção, valorização profissional, melhoria da coordenação intergovernamental para os corredores de mercadorias e de AV, integração dos nós urbanos, portos e aeroportos nas redes TEN-T, fixação da velocidade mínima de 160 km/h para serviço de passageiros, aplicação do ETS Emissions Trading System.

Citado o caso do Rail Baltica como exemplo correto de integração nas redes TEN-T de países com bitola diferente da UIC.

 

https://www.cer.be/sites/default/files/press-release/2021-07-14_CER%20Press%20release%20Fit%20for%2055_0.pdf

 

 

 

 

Da intervenção do representante da EIM, como organização de gestores de infraestruturas, destaco a chamada de atenção para a reduzida quota do transporte de mercadorias por ferrovia (7%) e a necessidade de garantir uma transferência de carga rodoviária (cerca de 75% de quota atual) para  a ferrovia e canais interiores porque aos referidos 7% correspondem menos de 3% de emissões desde a origem primária. Impõe-se uma aceleração do processo de construção da rede única europeia, atendendo a que segundo os relatórios dos coordenadores dos corredores TEN-T apenas 20% do plano está executado.

 

 

 

Do representante da UITP, pela importância da integração dos nós urbanos nas redes TEN-T e da redução de emissões pela transferência do transporte individual para o transporte coletivo, destacou a manutenção dos serviços durante a pandemia e a necessidade de atualizar os conceitos da mobilidade urbana no sentido da plena integração multimodal e complementaridade, relativamente aos modos de grande capacidade, de modos como os shuttles autónomos a pedido preferencialmente em sítio próprio (a exemplo das ciclovias).

 

 

 

 

A representante da Federação de Passageiros EPF evidenciou o trabalho desenvolvido para benefício dos passageiros. Referiu a utilidade dos silos auto, das adaptações a pessoas de mobilidade reduzida, da bilhética simples, do poluidor pagador, das medidas para recuperação dos passageiros pós Covid e da necessidade de medidas comunicacionais eficazes.


 


 

 

4          Fecho pelo ministro das infraestruturas e habitação

 

 

Para além de confirmar a estratégia adotada pelo governo, IP e AEIE de exclusividade da bitola ibérica e de privilégio das exportações para Espanha em detrimento do resto da Europa e da recuperação da rede e frotas existentes relativamente a linhas novas de parâmetros para melhor rendimento, o senhor ministro referiu que é bom haver uma controvérsia sobre a bitola (bitola ibérica em oposição a bitola UIC a utilizar de raíz em linhas novas segundo o mapa das redes TEN-T).

Para evidenciar a maior eficiência energética da ferrovia relativamente às soluções rodoviárias, referiu ainda o estudo de um fabricante de automóveis que na mineração de lítio e cobalto avaliou em cerca de 80 kg por kWh de bateria produzida a emissão de CO2, o que para uma bateria de 50 kWh equivaleria a cerca de 30.000 km de um automóvel de combustível fóssil de 150 g de CO2 por km .

Pena que da controvérsia não resulte uma discussão aberta com alinhamento dos argumentos de um lado e doutro e sua comprovação, esclarecendo definitivamente que não se pretende em sentido literal “migrar” a bitola (embora seja isso que está escrito no regulamento 1315), mas apenas construir de raíz as linhas novas TEN-T em bitola UIC e ERTMS especificadas pelo regulamento 1315.

Se a controvérsia fosse levada a sério, provavelmente provocaria a introdução de alterações na política oficial, considerando o carater vinculativo do regulamento 1315 sobre a interoperabilidade, a maior eficiência energética de linhas novas comparativamente com as existentes e o maior valor das exportações para a Europa além Pirineus relativamente às exportações para Espanha.

 

 

 

 

 

CONCLUSÕES

 

Retiro as seguintes conclusões, como mais importantes do meu ponto de vista:

1 – mantendo-se a politica do governo português, da IP e dos AEIE de exclusividade da bitola ibérica nos percursos previstos no regulamento 1315 como integrando a rede única europeia, resulta urgente promover a alteração dessa política através da sensibilização da DG MOVE e dos governos espanhol e francês para que, não sendo possível cumprir o objetivo de 2030 para as ligações de alta velocidade Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid e de mercadorias à Europa além Pirineus em bitola UIC e ERTMS, se minimize o atraso do início da sua operação.

2 – a recente confirmação dos objetivos do regulamento 1316 em consequência do Green Deal e do Fit for 55, para uma significativa transferência para a ferrovia de carga rodoviária atualmente com uma quota de 75% (omitindo desta vez a referência ao transporte marítimo de longa distancia), permite estimar, em função das estatísticas do INE de 2020 (10 Mton de exportações para Espanha, 4,2 Mton de exportações para França, Alemanha, Bélgica, UK, Itália) que serão necessários  15 comboios diários por sentido de 1500 toneladas para Espanha e 6 comboios para a Europa além Pirineus, o que não parece compatível, pelas limitações na travessia dos Pirineus associadas à bitola ibérica, com a politica oficial. Tendo os representantes dos organismos europeus enfatizado no seminário a travessia das fronteiras sem constrangimentos e a interoperabilidade da rede única europeia, parece legítimo que os mesmos organismos recomendem ao governo português a alteração da sua estratégia analogamente, por exemplo, ao Rail Baltica e ao Corredor mediterraneo.

3 – para evitar problemas às empresas de camionagem e aos seus funcionários, deverá desenvolver-se desde já o transporte de camiões e semirreboques em comboio, assim como das caixas móveis (swap bodies) refrigeradas (apoio à exportação de produtos agrícolas)

4 – relativamente à mobilidade urbana na área metropolitana de Lisboa, assinale-se a grave omissão da atualização do PROTAML, o não menos grave esquecimento da convenção de Aarhus (acesso público aos procedimentos ambientais) e a grave omissão   da elaboração de um plano de mobilidade da AML (PAMUS) aberta à participação das associações profissionais e empresariais, das universidades, da imprensa especializada e dos cidadãos. É desejável que as empresas de transporte, nomeadamente a Carris e o metro, diligenciem junto da CCDRLVT , da AML/Câmaras municipais  e da AMT/IMT o arranque coordenado desse plano, ou lançamento de um concurso público internacional.

https://ec.europa.eu/environment/aarhus/

5 – tendo ficado bem clara no seminário a necessidade de modos complementares dos modos urbanos de maior capacidade (metro, LRT) utilizando a internet, não foram no entanto pormenorizadas as soluções de integração desses modos em interfaces com os modos de maior capacidade. Isso implicaria por exemplo dimensionar de modo diferente as estações para comportarem bases para frotas partilhadas de bicicletas e autos ligeiros e os interfaces com as vias segregadas de PRT (personal rapid transit) autónomos a pedido (“on demand” via internet ou rede de consolas dedicadas) e de ciclovias.

6 – Relativamente ao problema do financiamento anota-se a repetida evocação da disponibilidade no seminário da EU ao abrigo do CEF, fundos de coesão e PRR, o que implica da parte dos Estados membros a produção dos anteprojetos das novas linhas e de análises de custos benefícios e de viabilidade, incluindo a ponderação das externalidades da não execução do investimento.

