Em recente transmissão pela SIC
Notícias duma reportagem sobre o andamento das obras do metro, realizada em dezembro de 2021 mas
transmitida dep is das eleições de 30 de janeiro de 2022, o sr professor Alvaro
Costa, que se sabe agora foi consultor para a elaboração do mapa de 2009 do
MOPTC para a expansão do metro, vincou bem como fundamento da linha circular a
possibilidade de uma frequência elevada (pequeno intervalo entre comboios)
enquanto no troço Campo Grande-Odivelas a frequência é menor (maior intervalo
entre comboios). Esta diferença justifica-se por diferentes níveis de procura, devido
aos movimentos pendulares no troço C.Grande-Odivelas com rarefação fora das
horas de ponta. Com base neste argumento, seria preferível a linha circular
mais a linha tangencial Odivelas-Telheiras, à linha em laço
Odivelas-C.Grande-Rato-C.Sodré-Alvalade-C.Grande-Telheiras.
Tem o sr professor razão neste
aspeto, a separação da linha Odivelas-Telheiras tangencial relativamente à
linha circular permite ter um intervalo de 2,5 minutos na zona circular e de 5
minutos na linha OD-TE com menos comboios
(6 na linha OD-TE e 31 na circular, incluindo reservas) do que na linha
em laço com intervalo uniforme de 2,5 minutos (total de 43).
Só que já é possível, atualmente,
compensar a desigualdade de procura com a utilização do término intermédio de
C.Grande: 1ºcomboio Rato-Odivelas, 2ºcomboio Rato-C.Grande, 3ºcomboio
Rato-Odivelas, e assim sucessivamente.
O término intermédio de C.Grande
não foi concebido para otimizar este tipo de exploração; para esse fim seria
preferível um resguardo de inversão entre as duas vias. Poderá otimizar-se a
infraestrutura existente com recurso à condução automática (compatível com
sistema CBTC encomendado) para redução do tempo de inversão de modo a obter
frequências elevadas (no caso da condução assistida, isto é, automatizada mas
com a presença de maquinista, a redução do tempo de inversão consegue-se
utilizando condutores de reforço , isto é, mudando de condutor em cada
inversão no término intermédio).
Poderá então, para explorar a
linha em laço com equilíbrio da procura enquanto ela for menor no troço
Odivelas-C.Grande, recorrer-se a um tipo de exploração não só com inversão em
C.Grande/lado Quinta das Conchas, mas aproveitando a possibilidade de lançamento
de comboios a partir do acesso do PMOII de Calvanas para redução do intervalo
durante as horas de ponta. Será ainda possível reduzir o número de comboios
para 39 se nas horas de ponta se utilizarem comboios expresso Odivelas-C.Grande:
1ºcomboio Odivelas-C.Grande sem paragem nas estações intermedias, 2º comboio
Odivelas-C.Grande com paragem em todas as estações intermédias, e assim sucessivamente.
Vem o senhor presidente do Metro
dizer que com a maior frequência da linha circular se vai reduzir o tempo de
espera e de percurso para os passageiros da linha de Odivelas forçados ao
transbordo em C.Grande. A componente falaciosa desta afirmação é fácil de
detetar, porque é o mesmo que dizer, não temos comboios e maquinistas
suficientes para assegurar intervalos curtos nas outras linhas, contentem-se
portanto com serviços rápidos na linha circular, ou por outras palavras, com a
verdade se pode enganar.
Certo que um dos objetivos deve
ser o alisamento do diagrama de marcha, preferentemente subindo as cavas em vez
de baixar as pontas (nivelamento por cima). No caso vertente, tratar-se-ia de
aumentar a procura no troço C.Grande-Odivelas através do “desvio” dos
utilizadores de transporte individual para o metropolitano, integrando assim
este troço na zona central da cidade. Para isso, é essencial aumentar a oferta,
e não “ajustar” a oferta à menor procura, porque reduzir a oferta piora a
perceção da qualidade do serviço e afasta os utilizadores. Evidentemente que
obrigar os moradores desta zona a um transbordo em C.Grande é um fator
negativo.
Se recordarmos que o PROTAML
(plano regional de organização do território da área metropolitana de Lisboa)
determinava a consideração de um círculo de raio 10 km a contar do Marquês de
Pombal, então todo o troço Odivelas-C.Grande está nele incluído (Odivelas-M.Pombal
em linha reta: 8 km; Hospital Beatriz Angelo-M.Pombal em linha reta: 11 km).
Por outro lado, a linha circular inscreve-se num círculo de 4 km de raio
(C.Grande-M.Pombal em linha reta: 4 km). Por outras palavras, é uma incorreção
o EIA (estudo de impacto ambiental) da linha circular dizer que a linha
circular respeita o PROTAML.
É este conceito que deverá
sobrepor-se à estimativa de que uma variante atrai mais passageiros do que
outra variante, apesar do EIA reconhecer que em 2016 houve 18 milhões de
validações nas estações de Odivelas a Quinta das Conchas, contra 16 milhões na
estação Cais do Sodré (se estimarmos que 40% dos passageiros vindos da linha de
Odivelas já fazem o transbordo para a linha verde, também teremos de estimar
que nem todos os passageiros da linha de Cascais se destinam à zona da Avenida
da República). A reportagem da SIC Notícias terminou com o comentário do prof Alvaro Costa dizendo que a contestação à linha circular é motivada por haver pessoas prejudicadas e que qualquer prolongamento do metro prejudicaria alguém. Não é um comentário elegante porque há mesmo moradores prejudicados concluindo-se que os habitantes da linha de Cascais são mais importantes do que os da linha de Odivelas, mas também porque privilegia a zona urbana em detrimento da área metropolitana. E isso é uma prepotência não desculpável, como não é desculpável a recusa do governo em cumprir o art 282 e o art 283 da lei 2/2020 da Assembleia da República.
