terça-feira, 19 de abril de 2016

A rede de transportes urbanos como componente do ordenamento do território - estratégia aplicável ao caso de Lisboa



É comumente aceite que na organização do território de uma área metropolitana, como tal base para a habitação de uma população significativa, para instalações industriais e comerciais, para escritórios e serviços, e ainda para atividades agrícolas, silvícolas e piscatórias, deverão ser planeadas e construídas redes de alimentação elétrica, de gás e de água,  de telecomunicações e de saneamento.
Relativamente ao escoamento e aproveitamento de resíduos urbanos e ao sistema de transportes, a postura dos cidadãos será um pouco difusa.
Não se nota uma opinião pública exigente em termos de recolha dos resíduos que possibilite o aproveitamento dos resíduos para produção de energia e para utilização agrícola.  A autarquia arranjará maneira de recolher o lixo e depois as sociedades intermunicipais que se preocupem com isso. Não se exige que nas novas urbanizações se prevejam infraestruturas para o aproveitamento dos resíduos e, muito menos produção local de energia.
De modo análogo, os transportes são considerados exteriores à organização do território em si. Os habitantes consideram normalmente o automóvel como solução para as suas deslocações casa-emprego, ou então há-de haver uma carreira de autocarros ou uma linha férrea tradicional e a pressão da opinião pública privilegiará a reivindicação de uma via rápida. A ineficiência do transporte individual face ao transporte coletivo ferroviário gera assim prejuízos para a economia nacional que se adicionam aos custos das vias rápidas.
Infelizmente, para o orgulho humano, as deslocações de pessoas obedecem às mesma leis da dinâmica dos fluidos, guardadas as devidas distancias e as diferenças de unidades. Isto é, tal como uma rede de saneamento subdimensionada satura e extravasa  ao mais pequeno excesso de afluência, assim uma rede de transportes deficiente e sobrecarregada prejudica seriamente os passageiros, quer estes se concentrem no transporte individual, quer no transporte coletivo. As crises de saturação ocorrem mais rapidamente no transporte individual para valores inferiores do volume de passageiros transportados, e são mais penalizadoras no caso de transporte coletivo subdimensionado.
É assim necessário planear uma rede de transportes quando se pensa em organizar o território, quer a construir-se uma nova urbanização, quer ao tentar corrigir a organização existente.   
No caso da área metropolitana de Lisboa o problema agrava-se com a desertificação da cidade intramuros (limites do município), a deslocação da habitação e de muitos serviços e atividades industriais para os subúrbios e a preferência pelo transporte individual.
A população da área metropolitana de Lisboa, cerca de 2,3 milhões de pessoas, distribui-se pelo município de Lisboa, cerca de 500 mil habitantes (nos anos 90 do século passado eram cerca de 800 mil), e pelos municípios envolventes.
A rede de comunicações  é composta principalmente por rodovias rápidas radiais e secantes relativamente à capital. Não existe a prática sistemática de realização de inquéritos de tráfego. No entanto, estima-se que as deslocações diárias em transporte individual no sentido habitação-emprego são da ordem de 160 mil automóveis entrados em Lisboa e 240 mil no tráfego secante, de um município envolvente para outro.
Um critério empírico, resultante de inquéritos de tráfego e de confirmação dependente da repetição desses inquéritos, admite que para uma população de 2,3 milhões de habitantes se espera um montante de 1,7 x 2,3 ~ 4 milhões de deslocações diárias motorizadas. O que daria uma carga na hora de ponta de um décimo (ou outro valor resultante de inquéritos de tráfego) ou 400.000 deslocações motorizadas na hora de ponta.
Aparentemente, a estrutura da habitação e do emprego na área metropolitana está distorcida em termos de ordenamento territorial. O facto de 60% das deslocações ser em transporte individual é um sintoma de uma mobilidade degradada, consequência do crescimento urbanístico desordenado.
Nestas condições, a utilização dos modelos normais para determinação das redes de comunicações ideais, nomeadamente as matrizes origem-destino ou habitação-emprego poderá ser irrelevante.
Isto é, encontrando-se distorcida a estrutura urbanística, a estratégia para o planeamento das redes de transporte deverá associar-se fortemente ao planeamento urbanístico, neste caso essencialmente corretor do existente, embora haja ainda algumas zonas extensas urbanizáveis intramuros (Vale Formoso/Comendadeiras, Chelas, Alta de Lisboa) em cuja construção nova deverá ser dada prioridade ao setor secundário (fábricas e oficinas pouco poluentes) relativamente à habitação e  aos setores terciário e quaternário .
A correção urbanística deverá ocupar-se da reabilitação dos edifícios, integrando-os e emparcelando-os de modo a melhorar o conforto, com áreas suficientes, em cada fogo, além das zonas de quartos e salas, para instalações sanitárias, logradouro e garagem. Terão de ser urbanizadas áreas abandonadas e remodelados os bairros, com uma percentagem de áreas verdes, assegurando no conjuntos dos edifícios uma distribuição  por habitação, serviços, comércio e oficinas. 
Considerando a área restrita do município de Lisboa, para o planeamento da rede de transporte urbano ferroviário, o metropolitano, terá de se partir da situação atual em que as deslocações internas são menos significativas do que as deslocações pendulares de entrada e saída do centro da cidade nas horas de ponta.
Isto é, a prioridade para novas obras parecerá ter de responder a duas tendências contraditórias.
Por um lado, deverão melhorar-se os canais radiais de penetração na cidade, o que implica  intervenções menores no centro da cidade, aumentando o conforto e a quota dos passageiros vindos do exterior da cidade e reduzindo em consequencia o consumo de combustíveis fósseis associado ao transporte individual.
Por outro lado, para redução dos movimentos pendulares, deverá favorecer-se a aproximação entre os locais de habitação e os de emprego, nomeadamente promovendo o repovoamento de Lisboa de acordo com os princípios de reabilitação urbanística referidos.
 Dado que não convém que do ponto de vista demográfico haja deslocações da população do interior do país para as áreas metropolitanas, parecerá que os municípios envolventes de Lisboa não deverão autorizar mais construção. Nestas condições, a força de produção das empresas de construção civil deverá ser reconvertida nas técnicas de reabilitação dos edifícios, compensando o aumento de preços de habitação nos subúrbios decorrente da diminuição da oferta com a diminuição do preço no interior da cidade por aumento da oferta (coisa alcançável igualmente com a manipulação dos IMIs e do IMTs).
Ao mesmo tempo, a deslocação de população para o centro de Lisboa será limitada pelo emparcelamento dos fogos disponíveis e pela contenção da componente habitacional nas novas urbanizações (para garantir a instalação dos setores secundário, terciário e quaternário), pelo que a população de Lisboa não deverá voltar a atingir o milhão de habitantes, impedindo-se na cidade a nova construção enquanto o parque habitacional se encontrar degradado ou utilizando a nova construção para substituir habitação degradada ou para instalar, por ordem de preferência, setores  secundário, quaternário e terciário.
É desejável que seja estudada a relação entre a disponibilização de mais percursos em transportes coletivos e a resposta da procura do transporte individual. Isto é, nas curvas de procura do TC e do TI, saber em que ponto ocorre a descompressão da oferta do TI (aumento da procura do TI por motivo de aumento da oferta do TC).
Dada a deficiente condição financeira do país, não será demais destacar a importância, nesta estratégia, de recurso aos fundos comunitários  (considerando a grave situação do desemprego, o nível do rendimento per capita da área metropolitana não poderá ser obstáculo a esse recurso).
A expansão da rede deverá fazer-se progressivamente de acordo com as possibilidades financeiras e estar integrada num plano global e coerente, de modo a evitar os desencontros sucessivos das estratégias anteriores de avanços por remendos dependentes de opções localizadas no tempo e decididas por políticos sem formação técnica para isso.
À medida que:
- forem sendo disponibilizados fundos comunitários mediante a elaboração o mais cedo possível, desde já, de projetos de expansão, da rede de metro e das redes de modos complementares, suscetíveis de aprovação pela comissão europeia atendendo às caraterísticas de sustentabilidade energética do modo de transporte ferroviário urbano, ou
- o tecido urbanístico da cidade for sendo recuperado e beneficiado, aumentando a densidade populacional intramuros,
será desejável a ampliação da rede de metro interna da cidade.

