Exmo Senhor José
Manuel Fernandes
Relativamente ao
seu artigo no Observador de 2 de outubro sobre a degradação do serviço do
metropolitano de Lisboa,
envio-lhe, na
qualidade de reformado, o seguinte comentário por este meio, dada a sua extensão
inviabilizar a inserção na caixa de comentários.
Duma maneira
geral, como aliás não poderia deixar de ser, considerando a evidente degradação
do serviço do metro, o seu artigo contem informação válida e tem interesse
público.
No entanto,
gostaria de mencionar três incorreções do seu texto.
Uma irrelevante,
dada a pequena diferença entre os 15 milhões de euros anuais dos complementos
de reforma e o valor real inferior a 13 milhões, com tendência a decrescer dada
a mortalidade que já se vai verificando entre os 1400 reformados com direito ao
complemento de reforma (este direito extinguiu-se em 2004, deixando os
trabalhadores admitidos posteriormente de beneficiar dele).
Das outras duas,
uma refere-se ao termo "exponencial" para o aumento dos custos de pessoal devido à
reposição dos complementos de reforma. Não disponho dos gastos com pessoal de
2015 (não houve pagamento de complementos de reforma) nem de 2016 (já houve
pagamento de complementos de reforma a partir de abril), mas estimando valores
semelhantes aos de 2014 (não houve pagamento de complementos de reforma) de 68
milhões de euros, a subida devida aos complementos seria de cerca de 20%. Numa
subida exponencial, é preciso que um expoente se aplique à base da potência, e
não parece ser matematicamente o caso.
A terceira
incorreção parece mais grave do ponto de vista jornalístico, por negar uma
informação pública. Como se poderá ver por estas ligações,
Comunicado STRUP 13jul2016
degradação empresas transportes:
resolução aprovada em 14jul2016
com mensagem entregue ao 1ºministro:
carta aberta ao ministro das
finanças de 20set2016:
a CGTP não esteve muda e queda
quanto à degradação verificada no metro, não podendo portanto ser acusada de
esconder as deficiências, embora, qualquer que seja a sua atitude, suscitará
sempre críticas.
Aliás, os serviços técnicos do
metro avisaram oportunamente a sua administração da necessidade de encomenda de
novos rodados por os mais antigos terem
atingido o limite inferior de tolerância. Igualmente avisaram do próximo esgotamento
do stock de rolos de cartolina com chip, mas não terá sido dada a devida
atenção (os gastos normais com fornecimentos e serviços externos no metro são
da ordem de 31 milhões de euros por ano, suficientes para cobrir uma primeira
encomenda de rodados e de rolos de cartolina, sem necessidade de ir “buscar” dinheiro
aos gastos com pessoal ). Como consequência, estão atualmente parados 18
comboios num total de 111. Mas já foram encomendados rodados novos,
esperando-se um prazo de entrega de 4 meses mais outro tanto para reposição em
serviço de todos os comboios afetados.
Poderei ainda falar numa quarta
incorreção, mas esta de natureza subjetiva.
Não foi o meu caso, dado ter
retardado a minha reforma (mesmo assim, vi diminuído o meu rendimento de cerca
de 20%, o que contraria o mito de que os reformados do metro têm uma reforma
que lhes permitiu conservar o rendimento), mas muitos dos meus colegas viram o
seu rendimento diminuido de cerca de 40% enquanto os complementos de reforma
estiveram cortados. Recebiam 2000 euros (depois de uma carreira contributiva de
40 anos, apesar de alguns se terem reformado com 55 anos) e passaram a receber
1200 euros. Quando se lhes chama privilegiados e se responsabilizam os
reformados do metro pelo colapso económico da empresa (e do país, como alguns
comentadores jornalistas ou de caixa de comentário fazem) está-se, quanto a
mim, a ofendê-los, embora isso não seja mais do que um esforço de
desvalorização do fator trabalho.
É ainda verdade ( contudo, os
artigos de opinião não devem apresentar só meias verdades) que a média dos complementos
de reforma, 640 euros, é muito mais do que a maioria das pensões de reforma.
Certo, mas isso demonstra o estado de penúria do país quando comparado com o
resto da Europa (exceto países de leste), que os pensionistas do metro tiveram
carreiras contributivas longas, que, como disse o ministro sueco a Otelo, deve
nivelar-se por cima, não por baixo, e que podemos em qualquer altura abrir um
debate sobre a abertura ou fecho do
leque salarial e das pensões em Portugal (comparar por exemplo os salários e as
reformas do metro e do Banco de Portugal, da EDP, da TAP, os complementos de reforma
do metro com as subvenções vitalícias por poucos anos de deputado…com a reforma
do senhor doutor Catroga…) .
Eis porque acho deselegante o seu artigo,
repetindo que é uma apreciação subjetiva, embora com base numa conceção moral, e
convidativo aos comentários pouco educados que se podem ler em anexo do artigo
(e contudo, alguns comentadores mostraram lucidez nas suas análises).