 

Reitera-se o aplauso à conceção e organização do seminário e à generalidade dos intervenientes.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


A ferrovia na e para a Europa - apreço pelo jornalismo da Investigate Europe na divulgação da problemática da ferrovia

 

Caro Carlos Cipriano

 

Como cidadão, agradeço-lhe a série de artigos sobre a ferrovia, quer europeia, quer nacional, que tem vindo a publicar no Público.

Os agradecimentos são naturalmente extensíveis ao colega Paulo Pena, nos artigos da Investigate Europe,   ( https://www.investigate-europe.eu/en/2021/whats-the-problem-with-european-railways-your-questions-answered/

https://www.investigate-europe.eu/en/2021/derailed-europe-railway/   )

 

Sobre os artigos da Investigate Europe e os artigos no Publico “o grande descarrilamento” e “os comboios têm um problema de comunicação”          (https://www.publico.pt/2021/11/28/economia/investigacao/comboios-descarrilamento-europeu-1986118    ;     https://www.publico.pt/2021/11/28/economia/noticia/comboios-europeus-problema-comunicacao-1986120 ) , gostaria de comentar que a análise do vosso colega Amilcar Correia (Investigue-se) está corretíssima quando apelida a política da Comissão Europeia de “dúplice”. Como diz o dicionário, dúplice significa dissimulada, falsa, fingida, ardilosa, enganosa, hipócrita. Porquê? Porque são muito bonitas as palavras que ouvimos nos seminários do International Year of the Rail de que a ferrovia é o melhor caminho para o Green Deal e blá, blá. Mas depois vem a senhora comissária Adina dizer que não podem obrigar nenhum operador a explorar travessias transfronteiriças não viáveis comercialmente  (http://fcsseratostenes.blogspot.com/2021/11/o-que-diz-adina.html ). Vem também a assessora do coordenador do corredor atlantico informar que a estratégia da CE/DG MOVE está em sintonia com a do governo português e que as análises custo benefício para as interligações ferroviárias além Pirineus são “pobres” e por isso só se poderá fazer o up grade da rede existente  (https://manifestoferrovia.blogspot.com/search?q=isabelle ). Fizeram alguma ACB para poderem dizer isso? A evolução das exportações contraria a opção de ficarmos reduzidos ao mercado ibérico (ver números adiante).

Essas declarações contradizem o estabelecido no regulamento 1315 (objetivo: espaço único coeso e redes transeuropeias), no Tratado de Funcionamento da União Europeia (política de coesão abrangendo região periféricas) e no regulamento 1316 (transferência de carga rodoviária para o modo ferroviário), contradizem ainda os objetivos do Green Deal e do Fit for 55.[1]

O coordenador do corredor atlantico existe para acelerar a execução dessas ligações até 2030, conforme o regulamento 1315.

 

Por isso são dúplices e merecem severo comentário, sugerindo eu encaminhamento das reportagens da Investigate Europe para a ombudswoman da União Europeia.

 

Não parece ser este o entendimento do governo português, através do senhor ministro das Infraestruturas, ao centrar a discussão com a CE na liberalização e na separação de operadores e gestores de infraestruturas (“separação roda-carril”), e ao abster-se de promover as referidas interligações de acordo com todos os parâmetros da interoperabilidade e de acordo com os traçados do regulamento 1315. Trata-se, a liberalização e a separação operação/infraestruturas,  de uma questão interessante, mas, salvo melhor opinião e fundada em experiência profissional mais sólida do que a minha (apenas testemunhei a separação no metro de Londres, com a estrondosa falência de uma das companhias de infraestruturas, enquanto aconteciam acidentes com recém chegados operadores privados no UK, na Belgica, na Holanda, na Alemanha; não admira que os incumbentes de França e da Alemanha sejam prudentes) é uma questão académica, especialmente porque o regulamento 1370/2007 admite a coexistência pacífica de Estados membros com operador/infraestrutura fundidos e Estados membros com eles separados, com empresas incumbentes e com empresas privadas.[2]

 

É portanto uma questão falsa que no contexto atual serve para desviar a atenção do objetivo 2030 das redes transeuropeias, com a indispensável coordenação com Espanha e incluindo o início urgente da preparação das autoestradas ferroviárias (transporte por comboio de camiões ou semirreboques).

 

Sobre outros artigos publicados recentemente no Público, gostaria de comentar:

- “projetistas contra-atacam”      (https://www.publico.pt/2021/12/04/economia/noticia/projectistas-contraatacam-criticam-governo-atrasos-ferrovia-2020-1986798 ) – este é mais um exemplo dos malefícios da lei da contratação pública. Em 2008, durante a fase de divulgação pública da lei pelo gabinete de advogados seu autor, tive oportunidade de propor sugestões que foram olimpicamente recusadas. De facto o critério não pode ser principalmente o preço e deve considerar-se a valia técnica da proposta, as referências e experiência do proponente. Deve utilizar-se a pré qualificação e só abrir as propostas económico-financeiras depois de classificadas as propostas técnicas. Do concurso deverá constar um anteprojeto com os traçados minimamente  avaliados, aliás condição essencial para uma correta ACB “ex ante” (como se receia o que vai ser o concurso para a nova linha Lisboa-Porto…)

- “congelamento de 5% da privatização da CP Carga”     (https://www.publico.pt/2021/12/05/economia/noticia/governo-congela-privatizacao-parte-cp-carga-1986533 ) – já é de suspeitar se como dizem os sindicatos a privatização foi quase uma oferta, mas vamos reconhecer que a gestão da Medway e da Takargo é correta e garante empregos (critica-se a politica oficial por exemplo pelo desmantelamento do terminal da Bobadela e pela inercia que não deixa resolver o problema do ERTMS), pelo que é inadmissível que não se execute a distribuição dos 5% pelos trabalhadores .

A propósito da referência a Carlos Vasconcelos/Medway neste último artigo, cito-o numa entrevista à Railway Gazette de 1out2021:

 

“It’s evident that I, as a railway operator, would like to have standard gauge. It would be much easier. I don’t have to arrive at the border with France and change bogies or trains. It would be much easier to have standard gauge freight routes across the Iberian peninsula, but they don’t exist.”

 

Numa altura em que as exportações portuguesas de bens crescem:

- em 2020 exportaram-se para Espanha por modos terrestres 10,1 milhões de toneladas e para os principais destinos europeus 5,1 milhões de toneladas;

- de janeiro a setembro de 2021, o total de exportações cresceu 4,8% relativamente ao mesmo período de 2019 (pré pandemia);

- de janeiro a setembro de 2021 exportaram-se para Espanha 10 milhões  de toneladas  e para os principais destinos europeus 7 milhões de toneladas (quase tudo por camião em ambos os casos).