Propõe-se assim como expressão da estratégia para o metropolitano de Lisboa, de acordo com o cumprimento progressivo de um plano integrado e como exemplos de aplicação de fundos comunitários :
- a adaptação dos cais a 6 carruagens, acesso a pessoas de mobilidade reduzida (elevadores e instalações sanitárias adaptadas) e remodelação da ventilação principal nas estações de Areeiro (incluindo ligação hectométrica subterrânea à estação da CP) e Arroios,
- acesso de pessoas com mobilidade reduzida e instalações sanitárias adaptadas nas principais estações que dele ainda não dispõem, nomeadamente nas estações de correspondência (Campo Grande, Colégio Militar, Baixa Chiado, Jardim Zoológico, Entrecampos),
- reforço dos níveis de segurança da circulação com sistemas de proteção automáticos do tipo ATP/ATO e CBTC para redução da probabilidade de ocorrência de acidentes,
- completamento do  esquema básico da rede:
·  prolongamento da linha vermelha de São Sebastião até à linha suburbana de Cascais,  com correspondência em Alcântara e Algés e com correspondência com parque de estacionamento em Campolide para o transporte individual da A5
·        prolongamento da estação Aeroporto a Campo Grande em viaduto
·      prolongamento de Telheiras a Pontinha com viaduto entre o Eixo Norte-Sul e a estação Pontinha passando pela nova feira popular
·  prolongamento Rato – Santos com correspondência com Cais Sodré e com desenvolvimento circular para reduzir a pendente, servindo Alcantara com futura extensão a Cacilhas
·    prolongamento de Santa Apolónia às Comendadeiras com futura ligação por metro ligeiro a Olaias
·     ligação na estação Moscavide a uma linha de metro ligeiro servindo a zona de Sacavém

- estudo de uma linha circular externa de metro de superfície, preferencialmente em viaduto, em sítio próprio, com correspondência com as estações de metro e das linhas suburbanas, de Algés, por Miraflores, Hospital Amadora-Sintra, Odivelas, Loures, Sacavém, Gare do Oriente
- estudo de novo material circulante para satisfação do previsível aumento da procura a médio prazo (por um lado é expetável que a economia venha a crescer com consistência, e por outro lado é provável que o preço do petróleo suba, desincentivando o transporte individual)
- estudo da cobertura de bairros de menor carga de deslocações por meio de linhas de modos ligeiros de transporte, guiados ou não, de condução integralmente automatizada (driverless, condução autónoma).


