domingo, 5 de maio de 2019

Chumbado o plano ferroviário do BE



Depois de uma discussão no plenário pobre, do ponto de vista técnico,  e morna do ponto de vista do debate politico, em que os senhores deputados se esmeraram, em função das suas filiações partidárias,  em apostrofar os adversários e a repetir as lenga-lengas justificadoras das ações e omissões dos respetivos partidos, o projeto de lei do Bloco de Esquerda com o anteprojeto de um plano ferroviário até 2040 foi chumbado, com votos favoráveis apenas do partido proponente e do PAN.
Foi pena, a iniciativa era meritória, para além de pretender substituir o trabalho cometido em 2015 ao XXI governo. E os partidos que o reprovaram ou se abstiveram, perderam uma boa oportunidade para o remeter para uma comissão na especialidade e aí de forma cooperativa produzirem um documento conjunto sem obstáculos partidários. Teria sido um serviço público, assim foi remeter a solução do problema para um futuro longínquo, agora que os senhores políticos tèm assuntos tão importantes a resolver, embora em 2015 já fosse tarde para estruturar a solução. Aguardemos entretanto pela apresentação de um plano ferroviário prometido pelo deputado do PSD.
Muitos dos senhores deputados têm pouca experiência em empresas de transportes, e isso viu-se no debate no plenário. Têm dificuldade em ver o conjunto de ameaças e de oportunidades em ambiente real. A oportunidade neste caso é o cofinanciamento europeu numa ação integrável na “descarbonização” e portanto coincidente com os próprios objetivos da CE. Isso contrabalança o velho argumento do "não há dinheiro". No entanto, só há cofinanciamento se Portugal desenvolver os anteprojetos e os justificar de acordo com os critérios da CE e da sua rede transeuropeia de transportes. A ameaça é que o tempo passa, os níveis de cofinanciamento vão baixando por desaproveitamento dos quadros estratégicos plurianuais, cada dia que passa vai engordando o desperdício energético porque o consumo por passageiro-km é superior na ligação aérea Lisboa-Madrid do que seria na ligação ferroviária de alta velocidade e porque a tonelada-km de mercadorias transportada por camião custa mais 3 centimos do que por comboio em linha com os critérios das redes transeuropeias (são à volta de (tráfego internacional anual por camião: 22.000 milhões de ton-km; por ferrovia: 800 milhões de ton-km, o que evidencia a fragilidade e incapacidade da rede existente).
Muitos dos senhores deputados têm dificuldade, e isso viu-se no debate, em conceber uma empresa de transportes dotada, para além da sua área de operação, duma área de manutenção (devidamente protegida contra a sabotagem das cativações), mas também duma área de estudos e projetos (para execução própria ou fiscalização ou coordenação de trabalho encomendado a terceiros. De acordo com o princípio de qualidade, deverão ser hierarquicamente independentes entre si e as suas opções estratégicas não poderão ser silenciadas por deliberações das administrações (isto é, havendo divergência, ela deverá ser publicamente assumida sem penalização dos técnicos que discordam da administração).  Não serve pois de argumento defensivo para o XXI governo e seus deputados o montante orçamentado (já que a execução em obra terminada é fraca) para a manutenção (dita modernização) da rede existente. Qualquer empresa ferroviária saudável tem de ter um orçamento para a sua manutenção e um orçamento para a sua expansão. E o plano ferrovia 2020 falha nisso e o caminho de preparação que o PNI2030 vem trilhando, parece também falhar, pela insignificância do debate público e secretismo do tratamento dos contributos enviados.
Se muitos dos senhores deputados tivessem trocado impressões com técnicos que privilegiassem critérios de eficiencia em vez de critérios partidários, teriam aceitado que é dificil e moroso a organização e funcionamento de equipas técnicas para pôr de pé um projeto de infraestruturas, e que os atrasos que se vão somando com as indecisões que nos caraterizam se ampliam nos sucessivos anos em que vamos continuando a pagar a fatura do nada fazer e a lamentarmo-nos de não podermos colher os benefícios.

Era importante discutir, em período de campanha eleitoral para as eleições europeias, as ligações ferroviárias à Europa, assim como as ligações energéticas. Mas falta sensibilidade para isso, foi pena.

Em resumo, oportunidade perdida.

http://www.canal.parlamento.pt/?cid=3974&title=reuniao-plenaria

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