Com este crescimento, é lícito tirar a conclusão que, se como diz Carlos Vasconcelos, com a bitola standard é mais fácil mas ela não existe entre Portugal e o resto da Europa, então o que há a fazer é instalá-la para benefício das exportações (e menor pegada ecológica nas viagens Lisboa-Madrid de passageiros).

Nem que para isso se tenha de invocar o princípio comunitário da subsidiariedade (apoio da UE quando o Estado membro não consegue, art.5 do TFUE).

 

Reiterando o apreço pelo vosso trabalho, envio

 os melhores cumprimentos




Investigue-se, por Amílcar Correia:

 








[1] art.93 do TFUE ,  considerandos 37 e 49 do regulamento 1316/2015 que tratam dos serviços públicos nacionais e internacionais e reembolsos em serviços não comercialmente viáveis, art.4 do regulamento 1315/2015 que determina os objetivos da rede única ferroviária europeia e art 50 (projetos transfronteiriços)

[2] considerandos 5 e 12 do regulamento 1370/2007.

 

 

sábado, 4 de dezembro de 2021

Reportagens sobre a linha circular do metro em novembro e dezembro de 2021

 


Entrevistas ao eng Moedas e reportagem de Ana Leal sobre a linha circular:

https://www.youtube.com/watch?v=hGiZreeyHZs

https://www.facebook.com/watch/?v=1019575998599615




Exercício do direito de resposta pelo metropolitano:












Comentário ao texto do direito de resposta:

Pela mesma ordem:
1 - O conceito de "derrapagem de custos" é um pouco subjetivo e seria necessário estudar as reais implicações das dificuldades de fornecimento e da subida de preços de materiais de construção, elementos de que não se dispõe. Penso que a ideia da reportagem seria que raramente os custos reais coincidem com as previsões, o que aliás tem consequencias negativas na contratação pública
2 - a profundidade de escavação diminui à aproximação do quartel dos bombeiros, junto do ISEG que teve uma má experiencia, e será otimista dizer que não implicará com a instabilidade dos terrenos devido à presença de água, mas evidentemente que se espera que não haja acidentes
3 - a experiência em manutenção de redes ensina que os sistemas de sinalização e de controle automático também avariam, e que nessas alturas terá de haver intervenção humana, mas não foi esse o problema focado. Se a exploração da linha circular for "partilhada" com a da linha atual de Odivelas, como afirmado pelo ex secretário de Estado da Mobilidade eng.José Mendes, o comboio da linha circular no itinerário da Cidade Universitária para Campo Grande terá de cruzar de nível com o comboio que de Odivelas se dirija para a Cidade Universitária. Se o Metro afirma que não haverá cruzamentos, isso significa, e é positivo, que não haverá partilha da linha circular com a linha de Odivelas-Cidade Universitária-etc
4 -a experiência em operação de redes ensina que, dadas as caraterísticas de intervalos curtos entre comboios (frequencias elevadas) um excesso de afluencia retarda um comboio numa estação implicando o retardamento dos outros; a necessidade de retirar um comboio também; numa linha circular a recuperação desses atrasos é mais dificil do que numa linha com términos; no caso de uma avaria, a experiencia ensina que antes que se tenha a certeza de que tipo de avaria se trata, e isso pode levar tempo com os atrasos a acumularem-se, a circulação nas duas vias deve estar suspensa; um dos piores acidentes da história dos metropolitanos ocorreu na Creia do Sul por não se ter respeitado esta regra (o incendio num comboio propagou-se ao comboio da outra via cuja marcha não tinha sido suspensa). É verdade que os términos provisórios permitem a exploração "em ferradura", mas por exemplo, para retirar um comboio com os términos disponíveis será em muitos casos necessário interromper a circulação numa das vias para retirar o comboio da outra via, e se se pensa aumentar as frequencias (reduzir os intervalos, a perturbação será maior. Aliás, o cálculo da probabilidade de ocorrencia numa linha circular conduz a um resultado superior à da simultaneidade de avarias nas duas linhas independentes equivalentes. Observo qu a linha cicular de Londres passou a ser uma linha em laço em 2009.
5 - profundidade das estações - aproveito para observar que no caso da estação Parque, considerando a paragem em emergencia de dois comboios cheios com os cais cheios (total 2000 pessoas), o número de unidades de passagem para evacuação (20) é insuficiente, de acordo com a portaria 135/2020, para as escadas disponíveis, o que recomenda uma saída de emergencia para o lado da Avenida Fontes, a menor profundidade; no caso da estação Baixa, efetivamente de muito movimento, observo que, apesar da lei de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida 163/2006, não existe elevador superfície-átrio
6 - mais uma vez observo que de acordo com a CRP (arts 37 e 48), os documentos dos assuntos públicos devem ser acessíveis aos cidadãos. O estudo de procura e de viabilidade que em 2017 foi apresentado com justificativo da linha circular e referido no EIA nunca foi divulgado, apesar da resolução da Assembleia Municipal da câmara de Lisboa 122/04 de novembro de 2020 o ter pedido formalmente ao Metro. Repetindo o pedido de divulgação, solicita-se informação se o concurso em 2016 que selecionou o gabinete que executou o referido estudo apenas pedia a comparação da linha circular com o prolongamento da linha vermelha de S.Sebastião a Campo de Ourique ou se incluia outras alternativas. Relativamente às equipas da CE que validaram a decisão solicita-se informação sobre a sua constituição e especialização dos seus membros.
7 - sobre a capacidade de escoamento da estação Cais do Sodré, observo que atualmente a linha verde (que contrariamente ao afirmado no EIA permite atingir a zona do Saldanha/Av.Republica apenas com 1 transbordo) pode ter uma frequencia com intervalos de 2,5 minutos, dependendo apenas da existencia de material circulante e maquinistas para isso. Como divulgado,  está prevista uma frequencia para a linha circular para intervalos de 3min 50s
8 - registo que o Metro afirmou que estão mobilizados todos os meios necessários para acorrer a eventuais assentamentos ou deslizamentos na colina da Estrela, mas só é afirmada pelo Metro a existencia 24/7 para a monitorização, isto é, não foi garantida explicitamente a disponibilidade dos referidos meios necessários 24/7. Sobre este assunto observo que seria desejável aumentar a distancia dos instrumentos ao eixo do traçado de 25 para 100m atendendo à natureza dos terrenos
9 - relativamente aos impactos no Campo Grande, para além da agressão paisagistica dos novos viadutos existirá um acrescento também agressivo na ampliação dos cais sul para nascente.  Recordo que, a propósito da afirmação "todos os impactos foram resolvidos no RECAPE" que o comentário no RECAPE do lote 1 às críticas foi "Fora do âmbito do RECAPE", o que significa que não são consideradas as críticas. Sobre a disponibilidade de informação no sitio do metro, observo que a informação é muito limitada, encontrando-se informação já com algum detalhe nos documentos da APA (em passant, observo que a mesma ausencia de informação se verifica já na proposta de prolongamento da linha vermelha para Alcantara  (Alcantara Terra ?) tendo o Metro informado que aguarda o EIA para divulgação). Relativamente às sessões na Ordem dos Engenheiros de abril de 2018, Assembleia Municipal de Lisboa de maio de 2017 e junta de freguesia da Estrela em março de 2019 observo que os representantes do metro se limitaram a apresentar o seu projeto como facto consumado e inamovível,  sem debate de argumentos, o que seria desejável.
10 - Sobre o imobiliário de luxo, nunca foi afirmado que o Metro tinha relações com esse imobiliário, apenas se constata o facto da proximidade real das estações e do imobiliário de luxo que obviamente não pode ser desmentida e que não deverá ser utilizado como fator justificativo do traçado de uma linha de metro
11 - Sobre as "várias soluções estudadas" no PDM de Lisboa, solicita-se informação do ano do PDM ou de alterações a que a resposta do Metro se refere, sendo certo que o PDM de 30ago2012 referia-se explicitamente ao prolongamento para Alcantara sem referencia a linha circular, que a alteração ao PDM  401/2018 de 8 de novembro de 2018 refere explicitamente uma estação de metro na Av.Infante Santo e não no Hospital Principal. Adicionalmente refiro que o PAMUS de fevereiro de 2016 não continha a linha circular. Tal como o PROTAML  de 2002 sem revisões aprovadas, que incluia apenas o prolongamento a Alcantara, desta vez Alcantara Mar, e uma circular externa em LRT Algés-Loures-Sacavém.
12 - A resposta do Metro está correta, apenas se receia que o quartel dos bombeiros já não possa vir a estar ao pé da estação
Como comentário final, recordo que a lei 2/2020 de março de 2020 (não uma recomendação, mas uma lei da AR) expressamente determinava ao governo nos arts 282 e 283 que promovesse as medidas necessárias para que o Metro suspendesse a construção da linha circular, estudasse o prolongamento para Alcantara, estudasse um plano de mobilidade para a AML e dotasse as estações com                  meios de acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida. Pelo contrário, assinou o contrato do lote 1 (toscos Rato-Santos excl) e obteve o visto do TdC poucos meses depois..