sábado, 16 de abril de 2016

Não quero que haja golpe, Dilma

Dilma, Dilma, não quero que haja golpe.
Ou como dizes, que tenha golpe.
Influencia francesa, saudosos de Belém.
Mas está difícil, a democracia nem sempre tem defesa contra os representantes, ou delegados, dos eleitores que se desligam deles e que resolvem por eles próprios, independentemente dos compromissos anteriores com eles.
Porque quem votar pelo impeachment está a fazê-lo dentro do formalismo da lei, não é bem golpe. Mas é obviamente contra a ética, e ainda por cima violando um princípio básico de um estado de direito, qualquer acusação tem de ser provada. E está por provar o delito de irresponsabilidade e de manipulações fiscais e orçamentais. Falha da democracia que não definiu corretamente o poder judicial, que não garantiu a vinculação dos eleitos aos eleitores.
Isto é, seria bom não haver luta de classes, mas estamos mesmo em pleno conflito entre coxinhas e petralhas.
Entre quem precisa de educação, saúde e transportes, de garantir o rendimento, e. do outro lado, quem quer seguir a cartilha do consenso de Washington.
Pena não teres dado atenção ao que o povo quis dizer com as manifestações antes do mundial de futebol pela educação, pela saúde, pelos transportes. Que as desigualdades se estavam a acentuar, que as elites continuavam a gerir a sua ganância, Pena não teres entendido a mensagem.
Aguardemos. Boa sorte. Tenta modificar-te, mais aberta com quem pretende menos desigualdade e menos elites. Quer ganhes, quer percas. Boa sorte.





http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/116

Citações de Bernie Sanders e de Cristhine Lagarde

Bernie Sanders, candidato à nomeação pelo partido democrático como candidato à presidência dos USA, no Vaticano, em 2016-04-15:
-"...num tempo em que uns poucos têm muito e tantos têm pouco, temos de rejeitar os fundamentos da economia contemporânea como imorais  e insustentáveis" .
De facto, os indicadores de desigualdade agravam-se, apesar da propaganda dos principais meios de comunicação social, o que é natural, considerando a respetiva estrutura acionista. E a desigualdade desestabiliza as sociedades.
Bernie Sanders tem a coragem de se declarar, nos USA, socialista, e a sua ação como "mayor" e senador confirma-o. Quão destrutiva será a campanha contra do partido republicano se ele conseguisse a nomeação? Não há políticos perfeitos, mas é interessante pensar como se manifestaria um socialismo, dito democrático e compatível com o modo de vida norte-americano? Como lidaria com a perda do poder de compra dos trabalhadores americanos, com a sua insegurança social e a falta de assistencia médica, com os crimes de guerra no médio oriente e norte de África, com o tráfico de armas e de droga? Ou de como estimularia o desenvolvimento de um verdadeiro socialismo democrático não dependente de uma personalidade, mas dos próprios cidadãos e cidadãs?

Aquela citação contrasta com as declarações de Cristhine Lagarde ("é preciso conjugar a política monetária de estímulos à retoma com um impulso orçamental e reformas estruturais amigas do crescimento") e do seu colega Poul Thomsen (as políticas em Portugal vão no sentido errado).
Assim insistem na desvalorização do fator trabalho (se interpreto bem o que estes senhores costumam significar com "reformas estruturais"), quando isso é incompatível com a componente da qualificação pessoal no produto final.

Recordo a declaração da senhora no filme Inside job, em que revelou a ignorância de que o Lehman Brothers ia falir (aliás, mais grave foi a bancarrota da seguradora AIG) e o comentário que fez (holly cow - cum caraças) quando soube da falência:
http://www.imdb.com/video/screenplay/vi3176241689?ref_=nmvi_vi_imdb_1

Recordo ainda as declarações de Poul Thomsen no início da intervenção da troika (o objetivo é aproximar os salários em Portugal dos salários da Bulgária e da Roménia). Pareceria que deveria ser o contrário, mas o senhor não deve ter dificuldades na vida e não terá sensibilidade para perceber isso.
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=paul+thomsen

Mas será mais interessante analisar os resultados das teorias económicas destes senhores comparando os gráficos do crescimento do PIB da zona euro com o resto do mundo.
Parecerá que não têm autoridade moral nem científica para dar instruções seja a quem for. Na minha profissão isto tem um nome, que é incompetência.






seria  desejável que o FMI e o BCE torcessem a linha das privações severas, em vez de a acentuar

Primavera








Primavera, molhada, enchendo as albufeiras para que a energia com origem renovável não falte.
Nêsperas amadurecendo, rebentos de laranjeira e de videiras, azedas amarelas espontâneas
( https://pt.wikipedia.org/wiki/Oxalis_pes-caprae ). Ciclo recorrente, com a nostalgia da incerteza da concretização.

terça-feira, 12 de abril de 2016

A flowering tree, uma árvore em flor

Centro cultural de Belém, 6 e 8 de abril de 2016, ópera de John Adams, sobre libreto de Peter Sellars a partir de uma lenda da Índia.
As óperas podem ser perigosas e John Adams compõe de forma interventiva. Basta citar a morte do senhor Klinghoffer, que põe em cena o conflito Israel-Palestina ouvindo os argumentos dos dois lados.
Mas em A flowering tree é suave como mostra a desigualdade entre os principes e o povo, e como é dura a vida de quem produz. Uma rapariga consegue sustentar a família através da sua transformação em árvore que floresce cujas flores vende. O principe, encantado com a magia, casa com ela e a irmã, estouvada, estraga o processo de reconstituição da forma humana. A rapariga fica uma aleijada que sobrevive como mendiga. Mas tem um final feliz, o principe é agora um homem diferente, humilde e respeitador do povo, e recupera a rapariga.
Esperemos por mais óperas de John Adams.

