sexta-feira, 3 de junho de 2016

Seleção de traçados numa rede urbana


Continuo a pensar que os períodos de contenção de despesas devem ser aproveitados para planear os investimentos futuros.
No caso dos transportes urbanos, esses investimentos correspondem a compromissos internacionais, nomeadamente para redução das emissões poluidoras, e são suscetíveis de obtenção de apoio  comunitário, basta recordar os discursos de Jean-Claude Juncker, da comissária dos Transportes Violeta Bulc ou de Daniel Gros (Centro de Estudos Europeus):
http://europa.eu/rapid/press-release_SPEECH-16-1893_en.htm
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/2015/01/transportes-e-investimentos-email.html
http://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/economistas/daniel_gros/detalhe/a_europa_e_a_mania_dos_investimentos_mal_orientados.html

Lisboa e Porto, com 60% de quota do transporte individual nas deslocações motorizadas nas áreas metropolitanas precisam de uma intervenção decisiva.
Não é sustentável continuarmos a despender o dinheiro que não temos no desperdício energético do transporte individual.
Não é possível sustentar o apetite dos importadores de automóveis e de petróleo.
Nos primeiros 5 meses de 2016 o crédito para  aquisição de automóveis atingiu 199 mil milhões de euros, ou 117% do PIB, vendendo-se 95240 automóveis.
É isto compatível com a afirmação gaspariana de "não há dinheiro"?

Possivelmente por concordar comigo, embora só em parte, a câmara de Lisboa vem criando sucessivos estrangulamentos à circulação automóvel.
Onde havia 3 vias para aumentar o escoamento, nos semáforos de mudança de direção ou nos recortes de paragem de autocarros, reduz para 2 vias.
Na 2ª circular, ignorando prepotente e arrogantemente os pareceres dos cidadãos, reduz a largura da via utilizada pelos autocarros para alargar o separador central. Pela cidade vai criando praças pedonais e vias cicláveis.
Claro que concordo com a restrição do trânsito automóvel, nomeadamente impondo limites urbanos de velocidade e fiscalização rigorosa do estacionamento, mas devem desenvolver-se alternativas. Porém, o transporte público não tem neste momento capacidade de resposta se houver um aumento de procura, além de que faltam ainda alguns troços para a rede de metropolitano cobrir a cidade.
É possível que os técnicos da CML se tenham deixado encantar pelo paradoxo que a seguir explicarei e que pode seduzir pelo velho princípio da sangria, para baixar a hipertensão. O problema é que pode criar anemia fatal ás atividades económicas, quando a procura turística baixar.

Apresento aqui uma proposta de estudo de expansão da rede do metropolitano com base nalguns princípios da técnica dos transportes, desejando que se passasse a um debate aberto sem ideias preconcebidas.






Seleção de traçados. Matriz origem-destino, problema geral de transportes. Fluxo de custo mínimo em redes de transporte, algoritmos de otimização (programação) linear, micro-simulação. Lei fundamental do trânsito, paradoxo de Braess. TOD – traffic oriented development (desenvolvimento orientado pelo trânsito). Organização do território. Caso de Lisboa

O método correto de abordagem do problema dos transportes numa dada região consiste, a partir dos dados de ocupação e organização do território, principalmente com recurso a inquéritos de tráfego, habitação e emprego, traçar a matriz origem destino, com a procura dos percursos nas colunas de entradas e a oferta da transportadora nas linhas de entradas.
Os pontos definidos serão os valores estimados para os custos de construção, operação e manutenção dos percursos.
A conversão da matriz em grafo ou rede de arcos e vértices representando os destinos segundo o princípio do fluxo de custo mínimo permitirá escolher os percursos a construir.
O problema geral de transportes pode enunciar-se como a ligação entre um conjunto de polos geradores de oferta ou origens e um conjunto de polos atrativos de procura ou destinos.
Do lado da oferta ou origem pode considerar-se um conjunto de locais de produção de um bem ou serviço e do lado da procura ou destino um conjunto de locais de utilização desse bem.
Os custos Cij do transporte por unidade de fator de produção do transporte podem registar-se num quadro em que no rodapé das colunas estão os volumes Dj de tráfego de procura desses destinos e na lateral das linhas os volumes Oi de tráfego gerado nos locais de origem.




destinos
Oferta total

origens
C11
C12
C13
C14
C1j
O1
C21
C22
C23
C24
C2j
O2
C31
C32
C33
C34
C3j
O3
Ci1
Ci2
Ci3
Ci4
Cij
Oi
Procura total

D1
D2
D3
D4
Dj



(Referência:  Investigação operacional – Transportes, afectação e optimizaçãode redes” de Manuela Magalhães Hill, Mariana Marques dos Santos e Ana Líbano Monteiro, ed.Sílabo )


O método de programação linear do fluxo de custo mínimo é aplicável ao problema geral de transportes ao pretender determinar o custo mínimo total entre os vértices extremos de uma rede existente em função dos fluxos entre vértices, ou o custo mínimo de construção de uma rede em função do custo de construção dos arcos entre vértices.
Pode resolver-se pelo algoritmo de Dijkstra (Daikstra), dada uma rede de vários vértices e conhecidos os custos de transporte (ou as capacidades de transporte do troço, ou os tempos de percurso) ou de construção dos respetivos arcos e afetando a cada vértice uma etiqueta à medida que avança a resolução, sempre no sentido do custo mínimo do caminho entre vértices e conjuntos sucessivos de vértices.