Gostaria ainda de chamar a sua
atenção, já que se trata de dinheiros públicos, para algumas das razões da existência
de complementos de reforma até 2004. Até aos anos 90, os ordenados do metro
eram inferiores até aos da CP. Por isso a inclusão dos complementos no contrato
de trabalho servia de atrativo.
Se calcularmos o rendimento obtido
com a capitalização desse diferencial, coisa que em parte poderia ter sido
feita mas não o foi por incúria de algumas administrações (outras foram
sucessivamente tentando, sem sucesso junto da tutela e do ministério das
finanças, a criação de fundos de pensões – como é fácil criticar quando não se
está dentro do furacão, coisa aplicável ao escândalo dos swap) obteremos (obteríamos)
um valor confortável para o pagamento dos complementos durante 20 anos.
Igualmente podemos dizer que a
reforma antecipada de grande parte dos 1400 reformados do metro com
complementos de reforma gerou poupanças para a empresa graças ao trabalho
desses reformados que ao longo dos anos foram capazes de construir um
metropolitano cujos indicadores ombreavam com os homólogos, que souberam manter
o serviço quando empresas inglesas e americanas exerceram boicote de
fornecimento de peças a seguir ao 25 de abril e que, graças à excelência do seu
trabalho e à própria inércia do sistema, deixaram um sistema de transportes que
pode funcionar com menos trabalhadores.
Admitindo um valor médio do complemento
de reforma de 640 euros (a pagar pelo metro depois da reforma) correspondente a
um salário antes da reforma de 2200 euros (incluindo descontos para a segurança
social), a poupança mensal por reformado será de cerca de 1600 euros (22400
euros por ano por reformado). Se 1000
trabalhadores anteciparam a sua reforma (a empresa insistiu com eles) de 5
anos, a poupança terá sido de cerca de 110 milhões de euros. Metade bem poderia
ter sido utilizada num fundo de pensões, coisa prevista na lei da reforma da
segurança social de 2007, mas não se pensou nisso.
É verdade que este é um processo perverso,
porque a poupança é suportada pela segurança social, mas consideremos que se
tivessem permanecido na empresa ter-se-iam reformado com uma carreira contributiva
de 45 anos (quando se obrigam crianças a trabalhar, como querem que haja
justiça?).
Caso tenha curiosidade em conhecer outros pontos de vista sobre
a problemática dos transportes, seu financiamento, condicionamentos, contexto
internacional, relação com as energias e as emissões, e sobre os reformados do metro, incluindo o cálculo
dos custos das privatizações (pág.231) e da capitalização das poupanças do
diferencial de salários anteriores aos anos 90 (pág.300), sugiro a leitura de
Terei muito prazer em lhe oferecer gratuitamente uma versão pdf , caso queira.
Mas não tenho grande esperança que
este email chegue ao destinatário ou que este lhe preste atenção, e quando digo
isto estou a manifestar grande descrença na sociedade que se diz de informação
e de partilha de conhecimentos, experiências e potencialidades, o que, no fundo,
virá confirmar a manutenção do estado em que vivemos de apagada e vil tristeza
de que já Luis Vaz falava, e a incapacidade que nós, portugueses, temos de nos
organizarmos em comunidade aberta, participativa e produtiva.
Com os melhores cumprimentos
Fernando Santos e Silva
Reformado do metropolitano de Lisboa
PS em 27 de novembro de 2016 - Será quase certo que o email não foi lido pelo destinatário, mas ele surpreendeu-me ontem, numa mesa televisiva de comentário ao aniversário do XXI governo. Voltou a falar no metro e nas excessivas regalias dos seus trabalhadores, Só que desta vez disse que as suas remunerações eram excessivas apenas por comparação com a maioria dos outros trabalhadores, que era uma coisa relativa, não um valor absoluto do seu trabalho. Como diria Fernando Pessa, e esta hein? afinal não quer desvalorizar o trabalho de quem trabalha, é só por uma questão de comparação (não claro, com o banco de Portugal ou com a EDP ou com a reforma da SAPEC). Pode ser que mais tarde venha a concordar que se deve nivelar mais por cima do que por baixo. Vamos ver.
PS em 27 de novembro de 2016 - Será quase certo que o email não foi lido pelo destinatário, mas ele surpreendeu-me ontem, numa mesa televisiva de comentário ao aniversário do XXI governo. Voltou a falar no metro e nas excessivas regalias dos seus trabalhadores, Só que desta vez disse que as suas remunerações eram excessivas apenas por comparação com a maioria dos outros trabalhadores, que era uma coisa relativa, não um valor absoluto do seu trabalho. Como diria Fernando Pessa, e esta hein? afinal não quer desvalorizar o trabalho de quem trabalha, é só por uma questão de comparação (não claro, com o banco de Portugal ou com a EDP ou com a reforma da SAPEC). Pode ser que mais tarde venha a concordar que se deve nivelar mais por cima do que por baixo. Vamos ver.
OLÁ! COMOP POSSO DEIXAR DE RECEBER OBSERVADOR ONLINE ? Obrigado
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