Entrevista de 10 de abril no DN do primeiro-ministro do XXI governo

http://www.dn.pt/portugal/interior/antonio-costa-quer-limpar-de-vez-o-lixo-que-ha-nas-contas-dos-bancos-5118926.html

Tenho interesse em comentar alguns pontos desta entrevista pelas relações com questões de organização da comunidade ou com questões técnicas.
1 - capitalização da CGD pelo Estado - a opinião geral é a de que as regras da UE proibem o Estado de capitalizar o seu banco. O primeiro-ministro chama a atenção que as regras da UE proibem a discriminação entre entidades públicas e privadas. Isso impede o favorecimento e o prejuízo de uns relativamente a outros. Como já referido neste blogue  a propósito das empresas públicas de transporte, a consequência lógica é que impedir o Estado de capitalizar as empresas públicas é discriminá-las negativamente. Ver a diretiva 1370/2007 da CE. Isto para não falar nas exceções devidas a condições especialmente desfavoráveis como desemprego e caraterísticas periféricas. Mas a dificuldade de interpretação de textos não é exclusiva de Portugal. Por isso é de aplaudir a posição do primeiro-miinistro. O problema é de facto a falta de dinheiro disponível para a capitalização.
2 - intervenção na TAP -  tratou-se de cumprir o programa de governo anunciado na campanha eleitoral. Porém, a realidade da TAP é muito grave, esperando-se que a intervenção possa reduzir eventuais prejuízos futuros. No entanto, é possível afirmar desde já que os prejuízos acumulados da VEM, empresa de manutenção no Brasil montam, segundo notícias publicadas, a cerca de 500 milhões de euros, que a sua aquisição foi desde o início criticada e que o consultor jurídico que apoiou as negociações esteve ligado à Geocapital, que vendeu a sua participação na VEM à TAP em 2005. Penso que só este facto deveria ser suficiente para um pedido de dispensa pelo próprio consultor. Desejaria pois ver este assunto esclarecido. Igualmente choca a coincidência entre o acordo com a Barraqueiro na TAP e o ajuste direto no prolongamento da exploração Porto (neste blogue já se afirmou que devido ao não investimento público em meios de exploração do metro do Porto não se justificaria a reversão da concessão à Transdev). O que é outro assunto que se desejaria ver esclarecido. Acresce a preocupação pela utilização até à última do aeroporto da Portela, com supressão de uma pista para estacionamento, com a ameaça constante de obras eternas e desperdício na solução Montijo em vez de novo aeroporto faseado. Não posso portanto apoiar a ação do governo no caso da TAP.
3 - investimento em infraestruturas ferroviárias com fundos comunitários-  trata-se de uma omissão. Na entrevista não se aborda a questão dos investimentos em infraestruturas ferroviárias, cujo desenvolvimento, em termos de ligação à Europa, faz aliás parte das orientações europeias (pelo que não deveriamos contrariar os compromissos com a  Europa). Dado já ter sido divulgado o plano ferroviário e ele ser omisso no planeamento dessa ligação à Europa (apenas prevê uma ligação em via única em bitola não europeia, contrariando assim compromissos com a Europa, entre Évora e a fronteira do Caia, esquecendo a necessidade de iniciar a transição para a bitola europeia e esquecendo as ligações de passageiros Lisboa-Madrid numa altura em que a Espanha obtem financiamento para concluir a ligação em alta velocidade de Madrid a Badajoz), deixo também registada a minha discordância neste assunto relativamente ao XXI governo, lamentando a perda da oportunidade na obtenção de fundos comunitários.
4 - banco mau para o crédito malparado - como já referido neste blogue e aprendido no livro de Tim Harford, Adapte-se, trata-se da solução de Bulow/Klemperer. Mas choca-me no meio de tantos comentadores e sábios de economia ninguém dizer o que vem no livro de Tim Harford, na página 233, que a solução implica que o banco mau (ou de retaguarda) fica dono das participações proporcionais dos bancos bons (de transição ou ponte) que descarregarem nele os seus créditos malparados. Mas é possível que seja má interpretação minha, num país em que tantos sábios e uma elite esclarecida nos têm conduzido onde estamos. Ao menos que lessem o livro.


sexta-feira, 8 de abril de 2016

De Esopo ao BANIF, ao BPI e ao Panamá, sem esquecer o Observador, a fábula do lobo e do cordeiro

Devo reconhecer que é muito importante que haja diversidade na informação, que seja possível comparar pontos de vista e, especialmente, fundamentações com tratamento matemático e físico de dados confiáveis. O que convenhamos é difícil dadas as exigências do tratamento científico das coisas. Mas mesmo assim é bom compararmos as posições diferentes, embora por vezes a insistência em temas ou a preocupação de cumprir uma orientação editorial em vez de dar predomínio à realidade possa diminuir a credibilidade da informação fornecida.
Defendo pois a existência do Observador, mas confesso que os seus colaboradores por vezes exageram (embora o exagero seja bom para estudar ou testar a consistência de um tema).
Mas também confesso que a forma de abordagem de alguns temas me toca no nervo, como se costuma dizer, ou faz-me saltar a tampa, e o tema dos rendimentos excessivos dos  velhos faz-me esse efeito. Claro, sou velho.
Eu preferiria que o Observador lançasse luz sobre temas como as candidaturas a fundos comunitários para deixarmos de ser uma ilha ferroviária (questão da bitola UIC e ligações ferroviárias inexistentes nesta bitola à Europa), ou uma ilha energética (questão: falta de interligações para exportação da energia renovável em excesso; insuficiência de gasodutos dos portos para a Europa) e se não haverá exagero nas candidaturas para investimento na educação e na qualificação pessoal (sabendo-se que a maior prte dos jovens formados sserá "aproveitado" no estrangeiro, isto é, estaremos a subsidiar o sistema educativo desses países, tal como atualmente subsidiamos o sistema fiscal de outros). Sendo certo que  política do atual governo, continuando de outro modo a política imobilista do anterior, é essencialmente secretista.
Parece-me algum exagero do Observador insistir nos malefícios da baixa natalidade, quando eu vejo os supermercados cheios de criancinhas e eu próprio tenho 7 netos; ou insistir ,  em estudos importados como a correlação entre o aumento do salário mínimo e o aumento do desemprego. Não digo que não haja correlação (numa entrevista a uma sobrevivente de um terramoto na Turquia, há uns anos, a senhora lamentava-se que tinha acionado o interruptor de um dos quartos e tudo caiu, isto é, houve uma correlação entre o acionamento do interruptor e o terramoto), mas sabendo-se que a política oficial é estimular a desvalorização do fator trabalho, nomeadamente através do desemprego, fica a dúvida se essa correlação não é como a do Excel dívida-investimento de Rogoff-Reinhardt, em que se "esqueceram" de considerar uma área de células do Excel. Veja-se por exemplo o caso da banca em Portugal, que perdeu 7500 funcionários entre 2000 e 2015 sem relação nenhuma com o salário mínimo. Ou a diminuição continuada da contratação coletiva e do crescimento salarial (abaixo do crescimento do PIB, como mandam os sábios).