    Os números representam o custo, a distância, a capacidade, o tempo de percurso, etc.

vértices
Etiquetagens e eliminações sucessivas
B
AB=4
ACB=3
Elimina AB
C
AC=2


D
ACD=10
ACBD=8
Elimina ACD
E
ACE=12
ACBDE=10
Elimina ACE
F
ACBDEF=12
ACBDF=14
Elimina ACBDF

O caminho mais curto ou o custo mínimo é  ACBDEF=12

Referências youtube do algoritmo de Dijkstra:



Lei fundamental do trânsito – Considerando uma procura elástica (curva pouco inclinada, quantidade de procura em abcissas), ou um potencial elevado de procura, qualquer aumento da capacidade de uma via de transporte para resposta a uma situação de saturação, rapidamente conduzirá a uma nova situação de saturação por ter aumentado a sua atratividade.
No caso de transportes de massas, com um diagrama de cargas normalmente limitado nas horas de ponta, esta lei traduz-se pela descompressão das pontas sempre que se aumenta a capacidade de transporte.


Os métodos de programação ou otimização linear são especialmente indicados para análise do trânsito rodoviário, nomeadamente para o conjunto dos nós e vias rodoviárias, bem como os programas de microsimulação que permitem visionar a estimativas de distribuição dos fluxos de trãsito pelas artérias disponíveis ou previsíveis.
 Na teoria da previsão das escolhas de itinerários tem interesse referir o paradoxo de Braess, aplicável principalmente ao tráfego rodoviário, destacando no entanto os riscos da sua interpretação fora de contextos ou isolado da teoria do equilíbrio de Nash.
No trânsito rodoviário com tendência para o congestionamento, o condutor egoísta tende a adotar comportamentos que o beneficiem, contando que os outros condutores mantenham as suas estratégias de condução. Por exemplo, a ultrapassagem em vias congestionadas sem intenção de mudança de direção, manobra proibida pelo código da estrada, tem como consequência a redução do tempo de percurso do condutor egoísta mas o aumento do tempo médio de percurso de todos os condutores, por gerar perturbação no sentido contrário do trânsito ao provocar uma travagem no veículo ultrapassado. No entanto, o sistema acaba por atingir um equilíbrio, o equilíbrio de Nash, quando se torna impossível a um condutor obter benefícios ao alterar a sua estratégia unilateralmente, isto é, independente dos outros participantes.


                                             Paradoxo de Braess 



As políticas de economia de investimentos podem recorrer a estes critérios para justificar o não investimento em novas infraestruturas.
Numa rede existente mal dimensionada, com troços de pouca capacidade, ou se se alterou a matriz habitação-emprego de um território, o paradoxo de Braess pode efetivamente verificar-se se é adicionado à rede um novo troço que fique em série com os troços saturados em vez de os by-passar. 
Dependendo da atratividade dos troços da nova rede, a escolha dos condutores pode sobrecarregar os percursos preferidos aumentando os respetivos tempos. 
Este fenómeno pode ser invocado para fechar troços de uma rede para, por exemplo, transformação em vias cicláveis ou praças pedonais, em vez de investir nas infraestruturas de transporte público alternativas ao transporte individual.
Por outro lado, dificultar o escoamento do tráfego de veículos pode diminuir a sua procura, desviando o trânsito para outras artérias ou os condutores para o transporte público (se houve investimento prévio no transporte público), ou simplesmente arrefecendo a economia,  justificando o fecho de vias urbanas e a sua transformação em vias cicláveis ou praças pedonais.
Inversamente, a expansão eficaz  de uma rede rodoviária para resolver o congestionamento prévio poderá ter o efeito perverso de desviar passageiros do transporte público para o transporte individual, aproveitando o aumento de oferta das suas iinfraestruturas.

Neste contexto é importante a regulação dos preços de utilização das rodovias para controlar a procura destas, para melhor distribuir o tráfego pelas diferentes vias  e para garantir procura ao transporte público, através de diferentes tarifas de portagens de vias de acesso às cidades,  de portagens de entrada nas cidades e de tarifas de estacionamento.

 Apesar da elegância das soluções de programação ou otimização linear, o seu carater académico e caraterísticas não típicas  da organização efetiva do território poderão recomendar uma análise mais concreta da realidade existente.