PS em 9dez2021 - No seguimento de nova entrevista do presidente do metro,    https://www.tsf.pt/portugal/economia/amp/vou-implementar-o-tracado-que-a-tutela-definiu-14377576.html                               acrescentei a negrito e itálico comentários:


entrevista do presidente do metro Vitor Domingues  PorPedro Cruz (TSF) e Diogo Ferreira Nunes (DV)

Metro de Lisboa. "Vou implementar o traçado que a tutela definiu"

Só em 2025, na melhor das hipóteses, o Metro de Lisboa vai recuperar o número de passageiros que transportava antes da pandemia. A recuperação vai ser longa e lenta, mas o presidente da empresa, Vítor Domingues dos Santos acredita que os utentes vão voltar. A linha circular, que está em execução na expansão do Metro, não agrada a Carlos Moedas, que prefere uma solução em laço:. O Metropolitano de Lisboa diz que está a implementar um projeto que foi decidido pelo Ministério do Ambiente.
  • Antes de falarmos sobre o futuro: quantos utentes teve o Metro de Lisboa no último mês e como compara com novembro de 2019?

Continuamos a recuperar lentamente a procura que tivemos em 2019. Fechámos outubro com cerca de 60% [dos utentes] que tivemos em 2019. Nos últimos dias de novembro, estivemos um pouco melhores, ultrapassando os dois terços. Estamos no bom caminho mas ainda é um caminho longo até recuperarmos a procura que tivemos em 2019.

  • Ainda há uma parte de utentes que não voltou.

É uma parte significativa, de um terço dos habituais utilizadores do metropolitano. Terá, provavelmente, muito a ver com a pandemia - vamos ver como se processa nos próximos tempos -, o maior recurso ao trabalho em casa e o crescimento do comércio eletrónico - as pessoas procuram menos lojas e espaços comerciais para as suas compras. Temos uma projeção que o caminho é lento. Estamos a apontar obter uma recuperação plena dos clientes em 2024 ou 2025. Está a ser melhor do que as expectativas iniciais. Eu gostaria que se melhorasse a ventilação das carruagens, com orifícios de ventilação nas paredes junto do pavimento e painéis de acrílico separando as pessoas de pé das sentadas, mas reconheço que é complicado.

  • Quais eram as expectativas iniciais?

Ficarmos um pouco abaixo na procura, entre 50% e 60%. Aí, já é bola de cristal.

  • Sobre a expansão da rede: Quando vão abrir as novas estações de Estrela e de Santos?

O programa atual prevê a entrada em operação em 2024.

  • Em que período de 2024?

No segundo semestre de 2024. Temos duas empreitadas separadas e que se conjugam na linha circular: a mais visível é a construção dos túneis e das duas estações; depois, temos a modernização. A parte mais importante é a alteração da sinalização ferroviária, sistema antigo e que quando iniciámos o processo de expansão na rede não pensávamos em investir. Rapidamente chegámos à conclusão que o nosso sistema era tão antigo que já não conseguíamos peças para incrementar a solução atual. Daí surgiu a necessidade de alterarmos a sinalização, e em boa altura, porque vamos ficar com um sistema, para já, nas três linhas, e, depois, em todas, do mais moderno que existe no mercado e que nos dá condições para podermos trabalhar com maior segurança e conceitos que nos baixem os intervalos de circulações de comboios. Referir-se-á provavelmente ao sistema DTAV de travagem automática em caso de ultrapassagem de sinal vermelho de tecnologia dos anos 70 , e não ao sistema de sinalização cuja tecnologia é maioritariamente posterior aos anos 90 

  • Em maio, o Tribunal de Contas deu visto prévio para a compra de 14 novos comboios e de um novo sistema de sinalização, por 114 milhões e meio de euros. Quando é que este material vai chegar à rede?

As duas empreitadas vão conjugar-se no segundo semestre de 2024. Nesta altura, já estamos em pleno planeamento de fabrico de material circulante, em Valência, onde já estiveram as equipas do metropolitano. Já começámos a definir as maquetes e vamos, com as comissões de trabalho, visitar as cabines do futuro dos maquinistas. Em 2023 vamos receber a primeira carruagem. A partir daí, o material vai chegar até ao final de 2024. Contamos iniciar a operação da linha circular no segundo semestre de 2024.

  • Quando estará concluída a construção dos viadutos do Campo Grande?

Estamos em processo final de ajuste da intervenção dos estaleiros da obra e em negociações com a câmara de Lisboa, a Transportes Metropolitanos de Lisboa e o promotor imobiliário que tinha acordo para a criação do terminal rodoviário do Campo Grande para a câmara de Lisboa. Estamos na fase final para arranque da empreitada. O contrato é de cerca de 20 milhões de euros e a sua rescisão poderia ser negociada, uma vez que está por executar a adaptação de 12 estações a pessoas com mobilidade reduzida, o que é imposto por uma lei de 2006. Os dois novos viadutos são uma agressão à zona, vai ser preciso ampliar os cais sul da estação desequilibrando o seu aspeto, vão ser necessários vário aparelhos de dilatação de via devido às carateristicas dos tabuleiros dos viadutos, e a dispensa destes viadutos permitiria a exploração em laço.