Mas como digo, é a questão dos rendimentos excessivos dos velhos que me deixa furioso (como comentou João Cesar das Neves depois de um comentário que lhe enviei). Quando devíamos estar todos a fazer força para aumentar os rendimentos dos mais novos (em Portugal acabámos com os ricos, dizia o revolucionário ao sueco em 1975, e este respondeu-lhe e nós acabámos com os pobres...). Então numa altura em que tanto se fala no Panamá, vir o Observador esquecer que o problema é de falta de receita, não é excesso de despesa...

ou de como poderemos perguntar a Vitor Gaspar: qual a parte do gráfico de que há dinheiro, que não entende? 

Mas não argumento, limito-me a refazer a fábula do lobo e do cordeiro, de uma e outra maneira.
Esopo, escravo ao serviço do senhor Xanto, que lhe permitiu deixar uma análise profunda das relações de produção, 2300 anos antes de Karl Marx, e 2450 anos antes do Observador:


1 -  O cordeiro, confiante, abeirou-se do rio UE que nasce em Bruxelas. Trata-se de um rio com um percurso acidentado, com um leito com grande inclinação. O cordeiro, que estava num plano inferior, a jusante, ficou surpreendido quando o lobo (wolf, em alemão), mais acima, o criticou por estar a beber mais água do que as suas possibilidades lho permitiriam e por lhe sujar a água. Bem explicou o cordeiro que não podia ser porque a correnteza do rio levaria a sujidade para o lado contrário do lobo. Mas o lobo insistiu que o cordeiro já tinha estado mais acima a beber, que tinha esgotado a erva, que a sua família ou amigos cerceavam a liberdade de investimento dele, lobo, e justificou tudo com argumentos e registos estatísticos. O défice aumentava porque os salários de todos os cordeiros tinham sido repostos nos níveis anteriores à epoca dos cortes.
O corddeiro argumentou que para reduzir o défice o melhor seria aumentar os impostos dos grandes proprietários.
O lobo, sentindo-se ofendido, gritou que não admitia que o cordeiro limitasse a sua, dele lobo, liberdade de movimentos na economia, porque todos têm direito à liberdade, e comeu-o.

2 - O cordeiro BANIF, confiante, foi-se queixar ao deus Odin, na Alemanha, dizendo que já não aguentava mais os olhares gulosos das raposas ibéricas e não tinha confiança nos cães de guarda do rebanho. Odin concordou que os cães de guarda não tinham nada de deixar arrastar os problemas do cordeiro BANIF, mas como era amigo deles e eles andavam a preparar-se para uma campanha eleitoral, também deixou andar. Até chegou a dizer ao cordeiro BANIF que, enquanto o ouvia, sentia crescer a saliva na boca, de tão apetitoso que ele era. Não o comeu, mas também não deixou que o nacionalizassem porque isso era contra os dogmas de Odin, e acabou por deixar que uma raposa ibérica o comesse quando disse que o cordeiro BANIF tinha de ser vendido nesse fim de semana.

3 - O cordeiro BPI, confiante, bebia no regato junto do rio Quanza, quando o lobo alemão, mais acima, disse que não podia ser, que só podia beber água no regato dele, lobo alemão, e que tinha até ao dia 10 para voltar ao seu regato. Ora o pobre cordeiro BPI não tinha forças para fazer o percurso em tão pouco tempo e com a ansiedade até tinha cada vez menos forças. Andava por ali um lobo ibérico, que, quando o prazo estava mesmo a acabar, comeu o cordeiro BPI.

4 - Estava o cordeiro, confiante, mas preocupado com a falta de erva nos campos, a beber a pouca água do raquítico regato, quando viu o lobo, mais acima, a beber a água com sofreguidão e a ralhar-lhe: não há água no regato nem erva suficiente nos campos porque tu ganhaste salários demasiado elevados e os teus primos têm reformas acima dos patamares da produtividade e da competitividade.
Mas, senhor, respondeu o cordeiro, vê como as notícias do Panamá mostram que afinal havia erva, estava era escondida por ti e pelos teus primos. O lobo ficou furioso e sacou das contas dos jornalistas do Observador, que mostravam que o rendimento dos cordeiros mais velhos sobe mais depressa do que o dos cordeiros mais novos.
É verdade, senhor, respondeu o cordeiro, mas isso é porque vocês andam a estimular o desemprego dos cordeiros como melhor forma de conter os preços da erva. E se devemos erva à terra mãe é porque com a erva que foi para o Panamá ficaram por pagar impostos por ti e pelos teus primos. Falta a receita, não é excesso de despesa com erva, que eu estive a ver e o que nós, cordeiros, gastamos, é mais ou menos o que as cabrinhas, os porquinhos, as vitelinhas, gastam na terra deles, por isso não venhas, lobo, com essa dos rendimentos dos cordeiros mais velhos crescerem mais depressa do que os dos cordeiros mais novos. Com o desemprego cada vez há menos receita e quanto menos receita mais vocês mandam cortar no rendimento dos cordeiros.
Foi o fim da paciência do lobo, que deu um salto e comeu o cordeiro.