O departamento de planeamento de S.Paulo introduziu o conceito de “corredor progressivo”, ou de realização faseada de um plano integrado, diferida no tempo consoante as disponibilidades de financiamento, no pressuposto de serem evitadas soluções intermédias que comprometam o plano final (exemplo de aplicação a Lisboa: sendo prioritário o prolongamento da linha vermelha para ocidente, poderá deixar-se a construção da estação Campolide para segunda oportunidade, aplicando os fundos disponíveis na construção de mais quilómetros de galeria, ou viaduto).

O método TOD (traffic oriented development, ou desenvolvimento segundo o fluxo de tránsito) parecerá mais prático, consistindo em procurar que qualquer ponto de uma zona habitacional e de emprego não fique a mais de 10 minutos a pé de distancia de uma estação de metro. 
Esse tempo de percurso a pé corresponde aproximadamente a 800m e à distancia interestações ótima. 
Considera-se a parte habitacional como polo gerador de oferta, e a parte secundária e terciária como polo atrativo de procura.

Considerando que:

- é prioritária por razões de sustentabilidade energética a transferência de deslocações em transporte individual para o transporte coletivo ferroviário garantindo os atuais fluxos por rodovia de penetração ou contorno dos limites do município (A1 – A8 – A16 – IC19 - A5 – Marginal – Ponte 25 abril – Ponte V.Gama)
 
-  a distância entre estações eficiente do ponto de vista energético é da ordem de 900m, o que justifica o critério de que qualquer ponto urbanizado da cidade esteja a menos de 800m de uma estação

- a rede de metro deve ser complementada com outros modos de transporte mais ligeiro e flexível, desde o metro de superfície a frotas de veículos a pedido, com condução integralmente automática (driverless) e  guiamento em sítio segregado

-a organização do território da área metropolitana de Lisboa encontra-se desequilibrada, nomeadamente pela desertificação da cidade de Lisboa (envelhecimento da população, degradação dos edifícios, reabilitação urbana com custos elevados de revenda, predomínio da atividade turística, abandono de atividades económicas), e da concentração da população e deslocação de empresas do setor secundário e terciário para cidades dos subúrbios,

parecerá que a elaboração de um plano de transportes para a área metropolitana de Lisboa deverá basear-se na realidade existente, com todas as suas inconformidades, na integração da rede de transportes nos planos de reorganização do território e na economia e rentabilidade, em termos de custos-benefícios, dos meios a empregar.

Tal plano não deverá exigir um ritmo demasiado apressado, antes deverá ser faseado, evoluindo de estado para estado segundo o princípio de custo mínimo, considerando os custos e benefícios, incluindo temporais, e manter a natureza de plano integrado no tempo e com as restantes atividades económicas.


Apresenta-se nesta perspetiva uma proposta de um novo mapa de traçados da rede de metro e modos complementares que deverá ser completada com uma análise de custos-benefícios e de viabilidade de obtenção de fundos comunitários.

Será com base em análises de custos-benefícios que deverá ser feita a comparação com outras propostas.






Pormenorização do mapa de expansões

1- linha vermelha, S.Sebastião-Belém-Algés


Construção faseada, com prioridade à construção dum interface intermodal junto das Amoreiras e nova urbanização de Campo de Ourique para o TI vindo da A5; objetivo turismo em Belém  e interface com a linha de Cascais em Algés e com a linha da ponte 25 de Abril no Alvito

2 - Linha vermelha, Aeroporto-Campo Grande


melhoria das correspondências com as outras linhas; serviço do terminal 2 do aeroporto; liação em viaduto do terminal 2 ao Campo Grande;  receção de futuras linhas de metro de superfície servindo Sacavem, Bobadela, Frielas, Loures, e a Alta de Lisboa

3 - Linha amarela, Rato-Cais do Sodré-Cacilhas


linha em espiral dado o desnível entre Rato e Cais do Sodré; serviço da Estrela, MNAA, Alcantara, Campo de Ourique, Parlamento e, por ligação hectométrica, Cais do Sodré; futura ligação a Cacilhas e metro sul do Tejo


4 - Linha azul, Reboleira-Hospital Fernando Fonseca


objetivo interface com o TI do IC19; ligação a futura linha de metro de superfície Algés-Loures

5 - Linha azul, S.Apolónia-Olaias


correção do término de S.Apolónia com prolongamento até Comendadeiras com correspondência em estação sobreelevada de nova linha de metro de superfície; construção articulada com o alargamento do terminal de contentores de S.Apolónia; nova linha em viaduto empre que posível com correspondência em Olaias com a linha vermelha e a linha de cintura da CP


6 - Linha verde, Telheiras - Pontinha


objetivo interface com o TI do IC16 e IC17 e ligação a futura linha de metro de superfície Algés-Loures; em viaduto serve a nova feira popular e tem correspondência com a estação Pontinha




1 comentário:

  1. Propostas ousadas. Gostei particularmente da linha de metro ligeiro de superfície.
    Esperemos que haja bom senso.
    Abraço.
    AV

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