  • Entre o final de 2023 e meados de 2024 poderemos começar a ver algo diferente no Metro de Lisboa.

Acho que até antes disso: as estações da Estrela e de Santos vão começar a aparecer, sobretudo a da Estrela, que está construída numa zona de maior visibilidade, em frente ao antigo Hospital Militar.

  • Depois das obras concluídas, qual deve ser o novo modelo de exploração do Metro de Lisboa? O presidente da câmara de Lisboa, Carlos Moedas, defende a linha em laço. Porquê a linha circular?

A linha circular resultou dos estudos efetuados e é a solução mais favorável em termos técnicos, económicos e ambientais. Aporta mais passageiros ao metropolitano. Mais uma vez se recorda que esses estudos não foram divulgados para se avaliar a forma como chegaram a esses resultados Esse foi o critério de escolha. De acordo com o plano de expansão definido em 2009, seguimos a primeira alínea do plano de expansão aprovado na altura pela secretária de Estado dos Transportes [Ana Paula Vitorino]: a criação de um anel circular. É a primeira vez que oiço que a linha circular era a primeira alínea. Solicita-se a indicação do numero e data do decreto lei ou da portaria ou do despacho em que o plano de expansão tenha sido publicado, ou pelo menos a referencia das reuniões intermunicipais em que o mapa tenha sido aprovado. De acordo com recente reportagem, a decisão pela linha circular, dentre as hipóteses do mapa de 2009 , foi do metro, em 2016, ainda antes da entrada de Vitor Domingues. Na altura, a tutela disponibilizou 200 milhões para o investimento. Analisámos duas opções: a linha circular e a ligação da estação de São Sebastião até Campo de Ourique. A comparação é falaciosa, deviam ter sido comparadas duas hipóteses com ligação à linha de Cascais, por ser geradora de tráfego. No caso da linha circular e da ligação do Rato ao Cais do Sodré, ainda estudámos duas variantes: funcionamento em anel ou com dois eixos centrados no Cais do Sodré, um para Odivelas e outro para Telheiras. Os estudos de procura apontam para um maior aportação de passageiros à linha circular.

  • Os estudos consideraram a opção pela linha em laço?
  • A opção em laço corresponde aos dois meios laços. A solução em laço beneficia um terço dos passageiros, que se deslocam de Odivelas para sul do Campo Grande, mas prejudica as pessoas que querem ficar no Campo Grande. As pessoas que já ficam no Campo Grande vão ter grandes vantagens: vão ter uma linha com intervalos de frequência de três minutos e 30 segundos, chegando muito mais depressa ao seu local de trabalho. As pessoas que hoje saem de Odivelas e cujo destino são as estações a sul do Campo Grande, no futuro, com o transbordo, vão conseguir recuperar o tempo perdido porque vão ter menos tempo de espera: há menos intervalos de circulação nos dois sentidos, inferiores a dois minutos e 40 segundos. Mais uma vez, uma falácia, nenhuma razão técnica impede que a linha em laço tenha a mesma frequência da linha circular; atualmente, a linha verde tem condições técnicas para ter intervalos de 2 minutos e meio num unico sentido, mas não existem maquinistas nem material circulante suficiente para isso; não é por ser circular que as frequências podem aumentar. Já foi explicado isto tecnicamente ao senhor presidente e seus assessores não técnicos, com referencia aos términos de linhas independentes com capacidade de inversão alternada e, por maioria de razão, com possibilidade de inversão automática,  mas ele insiste na falácia.   
  • Isso não pode excluir as pessoas que moram a norte do Campo Grande? Vai obrigá-las a fazer um transbordo que atualmente não existe.

Qualquer infraestrutura do metro tem transbordos: É verdade, razão por que deveria ter sido retirada do EIA como vantagem a eliminação de um transbordo na ligação Cais do Sodré-Av.Republica       há pessoas que fazem transbordos no Marquês de Pombal, Cais do Sodré, Sete Rios, São Sebastião, Alameda...Temos muitas situações desse sentido. É normal e corrente que na utilização diária do metro haja transbordos. Temos que entender que quando quando fazemos estudos de soluções alternativas temos de ter critérios económicos, técnicos e ambientais. Dos estudos que fizemos concluímos que há uma diferença de quatro a cinco milhões de passageiros/ano da opção da linha circular sobre o prolongamento da linha vermelho e do sistema de meios laços. Convém esclarecer que estes 5 milhões por ano de diferença correspondem a cerca de 15 mil passageiros por dia o que aproximadamente corresponde a mais 3 passageiros por carruagem na hora de ponta. A estimativa do estudo da VTM para o acréscimo de passageiros devido à linha circular é de 9 milhões, ou 6 passageiros por carruagem na hora de ponta. Esse acréscimo de 9 milhões por ano é inferior ao acréscimo que se verificou sem qualquer aumento da rede e antes do PART: de 2016 a 2018 o número de passageiros por ano cresceu 15,9 milhões, de 153,2 para 169,1 , indiciando que a atratividade da linha circular é baixa. Não fizemos o estudo do laço porque a opção é muito semelhante à dos meios laços. Uma circulação em laço contínuo prejudica a centralidade dos transportes no meio do centro de Lisboa. Este argumento da centralidade não é técnico, é subjetivo e de aplicação lata e não explica por que prejudica. A linha em laço, relativamente à circular, tem o inconveniente de obrigar a um transbordo quem da Av.Republica queira ir para o troço norte da linha verde, mas como se viu acima da boca do presidente Vitor Domingues, um transbordo é uma situação normal, e não é de facto uma boa solução, apenas se propõe para evitar o erro da agressão dos viadutos do Campo Grande. Mais uma vez se recorda a passagem de linha circular a linha em laço em Londres, em 2009, precisamente o ano da “ideia”. O objetivo da linha circular é a distribuição dos percursos urbanos e tentar que os percursos suburbanos sejam considerados como um segundo nível de movimentos. Isso é verdade, mas para linhas circulares com maior “diâmetro” ou afastamento do centro, cruzada por várias radiais que sim, facilitem as ligações suburbanas e constituam alternativa em caso de avaria ; tal como está apenas permite o “rebatimento” das ligações suburbanas que já existe na rede atual

  • Os dois principais candidatos à câmara de Lisboa não estavam de acordo sobre a opção pela linha circular. Carlos Moedas defendia a solução em laço. Já falou com Carlos Moedas?

Já tive duas reuniões com o presidente e já lhe expliquei como chegámos à linha circular. Ele ouviu-me mas presumo que mantenha a opinião que sempre nos transmitiu.

  • Acha que vai ser possível chegar a um entendimento?

O Metropolitano de Lisboa intervém sobre a cidade. A empresa tem de ter uma ótima relação com o presidente da câmara. No aspeto da linha circular, a administração cumpre o que está desenvolver. O projeto foi aprovado pela tutela, a quem cabe a decisão de, se pretender alterar a situação, tomar essa iniciativa. O presidente do metropolitano vai implementar a linha circular, que foi aquilo para que foi indigitado. Qualquer alteração terá de vir da tutela.