5 - Estava o cordeiro, confiante, ... et coetera, et coetera, et coetera....

Ariana, não em Naxos, mas no Alto dos Moinhos

Ariana, não em Naxos, mas no Alto dos Moinhos, na estação de metro, no museu da Música, Ariana Russo, soprano, com Rita Tavares, contralto, e Sergio Silva, orgão portátil do século XVIII, no Stabat Mater de Pergolesi, num fim de tarde de uma quinta feira, em 31 de março de 2016.

Aplausos pela qualidade das interpretações, pelo valor histórico do orgão e pela energia da vivência da cultura musical.

Apesar da barbarie, ela move-se, a cultura..

Votos de que o museu da Música se mantenha, pelo menos um polo em que possam continuar os concertos, mesmo que o grosso do museu se deslocalize para o convento de Mafra, como já anunciado.
















quinta-feira, 7 de abril de 2016

Citações nesta primavera de 2016





Os aluimentos da A41 e da A14



Arrastamento de inertes

Os aluimentos dos pavimentos de estradas ocorrem normalmente como consequência do fenómeno do arrastamento de inertes.
Isto é, forma-se mais ou menos lentamente um caminho subterrâneo para as águas irem arrastando as terras que suportam os pavimentos.
Há muitos anos aconteceu isso na própria galeria do metro, em Entrecampos. O coletor central, colocado sob as vias partiu-se sem que isso fosse detetado. As terras que suportavam o balastro sob o leito de via foram lentamente sendo drenadas pelo interior do coletor até que a altimetria das vias se alterou sensivelmente. Nestas coisas a sensibilidade dos maquinistas é superior à deteção automática.
Também há muitos anos, durante um inverno chuvoso, houve estradas recentemente construidas na região de Lisboa e no Alentejo que se fenderam longitudinalmente ou simplesmente foram arrastadas
por arrastamento de inertes depois da liquefação ou solução de solos.

Porém, uma coisa é os fenómenos ocorrerem em contexto de difícil deteção.
Outra é a gravidade de um ambiente de facilitismo e de aceitação de procedimentos incorretos, ou em linguagem mais terra a terra, de desculpabilização.

Os aluimentos na A41 e na A14 entristecem-me. Não por serem erros de engenharia cometidos por colegas. Porque também os cometi e que podiam ter consequências graves (gelei quando a cabeça de um carril foi arrancada perto da Praça de Espanha, por não ter antecipado que a soldadura que o empreiteiro de sinalização ferroviária estava a fazer deficientemente ia fragilizar o carril; fotografei tudo e apresentei o relatório no comité de metropolitanos, não escondi o erro nem o risco que se correu de descarrilamento). Mas porque o que interessa é estudar os erros para evitar a sua repetição. Não interessa culpabilizar (e por isso é inútil a desculpabilização como criancinhas apanhadas pelo professor), interessa evitar a repetição do desastre.

Tanto no caso da A41 como no da A14 houve, como normalmente tem de acontecer, ocupação de solos com uma barreira que se opõe ao escoamento natural. O efeito barreira só é evitado com túneis ou com construção em viaduto. Por este facto, considerações ambientais deveriam reter as hipóteses de construção em viaduto e o seu embaratecimento através de métodos de construção em série. Existe tecnologia amplamente experimentada.

Caso da A41, no acesso para Alfena, Valongo

No caso da A41, menos grave, o aterro da autoestrada não deu suficiente espaço para o escoamento de um pequeno riacho em situação de caudal de cheia. Terá havido subavaliação dos riscos de cheia perante a reduzida expressão do riacho (ver imagem). O arrastamento de inertes terá "descalçado" o apvimento. A Avaliar pelas imagens, não existia betão armado nem camada de brita entre o riacho e o pavimento da autoestrada (o que no primeiro caso encareceria a construção).

o aluimento ocorreu sensivelmente no local onde se vê um camião, por cima do riacho, definido pela correnteza da vegetação

continuação para poente do percurso do riacho ( a autoestrada está para a esquerda, ou nascente; é visível a deficiente organização dos solos, independentemente da autoestrada)

continuação para poente do riacho
Devia pois ter-se construido sob a autoestrada um aqueduto de betão armado de maiores dimensões.

Dado que aquilo que o cliente pagou e está a pagar pela autoestrada (rentabilidade entre 8 e 16% para a entidade financeira que financiou a construção - ver  "Parcerias público-privadas" de Joaquim Miranda Sarmento, ed.Fundação Francisco Manuel dos Santos), parecerá razoável que a ocasião seja aproveitada para reduzir essa rentabilidade, por caso de force majeure, a 3%. deixando à entidade financeira e ao construtor a tarefa de acertar os detalhes da operação. Relativamente ao concessionário, considerando que lhe era possível por simples observação a deteção de uma situação potencial de risco, por má ocupação do solo, parece também razoável imputar-lhe o custo integral da construção de um aqueduto inferior de betão armado de dimensões suficientes para o caudal de cheia da bacia hidrográfica envolvida e o pagamento de uma renda por cada mês em que o tráfego não estiver reposto após a construção desse aqueduto, igual ou superior aos seus lucros atuais. Igualmente deverá ser imputada ao concessionário uma parte dos custos de uma inspeção a todo o troço de autoestrada concessionado para deteção de riscos semelhantes, partindo da análise das deficiências da ocupação dos solos (efeito barreira).