A considerar também o argumento
de que se pretende transferir o uso do transporte individual , neste caso o
correspondente às origens e destinos do troço Odivelas-C.Grande, para um
transporte mais eficiente como o metropolitano. Este argumento é imperativo perante
as diretivas europeias contra as alterações climáticas (podemos imaginar a
deslocação de 10.000 passageiros por hora e sentido que tenham trocado o
automóvel pela bicicletas, mas teríamos provavelmente uma surpresa com o
congestionamento de bicicletas e a necessária ocupação de espaço urbano.
Acresce que há um pequeno erro de
consequências graves na organização do território do Campo Grande, se
atendermos a critérios de eficiência energética. O terminal rodoviário do
C.Grande perdeu a principal justificação com os prolongamentos do metropolitano
a Odivelas e à Gare do Oriente-Aeroporto. O investimento na recente remodelação
teria sido mais eficiente se se construíssem terminais rodoviários das
carreiras do Oeste em Odivelas e Senhor Roubado, e na Gare do Oriente ou
Moscavide para as carreiras da margem direita do Tejo. Aliás, o prolongamento do metropolitano como
modo pesado, e não em LRT, de Odivelas ao Hospital Beatriz Angelo permitiria
adaptar a procura à oferta nomeadamente com um parque dissuasor junto da CREL e
do hospital, até porque zonas como a da Ericeira e Mafra são das de maior
crescimento demográfico.
Dado o exposto, sendo verdade que
haverá economia de comboios separando a linha circular e tangencial para
obtermos um intervalo entre comboios de 2,5 minutos na zona central, também é
verdade que a linha em laço serve melhor, como estruturante, a área
metropolitana de Lisboa, e a perda daquela economia é o preço que tem de se
pagar por esta melhoria, quando for necessária a frequência dos 2,5 minutos (24
comboios por hora e sentido, correspondendo a 40.000 passageiros por hora nos
dois sentidos, 400.000 passageiros por dia nos dois sentidos e 130 milhões de
passageiros por ano).
A propósito desta problemática,
terá talvez interesse, em contraste com a valorização que os seus defensores
têm feito da linha circular, compará-la com a linha circular de Madrid, que circula
pelas duas margens do rio Manzanares e é atravessada por 7 linhas radiais e
outras duas têm nela origem para a periferia. A circular de Lisboa é
atravessada por 2 linhas e tangencial a uma, e a sua área circunscrita cabe
aproximadamente 4 vezes na área circunscrita da circular de Madrid. Dir-se-á
que não são comparáveis; então não deve ser utilizado o argumento que noutros
metropolitanos também há linhas circulares.
Cotejando os desenhos esquemáticos das redes de Madrid e de Lisboa:
Não é por ser circular que se critica esta linha, é pelas suas dimensões e pior fiabilidade e serviço da área metropolitana. Como em tudo, tem de se atender ao contexto. Neste caso, como explicado por exemplo pelo prof José Viegas, deveria ter-se atendido ao conjunto da rede, não à comparação de dois pequenos troços para escolher um (ver revista MOB, jan-fev2022).
E se se disser que a linha
circular integra o plano de 2009 do MOPTC
(um plano para 29 novos quilómetros feito à pressa sem atender aos
planos anteriores e contendo alguns erros de projeto de redes de metro),
convirá recordar que o próprio MOPTC tinha um plano estratégico de transportes,
para todo o país, de âmbito 2008-2020, publicado em maio de 2009 (antes da data
do mapa de 2009 com a linha circular, que é de setembro) e que nesse plano estratégico nada há sobre a
linha circular, antes se fala na expansão das linhas do metro amarela, azul e
vermelha (omitindo-se a verde) e em concordância com as orientações para a área
metropolitana do PNPOT (programa nacional da política de organização do
território) e do PNAC2006 (programa nacional para as alterações climáticas).
Analogamente, o PDM de Lisboa de 2016 não falava na linha circular, foi
adaptado pouco depois em função da decisão do governo pela linha circular em
2017.
Isto é, o referido mapa é uma
iniciativa de autosuficientes que infelizmente, com o apoio declarado e
exclusivo do respetivo partido, surdos à experiência na operação e na manutenção, conseguiram levar avante a sua proposta contra
a própria lei 2/2020 da Assembleia da República e contra as boas práticas de
projeto.
Referências:
- SIC Notícias – reportagem sobre
o metro de Lisboa em 2fev2022
https://sicnoticias.pt/pais/linhas-intermitentes/
- revista MOB Magazine, jan-fev2022
– reportagem circular ou em laço?
https://www.facebook.com/MobMagazine/
- Cálculo do
número de comboios necessários para diferentes modos de exploração:
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2019/03/email-para-o-sr-presidente-da-camara-de.html
https://fcsseratostenes.blogspot.com/2018/01/ultima-tentativa-ultima-chamada-da.html
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