  • Só a tutela é que pode alterar o projeto?

Com certeza. À luz da legislação, Constituição da República Portuguesa, não é assim, o metro e o governo (sobre o qual a AR tem competência de fiscalização e de elaboração das bases de ordenamento do território) desobedeceram ao art.282 da lei 2/2020 da AR (lei do orçamento de 2020) que suspendia a construção da linha circular, tendo o metro de imediato assinado o contrato e obtido do TdC o visto favorável. A situação atual, de obras significativamente avançadas, configura assim um facto ilícito consumado

  • Não o próprio metropolitano?

Com certeza que não. O Metropolitano de Lisboa responde à tutela, o ministério do Ambiente e da Ação Climática, e cumpre as suas indicações. A linha circular é a primeira alínea do plano de expansão aprovado em 2009. Mais uma vez se pede a indicação da referencia do documento oficial em que a linha circular aparece como primeira alínea para se aferir do valor jurídico da decisão.      Há um triângulo: Metro de Lisboa está a implementar um plano aprovado e que está em curso; a tutela validou esse plano; o município, entretanto, mudou de presidente e de partido. 

  • É possível haver entendimento ou todo o plano em causa pode estar em causa?

Não, não, não. O plano está em execução e as empreitadas estão contratadas. A linha circular vai concretizar-se. Em relação ao presidente da câmara, com o bom relacionamento que nós pretendemos, a seu tempo iremos tentar resolver as divergências existentes. Isto é, tudo se resolverá se se fizer como nós queremos. De nada serve a vontade expressa dos cidadãos que discordam da linha circular, que o fizeram através da AR, órgão supremo, e das assembleias municipais. É difícil encontrar uma situação que revele tanto desprezo pela vontade expressa dos cidadãos. Em Zurique não há metro porque os cidadãos em referendo o têm recusado (existe uma boa rede de elétricos e de comboios suburbanos, inclusive com ligação ao aeroporto)

  • Estas obras, mesmo quando concluídas, apenas permitem a linha circular ou seriam possíveis outros modelos de exploração?

Tal como está desenhado o projeto, é possível a linha circular e outros movimentos. O ministro do Ambiente e da Ação Climática já explicou que é possível a ligação de comboios que venham de Odivelas e que depois entrem na linha circular. Nós consideramos que isso não é um modelo eficaz de operação. O modelo referido pelo MAAC contem o risco de cruzamento de nível em Campo Grande dos comboios da linha circular e os da linha Odivelas-Rato, por isso sublinho que o metropolitano, no direito de resposta à reportagem de 10nov2021 da CMTV afirmou que não existirão cruzamentos em exploração. O modelo eficaz é a linha circular. Diariamente, temos de injetar comboios na rede das diversas redes. Os comboios da futura linha circular e da futura linha amarela vêm da linha circular. Refere-se à ligação da estação Campo Grande às oficinas do PMOII que por sinal vai ficar amputada de uma das agulhas por causa da ampliação para nascente dos cais sul de Campo Grande. Todas as ligações Odivelas-Campo Grande e Telheiras-Campo Grande vão continuar a existir porque precisamos de garantir a manutenção dos comboios.

  • Também há uma proposta para o metro ligeiro de superfície entre Loures e Odivelas, no valor de 250 milhões de euros. Quem vai operar esta linha?

Em princípio, será o Metro de Lisboa. É isso que está nas bases de concessão e no diploma aprovado em Conselho de Ministros. Em declarações públicas, o governo fala em descentralização, mas na prática resolve estas coisas à revelia do PROTAML , da CCDRLVT e da AML (embora esta possa vir a ser considerada uma correia de transmissão), no fundo, sem cumprir uma das alíneas do art 282 da lei 2/2020, que é a elaboração de um plano de mobilidade da AML.

  • Que material circulante poderá ser utilizado e qual a ligação com a restante rede do metro?

A solução que preconizamos é a primeira implementação de um anel circular que faça um arco de transportes públicos à volta de Lisboa e que conjugue os municípios de Oeiras, Amadora, Odivelas e Loures. O projeto de um LRT circular externa de Algés a Loures e Sacavém é um projeto incluído no PROTAML de 2002 e é uma boa proposta. Mas não é o de 12km que está previsto para Hospital Beatriz Angelo-Odivelas-Loures-Infantado, que é uma linha de elétrico (tramway). Este projeto vive por si mesmo: tem extensão de 12 quilómetros e vai ligar um conjunto de localizações importantes entre o hospital de Beatriz Ângelo e o Infantado. Estamos a desenvolver o projeto mas também o município de Loures mudou. Havia estudos desenvolvidos com a anterior vereação; nas próximas semanas, vamos reunir com os presidentes de câmara de Odivelas e de Loures para consertar e finalmente assentar o traçado definitivo.

  • Isso pode atrasar o projeto?

Apenas queremos definir tudo para rapidamente desenvolvermos o estudo de impacto ambiental.

  • Que material circulante será utilizado?

O investimento inclui: 12 quilómetros de infraestrutura, sinalização e energia; um parque oficinal e o fornecimento de material circulante. Estimamos que sejam necessários 12 comboios para a operação desta linha, que será independente e que terá um interface de proximidade com a estação de metro de Odivelas. O nosso objetivo é criar uma linha com tempos de percurso de 20 minutos entre Infantado e Odivelas para movimentos de pessoas entre várias localizações dos dois concelhos e como catalisador para a linha mais pesada, em Odivelas. Este tempo de percurso pressupõe uma velocidade comercial de 20 km/h que dificilmente poderá ser atingida com a partilha da estrada com os veículos automóveis, mesmo dando prioridade nos semáforos. O tempo de percurso será mais provavelmente de 30 minutos, a menos que o percurso do LRT seja em viaduto ou sítio segregado.

  • Se um passageiro quiser viajar entre Loures e Campo Grande terá de mudar de comboio?

Sim. São sistemas independentes. Estamos a falar de um metro ligeiro, com comboios mais pequenos, semelhantes ao do metro (ligeiro) do Porto ou o Metro Sul do Tejo (Almada e Seixal). O problema dos transportes públicos é muito complexo: o crescimento urbano das cidades nem sempre tem sido conduzido de modo planeado. As populações das localidades urbanas a norte de Lisboa são vários conjuntos espaços, com densidades de 10, 15, 20 mil pessoas   Loures+Infantado+Póvoa S.Adrião 80.000; Odivelas+Ramada +Famões 90.000. É sempre muito difícil, a qualquer meio de transporte, fazer uma interligação perfeita entre esses aglomerados. O metro ligeiro permite fazer isso: é mais fácil de implementar, é de superfície e anda nas ruas dos automóveis. De certa maneira, contribui para retirar mais carros de circulação. Tem um impacto ambiental importante. O problema é complicado, mas há soluções, o que se tinha proposto era o prolongamento efetivo do metro ao Hospital Beatriz Angelo e aí construir um parque dissuasor para serviço da A8 e das populações de Malveira, Mafra e Ericeira cuja densidade populacional está a aumentar. Mais uma vez se ignora o procedimento de debate público das soluções antes de serem escolhidas, é a preferência pelos factos consumados

  • De que forma o chumbo do Orçamento do Estado para o próximo ano travou o início do projecto do metro ligeiro, financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência?