vista da zona do aluimento, já durante as obras de reparação





Caso da A14, no troço entre Montemor o Velho e a ligação à A17

Este caso é mais grave, por se tratar da ocupação por efeito barreira de uma bacia hidrográfica composta por campos de arrozais e por canais e ribeiros, sendo possível compara as soluções de engenharia recentes adotadas na A14 com as da estrada antiga Maiorca-Montemor o Velho.
Esta, construida também em aterro, tem 7 pequenas pontes ou viadutos de betão armado que resistem há décadas, não só por serem de betão armado, mas também porque a barreira tem de ser interrompida a espaços curtos para as cheias não provocarem pressão excessiva sobre a barreira e as secções de escoamento. Ver imagens.
zona do aluimento na A14, na zona do camião, na outra via; veem-se os 4 tubos Armco que constituem a passagem de água




bacia hidrográfica atravessada pela A14; o aluimento deu-se sobre a ribeira de Foja; onde se lê Mondego, deverá ler-se canal do Mondego









imagem de uma das pontes da estrada antiga
outra das pontes da estrada antiga
vista da mesma ponte
aparentemente, a terra que se vê em primeiro plano veio também do substrato sob o pavimento  (arrastamento de inertes)
não parece haver betão armado nem brita sob o betuminoso; os inertes foram arrastados
embora os tubos Armco tenham boa resistencia devido ao aço rebitado e á ondulação, o espaço entre eles pode ser caminho de arrastamento de inertes, além de que a resistencia dos tubos diminui por efeito da fadiga (submissão a esforços variáveis como seja a passagem de camiões com 10 toneladas por eixo, podendo levar à ovalização ou à rotura, favorecendo o arrastamento de inertes)
inexistência de betão armado ou brita compactada




Terá interesse comparar os dois métodos de construção para passagem das águas, na estrada antiga e na A14. Ver o desenho:



No desenho de cima a solução adotada na A14, com 4 tubos Armco. No desenho de baixo a solução tradicional.



esta é uma solução proposta pelo fabricante dos tubos Armco; é ainda uma solução precária, mas tem a vantagem dos sacos de areia ou brita dificultarem o arrastamento de inertes





Provavelmente ter-se-á escolhido a solução mais barata, embora exigindo a substituição periódica dos tubos, o que não parece ser aceitável, considerando o custo elevado pago pelos contribuintes.
Por esse motivo, parece ser razoável também aqui se passar para uma rentabilidade da PPP de 3%, competindo ao concessionário o custo da reparação mediante a construção de uma ponte de dimensão adequada e de mais duas pontes idênticas, uma na localização indicada na passagem já existente com 3 tubos, a 1800 metros, e outra nova  a meio, a 900,
Com introdução de renda enquanto não concluidas e operacionais. Idêntica obrigação para inspeção do aterro da toda a autoestrada.


PS em 8 de abril - amáveis comentadores recordaram-me que há outro fator que contribui para a má execução das obras: os prazos curtos e apertados para as inaugurações poderem ser usadas como propaganda eleitoral. Porém, um bom planeamento integrado reduz a diferença dos prazos de execução entre uma solução precária e uma solução consistente.
Há ainda outra questão a considerar, prevista nos normativos para construção de autoestradas - deverão ser previdtas com frequência passagens inferiores para animais, reduzindo assim os riscos de colisão com os veículos à superfície.

PS em 10 de abril - ver episódio de aluimento do balastro da linha de Cascais em
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2013/02/no-melhor-pano-cai-nodoa-reflexoes.html







Continuação dos desabafos rabugentos - o BANIF

Lendo os jornais como reformado rabugento, comento as declarações do senhor governador do banco de Portugal, que em 21 de dezembro de 2015 o conselho de governadores do BCE retirou o estatuto de contraparte ao BANIF, isto é, cortou-lhe o financiamento, mas que não foi por isso que o banco foi "resolvido", foi porque estava com falta de liquidez.
A linguagem é, com todas as suas limitações, uma expressão do pensamento.
E uma linguagem que se expressa nestes termos, contraparte ou resolução, só pode traduzir um pensamento tortuoso.
E não venham culpar a notícia da TVI (que bem escusava de tirar conclusões que convidavam as pessoas a levantar o seu dinheiro) porque a causa está identificada pelo próprio governador do BdP, não havia dinheiro e o BCE não quis ajudar.
Por outras palavras, o BCE acha que nestas coisas os contribuintes que paguem.
Mas convem deixar claro que se trata de senhores que não têm de responder perante eleitores e cuja incompetencia se repercute nas dificuldades do quotidiano dos cidadãos.
E digo incompetencia porque mais uma vez não foi aplicada corretamente a teoria do banco mau e banco bom. O banco mau não tem de ser "resolvido". E muito menos nas pressas de um fim de semana (lembram-se de um cortejo de camiões a caminho de Chipre carregados de dinheiro quando houve falta de liquidez nos seus bancos?). O banco mau tem de ficar com os ativos tóxicos para libertar o banco bom, mas deve continuar a ser o proprietário do banco bom.
Isto já foi aqui referido.
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2015/12/banif-banif-uma-analise-por-um-ignorante.html

Aparentemente, a solução seria a nacionalização do BANIF com financiamento do BCE a juros baixos e colocação no mercado pelo BANIF de obrigações públicas. Ver medida nº14 do manifesto dos economistas aterrados, também já referido aqui:
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2010/10/economicomio-lxii-as-22-medidas-dos.html
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=aterrados


Só que os constrangimentos ideológicos dos senhores governadores do BCE não lhes permitem tomar essas decisões (o caso mais grave foi o do senhor Trichet, altamente prejudicial para a Europa).
São incompetentes e escapam ao controle dos eleitores.
Terão de fazer o favor de mudar.
Caso contrário lá se irá o BPI por causa da crise de Angola, salvo melhor análise,claro.


PS em 7 de abril - segundo as notícias do DN de hoje, a fuga de depósitos do BANIF de cerca de 900 milhões para 150 milhões ocorreu ANTES da notícia da TVI, o que vem mostrar a inconsistência das declarações do senhor governador do BdP. Por outro lado, a senhora Maria Luis, mais uma vez colocando-se de fora, vem dizer, como as criancinhas, não fui eu, só se foi aquele menino do BCE, ou então o do BdP. Com que paciência aturamos as deformações da realidade destas mentes, no fundo coerentes com os humildes servidores da causa financeira internacional sediados no BCE (porque tinha mesmo de ser vendido o banco num fim de semana? capricho de meninos mimados longe dos problemas, ou querem displicentemente favorecer o comprador, para ele aparecer depois na televisão, a rir, dizendo que o Santander só faz bons negócios...) e no FMI.

PS em 8 de abril - a comissão parlamentar vai ouvindo todos os intervenientes e vãi-se sabendo, de fonte credível, que o XIX governo deixou arrastar a solução para a sua propaganda eleitoral poder dizer que a saída do resgate "foi limpa". Tratou-se portanto de uma falsidade usada para fins eleitorais, pelo que se pode afirmar que foram eleitores enganados que deram a maioria de deputados ao PSD (e contudo, faz parte das regras do jogo as eleições apesar disso, serem válidas). Igualmente é inaceitável a pressão do BCE para vender o banco num fim de semana. Idêntica indignidade está sendo cometida com a obrigação de "despachar" a participação angolana no BPI por o desvalorizar (isto é, é mercado manipulado).

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Desabafo de um velho rabugento - o patchwork

O velho rabugento sou eu.
E o desabafo é o costume, o de um velho a pensar que no tempo dele é que era bom e a arriscar-se a dizer disparates porque não tem conhecimento de todos os dados de um problema atual.
Ou talvez não seja bem assim.
Estou a falar de uma questão tecnológica. E nas tecnologias deverá respeitar-se o princípio de que a nova deve fazer o mesmo que a velha e mais coisas, com os mesmos ou menos meios.
Mas vamos ao concreto, sendo o concreto o ir ao aeroporto e embarcar num avião.
Dantes, antes de haver bilhetes eletrónicos e check-in pela internet, eu chegava ao aeroporto com a minha bagagem e ia para a fila do balcão do check-in aguardando a minha vez. Fila a fila, elas têm atualmente sensivelmente, o mesmo volume. Só que são muitas mais agora, o volume de passageiros quase duplicou, mas a carga por balcão é semelhante.
Então, antigamente, eu entregava a minha bagagem a uma simpática funcionária (ou funcionário) no balcão e ía para o portão de embarque.
Hoje, já com check-in feito pela internet mas precisando de entregar a bagagem, chega-se ao aeroporto da Portela e pensa-se "estão outra vez em obras, quando acabarão?"  (o grave é que para os gestores isto é um elogio porque mostra o interesse em dar mais facilidades aos passageiros; msa para um velho rabugento significa a fragilidade de uma infraestrutura que não tem capacidade para o tráfego que lhe é imposto). Depois a pessoa dirige-se para o balcão de check-in enquanto outros passageiros, que não "beneficiaram" do check-in pela internet são abordados por simpáticas funcionárias (que não existiam no tempo em que eu viajava) para fazerem o check-in das máquinas respetivas espalhadas pelo aeroporto (que não existiam no tempo em que eu viajava). Dado que as máquinas foramfeitas por informáticos, é a simpática funcionária que tem de fazer o dito check-in, nao o passageiro não frequente (são úteis as máquinas?). Voltando à pessoa com o check-in pela internet, verifica-se que é também abordada por outra simpática funcionária, que verifica previamente as condições de acesso à fila do balcão do check-in. e elas são mesmo necessárias porque até aparecem passageiros com bilhetes e check-ins em smartphones que mostram alegremente às simpáticas funcionárias (que não existiam no tempo em que eu viajava, nem elas nem os smartphones - deuses, como era possível viajar-se sem smartphones...).
Claro que os gestores do aeroporto dirão que é um atendimento personalizado que mostra consideração pelo cliente. Porém, para um velho rabugento, é apenas e tão somente, uma baixa de produtividade, um fazer o mesmo com mais recursos (o que no entanto tem a vantagem de proporcionar algum rendimento às simpáticas funcionárias). Além de que os velhos rabugentos estão sempre a lembrar-se da anedota da velhinha que não queria ser ajudada a atravessar a avenida e não gostam de ser ajudados a ir para a fila do balcão, preferem ir sozinhos.
Mas devo confessar que só me lembrei de escrever este desabafo depois de levantar os olhos e dar com um "patchwork" na parede por cima dos balcões de check-in.



Bonito, sem dúvida, muito apelativo para os turistas que descem à reserva dos selvagens (Aldous Huxley em Admirável mundo novo, José Cardoso Pires em O anjo ancorado) para ver o seu artesanato.
Mas que para um velho rabugento é apenas a incompetência da gestão das coisas públicas por incapacidade de planeamento - fazemse as coisas por remendo, a pouco e pouco, por decisões isoladas de um plano consistente e integrado de ações de crescimento.
Que aborrecimento, ser rabugento.