Não teve nenhum impacto. Como os projetos tinham sido submetidos a aprovação do PRR, já estão contratados e o financiamento está assegurado. Está tudo a decorrer normalmente com este projeto e com a expansão da linha vermelha.

  • Qual é o calendário para a expansão da linha vermelha e quando é que o metro vai chegar às Amoreiras, Campo de Ourique, Infante Santo e Alcântara?

O projeto da linha vermelha está na fase final de entrega do estudo de impacto ambiental, marcado para as primeiras semanas deste mês. Após aprovação do estudo e declaração de impacto ambiental, vamos, em paralelo, preparar os concursos de empreitada, que irão decorrer em 2022. Ainda no próximo ano, esperamos conseguir contratar algumas das empreitadas, que irão decorrer em 2023, 2024 e 2025. A linha irá entrar em operação em 2026. Mais um exemplo de facto consumado. Está a realizar-se o EIA mas ignoram-se os detalhes do prolongamento a Alcantara, por exemplo, a que distancia fica a estação de Alcantara Terra relativamente à estação de Alcantara Mar, onde se deveria fazer a correspondência com a linha de Cascais.

  • Quanto custa esta obra?

Temos o investimento aprovado de 304 milhões de euros da estrutura de missão Recuperar Portugal mas para este projeto serão usados 285 milhões de euros.

  • A expansão da linha vermelha pode ser feita sem compra de novo material circulante?

Estamos à espera da aprovação da resolução do Conselho de Ministros para a compra de mais 17 unidades unidades triplas. O concurso seria efetuado no início de 2022, para o material chegar a pronto da expansão.

  • Está ainda em estudo a implementação de duas linhas intermodais: uma entre Oeiras e Alcântara e outra entre Santa Apolónia e Sacavém. Qual é o horizonte para a entrada em funcionamento destas linhas?

Não sei dizer. A nossa atividade é desenvolver os estudos prévios e os projetos para apresentação a estudo de impacto ambiental. Tudo o resto depende das autarquias. Presumo que haja um problema pendente: o financiamento. Estamos à espera de retomar os contactos com a câmara relativamente a este assunto. Refere-se ao projeto LIOS, que no fundo é uma rede de elétricos (tramway) com velocidades comerciais baixas por partilharem as ruas com os automóveis. Mais um exemplo de ausência de discussão publica, secretismo.

  • Está a ter muito cuidado sempre que se refere à câmara de Lisboa. Há alguma questão por resolver? Não há uma boa relação com o município e espera oposição aos projetos?

Nós temos a melhor relação com todas as direções municipais e temos contactos recorrentes. Temos algumas situações pendentes de resolver com a câmara de Lisboa. Por exemplo, há um projeto imobiliário que temos negociado com a câmara nos últimos anos, relativo aos terrenos de Sete Rios, onde esteve o nosso antigo parque oficinal. É um terreno com seis hectares. Em junho/julho, quando contávamos que o projeto fosse para discussão pública, a câmara municipal não avançou com a consulta pública. Falámos com o engenheiro Carlos Moedas para pedir o seguimento do projeto. Estamos tranquilos e aguardamos contacto. É um projeto relevante e muito antigo e é uma forma de financiar os nossos investimentos. É uma boa prática rentabilizarmos os ativos que já não são operacionais. Este ativo não está operacional porque as sucessivas administrações do metro não quiseram. Estava prevista a construção da nova central de comando e manter um zona de garagem para o material circulante com a vantagem de lançamento em exploração para reforço nas horas de ponta. Se se pensa obter mais valias com o imobiliário que não é equipamento social, os herdeiros dos expropriados na altura terão direito a indemnização.

  • Isso atrasa algumas das obras?

Todo o nosso financiamento está garantido, por programas operacionais e por fundos europeus. Nós precisamos de fazer uma revisão profunda do material circulante, que foi comprado na década de 1990 e que precisa de durar mais 10 ou 20 anos. Isso é necessário para evitarmos supressões.

  • E o projeto de ligação entre Telheiras e Pontinha?

Gostaríamos de enquadrá-lo no quadro comunitário para 2030. É um projeto já comentado com o presidente da câmara: é muito relevante para o metropolitano conseguir ligar Telheiras à Pontinha e fazer ligação à atual linha azul na estação do Colégio Militar. A manutenção seria mais ágil e passaríamos a ter dois pontos de entrada e de saída do material circulante entre as oficinas e a rede. Também serviria as populações de Telheiras e de Carnide. Se conseguíssemos levar as pessoas da linha amarela até à linha azul, só ficaria a faltar ligação da linha amarela à linha vermelha. A hipótese não é má, mas carece de análise comparativa e de discussão pública.

  • Que impacto todas as obras vão ter nas contratações de trabalhadores para o Metro de Lisboa?

Temos pedido à tutela o reforço dos recursos humanos. A idade média é elevada, entre os 45 e 50 anos. Já fizemos um estudo das aposentações para os próximos anos e pedimos uma antecipação de admissão de recursos para fazer face a isso. Vamos precisar de mais recursos para as estações, as oficinas e os quadros superiores.

  • Preside ao Metropolitano de Lisboa desde 2017 e já vai no segundo mandato. Quando termina o atual exercício?

Em fevereiro de 2022.

  • Gostaria de ver concretizados os projetos em construção?

Vai ser difícil: alguns dos projetos vão até 2026 e os mandatos são de três anos. Um mandato a começar em 2022 terminaria no final de 2024. É uma decisão que a mim não me pertence. Mas estou disponível para continuar a exercer funções. A decisão é da tutela.






quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

A competição, não a concorrência, será boa para as comunidades?

 Não devemos achar que já vimos de tudo. Muitas vezes aparecem coisas desgradáveis que não se pensava serem tão frequentes.

O exemplo que vou citar, tirado de uma notícia na Railways Gazette, é o de uma competição em Istambul que tem uma boa rede de metro e uma boa rede ferroviária suburbana, que não parece muito saudável para a população.

Zangado por ter perdido as eleições para o município de Istanbul, o partido no governo  da Turquia lembrou-se de desenvolver um programa de expansão de uma rede suburbana concorrente, mas apoucar o prestígio do partido no poder no município e ganhar votos dos passageiros atraídos. 

Difícil explicar aos decisores políticos que assuntos técnicos deve ser com os técnicos em desenvolvimento segundo as regras do referendo e escrutínio entre pares, o que passa necessariamente pelo estudo integrado e intermodal da área metropolitana.

Toda a semelhança será mera coincidencia, mas faz-me lembrar a obsessão de querer considerar a linha de Cascais como suburbana e injetá-la em plena linha interurbana norte-sul (ligação à linha da cintura), em vez de reconhecê-la como uma linha metropolitana, a integrar na rede de metro.

Eis os símbolos da rede suburbana "governamental", e da rede de metropolitano:



A rapariga da bicicleta

 1975 - eu trabalhava num gabinete com vistas para a Av.Fontes Pereira de Melo, perto do Marquês de Pombal. Sempre gostei  de me concentrar nas questões do trabalho mais para o fim do dia, quando a maior parte dos colegas desaparecia. 

Já nessa altura o transito era intenso na avenida, de regresso vindos da baixa, ou de travessia da cidade para saída para a autoestrada, nesse tempo ainda curta.

Todos os dias reparava num homem ainda novo, mas já de aspeto débil, de roupas pobres mas aparentemente protetoras do frio, que subia a avenida pedalando com esforço na sua velha bicicleta.

Seria talvez operário numa das oficinas que ainda funcionavam nas ruas da baixa, mas nunca soube, nem se as alterações sociais próprias da época o terão beneficiado e à sua família.

Mas retive a imagem dele subindo a avenida com esforço. O declive é de aproximadamente 4%, ou seja, por cada 50 metros que se avança, sobe-se 2 metros, mais do que a altura de um homem, e não se vendiam ainda as bicicletas elétricas. 

À noite, ao ver nos noticiários da televisão, por vezes, imagens da China, com as principais avenidas de Pequim cheias de ciclistas regressando do seu trabalho no meio dos autocarros fumarentos, poluentes, movidos por motores diesel, a imagem do operário da bicicleta da avenida Fontes foi-se gravando na minha memória.

2021 - já não trabalho, por isso posso tomar o pequeno almoço numa esplanada numa avenida na parte norte da cidade. Nas avenidas de Pequim só se vêem agora scooters e autocarros, umas e outros elétricos, enquanto o grosso do tráfego se faz pelo metropolitano ou pelas vias rápidas que contornam os bairros centrais da cidade.

Aqui em Lisboa, do balcão da esplanada, vejo por vezes passar uma rapariga de bicicleta, sem necessitar de muito esforço porque a bicicleta é elétrica e o terreno é plano. Tomo o pequeno almoço tarde, e por isso àquela hora o movimento de distribuidores de comida, de motoretas (scooters) ou de bicicletas, aumenta significativamente. A rapariga de que falo traz presa às costas, como os seus colegas, a caixa térmica cúbica , regularmente abastecida graças à conexão pela internet e à constante atualização dos pedidos junto dos restaurantes que bordejam a esplanada. A sua imagem é a da força e da elegancia da juventude, a  exibição da beleza em movimento que a Natureza gera graças a milénios de evolução. Pena Vasco Graça Moura já não estar para retratar esta musa como retratou a musa do jacto de água do Parque das Nações.

Mas hoje devo ter saído mais cedo, já estou na rua, de regresso a casa quando reparo nela. Vem na sua bicicleta do outro lado da rotunda, deve ter acabado de entregar uma refeição. Vem veloz, combinando os percursos em que o tráfego automóvel está cortado pelos semáforos vermelhos com os troços da rotunda momentaneamente desertos, com as passadeiras de peões, de travessia autorizada ou não para peões, mas nunca para ciclistas que não desmontem, mas que interessa esse pormenor aborrecido do código da estrada, é uma musa livre, não tem que pensar nisso, e continua veloz, são já várias asbruscas mudanças de direção a 90º, e como vira a cabeça de um lado para o outro controlando tudo, e eis que está no pequeno passeio, uma ilha como dizem os técnicos de mobilidade, mesmo em frente de mim, do outro lado da passadeira que tenho de atravessar, aguardando o sinal verde para peões. Mas ela não espera e dá um impulso aos pedais enquanto faz mais uma viragem a 90º.

A roda traseira escorrega no lancil molhado, perpendicularmente à direção desejada pela rapariga, foge de modo incontrolado e ela estatela-se no chão.

O choque terá sido amortecido pela coxa esquerda, as calças justas, pretas e grossas, terão ajudado, mas deve doer, a sua expressão é de dor. Não deve ter partido nada, não bateu com a cabeça, a caixa térmica continua agarrada às suas costas.

Não preciso de correr para a ajudar, várias pessoas, a maior parte jovens, fazem-no, não se apressam a levantá-la, ela precisa de se acalmar. Eu fico a fazer sinais aos automobilistas que se aproximam, porque a rapariga e quem a socorre estão a ocupar parte da passadeira e já está outra vez verde para os automóveis.

O seu rosto bonito continua a mostrar dor, mas apenas em parte, porque a expressão principal é de raiva, raiva por ter de correr riscos para trabalhar, raiva porque terá estudado para fazer outras coisas que não distribuir comida, que sendo uma atividade a respeitar, não seria necessariamente o que ela desejaria fazer  na vida. 

Felizmente já se terá acalmado, já está no passeio para onde se dirigia, vai tratar da próxima encomenda, vai esquecer este episódio. Vai superá-lo, talvez encontrar o trabalho para que se preparou.






terça-feira, 30 de novembro de 2021

Consulta pública sobre o acordo de parceria PT2030, PRR, etc. em nov2021

 https://www.consultalex.gov.pt/ConsultaPublica_Detail.aspx


Contributo enviado à ConsultaLex em 30nov2021:


Sem pôr em causa a generalidade das propostas nestes planos, observo que, apesar de no domínio dos transportes ferroviários (internacionais, regionais, suburbanos, urbanos) já se encontrarem previstas várias ações, algumas delas do ponto de vista técnico parece não serem consistentes com as boas práticas de planeamento nem, no caso das ligações internacionais, com os regulamentos comunitários 1315/2013 e 1316/2013 de natureza vinculativa.

Nestas condições, proponho o acrescento de uma verba, eventualmente da ordem de 50 milhões de euros, para o lançamento de um concurso público internacional a gabinetes de engenharia de mobilidade e do território para a revisão e atualização do plano ferroviário nacional e do plano de mobilidade das áreas metropolitanas de Lisboa, Porto e Coimbra. O facto de ser um concurso internacional justifica o acrescento da verba referida, a ter cobertura ao abrigo do princípio da subsidiariedade previsto no TFUE e nos regulamentos comunitários para as circunstâncias em que o Estado membro, por si só, não consegue executar os planos previstos nos referidos regulamentos. Tem ainda a vantagem de contribuir para a redução do ruído sobre as discussões sobre infraestruturas em que a sociedade portuguesa é fértil.

Ainda no domínio ferroviário, seria desejável que no acordo de parceria nalgum dos planos se previsse o desenvolvimento de material circulante para transporte de camiões e semirreboques  em comboios para ir preparando a transferência de carga rodoviária para o modo ferroviário no contexto do Green Deal e o Fit for 55.

No domínio hidráulico insisto (por já o ter referido em anteriores consultas públicas)  na conveniência de ir estudando a instalação de centrais de dessalinização e de projeto da barragem do Ocreza.

Cumprimentos